grelhas excluidoras: limitando as rainhas sem as limitar

Na utilização da técnica Doolittle para fazer desdobramentos tenho de confinar a rainha ao ninho por meio de uma grelha excluidora de rainhas.

Esta colónia, que habita uma colmeia do modelo Langstroth, recebeu o sobreninho a 21-03. A rainha foi confinada ao ninho em 27-03 por uma grelha excluidora, portanto há pouco mais de um mês.

Quando se menciona grelhas excluidoras de rainhas surge inexoravelmente a questão se limita ou não a postura das rainhas. Vamos por partes!

Esta é uma lâmina de cera que costumo utilizar nos ninhos das Langstroth. Tem 19,5 cm por 42 cm.

Ontem, depois do jantar comedido que fiz, decidi contar os alvéolos desta lâmina de cera.

Tinha 41 alvéolos na altura e 78 na largura. Multiplicando estes dois números fiquei a saber com rigor que estão presentes 3198 alvéolos em cada face desta lâmina de cera. Nas duas faces são 6396. Como incrusto a cera mais próximo do travessão do fundo dos quadros, estimei a altura com mais três filas de alvéolos, neste caso 44 em altura. Fazendo novamente as contas para esta alternativa obtenho um total de 3432 alvéolos em cada face, perto dos 7000 nas duas faces.

Outra questão que importa esclarecer: uma rainha põe exactamente quantos ovos por dia? Eu não sei! Julgo que varia de acordo com vários factores. Contudo na literatura são referidos valores médios a variarem entre 1000-2000 ovos/dia. Muito bem, se assim é 8 quadros do ninho bem desbloqueados dão espaço de sobra a uma rainha com uma postura média de 2000 ovos/dia durante 20 dias. Sim, porque ao fim do vigésimo dia começam a emergir as abelhas geradas a partir dos ovos postos 20-21 dias antes. E de novo esses alvéolos ficam disponíveis para um novo ciclo de postura — de facto o reverendo Langstroth não andava sob o efeito de psicotrópicos quando idealizou as dimensões dos quadros da sua colmeia.

Em conclusão, a grelha excluidora limita o espaço de postura de uma rainha ao ninho, mas não tem forçosamente de limitar a postura em si mesma. Bem desbloqueados os 10 quadros do ninho no modelo Langstroth — e também os da Lusitana, que têm um número de alvéolos muito próximo — não limitam a postura das minhas rainhas. No período de 20 dias permitem a oviposição de 40 mil ovos. Sabendo que a população máxima de uma colónia iberisiensis ronda as 45 mil abelhas, parece-me que não é “contra-natura” a utilização da grelha excluidora nas condições que descrevo. Não noto, nestas colónias, atraso nenhum no seu desenvolvimento.

Tirei umas fotos para me convencer que também não ando sob o efeito de psicotrópicos quando trabalho nos meus apiários — desde que anteontem uma raposa se aproximou de mim, a menos de 10 metros, enquanto eu trabalhava silenciosamente no meu apiário como é meu hábito, e ambos ficámos admirados de nos vermos ali tão inesperadamente próximos, que já não sei aos certo se o que vejo existe ou se vejo o que quero ver. Se calhar é um pouco das duas coisas!

Quadros do ninho da colónia 1, com rainha confinada ao ninho.
Quadros do ninho da colónia 2, com rainha confinada ao ninho.
Quadros do ninho da colónia 3, com rainha confinada ao ninho.

Mas como a apicultura é feita de imprevistos e de singularidades, se alguém desejar ensaiar não deixe de ir fazendo as suas observações e os ajustamentos que achar adequados. Nem sempre tudo sai como o planeado!

Como não saiu como planeado o meu primeiro ensaio na utilização da técnica de translarve.

A minha amiga Filipa Almeida e os meus amigos David Marques, João Gomes e Francisco Rogão já me deram umas dicas preciosas para evitar este colossal fracasso na próxima vez que tentar de novo.

a prevenção e o controlo da enxameação: o testemunho de um amigo apicultor

Quando desafio um ou outro apicultor a testemunhar a sua experiência apícola em torno desta ou daquela ideia por aqui veiculadas, é muito gratificante receber os seus testemunhos a confirmarem os ganhos que obtiveram — um pequeno aparte: uma das teorias da motivação mais interessantes que conheço, afirma que o sentido de utilidade que retiramos do que fazemos é um dos factores mais estimulantes para persistir e manter o empenho no que fazemos; como sou feito da mesma matéria que todos, importa-me saber que não estou a escrever sobre o “céu azul”, sim que estou a retratar com boa fidelidade a realidade dos meus apiários e os impactos das intervenções que realizo, que mais proximamente ou mais longinquamente há alguém que ficou a reflectir, que decidiu experimentar e, cereja no topo do bolo, obtém resultados satisfatórios. Por exemplo, recentemente o Rui Martins testemunhou como a sua estratégia de luta contra a varroose melhorou significativamente quando passou a ter em consideração o timing da aplicação dos tratamentos.

Hoje, publico o testemunho do meu amigo Miguel Pais acerca do impacto que algumas das sugestões por aqui divulgadas estão a ter nos seus apiários, em particular na prevenção da enxameação e no controlo da mesma. O texto e as fotos são suas. Obrigado Miguel por teres aceite o desafio e lhe teres dado resposta tão rapidamente. Um abraço!

Iniciei-me na Apicultura há quase 4 anos. Comecei com um enxame, e neste momento tenho cerca de 60 enxames. Tendo a varroa controlada, com poucas perdas anuais e conseguido não só manter o efectivo mas até aumentá-lo gradualmente de ano para ano, sinto cada vez mais a necessidade de prevenir e controlar a enxameação de uma forma mais prática e aumentar assim a produtividade das colmeias.

Visto que muitas vezes não quero aumentar mais o efectivo por já ter feito os desdobramentos que pretendia, começo agora a experimentar vários métodos de prevenção e controlo da enxameação. É aqui que o Eduardo tem dado uma grande ajuda com alguns métodos e experiências que tem descrito no seu blog, que têm sido importantes e têm feito a diferença no meu maneio. Muitas vezes são também os relatos dele que me fazem experimentar certo método que já conhecia mas que não estava ainda convencido da sua eficácia. 

Desses métodos que li no blog do Eduardo, há dois que me deixaram muito contente, apesar de só ter começado a usar um deles este ano, mas resultaram os dois muito bem, fiquei impressionado e arrependido por não ter começado a usá-los mais cedo! 

Em primeiro lugar passei a usar, o ano passado, aquilo a que o Eduardo chama de regra “não mais de 6”. Passei a usar essa regra, principalmente com rainhas mais velhas, não deixando assim que os enxames atinjam o pico da população antes da altura desejada, algo que considero muito importante, e esta regra parece uma forma bastante prática e simples de “segurar” os enxames. 


O segundo método comecei a experimentá-lo este ano, não é um método de prevenção mas sim de controlo de enxameação, o método Demaree, sobre o qual o Eduardo tem escrito ultimamente e que eu já conhecia, mas foi por ler o relato no blog que finalmente decidi experimentar. Em alguns enxames que começaram a aparecer com sinais de febre, comecei a meter a rainha no ninho com 2 quadros e os restantes quadros no sobreninho e uma grade excluidora entre o ninho e sobreninho, não me vou alongar muito no processo, porque podem-no ler mais detalhadamente no blog do Eduardo. 

Em conclusão, usei o método Demaree a primeira vez há cerca de 20 dias em alguns enxames e perderam a febre, bastante rápido.  Sem dúvida alguma vou passar a usar este método no meu maneio a partir de agora, vejo aqui uma solução simples e prática e que é feita sem consumir muito tempo.

Um grande obrigado Eduardo pelas coisas que escreves, desde que me iniciei que tem sido uma boa ajuda, além do mais dás também a conhecer apicultores lá de fora, como por exemplo o Randy Oliver ou o Bob Binnie, que também fazem coisas bastante interessantes.

os criadores de rainhas e o caso das rainhas da madeira

Entre os criadores de rainhas tenho maior simpatia por uns que por outros. E isto para mim conta, pois por princípio só adquiro rainhas aos criadores com quem simpatizo. E no caso das rainhas não agradarem a simpatia continua mas as compras acabam. Afirmo, portanto, que a minha disponibilidade para adquirir rainhas a alguns criadores é zero ou lá muito próximo. Não atino com aqueles criadores de rainhas que mal surge uma questão um pouco mais básica nos grupos de apicultores do Facebook, gozam, diminuem e sistematicamente mandam o novato fazer uma formação; não atino com aqueles criadores de rainhas que habitualmente apresentam vídeos ao estilo circense, com as rainhas a passear nas suas mãos e que, ao mesmo tempo que se expressam com muita humildade, estão nas entrelinhas e de forma latente constantemente a afirmar que são os maiores artistas cá do bairro; não atino com os criadores que, vindos do estrangeiro prometendo linhas seleccionadas e melhoradas, me enviam rainhas iguais e piores que todas as outras e que chegam mortas ou moribundas dentro das gaiolas; não atino com criadores de rainhas que ontem diziam cobras e lagartos das ibéricas por serem uma raça enxameadora, e hoje as criam e comercializam deixando implícito que são linhas que não enxameiam, num percurso cheio de contradições e falsidades; não atino com os criadores de rainhas que amuam porque gostei das rainhas de um concorrente, e esperam uma fidelidade canina…

À entrada de segunda semana de março, estabeleci contacto com três criadores de rainhas, com quem simpatizo, para me fornecerem uma pequena quantidade de rainhas fecundadas. O André Silva foi na altura aquele que as tinhas disponíveis de imediato. Enviou-me algumas fecundadas e, na mesma encomenda, o mesmo número de virgens. O foto-filme em baixo ilustra o desempenho de uma fecundada (à data de 26-04) e o de uma virgem, que já fecundou em terras serranas, à data de hoje.

Imagem geral da colónia, ontem 26-04, em que introduzi rainha fecundada no dia 19-03. De lá para cá, foi fortalecida com dois ou três quadros com criação fechada, e ontem apresentava o ninho praticamente cheio de abelhas e 8 quadros com criação (nestas rainhas do ano não aplico, habitualmente, a regra não mais de 6).
Coloquei a 1ª meia-alça, ontem.

Agora imagens da colónia onde introduzi a 19-03 uma rainha virgem.

À data de hoje, transferi esta colónia do núcleo onde cresceu para uma caixa de 10 quadros.
Apresentava 5 quadros com um padrão de postura digno de se ver!
Passei-a para caixa-colmeia e aproveitei para lhe doar um quadro mais com criação operculada.

Algumas das rainhas do André Silva estão, até ao momento, a dar-me bons sinais. Naturalmente vou continuar a observá-las, porque o seu percurso ainda está muito no início. Vou ficar atento para ver como vão responder a um conjunto de questões: o que vão produzir? como vão responder à varroose? como vão ultrapassar a invernagem? como vão arrancar no próximo ano? como se comportarão no período de enxameação reprodutiva? qual será a sua longevidade? Cada questão terá o seu momento próprio para ser respondida.

Nota: ao contrário do que se costuma ler nos filmes, qualquer semelhança entre o descrito no primeiro parágrafo com a realidade não terá sido mera coincidência.

o efeito de favos vazios na proporção de abelhas forrageadoras dedicadas à colecta de néctar

Thomas Rinderer (esquerda), observando um quadro com abelhas (scientific beekeeping).

Thomas Rinderer, o primeiro autor do artigo que traduzo em baixo dois excertos, é um nome de referência na investigação apícola norte-americana e mundial.

Introdução: Favo vazio nos ninhos de colónias de abelhas (Apis mellifera L.) influencia vários aspectos do comportamento de coleta, nomeadamente a coleta de néctar das abelhas (Rinderer & Baxter, 1978; Rinderer & Baxter, 1979; Rinderer, 1982a; 1982b; 1983). Geralmente, o aumento da quantidade de favos vazios resulta em maior intensidade e eficiência da coleta de néctar nas abelhas avaliadas individualmente. Além disso, certas evidências (Rinderer, 1982a) sugerem que as colónias estimuladas por favos vazios adicionais têm uma proporção maior de abelhas forrageadoras de néctar. Este estudo foi desenhado para testar essa hipótese mais fortemente.

Sumário dos resultados: A influência da adição de favos vazios às colónias nas proporções de abelhas forrageiras retornando às colmeias com néctar, pólen, pólen e néctar, ou água, e de forrageadoras mal sucedidas foi examinada. Quantidades maiores de favo vazio resultaram num aumento na proporção de forrageadoras de néctar, uma diminuição na proporção de forrageadoras de pólen e uma diminuição na proporção de forrageadoras para néctar e pólen. As proporções de abelhas coletando água e de forrageadoras mal sucedidas talvez tenham diminuído ligeiramente.

fonte: https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/00218839.1984.11100612?journalCode=tjar20

Nota: favo vazio, a opção que utilizei para traduzir “empty comb”, não é sinónimo de quadros com cera laminada, sim de quadros com cera puxada. Sobre a minha preferência por colocar as primeiras meias-alças com cera puxada escrevi aqui.

controlando a técnica de controlo da enxameação

Descrevi e publiquei que no passado dia 12, decidi utilizar uma técnica de controlo da enxameação proposta pelo advogado e apicultor norte-americano George Demaree, publicada no American Bee Journal em 1892.

Hoje passados 12 dias, voltei ao apiário para realizar diversas tarefas. A primeira constatação é que a Erica australis está a secar e a ser substituída gradualmente pela Erica lusitanica (urgueira ou moita branca).

O território continua estimulante!

No caso da colónia alvo da técnica Demaree em 12-04, há alguns indícios que continua a procurar enxamear. Uma inspecção a 19-04 revelou que, como esperado, tinha vários mestreiros abertos no sobreninho colocado por cima da grelha excluidora. Como não precisava destes mestreiros acabei por destruí-los. Menos esperado, por ser mais raro, foi encontrar dois mestreiros no ninho, ainda muito no início e que destruí, obviamente.

Hoje o indício de enxameação, menos evidente que os encontrados a 19-04, é a forma daquele alvéolo entre as duas abelhas.
Vista geral do ninho.
A abelha-mãe… a que geralmente e injustamente leva com as culpas de uma colónia querer enxamear.
Hoje, apesar do céu ameaçar, não foi dia de trabalhar à chuva… não seria o primeiro!

Observação 1: a propósito de um ou outro comentário que pude ler no Facebook acerca da publicação do dia 12-o4, quero deixar descansados os apicultores que parecem temer que com estas técnicas de controlo da enxameação se visa eliminar o instinto da enxameação nas abelhas melíferas. Não é esse o objectivo, como é claro, nem seria seguramente esta a técnica a utilizar para esse fim. As minhas abelhas vão continuar a querer enxamear neste e nos próximos anos. Eu é que não gosto de ficar sentado, sem nada fazer, a assistir a esse incrível fenómeno natural, mas que em nada contribui para a minha felicidade enquanto apicultor. Já os enxames saídos/fugidos em pouco ou nada contribuirão para a sustentabilidade da espécie, porque 99,9% deles estarão mortos em menos de um ano!

enxertia de mestreiros ou maximizar os recursos disponíveis e o teste a ideias feitas

Na sequência desta situação levei os núcleos formados para outro apiário. Neste outro apiário tinha por lá dois núcleos onde a introdução de rainha virgem em gaiola não resultou. Neste contexto decidi meter mãos à obra para maximizar os recursos disponíveis do momento, e ensaiar uma segunda oportunidade com estes núcleos, fazendo a introdução de mestreiros pela técnica de enxertia.

Estes são os recursos disponíveis: mestreiros retirados dos núcleos transumados onde já andavam virgens em joviais correrias.

Com um X-ato não é das tarefas mais complicadas fazer o procedimento. Sim, é verdade que as luvas são uma…, mas com um pouco de perícia a coisa vai.

Uma consideração acerca da viabilidade destes mestreiros: tenho verificado ao longo da minha experiência, que uma parte importante dos mestreiros que tenho encontrado fechados nos quadros, e isto após a emergência das rainhas virgens, depois de analisados a olho contém rainhas aparentemente mal-formadas. Sendo o caso há uma boa probabilida de ter recortado mestreiros inviáveis. Mas perdido por 100 perdido por 1000, e procurei seleccionar os que me pareceram viáveis e procedi ao seu recorte o mais cuidadosamente que me foi possível. Feito isso coloquei-os nos referidos núcleos, pendurados por um palito, entre dois quadros.

No momento em que coloquei os mestreiros sobre os quadros, o comportamento de ânsia das abelhas deixou-me esperançado que as rainhas poderiam estar vivas.

A enxertia foi realizada no dia 17 e ontem 19, entre outras tarefas, fui ver o avanço desta situação.

As abelhas tinham fixado os mestreiros a um dos quadros.

Procedi à inspecção o mais rapidamente que consegui e tomei nota que os sinais preliminares são muito animadores. Primeiro, encontrei os mestreiros rotos pelo fundo. Segundo, a forma certinha como os fundos foram recortados indicia que foi feito pelas rainhas virgens no momento da sua emergência.

Neste conjunto de dois mestreiros a precisão do recorte do fundo de um deles, o da direita, deixa-me convicto que de lá emergiu um rainha virgem viável. Daqui a cerca de 15-20 dias tirarei as dúvidas quando e se vier a surgir uma rainha fecundada em postura.

Neste momento a minha apicultura serve-me não só como a principal fonte de rendimento mas também como um inesgotável campo de pesquisa pessoal e de teste de algumas ideias feitas. Este mundo das abelhas, ainda cheio de segredos, co-habita com tantos ou mais mitos acerca dele. Por exemplo, assim como já vi inúmeras vezes que a primeira rainha virgem a nascer não elimina as suas irmãs rivais, coloco para mim a questão se tal se deve à simultaneidade com que nascem ou se a somar a isso se deve também à defesa destes mestreiros por parte das abelhas, que repelem as tentativas de destruição dos mesmos por parte das primeiras virgens a nascer. No caso vertente, se nestes dois núcleos, que já não têm possibilidade de criarem a sua rainha pelo tempo que já levam orfanados, como vou colocar quadro nenhum com ovos/larvas jovens, alguma rainha fecundada que venha a surgir só poderá ter tido origem num destes mestreiros rotos.

Se num destes dois núcleos por lá aparecer uma rainha fecundada a tese de que as primeiras rainhas a emergirem matam as suas rivais ainda no interior dos mestreiros se tiverem tempo para o fazer fica difícil de sustentar. Em sentido contrário, a tese não refutada é que nesta situação específica é a vontade/o instinto colectivo das abelhas que prevalece, expresso na defesa destes mestreiros mais tardios às investidas das rainhas virgens. E não será (quase) sempre assim no mundo secreto das abelhas: a vontade do colectivo a sobrepor-se à vontade do indivíduo?

o início do fluxo do mel claro e a expressão das rainhas

No passado dia 15, ao sacudir abelhas dos quadros para fazer desdobramentos, vi o néctar do futuro mel claro a escorrer generosamente dos quadros pela primeira vez este ano. O fluxo iniciou-se dentro da data prevista e, correndo tudo normalmente, vai manter-se durante os dois próximos meses, umas semanas mais intensamente outras menos, com origem em diversas florações.

Néctar sobre o travessão superior de alguns quadros que escorreu dos quadros sacudidos.

Em baixo deixo imagens do padrão de postura das rainhas, de várias colónias que abri ontem para conformar à regra “não mais que seis”, e que tendo passado pela minha aprovação durante o último mês e meio para prosseguirem temporada adentro, se expressam nos quadros de ninhos Lusitana desbloqueados da forma que as fotos ilustram.

São colónias com estas rainhas testadas em ambiente real que os meus clientes de enxames levam ano após ano.

Com o início do fluxo é chegada a altura de ir convertendo gradualmente as colónias preparadas até aqui para doarem quadros com criação e abelhas para os desdobramentos, em colónias direccionadas para a produção de mel.

Estas colónias Lusitana vão receber gradualmente quadros com cera laminada no sobreninho, que continuará separado do ninho por uma grelha excluidora de rainhas. O néctar será armazenado nestas ceras novas. Tal permitirá obter mel com as características organolépticas tão apreciadas pelos meus clientes e amigos, muitos dos quais o têm eleito como primeira opção nos últimos dez anos.
Mel cristalizado da produção de 2020. É o resultado que obtenho da parceria com as minhas abelhas, que se mantém vai fazer este ano uma dúzia de anos. Este é produto íntegro que os meus clientes pagam para degustar. Desde 2010!

os garfos ou o caso da colónia que ficou para trás

Com os dias a sucederem-se numa miscelânea de aguaceiros, sol, chuva, alguns mais frescos e outros um pouco mais quentes, as abelhas andam a 200 à hora. Eu vou procurando dar resposta a esta vertigem pois a idade, a saúde e a vontade permitem-me trabalhar a bom ritmo. Depois do dia de anteontem, em que não parei para ver este por do sol — mas a Filipa Almeida viu por mim! —, ontem as tarefas a realizar exigiram-me que o nascer do dia me fosse encontrar já no apiário.

Apesar de começar cedo, as horas e os dias passam tão ligeiros que há sempre alguma coisa a ficar para trás. Neste caso foi uma colmeia, que por ter o estrado estragado no dia de ser transumada com as outras para uma cota cerca de 300m mais baixa, acabou por se manter solitariamente no apiário onde estava. E tornou-se num daqueles projectos “amanhã tenho de a ir buscar”, só que o amanhã demorou mais de um mês a chegar e, durante esse mês, o seu maneio foi nenhum.

O estado do estrado. A colónia que vão ver em baixo passou um dos invernos mais frios que tenho memória, numa das zonas mais frias do país, nesta casa esburacada. Quando me dizem que os enxames de A, B ou C morreram de frio… tenham paciência pela minha falta de paciência para essa conversa..
Visão geral, ontem, da colónia que passou o inverno numa casa pouco aconchegante, aos nossos olhos.

Vejamos a colónia quadro a quadro.

Vista do quadro 10.
Vista do quadro 8.
Pormenor do quadro 7.

Sim, esta colónia enxameou… o enxame primário foi meter-se numa caixa com 8 quadros, que tinha a 30 metros a aguardar utilização num outro assento. Assim sendo, e uma vez que até aqui a fortuna não permitiu que perdesse abelhas deste enxame, decidi fazer o necessário para não vir ainda a perder abelhas — sabendo que o processo de enxameação ainda só tinha jogado a sua primeira parte —, desta feita por via de um aspecto muito negligenciado ou até desconhecido por alguns de nós: os enxames secundários ou garfos.

Vista de frente da colmeia que continha a colónia que enxameou e quatro caixas-núcleo de transporte. Sim, dividi-a em quatro!
A primeira divisão que fiz.
Última divisão que fiz.

E foi só porque me apeteceu fazer 4 enxames de um que fiz quatro enxames de um? Não, a razão foi esta…

Virgem 1… se apurarem o olhar vão vê-la!
Virgem 2.
Virgem 3.
Aqui, se não me engano estão três visíveis!

Desfeito o mito que a primeira rainha a nascer mata as outras? Se as abelhas deixassem e se a primeira nascesse/emergisse com um desfasamento temporal que lhe permitisse localizar as irmãs-rivais — já vi várias vezes rainhas romperem os mestreiros e emergirem com um minuto e menos entre si —, vontade para o fazer não lhe faltaria. Mas vontade apenas não chega!

Uma colónia que enxameou e continua cheia que nem um ovo? Só se o enxame primário tiver saído com meia-dúzia de abelhas, pensarão alguns. Pois nem isso também corresponde à realidade, neste caso e, muito provavelmente, na grande maioria dos casos. O enxame primário foi enfiar-se numa caixa a 30 metros de distância e ocupava cerca de 5 a 6 quadros.

As tiras de apivar coloquei-as antes de saber a proveniência do enxame… coisa que vim a saber poucos minutos depois.

Em conclusão, que o caso já vai longo e tenho que descansar que amanhã o dia vai começar cedo de novo: o grande desperdiçador de abelhas não é apenas o enxame primário; os enxames secundários ou garfos são os maiores responsáveis por chegarmos a uma altura em que na nossa colónia resta pouco mais que as abelhas que cobrem um a dois quadros.

Não estou a dizer nada de novo, Doolittle já o disse há quase 120 anos: o processo de cisão natural do enxame não termina com a enxameação primária. Para não vermos a população daquela nossa colónia, que estava pujante duas semanas antes e a prometer cinco meias-alças de mel, reduzida a 1/10 do que foi, vejo duas alternativas apenas, cada uma em função do estado em que encontremos o enxame: no caso de as rainhas virgens não terem emergido ainda, há que destruir todos os mestreiros com excepção de um; no caso de as rainhas já terem emergido há que fazer múltiplas divisões ou eliminar todas as rainhas virgens com excepção de uma.

o erro… a sua correcção

No passado dia 8 coloquei, no mesmo dia, um sobreninho e uma excluidora de rainhas numa colmeia do modelo Lusitana. O objectivo era configurar esta colónia de forma a utilizá-la esta semana para desdobramentos pela técnica Doolittle.

Foto de ontem do ninho da colónia. Oito quadros com criação e abelhas a cobrirem os 10 quadros.

Nesse mesmo dia coloquei um quadro com criação fechada no sobreninho, transferido do ninho da mesma. Hoje fui encontrar o quadro com criação como a foto em baixo ilustra.

As novas abelhas a emergir estão claramente enfraquecidas por falta de aquecimento. A falta de limpeza dos alvéolos logo após a nascença, comportamento atípico em condições normais, também denuncia essa fraqueza.

O meu erro foi ter “esticado a natureza”, isto é, ter pedido a uma colónia ainda que forte para aquecer de imediato um quadro com criação que estava no andar de cima e separado por uma excluidora. A meteorologia, com noites ainda abaixo do 8ºC, também não foi amiga — nem tem de ser, é o que é. De forma cristalina só posso afirmar que este maneio não foi prudente, que foi um erro!

Habitualmente o processo de preparação destas colónias passa por uma abordagem mais gradualista. Numa primeira fase do processo coloco o sobreninho apenas com quadros puxados vazios e/ou com ceras laminadas. Uma a duas semanas depois, caso a rainha tenha subido ao sobreninho para aí fazer postura — o que acontece frequentemente — confino-a ao ninho com recurso à excluidora, e deixo no sobreninho um ou dois quadros com criação da mesma. Só cumpridas estas etapas e observados estes pré-requisitos passo a utilizá-la para os desdobramentos pela técnica Doolittle. Este maneio é prudente e, na minha opinião, o correcto nesta altura do ano.

E foi assim que corrigi o erro. Noutra colónia confinei a rainha, que já andava em postura no sobreninho, ao ninho.

Esta rainha andava em postura neste quadro do sobreninho. Foi colocada junto com o quadro no ninho, e lá vai ficar confinada nos tempos mais próximos.
Ninho da colónia com excluidora que me permite passar a utilizá-la para efectuar os desdobramentos pela técnica Doolittle.
Nesta colónia em questão coloquei o sobreninho em 29-03, e só hoje coloquei a excluidora. Vou utilizá-la nas próximas semanas como doadora de quadros e/ou abelhas para os desdobramentos que ainda pretendo fazer. O quadro com a criação a emergir enfraquecida foi colocado neste sobreninho.

Lição re-aprendida: numa época do ano em que as temperaturas mínimas ainda podem descer abaixo do 8-10ºC, só nas colónias que naturalmente já subiram ao sobreninho e, preferencialmente, onde a rainha já ande em postura, devem ser utilizadas para este fim. Aprende Eduardo que eu não duro para sempre!

a cera e o cerieiro

Tenho falado com alguma regularidade da cera, como não poderia deixar de acontecer, pela sua importância para o bom desenvolvimento dos enxames. Nesta publicação antiga fiz algumas considerações acerca do que se supõe ser a influência do fluxo de néctar na conversão de abelhas não qualificadas em abelhas especializadas na produção de cera.

Com o passar dos anos tenho adquirido cada vez mais consciência da importância de ter cera puxada ao dispor para apoiar os enxames à saída do inverno (fevereiro e março).

No mês de abril e maio, com a conformação das minhas colónias à regra “não mais de seis“, as necessidades de cera laminada crescem exponencialmente.

Esta colónia foi conformada à regra “não mais de 6”. Os dois dois quadros novos com cera laminada, com a indicação JV21, foram colocados na semana passada.
Ontem verifiquei que estes quadros tinham sido bem aceites pelas abelhas que os puxaram de forma uniforme e pela rainha, que já os tinha aproveitado para a sua sementeira.

Sempre que experimento a moldagem de um novo companheiro/empresa cerieiro tenho por hábito marcar os quadros com uma sigla que o identifique, para depois verificar facilmente, com objectividade e rigor, a apreciação que as abelhas fizeram dessa cera.

A nova cera na caixa.
No momento da incrustação.
A identificação dos quadros com a cera laminada.

21 identifica o ano, JV identifica o cerieiro, o Apicultor José Vicente, residente ali próximo da bela Nisa, concelho onde comprei os meus primeiros enxames, em setembro de 2009.