Ontem, numa manhã nublada, na companhia do Nuno Capela, prossegui o trabalho de observação sistemática, recolha de dados, registo, análise, reflexão e aprendizagem a partir das 5 colónias do apiário pedagógico de Coimbra e que tenho vindo a efectuar desde a primeira semana de abril.
Ficam algumas fotos que documentam as etapas deste processo.
Eduardo Gomes: serviços de formação presencial e on-line, consultoria presencial e on-line e apoio técnico em apiário (contactos: 935 251 670; jejgomes@gmail.com)
Na semana passada levei a cabo a 4ª visita técnica aos dois apiários de um colega apicultor de Coimbra.
A primeira tarefa passou por recolher o pólen. A produção deste produto está a correr bem e a deixar o meu cliente muito satisfeito.
Para minha surpresa fomos encontrar uma colónia enxameada e uma outra prestes a enxamear. Na primeira fizemos um desdobramento com pelo menos uma rainha virgem, tendo assegurado que a colónia mãe ficava também com pelo menos outra rainha virgem. Na segunda fizemos outro desdobramento, desta feita com a rainha-mãe. Deixámos 3 mestreiros na colmeia mãe e utilizámos alguns para promover a resolução de um caso de uma colmeia top-bar zanganeira.
Avaliámos a taxa de infestação em abelhas adultas e fizemos o corte de criação de zângão para diminuir a população de varroas.
Se, nesta altura do ano, a taxa de infestação estiver nos 3% quando reduzimos a sua população em 15% com um corte da criação de zângão, na quinzena seguinte a taxa de infestação estará nos… 4%!!!
E vimos também o trabalho das novas rainhas, criadas naturalmente, nos desdobramentos feitos nas semanas anteriores. Bem nesse momento, brilharam os olhos do meu cliente e os meus também.
Eduardo Gomes: serviços de formação presencial e on-line, consultoria presencial e on-line e apoio técnico em apiário (contactos: 935 251 670; jejgomes@gmail.com)
A comunidade de apicultores nacional é muito heterogénea. Desde apicultores hobistas a apicultores profissionais, apicultores veteranos com muitos anos de experiência apícola a apicultores que estão a iniciar a sua experiência, apicultores muito jovens a apicultores menos jovens, esta comunidade é feita de mil ramos com um tronco comum, o interesse e paixão pela abelha melífera.
Dentro desta comunidade tão diversa, temos alguns de nós que pela sua influência positiva ao longo de muitos anos se têm destacado no sector. Entre eles está o Francisco Rogão.
Conheço o Francisco praticamente desde o início da minha aventura apícola. Como poderia ser de outro modo? Desde esse início que tenho aprendido com ele aspectos práticos e efectivos de maneio e que me serviram bem quando os apliquei. Lembro-me que em 2015 ou 2016, depois de ter estado presente numa palestra que apresentou no Porto, uma das suas propostas de desdobramentos me serviu como uma luva no quadro da gestão de um apiário que tinha em Coimbra. Dos 40 desdobramentos que realizei em duas semanas consecutivas, 38 resultaram. E esse enriquecimento, quer do meu património apícola e sobretudo do meu nível de conhecimentos, teve origem na generosidade do Francisco na partilha dos seus conhecimentos e práticas dirigidas ao grupo de apicultores presentes nesse fim de tarde no Porto. Este é um caso, entre outros, do meu maneio, onde a inspiração, o “saber fazer” e a motivação para agir foram determinados e orientados pelas “dicas” preciosas do Francisco.
Nos últimos 3 anos tenho colaborado mais activamente com o Francisco nos cursos que disponibiliza on-line e nas duas últimas Jornadas da Macmel. Estes desafios/convites à colaboração de palestrantes de diversas áreas, mostram outra faceta do Francisco, associada à sua generosidade: um espírito aberto e agregador. Um espírito aberto que se expressa na sua atenção e foco nos avanços que vão acontecendo na apicultura nas mais variadas áreas, dos equipamentos às técnicas de maneio e dimensão estratégica de uma apicultura sustentável; um espírito agregador que se expressa nos eventos que promove e em que participa, quer em Macedo de Cavaleiros quer noutros territórios do nosso Portugal continental e insular, e que funciona como uma cola que une pessoas e experiências tão diversas.
Esta publicação e estas linhas simples e incompletas servem para dar um grande Bem-Haja ao Francisco que estendo à Manuela, ao Rúben e à Raquel.
Foi em 2011, um pouco antes dos primeiros avistamentos em Portugal, que soube que uma vespa exótica estava a preocupar e muito os apicultores franceses. Quando recebi a notícia que tinha sido avistada em Viana do Castelo fiquei também bastante preocupado. Esta preocupação acabou por reflectir-se nas inúmeras publicações que tenho vindo a fazer desde 2016, data que fundei este blogue, até ao presente sobre este insecto predador.
Esta publicação tem como objectivo apresentar uma breve e parcelar revisão do que tenho publicado sobre a Vespa velutina nigrithorax.
Eduardo Gomes: serviços de formação presencial e on-line, consultoria presencial e on-line e apoio técnico em apiário (contactos: 935 251 670; jejgomes@gmail.com)
Numas jornadas de apicultores, em que tive o gosto de participar recentemente, foi afirmado por uma das intervenientes que achava que a velutina era mais perigosa que a varroa para as colónias de abelhas. Este achismo pode ser fruto tanto de uma boa reflexão como de uma reflexão muito incompleta e imperfeita.
Vejamos com algum detalhe:
(i) achar que a velutina é mais perigosa que a varroa faz sentido num quadro de pensamento em que se assume que podemos ter um grande controlo sobre a varroose e, portanto, tendo um controlo mais fraco sobre a pressão e danos que a velutina exerce a partir dos meses de agosto e seguintes, os danos sobre as colónias não advêm de uma varroose que até está muito controlada, mas sim de uma pressão das velutinas de difícil controlo.
(ii) achar que a velutina é mais perigosa que a varroa, só porque vemos muitas colónias a colapsar em julho, agosto, setembro e outubro, e responsabilizar as velutinas pelo colapso porque andam por ali a pressionar e comer abelhas, isto sem termos indicadores fiáveis das taxas de infestação por varroa nessa altura e ao longo do ano, é inúmeras vezes uma conclusão errada e que em nada contribui para a correcção necessária das intervenções dos apicultores no sentido de melhorarem o controlo do que devem prioritariamente controlar, a varroose.
Lembro-me bem do Bruno Moreira, presidente da Associação dos Apicultores do Norte de Portugal, um profundo conhecedor das abelhas e das velutinas, afirmar que a principal causa de morte das colónias no norte, onde a velutina já faz muita pressão há anos, continua a ser a varroa. Os apicultores mais veteranos têm presente que muito antes da famigerada velutina ter arrombado as nossas fronteiras, já morriam dezenas de milhar de colónias todos os anos. Muitos, como hoje, não chegavam a reconhecer que era a varroa a causa.
O mais difícil de engolir neste contexto é que, em boa medida, continua a ser assim, apesar da informação e técnicas actualmente disponíveis e de existirem bons exemplos por parte daqueles que controlam ano após ano o flagelo deste ácaro.
As coincidência turvam o olhar e a interpretação. Sem um efectivo controlo da varroose as colónias vão levar o golpe de misericórdia pelas velutinas, mas já estavam a colapsar por acção da varroa. Esta coincidência confunde o observador mais desatento.
As duas simulações que apresento em baixo são esclarecedoras do efeito do fraco controlo da varroa e da coincidência dos “timings”: a morte destas colónias por varroose coincide com o início da pressão das velutinas.
Cerca de duas semanas depois da primeira intervenção no apiário de um companheiro, situado nas proximidades de Coimbra, combinámos para hoje uma nova sessão de trabalho (ver aqui o resumo da intervenção anterior).
No final das 7 horas de trabalho, o apicultor contava com mais 16 novas colónias, resultantes dos desdobramentos efectuados, uns motivados por razões de controlo da enxameação e outros por necessidade de substituir rainhas semi-esgotadas, com um padrão de postura medíocre.
Para além dos desdobramentos procedi também a:
avaliação da taxa de infestação em abelhas adultas;
inspecção de todos os 32 ninhos das colónias estabelecidas ali instaladas;
organização dos ninhos;
transporte e instalação de 8 desdobramentos para/num segundo apiário.
De referir que num ano de intensa enxameação, a este companheiro só um enxame lhe fugiu para as árvores. As técnicas de prevenção e também as técnicas de controlo da enxameação que tenho levado a cabo têm sido oportunas e suficientes neste caso, com estas duas visitas intervaladas em cerca de 15 dias.
Em baixo um pequeno foto-filme de alguns momentos do trabalho hoje efectuado.
Para conversar e agendar acompanhamento técnico em apiário podem contactar-me para jejgomes@gmail.com
O investigador João Santos solicitou-me a divulgação do questionário em baixo junto da comunidade dos leitores deste blog. Apelo aos companheiros apicultores para que participem, respondendo ao mesmo. Desde já o meu agradecimento para com a V. disponibilidade e deixo o texto que o João Santos me enviou para acompanhar esta publicação, assim como a hiperligação (a azul sublinhado) para acederem ao questionário.
“Um dos projetos principais do Laboratório de Genómica Microbiana e Simbiose do Instituto Gulbenkian de Ciência foca-se nas bactérias do intestino da abelha do mel. Sabemos que as pragas e doenças interferem significativamente no estado destas bactérias benéficas, e estamos interessados em conhecer em maior detalhe quais as principais dificuldades por que passam os apicultores em Portugal, quais os conhecimentos base que possuem na identificação de doenças apícolas e como lidam com as doenças/pragas que surgem nos seus apiários. Este é um pequeno questionário (cerca de 5 minutos), construído com o auxílio de outros colegas apicultores, para que os participantes o possam preencher de forma completamente anónima. Pretende-se com este questionário organizar os dados e compreender como tem evoluído o conhecimento nesta área e quais os maiores desafios à apicultura atualmente. Por favor, não deixe de colaborar e de enviar a outros colegas apicultores, no sentido de obtermos uma maior participação.
Economic Costs of the Invasive Asian Hornet on Honey Bees é um artigo que vai ser publicado no próximo novembro, na revista Science of The Total Environment. É um artigo muito elucidativo e enfático sobre o impacto económico que a Vespa velutina tem sobre a apicultura francesa nos dias de hoje.
O estudo procurou dar uma resposta precisa, com base em dados de grande escala e técnicas de modelagem, aos custos económicos da predação da V. velutina sobre as abelhas melíferas em França, através de estimativas relativas a estes três pontos: (i) o risco de mortalidade das colónias de abelhas relacionado com as vespas, (ii) o custo económico da perda de colónias para os apicultores e (iii) o impacto económico da substituição de colónias em comparação com as receitas do mel às escalas regional e nacional.
As conclusões são: “Estimamos uma densidade global de 1,07 ninhos de vespas asiáticas/km2 na França, com base no registro de campo de 1.260 ninhos em uma área pesquisada de 28.348 km2. No entanto, esta densidade de predadores estava espalhada de forma heterogénea por todo o país, bem como a distribuição das colónias de abelhas geridas. No geral, este risco de mortalidade de colónias de abelhas relacionado com vespas pode atingir até 29,2% das colónias dos apicultores à escala nacional todos os anos num cenário de elevada predação. Este custo nacional poderá atingir 30,8 milhões de euros por ano devido à perda de colónias, o que representa para os apicultores um impacto económico da substituição de colónias de 26,6% das receitas do mel.“
Esta publicação visa colocar o “problema velutina” na exacta magnitude do mesmo: é um problema enorme para a apicultura dos países onde já está instalada e sê-lo-á naqueles onde se vier a instalar num futuro próximo — segundo alguns estudos a V. velutina será capaz de colonizar uma grande diversidade de habitats na Europa e regiões de fronteira, dos países nórdicos até às zonas costeiras do norte de África.
Nos três primeiros vídeos um apicultor galego apresenta-nos a sua experiência e conclusões dos efeitos alcançados com a utilização de cavalos de troia num ninho localizado no interior de uma habitação nos últimos dias de agosto.
O apicultor conclui que os troianos com fipronil não têm capacidade de eliminar os ninhos. No final confessa que esperava que os troianos com fipronil seria o suficiente para eliminar os ninhos. Neste ponto pergunto se as expectativas deste apicultor são realistas, isto é, podemos esperar realisticamente que libertar 175 troianos num ambiente com 6 ninhos activos os elimine por completo?
Nesta publicação, com dois anos, observou-se que cada velutina distribui o alimento por oito 8-10 irmãs. Sustentando e informado por estes dados escrevi: “Proposta quantitativa para a preparação de Cavalos de Tróia: Operando com esta média de distribuição de alimento por cada operária V. velutina, e sabendo que no pico de desenvolvimento dos ninhos existem cerca de 2000 a 4000 indivíduos adultos presentes, teremos que preparar entre 50 e 100 vespas se pretendemos eliminar 25% da população do ninho, entre 100 e 200 se o objectivo é eliminar 5o% da população do ninho, entre 200 e 400 se o objectivo é eliminar 100% da população do ninho.“
A terminar pergunto se as expectativas deste apicultor são realistas, isto é, podemos esperar realisticamente que libertar 175 troianos num ambiente com 6 ninhos activos os elimine por completo? Será que num ninho com 60 cm de altura, em excelentes condições de abrigo e em finais de agosto, não seria de esperar encontrar mais do que 1500 adultos e 150 larvas e uma a duas dezenas de futuras fundadoras? É de descartar um efeito letal dos troianos em parte da população adulta e larvas que explique estes números baixos? Será possível que todas as diminuições de predação que se relatam após a libertação dos troianos se devam à coincidência de acontecerem precisamente na altura de diminuição de criação?
Na minha opinião não encontro nos três primeiros vídeos evidências que os cavalos de troia não produzam efeito nenhum sobre os ninhos; encontro contudo aspectos que me fortalecem a convicção de que é necessário enviar uma grande quantidade de troianos para eliminar por completo um ninho, como já era minha convicção há dois anos atrás. Na minha opinião, a questão que cada um terá que responder para si, caso acredite nos efeitos desta técnica, é se o procedimento de besuntar o abdómen ou o tórax das velutinas será o mais prático para enviar o número suficiente de velutinas para que causem um grande dano no ninho ou ninhos envolventes aos nossos apiários.
A V. velutina, assim como as suas primas, a V. crabro e a V. orientalis, são vistas frequentemente sobre as flores.
O que procuram? Prioritariamente o néctar, para darem resposta à elevada quantidade de energia que os seus voos exigem. Como caçadores oportunistas que são não dizem que não à possibilidade de caçar um insecto ou outro mais distraído que tenha o azar de estar no local errado e à hora errada.
Contudo, se a procura dos néctares responde a essa necessidade primária ela é também essencial para responder a necessidades sociais destas espécies. Neste artigo, Continuous exchange of nectar nutrients in an Oriental hornet colony, (2022), podemos apreender alguns detalhes do processo de troca contínua, em loop, dos nutrientes açucarados num ninho de V. orientalis — a probabilidade de se passar o mesmo com a V. velutina é grande.
“A troca de nutrientes entre indivíduos adultos em insetos sociais é bidirecional, ou seja, podem ser doadores e receptores do mesmo tipo de alimento ou nutriente. […] Nas vespas sociais, as secreções larvais constituem um dos principais recursos alimentares dos adultos. As larvas de vespas são alimentadas com presas (artrópodes ou carne) coletadas pelos adultos e, em troca, as larvas devolvem aos adultos os produtos da degradação proteica na forma de uma secreção contendo carboidratos simples e aminoácidos livres (resultantes da gliconeogénese e da quebra de proteínas, respectivamente). […] Sugere-se que esta troca recíproca e unilateral de nutrientes (isto é, proteínas versus carboidratos e aminoácidos livres) e a consequente co-dependência nutricional entre adultos e larvas seja a chave para o estabelecimento da sociabilidade em Vespidae.
Apesar das vespas sociais serem ferozes caçadoras de insetos, os adultos também são frequentemente observados alimentando-se de néctar floral de uma variedade de espécies de plantas diferentes. A vespa asiática (Vespa velutina nigrithorax), por exemplo, foi observada alimentando-se de néctar floral de 27 espécies de plantas. Este consumo de néctar, no entanto, tem sido frequentemente caracterizado simplesmente como um comportamento oportunista, uma vez que a visita às flores também pode estar associada à caça de presas. As operárias adultas são voadoras fortes com uma taxa metabólica extremamente alta e alimentam seu metabolismo com uma dieta rica em carboidratos e aminoácidos livres encontrados no néctar e nas secreções larvais. Estas dietas ricas em carboidratos também podem proteger os músculos de vôo do stresse oxidativo derivado do alto desempenho aeróbico. A composição de macronutrientes das secreções larvais é análoga ao néctar das plantas visitadas pelas vespidae, embora geralmente seja mais rico em concentração e diversidade de aminoácidos. Ao contrário das operárias, as larvas necessitam de alimentos ricos em aminoácidos para sintetizar as proteínas necessárias ao seu desenvolvimento e são sustentadas por uma dieta altamente proteica. Como as larvas são alimentadas com presas e as secreções larvais são mais nutritivas para os adultos do que o néctar, por que razão as vespas também se alimentam de néctar floral?
[…] Também investigamos a importância do néctar para a sobrevivência da colónia. Nossos resultados revelam um papel importante do néctar na nutrição das vespas. Mostramos que os nutrientes do néctar são trocados num ciclo contínuo entre todas as diferentes fases da vida dos membros da colónia, desafiando o conhecimento predominante neste campo até o momento.”
Notas para levar para casa:
mesmo na designada fase proteica, os vespões adultos continuam a procurar fontes açucaradas;
a presença destes vespões nas flores explica-se pela procura de néctares e não exclusivamente por ali poder emboscar e caçar insectos;
se as larvas são alimentadas predominantemente com proteínas, os vespões adultos também lhes entregam nutrientes açucarados;
uma parte destes nutrientes açucarados, enriquecidos com aminoácidos, retornam aos indivíduos adultos através do consumo que fazem das secreções que as larvas produzem.