testagem de taxa de infestação por varroa em abelhas adultas: os nossos procedimentos

Esta publicação serve para identificar e descrever os equipamentos e procedimentos que utilizamos nos apiários para avaliar a taxa de infestação por varroa em abelhas adultas.

De casa são levados um copo de testes, um frasco com cerca de 300 ml de álcool puro ou diluído até 25%, um coador com malha inferior a 1,5mm e uma colher com um volume de 125ml — os equipamentos estão ilustrados nas fotos em baixo.

Copo de testes.
Componentes do copo de testes.
Interior do copo com um receptáculo sobre o qual irão ser despejadas as abelhas da amostra.
Frasco para transportar o álcool, coador e colher para recolher abelhas.

No apiário procuramos recolher amostras de pelo menos 30% das colónias ali assentes. Estas colónias devem ser as mais fortes do apiário. As etapas são as seguintes:

  1. Despejamos os cerca de 300 ml de álcool no copo de testes.
  2. Numa das colónias fortes que pretendemos testar localizamos o quadro onde anda a rainha e colocamo-lo de lado para termos a certeza de que não vamos sacudir a rainha para o copo com álcool.
  3. Sacudimos as abelhas de um ou dois quadros com muita criação aberta para o interior de um telhado. Este procedimento permite que as abelhas mais velhas, que não devem fazer parte da amostra, levantem voo e permaneçam sobretudo as abelhas mais novas, as que devem fazer parte da amostra.
  4. Enchemos a colher, com capacidade de 125 ml. Sabemos que esta colher cheia contém cerca de 300 abelhas.
  5. Despejamos esta colher de abelhas no copo de testes e fechamo-lo. Agitamos o copo com movimentos circulares durante cerca de 1 minuto para que as varroas se soltem das abelhas e caiam no fundo do copo.
  6. Contamos as varroas caídas no fundo do copo e fazemos o registo das varroas caídas nesta colónia.
  7. Coamos o álcool com o coador de malha fina para o limpar de resíduos e varroas e utilizar na testagem seguinte.
Quadro com muita criação aberta de onde foram sacudidas abelhas para amostragem. A rainha não andava neste quadro, andava noutro quadro que obviamente não foi sacudido.
As abelhas foram sacudidas para o telhado. As abelhas mais velhas levantaram voo e são recolhidas as que permanecem até encher a colher — são cerca de 300 abelhas. Imediatamente de seguida são depejadas no interior do copo. As que não foram recolhidas na amostra são devolvidas à colmeia.
Lavagem das abelhas com movimentos circulares durante cerca de 1 minuto.
Verificação e contagem das varroas caídas no fundo do copo. Neste caso para além de uma abelha que acidentalmente caiu no fundo do copo, não encontramos varroas caídas.

Esta testagem é feita com uma regularidade mensal ou bimensal e/ou antes do início de um tratamento e 12 dias após o tratamento concluído. As colónias são tratadas logo que ultrapassem 1%-1,5% de taxa de infestação. O monstro deve ser combatido quando é pequeno, é o nosso lema. Esperar que ele fique gigante diminui a capacidade de o combater no nosso terreno, aumenta o número de tratamentos necessários e diminui a eficácia das nossas armas.

Ainda que outros procedimentos possam ser utilizados, estes são os que levamos a cabo para atingir o objectivo: avaliar a taxa de infestação em abelhas adultas o que nos permite fazer os tratamentos de forma eficiente, oportuna e até proactiva se necessário for. A meta ou objectivo geral é passar 24 meses sem perder uma única colónia para a varroose. Destes 24 meses já passaram 8 meses e o caminho está a fazer-se como previsto. Que outros se entusiasmem e passem a adoptar estas boas práticas.

substituição de rainhas com introdução de alvéolos reais: uma técnica falhada

No livro de sumários da Apimondia 2023, que aconteceu recentemente no Chile, podemos encontrar na pg. 133 o sumário do artigo Requeening queenright honey bee colonies with queen cells in honey supers, e que traduzo em baixo:

Introdução de um alvéolo real numa colónia (foto do magnífico blog The Apiarist)

Sumário: Os apicultores canadianos substituem anualmente um subconjunto de suas abelhas rainhas, no entanto, o processo de introdução de uma nova
rainha numa colónia de abelhas não tem garantia de sucesso. Apesar do consenso de que é mais eficaz introduzir rainhas em colónias sem rainha, alguns apicultores profissionais introduzem alvéolos reais na alça meleira
em colónias com rainha.

Testámos a taxa de sucesso desta prática introduzindo alvéolos reais em 100
colónias com rainha no sul de Alberta durante um fluxo de mel. A maternidade dos zângãos descendentes resultantes foi determinada usando DNA mitocondrial para identificar as rainhas em postura.

Nossos resultados mostram que as novas rainhas substituíram com sucesso a
rainha original em apenas 6% das colónias, sugerindo que a prática não resulta na aquisição de liderança pela nova rainha na maioria das colónias. Além disso, nossos resultados mostram que a substituição por rainhas filhas é mais comum (13%) do que a substituição de novas rainhas ao introduzir alvéolos reais em colónias durante um fluxo de mel.

Esta técnica de substituição de rainhas de forma massiva e com pouca mão de obra foi-me sugerida em tempos no ano de 2012/2013 por um conhecido técnico apícola nacional. Porque não confiei no sucesso da mesma nunca a utilizei. Boa intuição!

apicultura darwiniana: análise crítica

Deixo em baixo a tradução/adaptação de um texto que analisa de forma crítica algumas das reivindicações mais frequentemente utilizadas pelo grupo de apicultores que abraçou uma abordagem radical dos pontos de vista expostos por Tom Seeley no artigo de 2017, Darwinian beekeeping: An evolutionary approach to apiculture (American Bee Journal. 157. 277-282).

“Nos últimos anos, algumas formas de apicultura alternativa foram revitalizadas, como a apicultura sem tratamentos (treatment free), biodinâmica e “natural”. Estas práticas ganharam popularidade quando o professor Tom Seeley divulgou as suas experiências e conclusões em 2017 e introduziu o conceito “Apicultura darwiniana”. Seeley argumenta que o conceito de evolução através da seleção natural raramente é usado na apicultura. Segundo ele imitando as condições naturais das abelhas e a seleção natural, podemos levá-las a superar os seus problemas. As soluções surgirão rapidamente se o apicultor estiver sintonizado com esta visão.

No passado, o campo da apicultura “natural” foi inspirado por uma filosofia da new age: “as abelhas superam tudo com o poder da natureza”. Ao longo do caminho, as intervenções de Seeley e outros cientistas, introduziram formas alternativas de apicultura, envolvendo os princípios da biologia evolutiva. Neste texto, explicarei como essa combinação de apicultura alternativa e ciência produziu uma cultura pseudo-darwiniana de práticas extremas. Meu principal problema com a chamada “apicultura darwiniana” é que ela não é verdadeiramente darwiniana. E não quero dizer que não seja radical o suficiente, muito pelo contrário. Este ramo da apicultura usa constantemente o apelo à natureza, criando uma retórica particularmente atraente para os apicultores orgânicos e alguns apicultores de pequena dimensão adeptos da lazy beekeeping (apicultura preguiçosa).

Estes apicultores tentam a apicultura “natural” e sem tratamentos sustentados alegadamente em argumentos darwinianos. Vou desenvolvê-los a seguir. É de realçar que Seeley é bastante cuidadoso nas suas palavras e instruções, mas as suas ideias são distorcidas e usadas de forma excessivamente rígida e radical. Na demanda da “naturalidade”, qualquer método natural de apicultura nunca será natural o suficiente. Surgirá sempre uma forma mais “natural” e “pura”.

Primeira reivindicação: “As abelhas sobreviveram milhões de anos enfrentando doenças e pragas sem intervenção humana. Portanto, têm, ou podem desenvolver, os mecanismos para lidar com a varroa, etc., desde que deixemos a natureza fazer o seu trabalho.”

Na história natural, inúmeras espécies bem adaptadas extinguiram-se por mudanças súbitas no meio. O Varroa destructor mudou o meio subitamente e teria exterminado as abelhas europeias se os humanos não tivessem intervindo.

Segunda reivindicação: a natureza tem o método de seleção natural para eliminar os desajustados e escolher os ajustados. A apicultura natural está mais próxima da seleção natural.

A seleção natural é um processo de eliminação/selecção ao longo de milhares de anos. Na verdade, estes métodos apícolas alegadamente naturais exercem muitas vezes uma pressão de seleção excessivamente rápida, expondo as abelhas ao stresse crónico (parasitário e dietético) e à morte de milhares de milhões de abelhas. O esquecimento destas perdas incontáveis é bem explicado pelo viés da sobrevivência. Além disso, a evolução das espécies envolve três outros mecanismos além da seleção natural: deriva genética, mutação genética e fluxo genético. Não encontramos referências a estes três mecanismos na apicultura darwiniana porque estragam qualquer narrativa credível acerca da sua efectividade.

Terceira reivindicação: Qualquer intervenção ou assistência com substâncias químicas, biológicas ou mesmo naturais retarda a adaptação natural das abelhas contra patógenos e parasitas.

Outro erro fundamental em torno do qual a apicultura sem tratamentos é construída. Pelo contrário, a intervenção dá às abelhas tempo para se adaptarem. Quanto tempo tiveram as primeiras colónias de abelhas europeias quando entram em contato com varroa? Muito pouco… e sucumbiram.

Quarta reivindicação: Através de métodos naturais de apicultura, o ácaro Varroa perde sua natureza agressiva e desenvolve uma relação simbiótica com as abelhas.

O Varroa destructor é um parasita europeu das abelhas melíferas. É improvável que perca essa característica rapidamente, só porque algumas pessoas colocam as abelhas dentro de troncos de árvores e as deixam enxamear todos os anos. Lembrem-se de que os parasitas e predadores permaneceram os mesmos por milhões de anos e não mudam facilmente. Por exemplo, vespas predadoras, esses ancestrais das abelhas, permanecem predadoras.

Quinta reivindicação: As abelhas na natureza escolhem as suas novas rainhas, enquanto nós, com nossas técnicas, as impedimos de escolhê-las.

Esta é uma das reivindicações mais fracas no texto de Seeley. Uma análise meticulosa da enxameação revela que há uma aleatoriedade na criação natural de rainhas. É como se as operárias “optassem por não escolher” suas rainhas, fazendo numerosos cálices que serão utilizados pela rainha de forma aleatória. As operárias simplesmente descartam algumas larvas mal alimentadas, enquanto retêm o elemento aleatório. Surpreendentemente, muitas das técnicas de translarve de rainhas mantêm um elemento análogo de aleatoriedade.”

fonte: https://thebeekeepinglab.com/2023/07/08/pseudo-darwinism-in-beekeeping/?fbclid=IwAR26HCU8BeHf1DAyYguCRS-49_SaEqVIsdlSfJ317AhhXm3v5mPuXJMhD5Q_aem_Ae9BTGDi31rgF_uwnNsrzVInb1J306DJoYO0rkoJz9NA7BszGhVCPk-7dByljzkWzMU

Notas:

1) na minha opinião a publicação “a minha resistência à resistência: o foco no foco” complementa esta adequadamente.

2) Aceitando que esta abordagem darwiniana seja a melhor maneira de lidar com os ácaros varroa, nunca funcionará se não for adoptada por praticamente TODOS os apicultores e ao mesmo tempo, isto para evitar a deriva/diluição genética dos traços que conferem resistência.

3) E se TODOS aderirem ao projecto… como se resolverá a falência da polinização, a escassez de alimentos e os efeitos sociais e económicos decorrentes de mortalidade massiva de 95-99% das colónias de abelhas e isto durante os anos que o efectivo apícola levará a recuperar?

4) Esta experiência com animais sociais, com milhões de milhões de abelhas condenadas ao sofrimento e à morte desnecessária, às mãos de uma ideologia que por uma triste ironia se diz apicentrada e que procura o bem-estar das abelhas, é um paradoxo ético.

5) Ninguém sabe que abelha resultará de um processo de selecção tão esmagador como o desta proposta “vive e deixa morrer”, que conduzirá inevitavelmente a um enorme empobrecimento do pool genético, aspecto que contraria a tendência natural de promoção da diversidade genética das abelhas .

6) Que garantias há que o ácaro varroa não evoluirá também para se adaptar a colónias pequenas, que enxameiem muito e que não são tratadas, como proposto pelos mais acérrimos defensores desta via, a única respeitadora das abelhas na sua opinião.

7) Como percepcionamos deixar de tratar os nossos outros animais domésticos, cães, gatos, …, para que a natureza elimine os indivíduos susceptíveis às doenças e para as quais temos medicamentos?

do controlo da enxameação às fábricas de quadros com criação

O meu maneio preferido para fazer o controlo da enxameação, passava por encontrar a rainha e transferi-la para um núcleo. Este maneio simula a enxameação natural, diminuição da força de trabalho e mudança de casa, e refreia absolutamente o impulso enxameador.

Quadro com a rainha retirado da colónia que estava para enxamear em 23-03-2021.
3 a 4 semanas adiante estes núcleos são fábricas de fornecimento de quadros com criação a outras colónias, em particular às colónias em produção. Dadas as características das rainhas, dadas as dimensões dos núcleos e, sobretudo, porque estas colónias mais pequenas têm mais fome de crescer do que uma colónia de 10 quadros, a produção de quadros repletos de criação é mais rápida e intensa.
Desde que geridos com regularidade, tirando semanalmente ou quinzenalmente um a dois quadros com criação, estas colónias explosivas não tendem a atingir o limiar que as predispõe a enxamear novamente no ano em que são criadas. É um maneio no fio da navalha, mas para quem tem disponibilidade e gosto é muito gratificante. Por regra, no ano seguinte continuavam a apresentar um padrão de criação bastante satisfatório no final do inverno, com uma rainha provavelmente no seu terceiro ano de postura (foto de 08-03-2022).

Publiquei e descrevi esta estratégia de maneio em várias publicações que podem encontrar neste blog a partir de 2018/2019. Provavelmente terei suscitado um vasto leque reações, desde as mais interessadas às do tipo “este gajo é doido em não deixar crescer o núcleo para colmeia “. Para fazer justiça a todos, uma vez mais repito que não inventei nada, esta estratégia de maneio aprendia-a das leituras que fiz de Michael Palmer, um apicultor do Vermont (EUA) que julgo que tem uma operação com cerca de 700 colónias, e que nos seus apiários tem permanentemente um conjunto de núcleos para este fim. Por cá na Europa sei que estou bem acompanhado nesta opção de controlo da enxameação e utilização dos núcleos, que é também a de David Evans, aquele que melhor escreve sobre abelhas no mundo virtual. É o que o David refere na última publicação do The Apiarist, esta semana.

De acordo com o Dr. Google serei o único a escrever sobre esta técnica em português. Sei que alguns amigos a passaram a utilizar quando me referiram a sua satisfação com os resultados.

óculo da prancheta, fechado ou aberto?

A ventilação das colónias e o seu maneio é um clássico nas conversas entre apicultores. Quando se fala de ventilação há que discriminar entre (i) a ventilação inferior, ao nível do estrado — sólido ou em rede? — e do alvado — com ou sem grelha de entrada?; (ii) a ventilação superior — óculo da prancheta, fechado ou aberto?

Vou apresentar as minhas opções relativamente à ventilação superior, que não são nem melhores nem piores que outras, são as que me pareceram favorecer mais os meus enxames no seu território. Lembro que é um território no distrito da Guarda, de temperaturas bastante baixas no inverno e altas no verão. As amplitudes térmicas diárias são elevadas no final do inverno, primavera e outono. É um clima de ar seco, aspecto a que dou particular importância, porque não tão atreito ao desenvolvimento de bolores e micoses no ninho. Lembro ainda que tinha as colmeias em assentos a cerca de 30 cm do solo, aspecto que também potencia a ventilação.

Tendo em conta estas particularidades, as minhas colónias no final da primavera (desde que as temperaturas diurnas atingiam os 25-27ºC e as noturnas se estabilizavam acima dos 13-15ºC) passavam a ter o óculo aberto em apenas cerca de 1/3 do seu diâmetro. Esta opção permitia às abelhas escolherem a sua ventilação superior. Quem melhor do que elas para decidir?

… e algumas colónias aparentemente desejam esta ventilação superior porque não fechavam com própolis este espaço aberto…
… enquanto outras aparentemente não desejam esta ventilação superior porque fecham com própolis o espaço aberto.

No outono/inverno e parte da primavera, com temperaturas nocturnas estabilizadas abaixo do 10-12ºC e diurnas abaixo dos 23-25ºC, fechava o óculo da prancheta. Com esta opção procurava evitar o efeito chaminé, a saída rápida pelo orifício da prancheta do ar quente e húmido proveniente do ninho. Como sabemos a criação de larvas beneficia muito por dispor de um nível relativamente alto e estável de humidade no ninho. Caso deixasse o óculo aberto, o ar seco do território entraria mais intensamente no ninho, podendo desidratar demasiado o ambiente interno do ninho e criar dificuldades suplementares às abelhas no cuidado às larvas.

Óculo fechado para estabilizar o mais possível a temperatura, mas sobretudo a humidade relativa no ninho. A humidade relativa no ninho de uma colónia forte e saudável situa-se entre os 50% e 60%. Com níveis inferiores a 50% de humidade relativa os ovos não eclodem. Com o óculo aberto o efeito de chaminé no ninho intensifica-se, podendo desidratá-lo em demasia.

quadros de cera laminada no ninho: como interpretar a sua utilização pelas abelhas

Na época da enxameação reprodutiva (abril e maio no território onde tinha os meus apiários), a aplicação da regra não mais de 6 para fazer a prevenção da enxameação de forma sistemática permitiu-me ir fazendo um conjunto numeroso de observações acerca da utilização e finalidade que as abelhas davam aos quadros de cera laminada que lhes ía colocando regularmente no ninho. Havia colónias que aproveitavam estes quadros para a rainha aí fazer postura de travessão a travessão num primeiro ciclo de postura, e nos ciclos seguintes ía aumentando a abóbada de mel permanecendo uma área generosa desses quadros para a postura da rainha. Contudo outras colónias aproveitavam estes quadros com cera nova sobretudo para armazenarem pólen e/ou néctar.

Das minhas observações verifiquei que esta apropriação e utilização diferente entre colónias dos quadros de cera laminada que ía colocando com intervalos de 15 dias e durante o período da enxameação reprodutiva (período com cerca de 45 dias no território onde tinha os apiários) estava associada frequentemente a dois modos diferentes das colónias:

  • as colónias que aproveitavam os quadros para a rainha aí fazer abundante postura não estavam em modo de enxameação;
  • as colónias que aproveitavam os quadros para aí armazenarem pólen e néctar estavam em modo de enxameação.
Quadro langstroth com cera laminada colocado na posição 2 do ninho 10 dias antes desta fotografia. Está cheio de larvas de travessão a travessão.
Quadro lusitana colocado na posição 9 no âmbito da aplicação da regra não mais de 6 com criação em mais de 90% da sua área. As abóbadas de mel aparecem somente no ciclo posterior de postura nesta época do ano.

A utilização que as colónias faziam dos quadros com cera laminada que lhes ía colocando em intervalos de cerca de 15 dias funcionavam para mim como bio-sensores do modo em que estavam as minhas colónias: em modo de crescimento ou em modo de enxameação.

prevenção da enxameação: aspecto comum de várias técnicas

Encontrar um ponto de equilíbrio ou compromisso entre colónias bem povoadas (40-45 mil abelhas) antes e durante um fluxo importante de néctar, colónias capazes de produzir um excedente de mel para o apicultor e, simultaneamente, evitar que enxameiem no início/durante esse fluxo é um dos desafios mais exigentes que encontrei na apicultura.

A prevenção da enxameação, isto é, evitar que a colónia produza mestreiros de enxameação, é posta em prática pelos apicultores por intermédio de variadas técnicas, entre as quais:

  • em colónias com dois ninhos, inversão quadro a quadro ou inversão à caixa;
  • checkerboarding (W. Wright);
  • regra “não mais de 6”;
  • drenar quadros com criação fechada e/ou abelhas amas para colónias mais atrasadas;
  • expandir/abrir o ninho, com quadros puxados vazios ou com ceras laminadas;
  • colocar atempadamente as primeiras meias alças com ceras puxadas;
  • colocar um quadro de meia alça no ninho;
  • no início de fluxo, retirar do ninho alguns quadros com largas abóbadas de mel e pólen;
  • retirar quadros com criação operculada e substituí-los por quadros com ovos e criação não operculada;
  • trocar colónias de lugar;
Aplicação da “regra não mais de 6” numa das minhas colónias.

Todas estas técnicas apresentam um ponto comum, de acordo com a minha percepção: visam criar nas abelhas/colónia uma “sensação” de que a sua casa ainda não está acabada ou completa, que ainda há mais alguma coisa para fazer. Ou têm cera para puxar no ninho, ou o sobreninho está vazio, ou a população de abelhas amas ainda é pequena, ou há um número apreciável de ovos para eclodir e larvas para alimentar, ou o mel/néctar armazenado é pouco face ao espaço disponível nas meias alças, ou…

Resumidamente, estas técnicas visam aproveitar um comportamento das colónias bem enraizado por milhares de anos de evolução: enxamear/ reproduzir-se sempre que atinjam um conjunto de condições óptimas em casa. Condições que garantam o melhor possível a sobrevivência de todas as abelhas, não só as que partem mas também as que ficam na colmeia, assim como das novas gerações de abelhas a nascer e da futura rainha, que permanecerão naquela colmeia durante os duros meses de escassez que virão pela frente.

Ao apicultor, e na medida do que lhe for possível e respeitando a vida do enxame, cabe o papel de ir desarrumando um pouco a casa durante a época de enxameação reprodutiva. Este modo de agir visa prevenir o mais possível a enxameação. Deste esforço para atingir o equilíbrio e o compromisso, colónias populosas e que não enxameiem, resulta uma apicultura mais rentável e um sentimento de competência e de trabalho bem feito, aspectos extremamente gratificantes e motivadores.

equalizar colmeias com tempo frio

Os dois vídeos em cima, o primeiro de Bob Binnie, apicultor norte-americano que gere uma operação apícola com mais de 2000 colónias, o segundo de Ian Steppler, apicultor canadiano que gere uma operação apícola com mais de 1500 colónias, são bem elucidativos de que a equalização de colónias de abelhas é não só compatível com operações apícolas de grandes dimensões, como é uma ferramenta essencial para efectuar a prevenção da enxameação nas colónias muito fortes no período pré-fluxo de néctar e, simultaneamente, habilita as colónias mais atrasadas no seu desenvolvimento para a produção no fluxo que virá 30 a 45 dias adiante. Como vemos nestes dois exemplos a equalização não é um maneio que está apenas ao alcance dos apicultores com poucas colónias, ainda que alguns erradamente acreditem que sim. No meu caso, sempre que se justificava apliquei esta técnica mesmo em alturas que tinha 500 a 600 colónias para trabalhar.

Contudo, como já referi nesta publicação de 2016, a equalização deve ser levada a cabo com alguns cuidados: “O apicultor deve ter um grande cuidado para não distribuir quadros com criação e abelhas a partir de colónias doentes. Deve verificar sempre se as colónias não apresentam sinais de doença antes da equalização.  A concluir, deve ter cuidado para não colocar muita criação em colónias fracas, pois estas não conseguirão dispor de abelhas em número suficiente para manter a criação quente durante as noites mais frias, ainda frequentes na primeira metade da primavera no interior do nosso país.

No caso das colónias mais fracas e para ter boas garantias que as abelhas seriam suficientes para aquecer a criação prestes a emergir do quadro que recebiam (sem abelhas), passei a proceder do seguinte modo:

  • tirava um quadro com criação predominantemente aberta e ovos. Procedendo desta forma, tinha um bom grau de certeza de que a colónia receptora mais fraca teria abelhas suficientes para não deixar esfriar a cria do quadro recebido: neste caso seria aquecido, grosso modo, pelas mesmas abelhas que antes aqueciam e cuidavam do quadro com criação aberta retirado;
  • ao mesmo tempo, a colónia mais forte recebia o quadro com criação aberta. Este quadro vai aumentar a ocupação das suas abelhas-ama assim como aumentar a libertação da feromona da criação no interior do ninho, elementos que contribuem para diminuir o impulso de enxameação nestas colónias prematuramente muito fortes;
  • estas colónias muito fortes, nada sendo feito, apresentam uma grande probabilidade de enxamear à entrada do primeiro fluxo forte de néctar 30 a 45 dias adiante, e nesta condição de enxameadas pouco ou nada produzem na temporada.

minimizando riscos do trabalho apícola

Assim como outros apicultores procuro o mais possível evitar os riscos habituais desta profissão ou, não sendo possível, tento minimizá-los. Entre outros cuidados, raramente sou picado e muito raramente me cai carga nos caminhos de acesso aos apiários.

Nesta publicação vou focar-me noutras medidas que visam minimizar os riscos nesta altura da época apícola. Uma destas medidas é planear o dia por forma a trabalhar no apiário com temperaturas inferiores a 25ºC. Hoje por exemplo, entre as 8h00 e as 10h30, estive ocupado a inspeccionar cerca de 80 colónias com o objectivo de identificar quais as que estavam a pedir mais uma meia-alça. Acabei por colocar mais 37. Por volta das 10h30 a temperatura estava a chegar aos 25ºC, isto a 900 m de altitude, e foi a hora em que iniciei o regresso a casa com o trabalho concluído.

Imagem parcial do apiário a 900 m.
Meia-alça praticamente cheia e…
… colocação de mais uma meia-alça.

Antes, no dia de hoje e por volta das 6h00, entrei no apiário das Lusitanas a 600 m de altitude para efectuar a cresta dos sobreninhos ali presentes. E a este respeito, aproveito para referir o segundo cuidado para minimizar riscos. Na cresta destes sobreninhos divido os quadros por várias caixas. A intenção é não ter de levantar mais de 15 kgs. Com 12 anos de apicultura a tempo inteiro, até agora não tenho problemas cervicais ou lombares. Assim espero continuar, tendo este e outros cuidados!

Na altura da cresta destes sobreninhos a máxima é dividir para vencer. Afinal é de apicultura mobilista que se trata.

bob binnie: o maneio de final de inverno e a divisão de colónias

Bob Binnie tem as sua operação apícola na Geórgia, EUA. Já a minha pequena operação tem a sua base na Guarda, Portugal. Vários milhares de kms separam estes dois territórios. Decorrente desta variável inegável, seria de esperar que o que observo e o que faço fosse diferente daquilo que o Bob observa e faz, em especial se considerarmos os timings das operações e o facto de ele trabalhar com híbridos de cárnicas x caucásicas.

Muito pelo contrário… acho notável a semelhança nos timings e no fluxo de procedimentos de final do inverno/início da primavera que ambos utilizamos para abordar, entre outros aspectos, a multiplicação de colónias com recurso à técnica Doolittle, a equalização, a regra não mais de seis, a utilização do tabuleiro divisor, a forte preocupação com a prevenção da enxameação, o conhecimento do ritmo de crescimento das colónias e o planeamento do maneio à luz do ritmo de crescimento das colónias.

Ficam em baixo dois dos mais recentes vídeos que o Bob Binnie publicou e que, como habitualmente, prestam um enorme serviço à comunidade apícola por esse mundo fora.