Numa das conversas que vou tendo ocasionalmente com o Randy Oliver através de e-mail, há poucos dias atrás perguntou-me: “You obviously follow how we do it in the U.S. What are the main differences in beekeeping in Portugal? And what do most beekeepers there use for varroa management?” (Obviamente acompanhas como fazemos nos EUA. Quais são as principais diferenças da apicultura em Portugal? E o que a maioria dos apicultores usam para o controlo da varroa?)
Sem pretensões a ser exaustivo, e muito menos desmesuradamente analítico, dei-lhe as minhas impressões na resposta que copio em baixo:
“Vou enviar alguns números globais: em Portugal, de acordo com os últimos dados oficiais (2018), havia cerca de 12 mil apicultores e 760 mil colmeias. Destes, apenas 1300 apicultores têm mais de 150 colónias (eu cheguei a 700, e agora tenho 170, fui vendendo para reduzir minha operação). Esses 1300 apicultores possuem 60% do número total de colónias.
As principais diferenças são estas, em minha opinião: nos EUA, a polinização traz bons rendimentos e segurança financeira aos apicultores comerciais/profissionais; aqui em Portugal este negócio da polinização começou a aumentar nos últimos 4 anos, devido à plantação de grandes pomares de amendoeiras numa zona do nosso país que passou a beneficiar de canais de irrigação. Porém os valores são bastante baixos, rondando os 20-30 euros por colónia.
Por outro lado, em Portugal e em muitos países europeus, a compra de acaricidas homologados é apoiada pelo Estado e pela UE na ordem dos 80%. Para você ter uma ideia, cada tratamento com tiras de Apivar custa ao apicultor cerca de 1,5 €. Dois tratamentos por ano são comparticipados.
Em Portugal, o produto da colmeia mais vendido é o mel, seguido do pólen e, em terceiro lugar, a própolis. O mercado de pólen é muito oscilante, com quedas e aumento de ano para ano em torno de 200% a 300%. Este ano, o mercado do mel a granel está a pagar mais do que nos últimos três anos: o mel multifloral a 3,50 €, o mel monofloral a 4,50 € e o mel de melada a 5 €.
A vespa velutina afasta muitos pequenos apicultores, embora muitas vezes atribuam à velutina a elevada mortalidade das colmeias quando de facto é a varroa que as mata. Porém, a falta de conhecimento para fazer um bom diagnóstico e talvez por vergonha, são levados a culpar a velutina. No entanto, a velutina está a desmoralizar muitos apicultores creio que porque é mais visível, mais observável em comparação com a varroa.
O tratamento mais utilizado é o Apivar e o Apitraz, mas muitos também utilizam formulações caseiras com amitraz em cartão. Há um número crescente de apicultores que notam uma diminuição na eficácia do Apivar e Apitraz. Este ano fiz pela primeira vez um tratamento intermédio com tiras de cartão de ácido oxálico. Até agora, nenhuma colónia morreu. Minha taxa de mortalidade no inverno nos últimos 7 anos não ultrapassou 5%, e muito graças ao que aprendo consigo.
Outra diferença, em Portugal ou não existem apicultores treatment-free, ou são poucos. Eu não conheço nenhum.
Randy, desculpe pela extensão da resposta. Se você tiver algum aspecto que queira abordar com mais detalhes, sinta-se à vontade para me perguntar.”
Nota 1: por que razão acho que a segurança financeira que os serviços de polinização oferece aos apicultores norte-americanos é assim tão importante? Uma vez mais repito o que já referi várias vezes, a principal ameaça à apicultura nacional em geral, e à apicultura profissional em particular, é a ausência de segurança financeira. As abelhas melíferas domésticas não correm actualmente perigo de extinção, mas o número de colónias depende inexoravelmente do retorno do investimento. Se esse retorno for cada vez mais incerto, ou pior, inexistente, o cenário de abundância relativa de abelhas melíferas domésticas pode mudar súbita e drasticamente por abandono da actividade de boa parte dos seus cuidadores.
Nota 2: por que razão acho que a comparticipação dos estados europeus e da UE na aquisição e consequente obrigação de tratamento da varroose, ao contrário do que se passa nos EUA é assim tão importante? As estatísticas globais de mortalidade invernal e estival de enxames dos últimos 20 anos colocam regularmente os EUA à frente da Europa. Sabendo que a varrooose e os vírus associados a esta doença são os principais indutores de mortalidade de colónias de abelhas, concluo que na Europa se está a abordar este problema de forma mais efectiva. Sabendo também que a principal diferença na abordagem está na comparticipação dos medicamentos na Europa, comparticipação inexistente nos EUA, na obrigação de tratar a varroose na Europa, em contraste com apenas a recomendação para tratar nos EUA, não posso deixar de considerar este um outro ponto muito saliente na diferença que encontro no modo como se faz na Europa por comparação com o modo como se faz nos EUA.
Incentivo os leitores a comentarem, e assim enriquecer, esta reflexão que fiz de forma tão sumária e pessoal às questões que o Randy me colocou.
Boa noite
Conconcordo com o que escreveste a cima mas em relação a política de tratamentos não é bem assim.
Repara em Portugal os subsídios vão para as associações, nos nossos vizinhos Espanhóis os subsídios são atribuídos diretamente aos apicultures, repara a maquinaria que eles tem em relação a nós.
Obrigado pelo trabalho que vais publicando
Bom dia, Paulo! Tanto quanto sei o PAN português e o PAN espanhol têm semelhanças e diferenças. No que diz respeito à comparticipação dos medicamentos contra a varroose, tendo lido o documento oficial de suporte ao PAN espanhol há uns anos atrás de uma ponta à outra, fiquei com a impressão que o que se faz em Espanha é muito semelhante, salvaguardando alguma alteração recente. Tenho ideia que a maior fatia dos apoios directos aos apicultores espanhóis tem origem sobretudo no orçamento das Comunidades Autónomas e não no PAN.Este apoio directo vai ao encontro do que refiro na nota 1 desta publicação: dá uma boa segurança e previsibilidade no retorno financeiro dos investimentos feitos. Esta medida faz muito falta à Apicultura nacional, como tenho escrito várias vezes.
Bom dia e muito obrigado pelo excelente trabalho. Tornei-me um seguidor assíduo do seu blog.
Quando refere que na Europa o tratamento para varrose é obrigatório e comparticipado, onde e como posso pedir essa comparticipação? Sou um pequeno apicultor diplomado pela SAP mas ainda ninguém me soube responder a esta pergunta!
Muito obrigado
Bom dia, Rui! O que eu fiz para aceder a esta comparticipação foi associar-me a uma Associação de Apicultores da minha zona. Através dessa Associação passei a receber os medicamentos comparticipados contra a varroose no ano seguinte à minha inscrição.
«Este ano fiz pela primeira vez um tratamento intermédio com tiras de cartão de ácido oxálico.»
Seguindo a formula do Randy, cartão embebido na mistura de OA e glicerina?
Bom dia, Paulino! Não sou eu que faço as tiras de oxálico com glicerina. Esta publicação responde à sua questão. Abraço. https://abelhasabeira.com/tratamento-intermedio-contra-a-varroose-resposta-a-quatro-questoes/