Nesta publicação menciono que a mortalidade normal de inverno situa-se entre as 2000-3000 abelhas (A. Imdorf, 2010). Nestes dias frios é habitual encontrarmos algumas destas abelhas mortas na rampa de voo. Tal não deve ser motivo de preocupação, sem mais. Julgo que as abelhas com funções funerárias as deixam logo ali para não se exporem ao risco de um voo mais demorado, em dias com temperaturas muito baixas, que muito provavelmente as mataria. Portanto, encontrar algumas dezenas de abelhas mortas à entrada ou na proximidade da colmeia é nestes dias mais frios, em condições normais, um sinal de vitalidade da colónia, um indicador que o balanço entre a vida e a morte segue os padrões naturais, próprios de uma colónia em equilíbrio, com as abelhas funerárias a executarem as suas tarefas habituais.
Uma abelha arrasta uma companheira morta para o exterior da colmeia.
A propósito deste grupo de abelhas com funções funerárias, saiu recentemente um estudo muito interessante acerca dos mecanismos envolvidos no reconhecimento das abelhas mortas, no ambiente escuro típico do interior da colmeia. Segundo Wen, os dados experimentais que recolheu levaram-no a concluir que nas abelhas mortas a libertação dos hidrocarbonetos cuticulares é muito reduzida, e provavelmente este é um sinal importante que as abelhas funerárias utilizam para identificar rapidamente as companheiras caídas. (ver referência ao estudo: https://www.sciencemag.org/news/2020/03/how-undertaker-bees-recognize-dead-comrades)
A tradução do sumário em baixo, de um artigo recente sobre uma preocupação recente, acerca da invasão da Vespa mandarinia de territórios da América do Norte, tem o propósito de reflectir sobre dois aspectos:
a minha suspeita que os autores acreditam que a sensibilização dos decisores políticos para o problema passa por fornecer-lhes dados fiáveis do impacto económico da invasão, em especial nos serviços de polinização;
aproveitar para relevar novamente a importância económica das colónias de abelhas nos serviços de polinização que prestam ao sistema agro-pecuário — US $ 101,8 milhões, o que equivale a uma mais-valia de mil dólares por colónia.
Teremos alguma coisa a aprender na Europa sobre como fazer a sensibilização de políticos? Seguramente que sim, e esta publicação poderá ajudar a ilustrar como o fazer: enfatizando perdas económicos mais gerais, em particular as decorrentes do empobrecimento de todo o sector agro-pecuário, se a luta contra a V. velutina não se traduzir em melhores resultados que os alcançados até à data.
Sumário
Contexto: As invasões biológicas são uma preocupação global na agricultura, produção de alimentos e biodiversidade. Entre as espécies invasoras, sabe-se que algumas vespas causam sérios efeitos sobre as abelhas, como as encontradas durante a invasão da Vespa velutina na Europa. As recentes descobertas de indivíduos Vespa mandarinia no estado de Washington, na costa oeste dos EUA, levantaram o alarme em todo o país. Aqui nós estimamos o potencial de propagação de V. mandarinia nos EUA, analisando seus impactos potenciais nas colónias de abelhas, perdas económicas na indústria de abelhas e áreas de cultivo polinizadas por abelhas.
Resultados: Descobrimos que a V. mandarinia poderia colonizar os estados de Washington e Oregon na costa oeste e uma proporção significativa da costa leste. Se esta espécie se espalhar por todo o país, poderá ameaçar 95.216 ± 5551 de colónias de abelhas, ameaçando uma renda estimada de US $ 11,9 e 101,8 milhões para produtos derivados de colmeias e produção de colheitas polinizadas por abelhas, respectivamente, quando colonizar 60.837,8 km2 de plantações polinizadas por abelhas.
Conclusão: Os nossos resultados sugerem que V. mandarinia terá graves efeitos nos EUA, aumentando a necessidade de ações de monitorização e planeamento imediatos em diferentes níveis administrativos para evitar sua potencial disseminação.
As colónias de abelhas são capazes de tolerar temperaturas frias mais extremas do que a maioria dos mamíferos e pássaros. A tolerância a temperaturas muito frias de pelo menos -80 ° C de um cacho de abelhas é tão boa quanto a de animais de “sangue quente” muito preparados para invernos rígidos. Grandes raposas árticas e cães esquimós podem tolerar -80º C, já o Ptarmigan do Alasca (Lagopus lagopus alascensis), uma ave que tem penas até nas patas tem um limite a temperaturas frias de cerca de -50º C. Os humanos nus, em contraste, podem tolerar perto de 0º C temperatura do ar e por apenas uma hora antes que a temperatura corporal comece a cair e entrem em hipotermia.
O mecanismo mais importante que as abelhas utilizam para produzir e controlar a transferência de calor é a formação de cachos ou agrupamentos de abelhas no interior do ninho. Estes cachos de abelhas apresentam um controle térmico praticamente indistinguível de pássaros e mamíferos. Contudo, para sobreviver a baixas temperaturas, é necessário um grupo de pelo menos 2.000 abelhas(Southwick, 1984). Sabemos que 2 mil abelhas é o número de abelhas necessário para cobrir as 2 faces de um quadro do modelo Langstroth ou Lusitano.
Esquema básico da geração e controlo da temperatura nos aglomerados/cachos de abelhas.
Em condições de frio extremo, mesmo os animais com uma espessa camada de pelos ou penas devem gerar calor adicional para manter a temperatura corporal elevada. A eficácia do isolamento da superfície está inversamente relacionada ao tamanho do corpo, portanto, os aglomerados de abelhas, bem como mamíferos menores e pássaros, têm que contar principalmente com a produção de calor para compensar a perda de calor nos dias frios. Nas abelhas, esse calor é geralmente produzido por rápidas contracções geradas no tecido muscular das asas, que aumenta a taxa metabólica por um fator de 25. Nos vertebrados os tremores musculares são uma forma menos eficaz de produção de calor, e produzem um aumento metabólico de apenas duas a cinco vezes as taxas metabólicas basais.
Neste dias frios um grupo de abelhas (abelhas termogénicas ou “abelhas aquecedor”) enfiam-se de cabeça para baixo nos alvéolos e produzem calor através dos tremores referidos. Camadas adicionais de operárias cobrem estas “abelhas aquecedor” e fornecem isolamento para reter o calor. Estas abelhas são alimentadas continuamente por um outro grupo de abelhas que trazem a comida (combustível), recolhida por ex. no mel armazenado em áreas mais ou menos distantes do cacho de abelhas.
As abelhas de cabeça enfiada nos alvéolos não estão à procura de mel no fundo dos alvéolos. Abelhas saudáveis, bem alimentadas e com a cabeça dentro dos alvéolos são uma parte normal de um aglomerado de inverno. Jurgen Tautz explicou este fenómeno em detalhes no livro que publicou em 2008, The Buzz about Bees. Filmando um cacho de abelhas com uma câmera sensível à temperatura, Tautz descobriu que algumas abelhas são capazes de elevar suas temperaturas corporais cerca de 10º C acima do normal, usando contrações musculares rápidas. Depois de aquecerem, algumas das abelhas entram de cabeça nos alvéolos vazios, onde permanecem cerca de 30 minutos, ou até que seus corpos voltem à temperatura normal.
Para todas as colónias que vierem a sucumbir nos próximos dias nos meus apiários e, até agora, em território com duas semanas seguidas com temperaturas mínimas abaixo do 0ºC, irei tentar perceber que factor ou factores confluíram e desaguaram nesta altura para que não superassem esta exigente prova. O frio, per si, está ilibado!
Foi no passado dia 19 de Dezembro que tirei estas três fotos em baixo:
Horta com nabiças floridas situada nas proximidades de um dos meus apiários.Depois de uma intervenção mais profunda e demorada neste núcleo, fica visível que as abelhitas têm pólen disponível, o recolhem, o transportam e armazenam, à porta do solstício de inverno.No mês de dezembro, pão-de-abelha recém ensilado.
Neste território, em que as fontes de pólen estão presentes no campo durante esta época, a minha opção tem sido não fornecer pólen ou seus substitutos às colónias. E apesar desta malfeitoria, ano após ano cerca de 75% a 80% das colónias chega a meados de abril, altura do primeiro fluxo sério de néctar, com um número de abelhas suficientes para garantir médias de 16 a 24 kgs de mel por colónia (valores médios, mínimo e máximo, de produção desde 2010).
Em baixo ficam duas fotos ilustrativas do estado de algumas colónias em setembro 2020, num apiário localizado a cerca de 900 m de altitude no Parque Natural da Serra da Estrela.
Pão-de-abelha de diversas origens botânicas, o melhor alimento proteico que as abelhas conhecem até à data. Havendo proteína de qualidade a entrar ou devidamente armazenada vou encontrando quadros com áreas apreciáveis de onde emergirão as futuras abelhas de inverno, logo após a escassez do mês de agosto.
Recuando mais alguns meses no ano, em finais de março ou durante a primeira quinzena de abril encontro uma boa parte das colónia mais ou menos assim…
É verdade que as minhas colónias não têm 80 mil abelhas nem produzem médias de 60 kgs, mas esse é o campeonato de outros não o meu… eu jogo na liga da realidade!
Como a Rusty Burlew, acho que neste território o melhor é mesmo deixar as abelhas “fazerem a sua coisa”, e deixar os suplementos com proteína para os companheiros de outras latitudes e/ou longitudes.
“As abelhas estão, na verdade, bem equipadas para dispensar qualquer suplemento. As chamadas abelhas de inverno (abelhas diutinus) armazenam reservas de alimentos no seu corpo gordo. O corpo gordo também produz uma substância chamada vitelogenina, que permite a secreção de geleia real mesmo na ausência de pólen fresco. Durante muitos anos, não alimentei com nenhum substituto do pólen e não tive problemas. Acho que o maior erro está em fornecê-lo muito cedo no ano. Há vários anos atrás, experimentei dar suplementos mais cedo, a partir de outubro, e meti-me em muitos problemas. Nos primeiros dias de janeiro, tinha colónias enormes que precisavam de ser alimentadas quase que diariamente. Eu estava realmente cansado de abelhas em abril, então quando todas aquelas colónias superlotadas começaram a enxamear, eu pensei, “Boa viagem!” Nunca fiquei tão feliz em ver o traseiro de uma abelha na minha vida. Em resumo, a alimentação com suplemento de pólen é como qualquer outro aspecto da apicultura. A necessidade de um suplemento varia de acordo com sua localização, estação, ano e colónia. Para saber se suas abelhas precisam, examine suas colmeias, observe suas abelhas e aprenda com a experiência.“
Notas: 1) esta publicação, em especial o quadro regressivo no final, complementa bem o conteúdo da presente; 2) sobre as melhores receitas proteicas e sobre os seus efeitos a diversa literatura científica que consultei não é consensual; contudo é bastante consensual sobre o impacto nulo da suplementação com proteína quando as colónias têm pólen disponível no exterior, este é de origem botânica diversa e as abelhas têm condições meteorológicas para o colher, transportar e ensilar na proximidade da criação larvar — consenso bem sumariado nas palavras de Laidlaw (o pai das abelhas VSH) “pollen supplement, or pollen substitute is not beneficial after the pollen flow begins” [suplemento de pólen ou substituto de pólen não é benéfico após o início do fluxo de pólen].
Sou um leitor ávido e habitual de relatórios anuais publicados por algumas associações/institutos de apicultura, tendo já publicado um ou outro pelo interesse que encontro nos seus dados (ver por ex. aqui). Acho os relatórios extremamente didácticos pela visão macroscópica que me permitem elaborar, pelo sentido que dão às observações mais fragmentares que vou fazendo nos meus apiários e pelo reforço que dão a algumas das acções basilares no maneio das minhas colónias.
As observações demasiado fragmentares, sem a devida integração e comparação com dados de natureza mais global, são semelhantes ao “olhar de um boi para um palácio”!
Nas duas últimas newsletter (28/12/2020 e 05/01/2021) que recebi do Bee Informed (EUA) é apresentada, na primeira, a análise de vários especialistas regionais acerca das tendências encontradas nas operações apícolas “comerciais” (operações com mais de 500 colónias) e os resultados do Sentinel Apiary Program, na segunda.
Relativamente à primeira newsletter (28/12/2020) chamou-me a atenção a organização e a quantidade de trabalho realizado pelos diversos especialistas que acompanham as operações comerciais e transumância de colónias entre várias regiões, da qual podemos ver um vislumbre no esquema em baixo.
Mapa das regiões das equipes de transferência de tecnologia BIP. Os pontos amarelos representam a base de cada especialista de campo e os pontos laranja identificam os estados onde eles fornecem serviços de supervisão de colónias. As setas indicam os movimentos dos especialistas de campo à medida que seguem as migrações de colónias de abelhas dos apicultores “comerciais” dos EUA durante a temporada de apicultura.
Na Região Noroeste, Ben Sallmann, o especialista de campo dessa região apresenta o seguinte sumário, no qual revejo boa parte dos eventos meteorológicos no território dos meus apiários em 2020: “Em fevereiro passado (2020), as condições climáticas da Califórnia foram ideais para a produção de amêndoas, e as abelhas também tiveram acesso a uma quantidade maior de pastagem este ano em comparação com o anterior. Portanto, as colónias cresceram muito rapidamente e os apicultores constaram muita enxameação. Durante este período, o clima da região noroeste foi chuvoso e muitos destes enxames fracassaram na fecundação das novas rainhas [não tive esta experiência, julgo que em boa medida porque consegui adiar a enxameação para “fora” da época das chuvas, para lá de meados de maio para ser mais concreto]. Não surpreendentemente, os níveis de infestação pelo ácaro Varroa também aumentaram mais cedo este ano. A loque europeia foi menos prevalente em 2020 em comparação com 2019, mas foi observada em algumas das colónias utilizadas para polinizar mirtilos [não sei o que é loque europeia, felizmente] . O mesmo padrão também se verificou nas taxas de infecção por ascosferiose (cria de giz) [doença muito esporádica e rara nas minhas colónias]. Embora os dados do Nosema sejam difíceis de avaliar devido à redução nos testes do Nosema este ano, em geral, as amostras que foram analisadas mostraram contagens de esporos mais baixas em comparação com os dados de 2019 [ao longo dos anos não tenho notado colónias com problemas críticos de nosemose, felizmente]. Neste outono, os níveis regionais de Varroa aumentaram consideravelmente depois que as rainhas começaram a diminuir a sua postura e muitas dessas colónias continuaram a enfraquecer, mesmo após a aplicação de tratamentos de controle de Varroa [sim, este ano constatei o mesmo em cerca de 20% das colónias tratadas]. Por outro lado, observamos menos sintomas visíveis de infecções virais do que anteciparíamos com cargas de Varroa tão altas [vi sinais evidentes e intensos das infecções virais nos 20% das colónias referidas em cima]. No geral, os apicultores que realizaram um tratamento de Varroa no início do verão se saíram muito bem.” fonte: https://beeinformed.org/2020/12/28/the-bee-informed-partnership-field-specialists-report-on-2020-commercial-beekeeping-trends/
Da segunda newsletter (05/01/2021) com os resultados do Sentinel Apiary Program…
Em 2020, apicultores com 76 apiários representando 394 colónias participaram no Programa Sentinela. O laboratório da Universidade de Maryland processou quase 2.000 amostras do programa durante a temporada para monitorar Varroa e Nosema!
… queroenfatizar uma vez mais a importância crítica do mês de agosto para iniciar o segundo tratamento contra o ácaro varroa (ver mais aqui). Também nos EUA este mês adquire, em muitas regiões, a mesma importância para quem deseja controlar efectivamente e a tempo e horas o ácaro. No gráfico em baixo verifica-se que o limiar de 3% de infestação de abelhas adultas (demarcado pela linha tracejada) é ultrapassado no mês de agosto para a média nacional. Estes dados não me surpreendem; já há alguns anos leio relatos no Beesource, por parte dos apicultores mais experimentados, para a necessidade de controlar a varroa nos meses de julho e agosto.
No relatório detalhado podemos ler: “Detectámos Varroa em mais de 70% das amostras do Sentinel recebidas em 2020. A percentagem de amostras contendo Varroa aumentou ao longo da temporada. A partir dessas amostras positivas, a fração das que atingiram o valor limite de 3 ácaros por 100 abelhas também aumentou ao longo dos meses (linha tracejada).
Terminado 2020, um ano inesperado do ponto de vista da saúde pública, contudo relativamente normal no que respeita à minha actividade apícola — os diversos constrangimentos surgidos não alteraram de forma importante o trabalho que fui realizando ao longo do ano nos apiários — proponho-me nesta publicação elencar algumas linhas-de-força do que pretendo para o novo ano, enunciando o que pretendo modificar e aquilo que pretendo manter e até intensificar no maneio das colónias.
Em 2020 fui confrontado com uma taxa de insucesso no segundo tratamento anual contra a varroose, aqui relatada, que me impele a fazer algumas modificações na abordagem que pretendo fazer neste novo ano. O plano está gizado, escreverei sobre ele após a sua concretização e depois de avaliados os primeiros resultados.
Esta semana (3ª feira a domingo) tenho andado ocupado com trabalho nos apiários (tema para uma publicação em breve) e com a resposta aos pedidos dos meus clientes do retalho.
Em baixo fica o foto-filme de algumas das etapas do enfrascamento, desde a descristalização do mel, armazenado em potes de 50l, até à rotulagem.
Um dos potes onde armazenei o mel após a extracção.
Cerca de 4 meses e meio após a extracção o mel de montanha está cristalizado. Temperaturas ambiente entre os 5 e 15º C potenciaram a cristalização. Um dos cordões descristalizadores utilizado, em banho maria para sua limpeza e posterior re-utilização. Enfrascando o “montanhês”!Frasco com rótulo e com precinto. Três cores de rótulos para os 3 tipos de mel que o território paga pelo trabalho.
Apresento em baixo um documento de trabalho de um apicultor amigo, de grande competência na minha opinião, acerca dos resultados que obteve este ano com a aplicação do Formivar 60%, um medicamento com ácido fórmico. Podem ver aqui o protocolo de utilização. Nunca experimentei, mas segundo o que li e agora re-confirmado por estes dados, tenho a convicção que este tratamento pode ter uma boa eficácia em casos de uma infestação elevada, em casos de re-infestação ou em casos de baixa eficácia com o tratamento principal.
Foram estabelecidos dois grupos de colónias de acordo com o veículo utilizado para veicular o Formivar como se vê na tabela em baixo.
Tabela com os testes de contagem de varroas com açúcar em pó
Legenda: gr – peso das abelhas nº – número de varroas caídas % – percentagem de infestação, calculada/fórmula nºx10/gr
Algumas notas de detalhe:
Apiário composto por 18 colmeias reversíveis e 3 lusitanas que foram as usadas na aplicação com vaporizador;
As colmeias tinham sido tratadas com timol em junho/julho e sofreram, provavelmente, uma reinfestação nos inícios de setembro;
Nas colmeias reversíveis, dada a sua menor capacidade, foram utilizados 2,5ml por quadro de abelhas, sendo que nunca foram ultrapassados os 15ml;
Foram feitas 3 contagens, a inicial para avaliar o nível de infestação, a segunda ao 8º dia coincidindo com a terceira aplicação nos panos/esponja e a última 30 dias depois do início do tratamento;
Nas colmeias lusitanas foi introduzido o máximo da capacidade do vaporizador (entre 100 e 120ml) e com as aberturas a meio. No dia 7/10, as aberturas foram totalmente abertas, quando foi feita 2a contagem;
A partir do 8º dia notou-se uma melhoria significativa na qualidade da criação com posturas homogéneas e que se consolida no estado geral quando nasce a 1a geração de abelhas pós-tratamento.
Tiro daqui o chapéu a todos os apicultores que em modo de produção biológica têm perdas por varroose relativamente baixas (entre os 5 e 15%). Creio ser o caso deste amigo, que tenho ouvido com ganhos pessoais, com o objectivo de montar uma estratégia mista, convencional e biológica, para gerir eventuais resistências aos princípios activos dos acaricidas que tenho utilizado regularmente.
Apresento alguns excertos de um relatório disponibilizado pela FNAP, a que tive acesso muito recentemente. Numa primeira leitura deste relatório chamaram-me a atenção vários aspectos, dos quais destaco os que apresento em baixo.
“… as explorações com mais de 600 colónias detêm um volume de mão-de-obra total equivalente a uma atividade a tempo inteiro, correspondendo a um volume de trabalho aproximado equivalente a 3 indivíduos.
A análise do volume de mão-de-obra apícola por colónia (UTA/número de colónias), permite verificar que os apicultores não profissionais dedicam um maior tempo à atividade (em média despendem 0,006 UTA por colónia) que os apicultores profissionais (em média, 0,003 UTA por colónia), sendo a diferença estatisticamente significativa (valor de p = 0,015), sem que tal se reflita numa maior produtividade de mel por colónia, como se verá no capitulo seguinte.
Sendo a visita ao apiário uma componente fundamental do maneio apícola, os apicultores foram inquiridos relativamente a esta prática. Por norma, na Primavera/Verão, 49% dos apicultores visitam o apiário semanalmente, 15% visitam-no diariamente, 12% fazem-no 3 vezes por semana e 11% quinzenalmente. No Outono/Inverno, 41% dos apicultores visitam o apiário mensalmente, 33% visitam-no quinzenalmente e 15% semanalmente.” p. 26
“A análise […] permite observar que à medida que a percentagem de perdas diminui com o aumento da dimensão da exploração, verificando-se diferenças estatisticamente significativas, entre apicultores profissionais e não profissionais (valor de p = 0,013).
Analisando a percentagem de perdas geograficamente, verificou-se que a região Centro apresenta, em média, maior taxa de perdas por exploração (38 %), seguindo-se a região Sul (28%); na região Norte as perdas são de 26%. Contudo estas diferenças não são estatisticamente significativas.
Quando analisada a relação entre as percentagens de perdas e o associativismo, verifica-se que os apicultores não associados têm percentagens de perdas na ordem dos 50%, enquanto que para os apicultores associados, essas perdas são, em média, apenas de 27%. Porém esta diferença não é estatisticamente significativa, atendendo à variabilidade encontrada nos dois grupos.
Foram analisadas outras variáveis, como o tipo de maneio (número de visitas ao apiário, realização de análises às abelhas, realização de tratamentos contra a varroa e a alimentação artificial), a formação em apicultura, a idade e o nível de instrução do apicultor, não se tendo verificado que estas influenciassem, de forma estatisticamente significativa, a percentagem de perdas do efetivo.” p.30
“A maioria do mel em MPB comercializado a granel é efetuada através de intermediários (79% do mel) ou da cooperativa/agrupamento com cerca de 20%. Quanto ao mel em MPB embalado, os canais de venda assumem posições mais equitativas: as lojas especializadas (37% do mel), a venda direta a particulares (23%), o comércio tradicional (19%), os intermediários (14%), e por fim, as grandes superfícies e o canal HORECA, com peso de 3%. Os preços praticados são também bastante diferenciados. No caso do mel a granel, a cooperativa/agrupamento destaca-se pela negativa, com valores de 0,34€/kg abaixo dos praticados pelos intermediários. Quanto ao mel embalado, o canal Horeca e comércio tradicional praticam os preços mais favoráveis, sendo a venda a grandes superfícies a menos lucrativa com um diferencial máximo, em média, de 0,35€/kg.
Os baixos preços obtidos pelos apicultores que optam por escoar o mel através da cooperativa/agrupamento talvez explique o porquê da comercialização do mel ser feita essencialmente de forma individual (75% dos apicultores opta por esta forma de comercialização), e apenas em 15% dos casos de forma coletiva (4% dos produtores fazem-no das duas2 formas). A dificuldade na criação de uma rede de comercialização é frequentemente apontada como dos principais entraves ao desenvolvimento da atividade empresarial em Portugal, designadamente no setor agrícola.” p. 43
” O modelo 1 mostra que a idade do apicultor, o montante despendido com despesas de exploração, o número de anos de atividade certificada e a utilização de colmeia lusitana têm uma influência positiva, estatisticamente significativa, na produção de mel por colónia. Especificamente, um acréscimo unitário no número de anos do apicultor traduz-se num acréscimo de 0,16kg na produção de mel por colónia, mantendo todas as outras variáveis e o erro constantes. Da mesma forma, cada ano adicional de atividade certificada implica um acréscimo de 0,80kg na produção de mel por exploração. Estas variáveis refletem os benefícios da experiência adquirida, que permite aos apicultores aprender com a prática. Por outro lado, a diferença na produção de mel por colónia entre utilização de colmeia lusitana ou outro tipo de colmeia é de 3,1 kg, mantendo-se tudo o resto constante. Pelo contrário, a variável Colmeia_reversível mostrou ter uma influência negativa, estatisticamente significativa, sobre a produção de mel por colónia; sendo a diferença na produção de mel por colónia entre utilização de colmeia reversível ou outro tipo de colmeia de -3,7 kg, mantendo todas as outras variáveis e o erro constantes. Também o número de apiários tem um impacto negativo na produção de mel por colónia, traduzido num decréscimo de 0,40kg por cada acréscimo unitário no número de apiários, indicando a existência de um decréscimo na produtividade com o aumento da área geográfica da exploração.” p. 47-48
Em outubro de 2017, referi-me aqui às características fisiológicas distintivas entre as abelhas de primavera-verão e as abelhas de outono-inverno. Foi referido que a quantidade do composto proteico vitelogenina é um dos componentes críticos que distingue a fisiologia destes dois tipos de abelhas. As abelhas de outono-inverno apresentam uma maior quantidade de vitelogenina. Mais recentemente, nesta publicação, abordei a relação entre o envelhecimento das abelhas e a necessidade de alimentarem a sua criação. Estribado no estudo realizado pela equipa de Gro Amdam, acerco-me agora dos indutores primários, os “gatilho” basilares envolvidos no processo de envelhecimento das abelhas.
A longevidade das abelhas, na minha opinião, é um aspecto relevante para a apicultura, pela sua determinância na sobrevivência invernal e bom arranque da colónia no final do inverno. Deixo em baixo o texto que descreve o percurso da equipa de Gro Amdam, desde a curiosidade inicial, passando pelo processo investigacional, até às conclusões retiradas sobre o impacto do cheiro/odor da criação na esperança de vida das abelhas obreiras.
“Durante algumas semanas cruciais a cada primavera, as abelhas são os trabalhadores mais essenciais do planeta, polinizando muitas das principais produções de frutas do mundo: sua sobrevivência durante o inverno é, portanto, fundamental para a agricultura.
Percebendo que a sobrevivência do indivíduo era a chave para o sucesso de uma colónia, Gro Amdam ficou intrigado com a longevidade das abelhas. A esperança de vida das abelhas operárias tende a ser de apenas algumas semanas; no entanto, Amdam clarifica que um novo tipo de abelha desenvolve-se no final do verão, conhecido como abelhas diutinus*. Estas abelhas têm uma vida útil surpreendente de 6 meses ou mais e garantem a sobrevivência da colónia durante o inverno. Curiosa para saber o que limita a longevidade das abelhas operárias e permite o desenvolvimento das abelhas diutinus, Amdam começou a investigar a longevidade das abelhas.
Lendo a literatura, ela percebeu que uma proteína do ovo, a vitelogenina, poderia ser essencial para a longevidade da abelha diutinus: o que é curioso, porque as abelhas diutinus são na sua maioria estéreis, não produzem ovos e não precisam da proteína do ovo. Outra coisa que ficou clara foi que a presença de criação aberta numa colónia era suficiente para evitar que as abelhas operárias se tornassem veteranas longevas. ‘A criação está para as abelhas diutinus como a criptonite está para o Super-homem’, ri Amdam ao sumariar o tema. A princípio, Amdam pensou que o trabalho árduo de alimentar as larvas evitava que as abelhas operárias aumentassem seus níveis de vitelogenina e se transformassem em abelhas diutinus. Mas então ela leu um relatório de que o cheiro do fermento afeta a vida das moscas-da-fruta. O odor da criação – feromona da criação – pode afetar a longevidade das abelhas? A feromona poderia impedir que as operárias aumentassem seus níveis de vitelogenina e se tornassem abelhas diutinus de vida longa? Amdam decidiu investigar se a feromona da criação poderia ser a chave para a curta vida das abelhas operárias.
Trabalhando com Claus Kreibich e Margrethe Brynem, a aluna de Amdam – Bente Smedal – preparou 12 colmeias onde a equipe poderia controlar cuidadosamente os níveis de cria e feromona da criação para descobrir se os baixos níveis de vitelogenina das abelhas operárias e a curta esperança de vida eram devidos ao odor da feromona da criação. Fornecendo às abelhas operárias em cada colmeia uma rainha enjaulada (que não podia produzir cria) para que Smedal pudesse controlar os níveis de criação e feromona de cada colónia, ela assumiu o controle do suprimento de criação da colmeia, fornecendo às abelhas: cria; feromona sintética de criação; tanto criação como feromona sintética; ou nem cria nem feromona. Monitorando os níveis de vitelogenina das abelhas 3-4, 7-8 e 23-24 dias após o estabelecimento das colmeias, ficou claro que estar perto da criação reduzia os níveis de vitelogenina das abelhas operárias. Mas a exposição à feromona da criação isolada também reduziu os níveis de vitelogenina das abelhas na mesma quantidade. E quando Smedal observou os níveis de vitelogenina nas abelhas com 23-24 dias de idade, as abelhas que foram privadas de criação e da sua feromona tinham os níveis mais altos de vitelogenina, tal e qual as abelhas de outono que iniciam a invernagem na colónia. O trabalho duro de cuidar da criação não explica os baixos níveis de vitelogenina das operárias.
E quando Brynem verificou as colmeias 200 dias depois para descobrir quais as colónias que sobreviveram e quais as que morreram, as colónias que não tiveram cria ou feromona sobreviveram melhor, enquanto as colmeias que receberam cria e feromona tiveram as piores taxas de sobrevivência. Era o odor da criação – feromona da criação – que regulava os níveis de vitelogenina e a longevidade das abelhas.”
* diutinus é a palavra do latim para “longa duração”. As abelhas diutinus são, portanto, abelhas de longa duração. São as abelhas que, nas regiões temperadas, mantêm a colónia desde o outono-inverno até aos dias mais quentes do início da primavera.