adaptação local da Abelha Ibérica (Apis mellifera iberiensis): uma experiência de translocação recíproca

Um dos leitores das publicações do abelhas à beira, Tó Zé da Frágua, ligou-me há umas três semanas para trocarmos ideias, e perguntou-me se conhecia algum estudo que avaliasse o desempenho de rainhas locais comparado com o desempenho de rainhas não-locais. Na altura só me ocorreu o que tinha lido em estudos realizados nos EUA. Contudo, no último Congresso Ibérico de Apicultura realizado em Portugal foi apresentado este estudo levado a cabo no nosso país.

A foto em baixo espelha a postura de uma das rainhas criadas por mim e que em regra têm bom desempenho, mas tenho também experiências positivas com rainhas compradas a um criador da Beira Litoral e a um outro da Beira Baixa — em regra faço apenas questão que sejam fecundadas pelos zângãos locais.

Postura de rainha nova. Um detalhe: nesta altura já se começa a ver a abóbada de mel e pólen, que irá crescendo à medida que o verão for entrando. De imprevidente, a estas abelhas adaptadas, não lhes conheço nada (foto e texto de junho do ano passado).

Resumo: Na Europa, várias experiências de translocação recíproca com diferentes subespécies de abelha melífera (Apis mellifera L.) têm demonstrado a existência de adaptação local, sobretudo quando a pressão de selecção é mais forte devido, por exemplo, a novas doenças e parasitas, agroquímicos, ou rápidas mudanças climáticas. Contudo, até agora nenhum desses estudos abrangeu a subespécie da Península Ibérica, Apis mellifera iberiensis. Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar a existência de adaptação local em A. m. iberiensis. Em 2015 foram instalados dois apiários, com 36 colónias cada, em dois extremos latitudinais de Portugal: Bragança e Vila do Bispo*. As 36 colónias (18 da origem Bragança e 18 da origem Algarve) foram avaliadas para várias características durante um ano. Entre as características avaliadas incluem-se o número de alvéolos com mel, produção de mel, e o peso mensal das colónias. Na análise destas características foram usadas duas abordagens: (i) comparação entre as duas origens no mesmo apiário e (ii) comparação da mesma origem entre os dois apiários. Os resultados indicam que embora as três características possam sugerir uma interação genótipo-ambiente, apenas a produção de mel e o peso da colónia demostraram adaptação local, uma vez que as abelhas locais tiveram um melhor desempenho no seu apiário de origem. Adicionalmente, verificou-se que as diferenças entre as duas origens foram mais evidentes no ambiente considerado menos hostil (Vila do Bispo), onde cada colónia pode expressar todo o seu potencial genético.

fonte: https://bibliotecadigital.ipb.pt/handle/10198/18031

Nota: * Vila do Bispo é uma vila portuguesa no distrito de Faro.

sam: uma ferramenta para melhorar abelhas num futuro próximo

Tendo ficado apeado, com as chaves da pick-up no interior da carrinha, e as portas inexplicavelmente trancadas (tenho um comando de portas com vontade própria?), ocupo-me a limar alguns rascunhos por publicar. Este deu-me algum trabalho, mas muito gosto a escrever. Boa leitura!; eu vou continuar a limar arestas de futuras publicações enquanto espero que me tragam a segunda chave!

Não sou um grande crente nas proclamações de selecção e melhoria de abelhas que se fazem na actualidade, em Portugal e no estrangeiro. Neste cepticismo estou acompanhado por Keith Delaplane, entre outros (ver a palestra nesta publicação de 2019). Por exemplo, nos últimos vinte anos diversos programas de melhoria de abelhas no que respeita à resistência ao ácaro varroa produziram resultados decepcionantes. Como poderei fazer outra avaliação se após duas décadas de trabalho se identifica de forma comprovada apenas uma região onde persistem linhas resistentes: Gorgona, em Itália (ver o artigo Geographical Distribution and Selection of European Honey Bees Resistant to Varroa destructor, publicado em dezembro de 2020, de Yves Le Conte e Ralph Büchler, dois dos maiores especialistas neste domínio)?

Dito isto, acredito que num futuro próximo iremos assistir a desenvolvimentos importantes na nossa capacidade de selecção e melhoramento de abelhas. A genómica em geral e a Seleccção Assistida por Marcador (SAM) em particular fazem já parte do presente, e estão a ser utilizados para nos ajudar e capacitar a fazer esse melhoramento de forma económica e confiável. É sobre esta ferramenta a Seleccção Assistida por Marcador o conteúdo desta publicação.

“Selecção Assitida por Marcador é o uso de um marcador molecular* que é conhecido por estar associado a uma característica comercialmente importante para identificar indivíduos portadores de um genótipo desejado. A capacidade de selecionar indivíduos superiores diretamente e com base nos seus genótipos permite a possibilidade de ganhos substanciais no melhoramento das abelhas. Uma vez que os marcadores moleculares para uma característica estejam identificados, eles podem ser usados para facilitar a avaliação do valor reprodutivo (breeding value) estimado das colónias. Esta capacitação terá o maior valor para características comportamentais que são difíceis de quantificar com precisão. Além disso, rainhas e zângãos podem ser genotipados antes do acasalamento (Oldroyd e Thompson, 2007), proporcionando uma intensidade selectiva muito forte (Lande e Thompson, 1990) e ganhos mais rápidos na melhoria de características.

fonte: The Genetic Architecture of Honeybee Breeding, Peter R. Oxley and Benjamin P. Oldroyd, Behaviour and Genetics of Social Insects Laboratory, School of Biological Sciences, The University of Sydney, New South Wales, Australia

* marcador genético/molecular: historicamente, o princípio da utilização de marcadores genéticos está baseado no dogma central da biologia molecular, no princípio da replicação do DNA, e na pressuposição de que estes marcadores refletem alterações nas sequências do DNA podendo muitas vezes resultar em diferenças fenotípicas. A partir disto, dados morfológicos e bioquímicos também servem como marcadores genéticos. (https://pt.wikipedia.org/wiki/Marcador_genético)

Um estudo de caso de colónias de abelhas canadianas

A criação seletiva de abelhas produtoras de mel é atualmente usada por um pequeno grupo de criadores de rainhas que escolhem características com base em comportamentos exibidos por abelhas no campo (Seleção Assistida em Campo ou SAC). Existem diversos obstáculos a esta metodologia como os custos, recursos e eficácia que limitam a adoção generalizada de testes baseados em campo, resultando em que poucos criadores se empenham na metodologia SAC e menos ainda em resultados precisos e eficazes (Spivak e Gilliam 1998, Pernal et al. 2012). O teste de campo para comportamento higiénico, em particular, depende de um teste específico de características que não pode ser usado para testar outras características, como produção de mel ou defensividade, tornando o processo de teste para características múltiplas muito exigente em recursos.

Uma alternativa aos testes de campo é o uso de diagnósticos moleculares, especificamente a Seleção Assistida por Marcador (SAM), que usa marcadores moleculares para auxiliar na identificação de colónias que apresentem características específicas de interesse ou a falta de características indesejáveis ​​(por exemplo, defensividade). A seleção assistida por marcadores em abelhas é baseada em marcadores de proteínas e tem o potencial de fornecer uma capacidade de seleção mais rápida na criação de rainhas do que a metodologia SAC, pois permite aos criadores testar um número maior de colónias, abrangendo e maximizando a diversidade genética no pool de seleção . Uma vez identificados os marcadores adicionais, os testes de marcadores podem incluir uma série de características diferentes simultaneamente (como comportamento higiénico, produção de mel e mansidão) e podem ser avaliados por monitorização de múltiplas reações na mesma análise sem aumento de custo (Parker et al. 2014 ) Uma vez que uma característica hereditária tenha sido identificada e ligada a marcadores específicos de proteína por pesquisadores, os apicultores podem colectar e enviar amostras de abelhas para um laboratório de diagnóstico para teste. Os resultados podem então ser usados ​​para rastrear colónias de reprodutores com potencial, de acordo com as próprias prioridades de reprodução do apicultor ou índice de seleção.

[…]

Uma equipe de cientistas canadianos identificou recentemente marcadores nas antenas de abelhas que correspondem a características comportamentais em abelhas e podem ser testados em laboratório. Esses cientistas demonstraram que esta seleção assistida por marcador (SAM) pode ser usada para produzir colónias de abelhas melíferas higiénicas e resistentes a patógenos. Com base nesta pesquisa, apresentamos um estudo de um caso de apicultura onde a função de lucro de um apicultor é usada para avaliar o impacto económico da adoção de colónias selecionadas para comportamento higiénico usando SAM num apiário. Nossos resultados mostram um ganho de lucro líquido de colónias SAM entre 2% e 5% quando os ácaros Varroa são tratados de forma eficaz. No caso de tratamento ineficaz, o SAM gera um benefício de lucro líquido entre 9% e 96%, dependendo da carga de Varroa. Quando uma população de ácaros Varroa desenvolveu alguma resistência ao tratamento, mostramos que as colónias SAM geram um ganho de lucro líquido entre 8% e 112% dependendo da carga de Varroa e do grau de resistência ao tratamento.

[…]

Ferramentas de reprodução com seleção assistida por marcador (SAM) têm o potencial de aumentar o lucro da colónia e reduzir a mortalidade, o que pode contribuir positivamente para a viabilidade da indústria apícola, particularmente em face do aumento das infestações de Varroa e o risco de resistência aos tratamentos. “[…] 

fonte: https://academic.oup.com/jee/article/110/3/816/3073489

Notas:

  • esta publicação decorre desta outra;
  • em conjunto com um pequeno grupo de amigos, em 2016, talvez tenha sido dos primeiros a tentar introduzir uma linhagem resistente em Portugal. Os resultados foram maus! Ou a proclamação feita pelo criador, John Kefuss, era exagerada ou a hibridação com zãngãos nacionais diluiu ou eliminou o efeito aditivo e/ou epistático dos genes envolvidos na característica. Por feitio acredito mais na segunda hipótese.

as colónias mais fortes do apiário: projecções de maneio

Anteontem e ontem, tenho andado focado na suplementação das colónias com hidratos de carbono, na forma de pasta alimentar e, em alguns casos, coloco também um quadro ou dois com mel. Ontem esta tarefa permitiu-me, nos apiários a 600 m de altitude e com as temperaturas entre os 16-18ºC, ver um pouco mais profundamente algumas colónias, em particular as mais fortes. A publicação de hoje vai focar-se nestas colónias mais fortes e nas projecções de seu maneio neste período de final de inverno e início de primavera.

As colónias fortes e muito fortes, uma forma rápida de designar colónias com 8 ou mais quadros de abelhas e com 4 a 5 quadros com áreas expressivas de criação de novas abelhas, representam cerca de 20-25% do total de colónias neste momento — momento este em que, habitualmente, se inicia um forte fluxo de pólen neste território.

Foto de ontem de uma colónia muito forte, na configuração de duplo ninho do modelo Lusitana. Passou o outono/inverno nesta configuração.
Foto de ontem de uma colónia muito forte, na configuração de duplo ninho do modelo Langstroth. Passou o outono/inverno nesta configuração.
Foto de ontem de uma colónia forte, na configuração de ninho simples do modelo Langstroth.

Com alguns anitos de apicultura a tempo inteiro “no meu cinturão” mal seria se não tivesse aprendido uma coisa ou meia! Por exemplo, aprendi que deixando estas colónias evoluírem “naturalmente”, ao seu gosto, sem freios, pouco ou nenhum mel irão produzir em abril/maio. Isto porque, ainda antes da entrada do principal fluxo de néctar, uma boa parte delas já terão enxameado. Ainda assim, estas colónias são-me muito úteis nestes próximos 30-45 dias, em particular para efectuar os maneios de equalização (entre outras publicações sobre a equalização, esta é a mais recentemente publicada) e criação de novos núcleos populacionais. Cada coisa é para o que nasce, costuma dizer-se, e estas colónias que cresceram de forma temporã, serão preciosas para estes maneios que tanto aprecio realizar. Para produzir mel estão as outras, as que agora estão médias ou fracas e que estarão em “ponto de rebuçado” para daqui a 60 dias se afincarem na colecta do primeiro fluxo importante por cá.

Foto de ontem de um quadro de uma colónia forte do modelo Lusitana onde, para além da bonita mancha de criação de obreira, observo criação fechada de zângão. Desconfio que 30 a 40 dias após o inicio da criação de zângãos, a “mentalidade” desta colónia é a de que reuniu boa parte das condições para se cindir/reproduzir.
Foto de ontem de um quadro de um núcleo do modelo Langstroth, onde se pode ver pão-de-abelha recentemente ensilado.

Dado o acentuado e rápido crescimento que noto nas colónias, típico desta altura do ano, estou em crer que a proporção dos diversos aminoácidos presentes no pólen deste território deve estar próximo do perfil ideal e surge com a devida antecipação. Dado que nada mais faço para as estimular nutricionalmente — há vários anos que não utilizo alimentação líquida 1:1, nunca utilizei suplementação proteica, promotor L que tipo de eletrodoméstico é ? — que melhor explicação que a da qualidade do pólen que a Natureza tão generosa e atempadamente fornece?

No topo da fotografia vemos o segredo da estimulação das minhas colónias nas patitas da abelha. Mais ao centro… a mãe – já agora refiro que quando tiro uma foto de um quadro com criação tenho que ter a certeza que a mãe anda noutro quadro, e só tenho essa certeza vendo que ela anda nesse outro quadro, ou em alternativa vou ter que sacudir todas as abelhas do quadro que pretendo fotografar.

a dinâmica de consumo de açucares de uma colónia ao longo do outono e inverno

Cacho invernal numa colónia sem criação. No interior do cacho a temperatura média é de 18ºC. Na zona mais exterior do cacho a temperatura é um pouco mais baixa. No restante espaço da colmeia a temperatura é pouco mais alta que a temperatura exterior. O cacho de abelhas quase não irradia calor para o seu exterior, pelo contrário, tudo faz para o capturar no seu interior.

No território onde tenho os apiários (distrito da Guarda), as colónias deixam de criar novas abelhas, ou abrandam significativamente esta criação, entre novembro e finais de dezembro. Nesta condição, sem criação para aquecer, as abelhas necessitam de manter a temperatura no interior do cacho invernal nos 18ºC para não entrarem em coma térmico, ficarem paralisadas, caírem no estrado da colmeia e aí morrerem.

Pouco depois do solstício de inverno, entre o início de janeiro e primeira/segunda semana de fevereiro, as colónias iniciam gradualmente a criação de novas abelhas e, nesta nova condição, surge a necessidade de manter estas áreas com criação a cerca de 35ºC.

Foto tirada a 27 de janeiro deste ano numa colónia situada a 900 m de altitude, onde se pode ver uma pequena área com criação operculada, geralmente no lado mais quente do quadro.

A partir de meados de fevereiro o fluxo de pólen aumenta significativamente e as áreas dos quadros dedicadas à criação de novas abelhas aumenta também, acompanhando os inputs do exterior, isto é o suprimento crescente de proteína saudável que a natureza lá fora vai disponibilizando. Nesta nova condição a pressão sobre as abelhas adultas aumenta em virtude da necessidade de manter a 35ºC estas áreas em crescimento linear (não exponencial, porque a rainha é só uma).

Foto de 27 de fevereiro do ano passado . Comparar a área dedicada à criação de novas abelhas na foto em cima, com um mês de diferença no calendário.

Em conclusão: a evolução da dinâmica de criação de novas abelhas que assisto regularmente, ano após ano, entre novembro e finais de março, em colónias com desenvolvimento normal, está associada de forma directa à dinâmica de consumo de hidratos de carbono/mel/açucares suplementares disponíveis na colmeia. Sabemos que as abelhas através do seu mecanismo termogénico, a contração rápida dos músculos das asas, fazem subir a temperatura do seu corpo. Este mecanismo é, naturalmente, um grande consumidor de energia, e quanto maior for a necessidade de recorrer a ele maior é o consumo do combustível, isto é o consumo de hidratos de carbono, estejam eles na forma de mel e/ou na forma dos complementos açucarados que lhes fornecemos.

Implicação prática: Nestas próximas 6 a 8 semanas a maior parte das minhas colónias estão/irão transitar para novas condições: as áreas que têm de ser mantidas a 35ºC aumentam consideravelmente, e isto num território em que o fluxo de néctar é habitualmente baixo até meados de abril. Sendo assim o maneio mais crítico para a sua sobrevivência, de agora em diante e até ao início do primeiro fluxo importante de néctar, o do rosmaninho — que surge habitualmente entre a segunda e terceira semana de abril, isto considerando um ano meteorologicamente regular —, é cuidar que cada uma delas tenha o mel e/ou os suplementos de açúcar em quantidade suficiente e sempre presentes. Porque a dura realidade já me mostrou, poucas vezes felizmente, que chegou aquela altura do ano em que colónias saudáveis e populosas podem sucumbir em poucos dias por falta de reservas e morrerem na praia.

eficácia da própolis como tratamento adjuvante para pacientes com COVID-19 hospitalizados: um ensaio clínico randomizado e controlado

Publico o resumo de um estudo recente* que identificou as vantagens da utilização da própolis como tratamento adjuvante em pacientes com COVID-19 hospitalizados, nomeadamente na redução significativa do tempo de internamento e na redução, também significativa, do número de pacientes que desenvolveram lesão renal aguda.

Resumo: Entre as opções de tratamento ao COVID-19, a própolis, produzida por abelhas a partir de exsudatos de plantas bioativas, tem demonstrado potencial contra alvos virais e propriedades imunorregulatórias. Conduzimos um ensaio clínico randomizado, controlado, aberto e de centro único, com um produto de própolis padronizado (EPP-AF) em pacientes adultos com COVID-19 hospitalizados. Os pacientes receberam tratamento padrão mais própolis na dose oral de 400mg / dia (n = 40) ou 800mg / dia (n = 42) por sete dias, ou tratamento padrão isolado (n = 42). O cuidado padrão incluiu todas as intervenções necessárias, conforme determinado pelo médico assistente. O desfecho primário foi o tempo para melhora clínica definido como o tempo de internamento hospitalar ou dependência de oxigenoterapia. Os desfechos secundários incluíram lesão renal aguda e necessidade de terapia intensiva ou drogas vasoativas. O tempo de internamento hospitalar após a intervenção foi significativamente reduzido em ambos os grupos de própolis em comparação com os controles; mediana de 7 dias com 400mg / dia e 6 dias com 800mg / dia, versus 12 dias para o tratamento padrão sozinho. A própolis não afetou significativamente a necessidade de suplementação de oxigénio. Com a dose mais alta, significativamente menos pacientes desenvolveram lesão renal aguda do que nos controles (2 contra 10 de 42 pacientes). A própolis como tratamento adjuvante foi segura e reduziu o tempo de internamento.

fonte: https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2021.01.08.20248932v1.full

Notas:

  • * pela sua recenticidade esta publicação científica ainda não foi sujeita à revisão pelos pares;
  • nestas publicações, aqui e aqui, apresentei outros dois estudos muito credíveis acerca dos benefícios da própolis.

introdução de rainhas: algumas dicas

Há uns anos descrevi nesta publicação os princípios que sigo quando pretendo introduzir rainhas protegidas por gaiolas. Na altura escrevi: “Do saber que foi sendo construído pelas anteriores gerações de apicultores sabemos que em regra é mais fácil uma rainha estranha/nova ser aceite por uma colónia estabelecida durante um fluxo de néctar. Se não houver néctar a entrar na colmeia, a aceitação será facilitada com o fornecimento de xarope de açúcar.

Para aumentar a probabilidade de uma rainha nova ser aceite há ainda um conjunto de outras considerações a ter muito em conta:

  • dar às abelhas o tempo e a oportunidade de se acostumar com sua nova rainha. Durante este período de um a dois dias a rainha deve estar protegida por uma gaiola lhe permite manter contato “físico” com as obreiras (exsudando as feromonas reais no coração da colónia);
  • as abelhas mais jovens aceitam rainhas mais facilmente do que as abelhas velhas;
  • colónias menores aceitam as rainhas mais prontamente do que colónias maiores.

A juntar a estes princípios, Randy Oliver aconselha ainda que na altura da abertura da gaiola se observe atentamente o comportamento das abelhas sobre a mesma. Se as abelhas andam suavemente sobre a gaiola, se se deixam empurrar com um toque suave do nosso dedo, elas aceitaram a rainha. Nestas circunstâncias podemos abrir o acesso das abelhas ao candy da gaiola, para que libertem a sua futura rainha, e voltar a colocar a gaiola tranquilamente na colmeia.

Na foto em cima, as abelhas aceitaram a rainha. Na foto em baixo não a aceitaram. As abelhas denotam um comportamento agressivo para com a rainha e não se movem quando as procuramos afastar; estão a tentar “pelotar” a rainha para a matar por aquecimento e asfixia.

Neste caso, provavelmente haverá uma rainha na colmeia, ou talvez seja necessário deixar a rainha mais um ou dois dias na gaiola antes de a libertar; se o fizermos neste momento ela será morta. 

Se por um acidente uma rainha enjaulada levanta voo, o melhor a fazer é manter a calma, colocar a gaiola sobre os quadros que ela provavelmente retornará à gaiola passados alguns minutos.

interrupção artificial da postura da rainha para aumentar a eficácia do tratamento da varroose: apêndice

Dado o interesse, problematização e dúvidas que suscitou esta publicação justifica-se a meu ver este apêndice, que visa detalhar um pouco mais os equipamentos utilizados assim como reflectir sobre a avaliação do impacto da técnica ao nível da colónia.

Quadro confinador de rainha (modelo construído por Randy Oliver).

A técnica preconiza o confinamento da rainha a um quadro normal (ou mesmo dois), designado quadro armadilha para o varroa, através de um dispositivo/equipamento que permite o trânsito das abelhas obreiras para o exterior-interior da zona confinada mas impede o trânsito da abelha rainha para o exterior da zona confinada. Utilizam-se, para conseguir este objectivo, dispositivos subsidiários das grelhas excluidoras de rainhas Para tal podemos construir quadros falsos, designados por mim quadros confinadores de rainha, à imagem do que propõe Randy Oliver.

Estas imagens ilustram outros modelos:

Este tipo de equipamento é também utilizado por alguns criadores de rainhas que pretendem diminuir o ritmo de oviposição e desgaste das rainhas matriarcas.
Equipamento disponibilizado para um ou dois quadros pelos nossos vizinhos de La tienda del Apicultor, com a designação Cesto Excluidor.

A rainha é transferida para esta zona confinada no mesmo quadro onde anda em postura, ou transferida para um quadro com cera puxada com muitos alvéolos livres para iniciar a oviposiçao.

Cesto excluidor de dois quadros colocado no ninho de uma colónia (La tienda del Apicultor).

Por comparação com a técnica de enjaulamento de rainhas em jaulas dedicadas, como a utilizada por diversos apicultores, em particular os da península itálica, não conheço testemunhos que indiquem a morte e substituição da rainha confinada com recurso a esta técnica.

Sobre o impacto ao nível da colónia, decorrente desta interrupção parcial da postura, é um aspecto de avaliação complexa. O impacto negativo mais imediatamente evidente materializa-se na redução significativa de novas abelhas a nascerem nos 14 dias após o desconfinamento das rainhas. O impacto positivo mais relevante, dado o incremento assinalável da efectividade da desparasitação, verifica-se ao nível da colónia na sanidade e esperança de vida nas novas abelhas a serem criadas. A somar a este efeito positivo soma-se este outro: as abelhas, nascidas durante os 14 dias de confinamento de sua mãe, não estarão sujeitas a um envelhecimento tão rápido como o que ocorreria caso tivessem de nutrir larvas e aquecer as pupas surgidas da postura de uma rainha não confinada durante estes 14 dias.

interrupção artificial da postura da rainha para aumentar a eficácia do tratamento da varroose

Todos nós sabemos que a existência de criação operculada nas colónias diminui a eficácia dos tratamentos contra a varroose, em particular a eficácia dos tratamentos “flash” ou de curta duração. Por exemplo, os tratamentos com ácido oxálico, na forma gotejada ou sublimada, são muito eficazes quando a colónia não apresenta criação fechada, contudo essa eficácia fica seriamente comprometida quando ela está presente.

Algumas técnicas apícolas, ao alcance de todos, permitem promover a interrupção, total ou parcial, da postura. Em baixo deixo a descrição de uma destas técnicas, a partir de uma proposta de Randy Oliver:

  • Dia 1: Com recurso a quadros confinadores de rainha*, confinar a rainha a um quadro normal, que servirá de “quadro armadilha para o varroa”;
  • Dia 14: Solte a rainha;
  • Dia 21: Remover o “quadro armadilha para o varroa” e gotejar (ou sublimar) com ácido oxálico as abelhas da colónia.
* Exemplar de um quadro confinador de rainha, fabricado por Randy Oliver.

Nota: A programação em cima é para facilitar a execução no mesmo dia da semana. Se houver muita criação de zângãos, pode aumentar os intervalos para os dias 17 e 24, para uma eficácia ligeiramente superior. 

a diminuição dos recursos de pólen desencadeia a transição para populações de abelhas de vida longa a cada outono

Deixo a tradução do resumo de uma artigo que li pela primeira vez há uns 5 anos atrás. Na altura achei-o contra-intuitivo e muito “fora-da-caixa”. Este estudo verificou um atraso na criação de abelhas de vida mais longa nas colónias que acederam até mais tarde a fontes de pólen, e a repercussão disso na dinâmica do número de abelhas por colónia nos meses seguintes de inverno. Todo este quadro que ilustra bem a complexidade do mundo das abelhas, da co-existência de fenómenos com várias camadas imbricadas, e da fragilidade e incompletude do nosso conhecimento, muito em especial no que respeita à nutrição do enxames. Neste contexto, em que confesso a minha grande ignorância acerca dos efeitos globais de muitos maneios com alimentação suplementar e alimentação estimulante, a minha divisa é “bee keep it simple“, ou seja, faz só o necessário para que não morram de fome. O resto, a parte mais complicada, deixo para elas.

Resumo:

1. A cada outono nas regiões do norte do hemisfério, as colónias de abelhas mudam de populações de operárias de vida curta para populações de abelhas de inverno de vida longa. Para determinar se os recursos de pólen em declínio desencadeiam essa transição, o desaparecimento natural dos recursos de pólen externos foi artificialmente acelerado ou atrasado e as colónias foram monitoradas para verificar os efeitos sobre a atividade de criação de larvas e o desenvolvimento de populações de abelhas de inverno de vida longa.

2. Atrasar o desaparecimento dos recursos de pólen adiou o declínio na criação de larvas nas colónias. As colónias com um suprimento mais prolongado de pólen criaram abelhas por mais tempo até outubro, antes que a criação das larvas terminasse, do que as colónias de controle ou para as quais o suprimento de pólen foi cortado artificialmente no outono.

3. As colónias com maior suprimento de pólen produziram mais obreiras durante o outono do que as colónias com menos pólen, mas o desenvolvimento da população de abelhas de vida longa no inverno foi adiado até relativamente mais tarde no outono. As colónias apresentaram números semelhantes de abelhas de inverno, independentemente do momento do desaparecimento dos recursos de pólen.

4. A longevidade média das operárias criadas no outono esteve inversamente relacionada com a quantidade de larvas remanescente para ser criada nas colónias quando as operárias eclodiram. Consequentemente, operárias longevas não apareciam nas colónias até que a criação de larvas diminuísse, que por sua vez era controlada pela disponibilidade de pólen.

5. A redução dos recursos de pólen fornece um dado marcante que inicia a transição para as populações de abelhas de inverno, porque afeta diretamente a capacidade de criar larvas das colónias e indica indiretamente a deterioração das condições ambientais associadas à aproximação do inverno.

fonte: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/j.1365-2311.2007.00904.x

Notas:

1. associar à leitura desta e desta publicações anteriores;

2. no território onde tenho as minhas colónias, a fase de crescimento das mesmas inicia-se, em regra, na última semana de dezembro, muito gradualmente como gosto de observar. As abelhas de inverno morrem a uma taxa mais rápida nestes dois meses de janeiro e fevereiro, em razão da sua idade já prolongada assim como pela redução da sua longevidade, uma consequência do aumento gradual das tarefas de nutrição das larvas.

limiares de tratamento em função da fase de vida da colónia

Trato e controlo a varroose de acordo com o calendário (ver aqui outros dois programas, alternativos a este que utilizo). Realizo habitualmente dois tratamentos por ano, o primeiro iniciado no final de janeiro/início de fevereiro e o segundo iniciado no final de julho/início de agosto. Na altura do primeiro tratamento as colónias estão, em geral, na fase de aumento da população de abelhas. Na altura do segundo tratamento estão na fase de diminuição da população de abelhas. Como podemos ver no quadro em baixo não devo deixar que a infestação, medida em abelhas adultas, ultrapasse os 3% para estas alturas do ano em que habitualmente faço os tratamentos.

Este ano, pretendo avaliar mais precisamente a eficácia do apivar e eventualmente efectuar algumas afinações ao calendário de tratamentos. Para isso tenciono fazer a avaliação das taxas de infestação pós-tratamentos e avaliar a taxa de infestação no pico da população (ver estes três excelentes vídeos com os procedimentos). O pico da população ocorre, na generalidade das minhas colónias, na última quinzena de maio (sobre a dinâmica populacional ver mais aqui). Caso a testagem feita nesta fase me dê uma taxa de infestação entre os 2%-3% vou fazer por baixar a taxa de infestação, com um acaricida não-sintético em finais de maio (uma possibilidade aqui referida, entre outras), para que o medicamento colocado no verão, em agosto, não seja colocado em colónias com uma taxa de infestação superior a 3%. Sei que vários dos acaricidas homologados, sintéticos e não-sintéticos, tendem a apresentar resultados de eficácia baixa quando a taxa de infestação ultrapassa os 3% (ver estudo aqui).

Fase da colóniaAceitável
Não é necessário um controle próximo
Cuidado
O controle pode ser necessário
Perigo Controlo urgente
Dormente com criação<1%1%–2%>2%
Dormente sem criação<1%1%–3%>3%
Aumento da População<1%1%–3%>3%
Pico da População <2%2%–5%>5%
Diminuição da População<2%2%–3%>3%
Aceitável: as populações atuais de ácaros não são uma ameaça imediata. 
Cuidado: a população de ácaros está a atingir níveis que podem causar danos em breve; um acaricida não-sintético pode ser utilizado; um acaricida sintético pode ser necessário dentro de um mês. Continue a testar e esteja preparado para intervir. 
Perigo: a perda da colónia é provável, a menos que o apicultor controle o Varroa imediatamente e eficazmente.

fonte*: https://edis.ifas.ufl.edu/in1257

Nota: nesta publicação* da Universidade da Florida é referida também uma fórmula para calcular a taxa de infestação a partir do número de varroas caídas numa cartolina pegajosa ou estrado sanitário. Dizem o que habitualmente é dito acerca desta técnica de cálculo: é muito falível e pode induzir o apicultor a tratar tardiamente. Na fórmula (“x = 3.76-y/-0.01 divided by the number of days in a colony, where y represents the total number of Varroa captured on the sticky board and x represents the actual mite population within the colony. (Dr. Keith Delaplane, personal communication“)) despertou-me interesse o factor 3,76, que representa, no entender do prestigiado entomólogo Dr. Keith Delaplane, a relação entre o número de varroas na fase de dispersão (fase forética) e o número de varroas na fase de reprodução, isto é, o número de varroas alojadas nas abelhas adultas num dado momento é 3,76 vezes menor que o número de varroas que se reproduzem nos alvéolos, protegidas pelos opérculos de cera da acção imediata de quase todos os acaricidas, com excepção do ácido fórmico.