No passado dia 01.06, o meu amigo David Marques, tinha um lote de rainhas virgens a nascer, do qual retirou 5 para me oferecer. No dia 03.06 passei por sua casa lhe dar uma “cotovelada” (cumprimento higiénico em tempos da COVID 19), dar dois ou três dedos de conversa, e trazer as princesas para cima para as introduzir. Na parte da tarde, quando cheguei, não se via um palmo à frente da cara devido ao nevoeiro intenso no apiário onde pretendia recolher as abelhas e quadros para fazer os núcleos de introdução, tendo sido obrigado a adiar esta tarefa para o dia seguinte. Haja paciência que é a Natureza que dá ritmo ao tango que danço.
No dia seguinte, 04.06, com boas condições meteorológicas, lancei mãos à obra, e comecei por fazer uma selecção de 3 quadros com boas reservas e sem abelhas para colocar em cada um dos 5 núcleos onde iriam ser introduzidos os dois quadros restantes com as abelhas e alguma criação nos três estádios.
O passo seguinte foi seleccionar os 10 quadros (2 para cada um dos núcleos) com criação, retirados de diversas colónias, que foram em seguida colocados, sem abelhas, na caixa superior de 5 colónias com grade excluidora de rainhas (com a rainha na caixa inferior) para ali ficarem umas horas para serem cobertos por abelhas jovens.
Cada uma das 5 colónias dadoras de abelhas-ama recebeu 2 quadros com criação.
Passadas cerca de 6 horas, regressei aos dois apiários onde tinha feito esta preparação, para retirar os 10 quadros e os introduzir, 2 em cada um dos cinco núcleos, com as respectivas abelhas aderentes e mais umas quantas sacudidas de um quadro ou dois adjacente a estes.
Uma recomendação que os meus amigos criadores de rainhas e especialistas na introdução das mesmas me fazem é a de misturar abelhas de pelo menos duas colónias diferentes, para as baralhar no que respeita a feromonas, e aumentar assim a probabilidade da rainha virgem ser aceite. Há dois anos atrás, quando produzi cerca de 300 núcleos para os meus clientes, assim fiz, e correu bastante bem, com uma taxa de fecundação a rondar os 90%. E como em equipa que ganha não se mexe, voltei a seguir esta boa recomendação. Concluída a principal tarefa do dia, regressei a casa com os 5 núcleos que ficaram fechados nessa noite e em cima da carrinha, para na manhã seguinte serem levados para o apiário onde os vim a colocar, a cerca de 15 km de distância dos apiários onde foram recolhidas as abelhas.
Tendo começado por transportar núcleos e/ou colmeias no sentido longitudinal em relação à caixa da pick-up, mudei de opinião e passei, há já muitos anos atrás, a transportá-los no sentido transversal, como se vê na foto. Deste modo procuro evitar o balanceamento dos quadros provocados pelos movimentos laterais da carrinha quando saio ou entro nos caminhos rurais, já na proximidade dos apiários. Estas oscilações laterais são-me impossíveis de evitar por muito devagar que vá. Já as oscilações no sentido frontal, evito uma boa parte delas nas estradas com uma condução defensiva e com velocidade regrada para evitar travagens pesadas e bruscas. Mas como costumo dizer este é um daqueles assuntos em que 10 apicultores são capazes de ter 11 opiniões diferentes.
Nos próximos dias relatarei por aqui as fases seguintes do processo.
Duas notas finais:
nos anos em que produzi algumas dezenas e centenas de núcleos para os meus clientes, ainda que seguindo uma boa parte destes procedimentos, trabalhei de uma forma um pouco diferente para compatibilizar os objectivos a atingir com a gestão do tempo dedicada às tarefas. Agora a abordagem é mais “slow beekeeping”;
de forma concomitante com a tarefa principal, “construir” estes cinco núcleos, fiz o que faço habitualmente, de forma a cumprir uma filosofia base do meu trabalho nos apiários: aproveitar para com uma operação/tarefa atingir dois ou três ganhos para as colónias, logo para mim. Explicando esta filosofia com exemplos deste dia de trabalho: “palmerizei” uma vez mais diversos núcleos estabelecidos e muito povoados, de onde retirei a maioria do 10 quadros com criação que necessitei, avaliei a condição dos ninhos, em particular os ninhos das colónias com grelha excluidora, que continuam muito desbloqueados, retirei 15 quadros de reservas de ninhos mais bloqueados, que vieram sobretudo das colónias orfanadas e que já têm rainhas novas em postura e das colónias que ainda não têm mãe em postura. Nestas proveitei para lhes introduzir quadros com criação, um pouco mais mal-formados e/ou com criação de zângão, retirados das colónias em produção ou das colónias com excluidora.
Um jovem apicultor, amigo e cliente, colocou-me ontem a questão do título da publicação. Hoje respondi-lhe: alguns conseguem viver da apicultura e outros não. Eventualmente este jovem, assim como outros, desejam uma resposta sim ou não. Mas essas respostas de sim ou não para aspectos complexos, que dependem de inúmeras variáveis, sendo sedutoras para quem as ouve porque fica com o assunto resolvido logo ali, e tentadoras para quem as dá porque reforçam o seu estatuto de autoridade e conhecimento, são na realidade respostas parvas (do étimo pequeno).
Por exemplo, hoje saí de casa depois de tomar o café e comer uma barrita de cereais, estavam a bater as 9h30 no relógio da torre. A manhã esteve relativamente fresca e o trabalho corria bem e, quando dei por mim, eram 13h10. Parei um pouco para reflectir se deveria continuar ou parar e fazer 15 km de regresso a casa para almoçar e retornar depois de almoço. Decidi continuar o trabalho e concluí-o por volta das 14h00. Contudo e como ainda faltava uma tarefa que tinha mesmo que fazer hoje noutro apiário, a cerca de 4 km de distância, decidi castigar um pouco mais o corpo e ir fazê-lo, antes de regressar a casa para almoçar. Terminei por lá por volta das 16h00. Regressei a casa e almocei por volta das 17h00. Voltei de novo a esses dois apiários já próximo das 18h00 e conclui a principal tarefa que hoje me comprometi fazer, seriam cerca das 19h45. Agora, que já estou em casa, dou comigo a pensar que este está longe de ter sido um dos dias duros, dos muitos que já tive na apicultura. Alturas houve em que os dias duros vinham em cachos de 5 ou 6 dias seguidos ao longo de 4 a 5 meses.
Voltando à questão: sim para alguns é possível viver da apicultura e, acredito, que o factor decisivo, como não poderia deixar de ser, é o humano, isto é, é a ética profissional, o conhecimento, o pragmatismo, a vontade de superação, a resiliência e, para mim a mais importante na apicultura, a paciência. Paciência para esperar pela natureza, porque quem toca a música é a natureza, o ritmo é marcado por ela.
Vista geral parcial do apiário que trabalhei hoje de manhã. Vista geral parcial do apiário que trabalhei da parte da tarde.
Não acredito nos “mecânicos/melhoradores da genética” da natureza, não acredito nos “criadores” de naturezas exóticas alternativas. Acredito e admiro os “amadores” da natureza local, aqueles que pacientemente a prescrutam e, sem lhe alterar a génese, ou introduzir exotismos, se apercebem dos carreiros mais escondidos por onde devem fazer o seu caminho. Tenho para mim cada vez mais certo que o apicultor que quer viver da apicultura em Portugal mais tarde ou mais cedo vai confirmar aquilo que já confirmei há algum tempo: não é sobretudo uma questão de genética, é mais uma questão de maneio. Mesmo que isso implique adiar a hora do almoço!
“Nas espécies que cuidam da sua prole/descendentes, o aprovisionamento de alimento disponível para o seu desenvolvimento tem efeitos profundos nas características da prole. O aprovisionamento é importante nas abelhas porque os aspectos nutricionais determinam se uma fêmea se torna uma rainha reprodutora ou operária estéril. Pensa-se que uma diferença qualitativa entre as dietas larvais de rainhas e operárias conduza a essa divergência (1); no entanto, nenhum composto isolado parece ser responsável pela diferenciação (2). A quantidade da dieta pode ter um papel durante a determinação das castas de abelhas, mas nunca foi formalmente estudada. Nosso objetivo era determinar as contribuições relativas da quantidade e qualidade da dieta para o desenvolvimento da rainha. As larvas foram criadas in vitro com nove dietas variando a proporção de geleia real e açúcares [aspecto qualitativo da dieta], e foram alimentados com oito quantidades diferentes [o que perfaz 72 regimes alimentares distintos] (3) . Para a dieta situada a meio da escala [na escala de proporção de proteína e açucares/carboidratos da dieta] (4), foi incluído um tratamento com quantidade ad libitum [à vontade]. Após a emergência, as características de rainha foram determinadas usando uma análise de componentes principais (CP) através de sete medidas morfológicas (5). Descobrimos que as larvas alimentadas com uma quantidade ad libitum de dieta eram indistinguíveis das rainhas criadas comercialmente, e que as características de rainha eram independentes da proporção de proteína e açucares na dieta (6). Nem o teor de proteínas nem os carboidratos tiveram influência significativa no primeiro componente principal (CP1), aquele que explicou 64,4% da diferença entre rainhas e operárias (7). Por outro lado, a quantidade total de alimento explicou uma quantidade significativa da variação no CP1 (8). Grandes quantidades de dieta no instar final [o que ocorre no 6º dia de desenvolvimento larvar] foram capazes de induzir os traços da rainha, contrariamente à sabedoria recebida de que a determinação da rainha só pode ocorrer até ao terceiro instar [o que ocorre no 3º dia de desenvolvimento larvar] (9). Estes resultados indicam que a quantidade total de dieta/alimento fornecida às larvas pode regular [condicionar] a diferença entre castas de rainhas e operárias nas abelhas. (10)”
O conhecimento convencional refere que a diferenciação entre as castas de abelhas fêmeas ocorre, o mais tardar, até ao 3º instar larvar. De acordo com os dados obtidos pelos autores deste estudo esta diferenciação pode ocorrer até ao último instar larvar, isto é, até ao 6º dia de desenvolvimento larvar, e se as larvas forem alimentadas com grandes quantidades de dieta apropriada.
(1) Desde a década de 1890, acredita-se que a qualidade da dieta determina casta nas abelhas através de uma ‘substância ativa biológica’ encontrada apenas na geleia real que ativa uma chave [epigenética] de desenvolvimento das rainhas.
(2) Embora os estudos tenham mostrado inicialmente que as proteínas eram reguladoras-chave da casta, os estudos de acompanhamento/aprofundamento falharam em reforçar estes dados iniciais.
(3) A menor quantidade de dieta (160 µl) foi adoptada a partir de métodos in vitro anteriores, porque essa quantidade produz abelhas operárias. A quantidade foi aumentada em incrementos de 30 µl de 160 µl até 370 µl para produzir os outros tratamentos. Houve um tratamento ad libitum adicional no qual as larvas eram alimentadas com um excesso acima do que podiam consumir. Todas as larvas foram alimentadas com a mesma quantidade durante os primeiros 5 dias de desenvolvimento: dia 1: 10 µl, dia 2: 10 µl, dia 3: 20 µl, dia 4: 30 µl e dia 5: 40 µl, totalizando 110 µl de dieta durante os 5 dias. Durante o sexto dia de desenvolvimento, as larvas foram alimentadas com quantidades diferentes, dependendo do tratamento da quantidade da dieta, de modo que a quantidade total da dieta variou de 160 µl a 370 µl. No tratamento ad libitum, as larvas foram alimentadas com 200 µl por dia até à purga intestinal. Os tratamentos com grande quantidade de alimento produziram uma alta proporção de rainhas. Por exemplo, o tratamento ad libitum produziu 100% (20 de 20) rainhas e o tratamento de 370 µl produziu 58% de rainhas (19 de 33). Nos tratamentos de menor quantidade de alimento (220, 190, 160 µl), apenas três rainhas foram produzidas.
(4) A dieta de referência (dieta com proteínas e carboidratos em níveis médios) foi baseada num estudo anterior que estabeleceu o desenvolvimento de operárias induzidas pela dieta. A geleia real continha 12,35% de proteína, 27% de carboidratos e 56% de água. Esses valores foram utilizados para calcular a percentagem de macronutrientes em cada dieta.
(5) A morfometria de adultos pode separar e classificar castas. As mandíbulas, o basitarso e a cabeça dos adultos foram dissecados e fotografados. As medidas morfométricas incluíram peso húmido corporal total, largura e comprimento do basitarso, largura e comprimento da mandíbula e largura e comprimento da cabeça.
(6) Os resultados indicam que esses componentes qualitativos parecem não determinar a casta quando a quantidade de alimentos é controlada. Dietas ricas em carboidratos produzem mais rainhas quando a quantidade da dieta não é controlada. Royalactin (MRJP-1) e Major Royal Jelly Protein-3 (MRJP-3) são considerados os principais componentes da geleia real que influenciam o desenvolvimento da rainha, mas nenhum estudo controlou a quantidade da dieta. Nossos resultados indicam que esses componentes qualitativos parecem não determinar a casta quando a quantidade de alimentos é controlada e esses fatores qualitativos devem ser reavaliados para determinar se desempenham ou não um papel importante no desenvolvimento da casta.
(7) Quando o conteúdo de proteínas e carboidratos é alterado em quantidades controladas na dieta, o desenvolvimento e a sobrevivência são afetados, particularmente em dietas com pouca proteína. Observamos um resultado semelhante de alta mortalidade em dietas com pouca proteína. No entanto, a proporção de proteínas e carboidratos não parece determinar a casta nas abelhas.
(8) Nosso estudo corrobora outros estudos que indicaram que o teor relativo de proteínas não controla a diferenciação da rainha. Nossos resultados indicam que a quantidade da dieta tem um papel maior no desenvolvimento da rainha do que a qualidade, e estudos futuros devem controlar a quantidade da dieta ao testar sistematicamente macronutrientes no desenvolvimento de castas.
(9) O terceiro dia foi considerado a janela crítica para a determinação da rainha, mas nossos resultados sugerem que o status reprodutivo pode ser mantido até ao sexto dia se houver comida suficiente.
(10) Os miRNAs e o ácido p-cumárico encontrados no pólen inibem o desenvolvimento dos ovários e estão presentes apenas na dieta de larvas destinadas às operárias. No nosso estudo, baixas quantidades de alimentos inibiram o desenvolvimento da rainha. Nos tratamentos com menor quantidade de alimento (220, 190, 160 µl), apenas três rainhas foram produzidas.
Nota: este estudo, com um desenho experimental elegante e complexo, aprofunda uma linha de investigação, que visa identificar as variáveis independentes que melhor explicam a diferenciação de castas nas abelhas fêmeas. Do que entendi e procurando simplificar e resumir, a quantidade de alimento influencia de forma importante a diferenciação até ao 5º instar larvar, isto é, quantidades elevadas de dieta apropriada, mesmo que fornecidas no 6º dia do estádio larvar, contribuíram para que 58% dessas larvas tenham evoluído para abelhas-rainha. Este estudo reforça a ideia que tal como noutros insectos sociais (vespas e vespões, por ex.), também nas abelhas melíferas a quantidade de alimento, não apenas a sua qualidade, tem um papel decisivo na diferenciação entre fêmeas reprodutivas e fêmeas estéreis. Verificou-se também que dietas ricas mas em quantidades baixas não foram suficientes para fazer evoluir as larvas no sentido da formação de abelhas-rainha num número significativo de casos. Este estudo, e outros nesta linha, visam fornecer a indústria de criadores de rainhas (em especial a norte-americana) de conhecimentos que lhe permita melhorar a qualidade das rainhas que coloca no mercado e que tem sido alvo de críticas num passado recente.
Depois de 3 dias passados a trabalhar as colmeias que possuo nos dois apiários a cotas de 600m, voltei, hoje, ao que está a 900m de altitude. Comecei um pouco antes das 9.00h e terminei pouco depois das 12.00h.
Um dos três apiários que estão instalados neste terreno. Neste momento tem 21 colónias para uma capacidade de 40 colónias.
Uma vez que neste apiário o período de enxameação reprodutiva vai, habitualmente, da segunda/terceira semana de abril até à primeira/segunda semana de junho e porque estou a fazer uma pequena experiência com as grelhas excluidoras de rainhas, resolvi voltar a “mergulhar” nos ninhos das 21 colmeias. Acabei também a colocar mais algumas meias-alças em cima de algumas. Nas 21 colónias encontrei uma enxameada, que já estava “sinalizada a vermelho” da última inspecção no passado dia 25.
Anotações de aspectos críticos no tecto da colmeia.
Como tinha “arrefecido” esta colónia há 4 dias atrás, o enxame primário não parece ter levado os 50-75% das abelhas habituais nestes eventos.
Ninho da colónia enxameada com uma quantidade muito apreciável de abelhas.
Dado que estava bem povoada optei por dividi-la. Para tal fiz um desdobramento vertical com recurso ao tabuleiro divisor.
Tabuleiro divisor utilizado.Ninho original depois de dividido. Orientei o alvado/entrada no sentido contrário. A entrada do tabuleiro divisor ficou virada para o lado da entrada original e as abelhas campeiras começaram de imediato a utilizar esta nova entrada e a povoar o ninho/divisão superior.
Nas colónias com grelha excluidora de rainhas não me apercebi do mais pequeno indício de preparação de enxameação.
Colónia do modelo Lusitana com grelha excluidora de rainhas.Os ninhos estão repletos de quadros desbloqueados que permitem a expressão da qualidade das rainhas de minha produção. “Minha” é uma força de expressão, porque procuro o mais possível deixá-las fazer o que tão bem fazem há milhões de anos: as suas abelhas-mãe.
Entre os diversos argumentos negativos relativos à utilização de grelhas excluidoras sobressaem estes dois: promove a enxameação e funcionam como excluidoras do armazenamento do néctar nas caixas que lhes estão sobrepostas. Acerca do primeiro argumento o que posso dizer é que tenho dúvidas que assim tenha que ser e estou a fazer um teste particular. Conto apresentar os resultados quando tiver mais dados, dentro de uma semana ou duas. Relativamente ao segundo argumento posso afirmar que nas minhas colónias e com as minhas abelhas as excluidoras não funcionam como uma barreira ao armazenamento de néctar nas caixas que lhes estão sobrepostas.
Visão de pormenor de um quadro, retirado de uma caixa colocada sobre uma grelha excluidora, com o néctar recente a brilhar nos alvéolos do quadro.
E, finalmente, imagens da colocação de mais algumas meias-alças com cera puxada, que permitirá acomodar o néctar deste fluxo abundante das marcavalas.
Colocação da segunda meia-alça.Correndo normalmente e bem estas três colónias poderão produzir entre 160-180 kgs de mel para o apicultor. Ao dia de hoje a primeira meia-alça está praticamente cheia, a marcavala existente no campo deverá dar para encher a segunda meia alça. Lá para a terceira semana de junho começará o fluxo do castanheiro que deverá permitir encher mais duas meias-alças (15 kgs x 4 = 60 kgs). Trabalho não falta, para elas e para mim.
Ontem, 25 de maio, percorridos os 150 km que me separam de Coimbra dos apiários na Beira Alta, cheguei ao local onde decidi iniciar o maneio esta semana. Dirigi-me ao único apiário que tenho, neste momento, a 900 m de altitude. Cheguei por volta da 14.30h e por lá andei até às 19.00h. Depois da última visita, a 18 de maio (ver aqui), data em que coloquei as primeiras meia-alças sobre as colmeias direccionadas para a produção de mel (este ano direccionei a maior parte das colónias para a produção de enxames), verifiquei que uma boa parte delas estava já a “pedir” outra meia-alça. Com a marcavala no auge, com boas temperaturas (entre os 23-28ºC), com a varroa controlada de forma muito decente, com boas populações de abelhas e com rainhas em “andamentos altos”, tudo se conjuga para uma armazenagem rápida e muito satisfatória. Para este resultado contribui também o facto de estar a fornecer meias-alças com ceras puxadas às colmeias.
A marcavala (Echium lusitanicum), uma “vaca leiteira” nas palavras do meu grande Mestre, o meu pai, com quem comecei a visitar as abelhas, teria eu 7-8 anos.
Algumas das meias-alças que coloquei ontem.
Colónia no ninho e na qual coloquei a primeira meia-alça.
Colónia com a primeira meia-alça, colocada na visita anterior a 18.05.
Uma das meia-alças colocada a 18.05 e já com uma quantidade bastante apreciável de néctar. Verifiquei também a total ausência de criação nas primeiras meias-alças.
Esta foto serve para ilustrar como a combinação de quadros desbloqueados no ninh0 (modelos Langstroth e Lusitana) e fluxos intensos, que rapidamente ocupam as meias-alças, tendem a manter as rainhas, mesmo as mais prolíficas, no local desejado, o ninho.
A segunda meia-alça, para além de aumentar a capacidade de armazenagem da colónia, contribuindo para ninhos pouco bloqueados, facilita também o trabalho das abelhas na desidratação do néctar.
Inclusive colónias orientadas para a produção de enxames, com ninho e sobreninho, são utilizadas em simultâneo para a produção de mel em casos que o justificam.
Colmeia lusitana com ninho+sobreninho+meia alça/alça.
Hoje, no dia mundial das abelhas, levantei-me cedo e fui, pelo fresco, fazer o que mais e melhor me apetece fazer: estar como profissional (porque é a actividade que me põe o pão na mesa) a trabalhar as minhas colónias com uma atitude descomprimida e sem pressões económicas. Este contexto permite-me fazer algumas coisas de forma diferente do passado, ensaiar e testar algumas ideias e avaliar, com o melhor rigor que me é possível, os resultados alcançados.
Uma das tarefas no apiário que me preencheu estas horas mais frescas, na manhã de um dia que se prevê atingir 28ºC (e mesmo sem t-shirt por baixo do fato este calor faz-se sentir com alguma violência), foi dar seguimento ao que tinha iniciado há cerca de 4 semanas atrás (aqui descrito) e “palmerizar” um conjunto de núcleos. Basicamente, o maneio passou por transferir um ou dois quadros com criação dos núcleos onde coloquei as rainhas das colónias anteriormente orfanadas, para as colónias actualmente orfanadas. A intenção deste maneio visa alcançar 4 objectivos em simultâneo:
atrasar/arrefecer o crescimento das colónias nos núcleos, forma de prevenir a enxameação não reprodutiva, cuja causa principal e determinante é o excessivo confinamento da colónia. Este tipo de enxameação sucede o período da enxameação reprodutiva. Do ponto de vista do maneio, a enxameação não reprodutiva ocorre sobretudo por falta/atraso de maneio adequado por parte do apicultor. Já a enxameação reprodutiva pode suceder mesmo no caso de um maneio adequado do apicultor;
equilibrar os grupos etários/cohortes das abelhas nas colónias previamente orfanadas. Este equilíbrio visa fornecer às jovens rainhas já nascidas, e a iniciar postura, abelhas com a idade certa para “amamentar” as novas larvas que surgirão da sua postura;
fornecer quadros que ficarão desbloqueados imediatamente depois desta criação, hoje oferecida, emergir, e propiciar uma boa quantidade de alvéolos disponíveis para um novo ciclo de postura das jovens rainhas;
fortalecer estas novas colónias com mais abelhas, com o objectivo de estarem capazes de trabalhar as meladas do castanheiro e azinheira, que surgirão previsivelmente dentro de um mês e meio a dois meses.
Em baixo deixo o foto-filme do que me encantou fazer hoje com as minhas abelhas, no dia mundial das abelhas.
Núcleo onde coloquei, há cerca de 3 semanas atrás, a rainha da colónia orfanada, em baixo.Foto de hoje da colónia orfanada há cerca de 3 a 4 semanas atrás.Abertura de um espaço para colocar dois quadros com criação na colónia orfanada.Quadros com criação retirados de um dos núcleos hoje trabalhados.Foto de detalhe de um dos quadros com criação introduzidos numa das colónias orfanadas.Quadro com cera laminada rígida, muito apreciada pelas abelhas, e mais resistente às elevadas temperaturas dos próximos dias. Recolocação do núcleo em cima da colónia. Será levado para outro apiário assim que se confirme a presença de uma rainha nova em boa postura na colónia em baixo.
Neste dia, envio um abraço a todos os que gostam de passar umas horas junto das abelhas e/ou lhes reconhecem o importante serviço ecossistémico que prestam a todos nós.
Finalmente a primavera parece ter chegado aqui, ao lado norte da Serra da Estrela! No apiário que tenho a 900 m de altitude vejo, pela primeira vez neste ano atípico, que ao sacudir abelhas dos quadros para além das abelhas também cai néctar recente. Até aqui tem sido necessário suplementar com pasta. Estou certo que, caso o não tivesse feito regularmente, teria uma mortalidade por fome entre 90-95% das colónias. Consegui “aguentar o barco” e a mortalidade foi um redondo zero.
A primeira floração significativa, que dá néctar às abelhas e ao apicultor, neste apiário, o meu pai ensinou-me a chamar-lhe marcavala: uma “vaca leiteira” para as abelhas, nas suas palavras.
A marcavala hoje: excelente planta nectarífera, que dá um néctar muito claro, e que exsuda geralmente durante cerca de 3 a 4 semanas, entre o início e final de maio. Este ano começou a exsudar mais de 15 dias mais tarde. Abelha libando na flor da marcavala (hoje).
Entre outras tarefas do dia de hoje, coloquei as primeiras meias-alças sobre uma série de colónias que estou a dedicar de corpo inteiro à produção de mel. Como de há vários anos para cá, prefiro que as primeiras meias-alças sejam com quadros com cera puxada. Verifico que as abelhas reconhecem mais rapidamente esse espaço como seu, e tendem a assenhorar-se dele logo nas horas seguintes.
Quadros de meia-alça com cera puxada, meio caminho andado para uma boa produção. Com mais de 5 mil abelhas para nascer nos próximos dias em cada quadro como o da figura, estou optimista. Mas… só depois do mel estar nos potes/bidões se fazem contas certas. Algumas das colmeias que receberam hoje a primeira meia-alça.
A terminar uma imagem do meu companheiro habitual dos últimos 5 anos. Há coisas que valem bem o “dinheirão” que se dá por elas, e este fato é um exemplo disso.
Entre os vários equipamentos de apicultura as grelhas excluidoras de rainhas é dos que suscita os debates mais acesos entre apicultores, com os seus defensores acérrimos e os seus detractores empedernidos. Mais uma vez, como noutros casos, a utilização que faço deste equipamento é pontual, não é sistemática, é casual, não é universal, é temporária, não é permanente. Utilizo este equipamento mais regularmente nas colónias com sobreninho, muito raramente em colónias com ninho e meias-alças; em colónias que serão divididas, ou que doarão abelhas, ou quadros com criação ou quadros com reservas; são colocadas preferencialmente após o período de enxameação reprodutiva e são tiradas no final do verão, senão antes. Em baixo deixo um foto-filme deste maneio realizado em várias colónias no dia de hoje.
Colónia do modelo Langstroth com ninho e sobreninho.Separação do ninho e sobreninho.Transferência da rainha (espero que sim) e dos quadros com criação aberta e operculada e maiores áreas de criação do sobreninho para o ninho. Este é um processo de inversão quadro-a-quadro. Acomodados os 8 quadros com criação e mais dois quadros com reservasnas posições 1 e 10, chega a altura de colocar a grelha excluidora no topo do ninho (não procurei a rainha mas confio que tenha “viajado” nos quadros com criação mais recente para o ninho, onde pretendo que ela permaneça).Colocação do sobreninho onde serão colocados os 10 quadros restantes. Nas laterais coloco os quadros com reservas (pólen e néctar) e no centro coloco quadros com criação fechada que não tiveram lugar no ninho.Configuração final da colmeia da base para o topo: ninho, grelha excluidora de rainhas, sobreninho (que poderá tornar-se numa alça meleira) e no topo meia-alça. Correndo tudo bem esta colónia nesta zona poderá produzir, sem qualquer favor, 50 a 60 kgs de mel .
Publiquei no passado dia 27.04 um post sobre o síndrome provocado pelo vírus da paralisia crónica das abelhas. O blog The Apiarist, do qual sou subscritor, publicou ontem, dia 08.05, um post sobre este mesmo síndrome, a propósito da crescente mortalidade de colónias verificada na Grã-Bretanha nos últimos anos por esta causa.
Como se vê no gráfico o número de apiários que registam casos de paralisia crónica das abelhas tem aumentado, em especial a partir de 2013 (2017 é o último ano registado). O Sun Reporter publicou, no passado dia 02.05, um artigo sobre este vírus. E os comentários incluíram estas referências à atual pandemia do Covid-19 e à tecnologia 5G: “Acho que é beevid – 19. Eu não acho surpreendente” “É a radiação de 5g..google it” “O mel local supostamente carrega anticorpos de vírus e constipações locais – ajuda os seres humanos se comer este produto, ou é o que dizem. Portanto, pode ser que as abelhas estejam realmente infectadas por covid. Não é brincadeira.”
Radiação 5 G, oh my god!!? Este síndrome foi documentada há mais 2300 anos por Aristóteles e não consta que há época, na Grécia, existissem antenas e radiações 5G. Enfim, a “realidade” é o que quisermos!!
Deixando estes “cientistas” conspirativos e alucinados, que se multiplicam exponencialmente nas redes sociais, atentemos sobre o que nos dizem os cientistas (os autênticos) que trabalham no campo, que observam de forma controlada e medem com o melhor rigor possível para depois, com humildade científica, retirarem conclusões circunstanciadas, verificáveis e refutáveis.
Fatores de risco da síndrome ao nível do apiário
“Os metadados associados aos registros do Beebase são relativamente esparsos. Detalhes de métodos específicos de gerenciamento de colónias não são registrados. Fatores ambientais locais – OSR, borragem, gap de junho etc. – também estão ausentes. Inevitavelmente, alguns dos fatores que podem estar associados ao aumento do risco não são registrados.
Uma doença relativamente rara que está agrupada espacialmente, mas não temporalmente, é um problema complicado para definir fatores de risco. Steve Rushton, o autor sénior do artigo, fez um excelente trabalho ao analisar os dados disponíveis.
Os dois fatores mais importantes ao nível apiário que contribuíram para o risco da doença foram:
Apicultura comercial/profissional – os apiários geridos por apicultores comerciais/profissionais tinham um risco 1,5 vezes maior de registrar a síndrome.
Importação de abelhas – os apiários que tinham importado abelhas nos dois anos anteriores tinham um risco 1,8 vezes maior de registrar a doença.” (ver o artigo aqui: https://www.nature.com/articles/s41467-020-15919-0)
Artigo do The Times com o título ” Rainhas exóticas provocam uma epidemia às abelhas”.
Importação de abelhas não significa importação de doenças
Há bons registros de abelhas importadas pelos canais oficiais. Isso inclui rainhas, pacotes e colónias em núcleos. Entre 2007 e 2017, houve mais de 130.000 importações, 90% das quais foram rainhas.
Um risco aumentado deste síndrome em apiários com abelhas importadas não significa que as abelhas importadas foram a fonte da doença.
Com os dados disponíveis, não é possível distinguir entre as duas hipóteses a seguir:
as abelhas importadas são portadoras do vírus da paralisia crónica ou a fonte de uma nova (s) estirpe (s) mais virulenta (s) do vírus, ou
as abelhas importadas são suscetíveis à (s) estirpe (s) de vírus da paralisia crónica endémica no Reino Unido às quais não foram expostas em seu país de origem.
Existem maneiras de separar essas duas possibilidades … o que obviamente é algo que queremos concluir.” fonte: https://theapiarist.org/aristotles-hairless-black-thieves/
Tendo iniciado o tratamento de final de inverno/início da primavera com as tiras de Apivar na passagem da 2ª para a 3ª semana de fevereiro, de acordo com o calendário que fui afinando e com resultados muito positivos nos últimos 4 a 5 anos, esta semana estou a proceder à sua retirada, ao fim de cerca de 10 semanas. Terei sido, tanto quanto sei, dos primeiros apicultores em Portugal a referir e estender o tratamento para além das habituais 6 a 8 semanas. Actualmente o fabricante (Veto Pharma) também recomenda 10 semanas para a duração do tratamento em colónias com muita criação. É o meu caso nesta altura do ano, assim como o caso de larga maioria dos apicultores nas zonas temperadas do hemisfério norte.
É um excelente sinal esta coloração amarelo-acastanhado nas tiras, sinal inequívoco que foram tocadas e calcorreadas pelas abelhas inúmeras vezes..
Em casa junto-as, para depois as entregar na minha associação de apicultores, que por sua vez as entregará à Valormed, para que procedam à sua destruição em condições devidamente controladas
Neste período de tempo perdi uma colónia, em cerca de 200 tratadas, para o Varroa (0,5%). Não sendo um utilizador convicto e frequente de nenhuma das várias técnicas de controlo da taxa de infestação, faço o controlo por observação a olho nú das abelhas e criação com muita regularidade, durante o maneio do ninho nestas 10 semanas. Contudo hoje fiz um controlo pouco habitual na minha prática.
Por uma razão específica e pouco habitual, no maneio de hoje tive de cortar este favo com criação de zângão, que tinha sido construído por debaixo do travessão do quadro de meia-alça que habitualmente coloco no ninho.E aproveitei para re-confirmar a elevada eficácia deste primeiro tratamento da varroose deste ano. Zângãos limpos de varroa.
No quadro do meu maneio, tendo em conta o timing, duração e eficácia do tratamento, é um disparate estar a fazer o designado “corte de zângão”. Caso o fizesse, estaria a eliminar maioritariamente zângãos limpos com impacto pouco significativo na infestação, mas que consumiram uma quantidade apreciável de recursos da colónia até serem operculados. Neste quadro estou convicto que a colónia ganha mais deixando os “boys” nascer.