o processamento da cera de opérculos: a minha opção

O processamento da cera de opérculos era com frequência o ponto de estrangulamento no meu processo de extracção do mel. Mesmo naqueles anos em que extraí algumas dezenas de bidões de mel nunca dei o passo para a compra de uma máquina dedicada a esta operação. Nesses anos optei por externalizar parte do processo de extracção, socorrendo-me dos serviços de uma cooperativa da zona, e de forma inerente o processamento da cera de opérculos dos quadros lá extraídos.

Este ano, assim como nos anos em que optei por extrair a totalidade ou parte do mel na minha UPP, a opção escolhida para o processamento da cera de opérculos tem procurado rentabilizar os recursos que tenho disponíveis sem me empenhar em comprar maquinaria cara e que, eventualmente, avaria.

Assim, a cera dos opérculos, ainda parcialmente besuntada de mel, que retiro da tina de desoperculação…

… é colocada numas caixas largas e com pouca profundidade.

Estas caixas são levadas para uma casa rústica no interior da propriedade e a pouca distância do local onde está implantado o meu apiário preferido.

Como a casa na actualidade não é habitada, as janelas não estão nas melhores condições, apresentam alguns vidros partidos, mas este facto contribui para a entrada das abelhas na divisão onde armazeno as alças e meias alças e onde coloco temporariamente estas caixas com a cera dos opérculos.

As caixas com a cera dos opérculos são colocadas numa disposição que permita o acesso fácil das abelhas à mesma.

Passados poucos minutos estes opérculos começam a ser limpos do mel pelas abelhas do apiário.

Passados alguns dias estes opérculos estão completamente secos/limpos e em óptimas condições para serem encaminhados para a caldeira da cera.

Nota 1: nas duas ou três vezes em que procurei atalhar este processo, colocando as ceras dos opérculos retirados da tina e ainda besuntados com mel directamente na caldeira, reparei que sistematicamente a broa de cera resultante ficava muito “areada”, pouco aglomerada, o que me levou a intuir que o mel ainda presente contribuía para este desfecho que não me agradava.

Nota 2: por regra sempre fui relativamente espartano nas minhas compras de equipamento para a UPP. Se por um lado tinha muito pouca vontade de investir milhares de euros em maquinaria, por outro sempre temi ficar com o bebé nos braços ou por causa de uma avaria ou por causa de uma cessação abrupta da minha aventura apícola. Agora, com três vezes menos colmeias que há dois anos atrás, o equipamento que tenho é suficiente e acabaram-se os estrangulamentos no processo de extracção.

uma formulação em gel de ácido fórmico para o controle de ácaros (varroa e traqueia) em abelhas melíferas

Estudos com alguns anos e que, muito provavelmente, terão servido de ensaios percursores e inspiradores ao desenvolvimento do MAQS e outros tratamentos de gel com ácido fórmico. Medicamentos para a varroose com eficácia inferior a 90% creio que poderão ser homologados pela Agência Europeia do Medicamento (EMA), mas com a orientação para o aplicador dever acompanhar o tratamento com outras medidas de gestão integrada de pestes*.

“Uma formulação de gel de ácido fórmico a 65% e um sistema de veiculação, conhecido como pacote de gel de ácido fórmico Beltsville (BFA), foram desenvolvidos para controlar ácaros parasitas de abelhas. As concentrações de ácido fórmico em aplicações únicas de pacotes de gel BFA foram em média de 10-50 ppm dentro da colmeia, o que igualou ou excedeu os níveis de ácido fórmico obtidos por quatro aplicações líquidas sucessivas. Num estudo de campo da Primavera, uma única aplicação de pacotes de gel de BFA foi cerca de 70% eficaz no controle do Varroa jacobsoni, quando avaliados por tratamentos de acompanhamento com Apistan®. Em estudos com abelhas enjauladas, o controle do ácaro da traqueia, Acarapis woodi, aproximou-se de 100% ao oitavo dia. O pacote de gel de BFA é mais seguro de manusear do que o ácido fórmico líquido e, devido à sua liberação mais lenta, requer menos aplicações do que seu equivalente líquido. A eficácia contra o Varroa e ácaros da traqueia deve encorajar o uso de pacotes de gel BFA num programa geral para controlar os ácaros (varroa e/ou traqueia) que parasitam as abelhas.”

fonte: https://www.researchgate.net/publication/287849856_A_Gel_Formulation_of_Formic_Acid_for_the_Control_of_Parasitic_Mites_of_Honey_Bees

Um segundo estudo, agora com uma formulação com uma concentração de ácido fórmico a 85% obteve uma taxa de eficácia semelhante.

“Duas formulações de um gel à base de amido contendo 85% de ácido fórmico foram avaliadas para controlar o Varroa destructor em colmeias de abelhas. […] A eficácia média na redução da população Varroa foi de cerca de 73%.

fonte: https://www.researchgate.net/publication/273259562_A_gel_formulation_of_formic_acid_for_control_of_Varroa_destructor

* À luz do que é feito na ficha técnica do Varromed:

4.4 Advertências especiais para cada espécie-alvo: VarroMed só deve ser usado como parte de um programa de controle integrado do Varroa. A eficácia foi investigada apenas em colmeias com taxas de infestação de ácaros baixas a moderadas.”

fonte: https://ec.europa.eu/health/documents/community-register/2017/20170202136456/anx_136456_en.pdf

a solução de um caso concreto de uma colónia com pms

Hoje a chegada ao apiário, onde localizei ontem uma colónia com sinais inequívocos de PMS, foi anunciada novamente pelo levantar voo da comunidade de abelharucos que por ali está instalada. Já os começo a ver com alguma simpatia e até esperança de que possam estar a contribuir para as zero velutinas que vi este ano nos meus apiários.

O que me levou ao apiário não foi contudo a intenção de observar as acrobacias aéreas dos abelharucos. Fui solucionar, o mais rapidamente possível, o caso da colónia com PMS.

Desta colónia, retirei 8 quadros com reservas que não apresentavam criação absolutamente nenhuma e coloquei esses quadros valiosos numa colmeia armazém deste apiário depois de sacudidas todas as abelhas.

A colónia doente, que ficou apenas com os dois quadros que apresentavam criação e respectivas abelhas, foi fechada e retirada do apiário.

Foi transportada para minha casa e colocada num cantinho da horta. Para eliminar as abelhas decidi introduzir água com detergente pelo óculo da prancheta.

Esta foi a solução que achei ser a melhor para este caso concreto de uma colónia já demasiado fragilizada pelo PMS, com uma população de abelhas que não chega para cobrir as duas faces de um quadro e muitas delas doentes pelas viroses, em particular o VAD.

Caso esta colónia tivesse mais abelhas e caso o PMS não estivesse tão avançado, muito provavelmente teria sido tentado a retratar e fazer um esforço mais para a apoiar . Não sendo isso o que vi, decidi retirá-la com a máxima urgência do apiário e eliminar este super-organismo moribundo, como recomenda qualquer manual de boas práticas da pecuária.

Conto em breve, e com um pouco mais de tempo, voltar ao caso desta colónia, que por ser único nos meus apiários nos últimos anos, pretendo aprofundar um pouco mais, agora na perspectiva da formulação de 3 ou 4 hipóteses alternativas que possam explicar as causas deste conjunto infeliz de eventos.

pms: a factura que as minhas abelhas estão a pagar pela minha incompetência

Hoje, por volta das 9h30, estava a entrar no meu segundo apiário a 600 m de altitude, e não pude deixar de notar um bando de cerca de 10 abelharucos a levantar voo. Não sei se coincidência ou não, o ano passado tinha algumas velutinas à frente dos alvados das colmeias neste território e não dei conta dos abelharucos. Este ano dou conta dos abelharucos e não vi, até agora, uma velutina ou crabro em frente dos alvados das colmeias.

Nas 41 das 42 colónias assentes neste apiário à data de hoje verifico uma expansão da área de criação em boa parte delas e um padrão e compaticidade que me deixaram satisfeito.

Foto representativa do padrão de postura e compaticidade encontrado nas 41 das 42 colónias deste apiário.

E na 42ª?

Na 42ª foi isto o que vi:

Colónia pouco povoada! Medicada com duas tiras de Apivar, e tratamento iniciado em meados de julho, de acordo com o calendário afinado nos últimos anos.
Criação em mosaico, abelhas com asas deformadas, abelhas com varroas, larvas distorcidas…
… abelhas moribundas a emergir com o probóscide/língua estirado.

Tudo sinais muito claros de PMS. Isto numa colónia com reservas de mel e pão-de-abelha suficientes para a altura.

Olhando para o tecto da colmeia, onde fui anotando os aspectos críticos desta colónia ao longo da estação, ajudou-me a tornar compreensível este desfecho.

Esta colónia, prematuramente forte, tinha a rainha já em postura no sobreninho a 16.03.

Sendo uma colónia forte e tendo eu colocado o sobreninho cedo na temporada, reforcei-a com alguns quadros com criação retirados de outras colónias dedicadas à produção para conformar estas à regra “não mais de 6”. Apesar de na altura esta colónia ter as duas tiras de Apivar no ninho (tratamento de final do inverno), este suplemento de quadros com criação deveria ter sido acompanhado com a colocação de mais uma ou duas tiras de Apivar no sobreninho para respeitar o que o fabricante preconiza: uma tira de Apivar por cada cinco quadros de abelhas. Sabendo isto há anos, não o tendo feito é inequivocamente uma incompetência minha no maneio desta colónia sobrepovoada.

A 16.05 coloquei uma excluidora entre o ninho e o sobreninho, com a rainha confinada ao ninho. Hoje vi sinais muito evidentes de PMS.

PMS identificado hoje, e hoje ainda ou amanhã cedo, o mais tardar, vou dar os passos que se exigem para solucionar esta situação. Tema para uma próxima publicação.

o caminho para a homologação de um medicamento de uso veterinário

Não sendo uma absoluta novidade para mim o quão complexo e dispendioso é o processo de homologação de um medicamento de uso veterinário, encontrei no Bee-L uma descrição informal do processo de homologação requerido nos EUA. Na nossa UE não será muito diferente. No caso da apicultura apenas os tratamentos para a varoose estão homologados. Todas as outras doenças que afectam as colónias de abelhas não têm tratamentos homologados pela UE.

Contextualizando brevemente, esta é uma descrição de um apicultor, que por acaso é químico ou bio-químico e que trabalhou no âmbito da sua actividade profissional em vários laboratórios de produção de medicamentos, tanto quanto eu percebi até agora. As iniciais do seu nome são R.C. Esta descrição está ligada a uma questão que surgiu no Bee-L acerca do processo de homologação dos famosos toalhetes com oxálico e glicerina que têm vindo a ser testados pelo Randy Oliver. Tenho ideia que a EPA será a congénere norte-americana da nossa Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) e a FDA a congénere da nossa Agência Europeia de Medicamentos (EMA).

De vez em quando virei ler esta publicação para me lembrar o caminho que tem de ser percorrido (já nem falando em tudo o que está a montante em I&D) para alguém ver o seu medicamento para a varroose homologado. Não quero também esquecer-me do que alguns entre nós fizeram, e bem, para que esses medicamentos tenham comparticipação da UE e do Estado português no seu custo de aquisição. Por exemplo, nos EUA essa comparticipação não existe.

Os toalhetes de ácido oxálico diluído em glicerina
criados e testado por Randy Oliver.

R.C. : “Eu realmente não sei quais dados a EPA gostaria de ver. No mínimo, eles provavelmente gostariam de ver os dados de resíduos no mel e na cera para o ácido oxálico quando o produto for usado de acordo com o protocolo proposto. Portanto, a primeira coisa necessária é um rótulo com o protocolo de de uso proposto. Não creio que os resíduos de glicerina sejam motivo de preocupação. Afinal, nosso próprio corpo produz glicerina todos os dias como parte do metabolismo normal. De acordo com sua prática de longa data sobre dados, eles (EPA) gostariam que os dados fossem gerados com boas práticas de laboratório (BPL). O BPL não tem quase nada a ver com fazer boa ciência e obter resultados corretos. Em vez disso, as BPL se referem à manutenção de registros e inspeções de qualidade, registros de laboratório e procedimentos operacionais padrão escritos e de forma muito detalhada para cada operação. Coisas como qual foi o número do lote de todos os reagentes usados, qual foi a data em que esses frascos foram abertos e se estavam devidamente rotulados e registros de quem abriu o frasco e prazo de validade. Se você usou um frasco de acetona, se o rótulo era atualizado toda vez que era recarregado, mesmo que você o recarregasse três vezes ao dia. Você tem registros escritos mostrando qual balança que foi usada para cada pesagem e você tem registros escritos que teve sua calibração verificada com algum peso padrão e foi documentado todos os dias em que a balança foi usada? Seus cadernos são devidamente conferidos diariamente? Se você usou uma geleira, você tem documentação em papel que mostra o registro de temperatura nessa geleira para todos os dias em que fez parte do estudo? Você tem arquivos protegidos à prova de fogo onde pode armazenar todos os registros de estudo para sempre? O BPL realmente resulta no corte de uma floresta de árvores de para fornecer todo o papel necessário a esta extensa tarefa de registrar tudo ao mais pequeno pormenor. Todo o objetivo do BPL é fornecer documentação mais do que suficiente para que alguém versado na técnica possa repetir o estudo como feito originalmente e obter os mesmos resultados e também demonstrar que todos os equipamentos usados ​​estava em boas condições de funcionamento no dia em que foram usados ​​e que um inspetor de Qualidade verificou essas coisas e verificou todos os cálculos para ter certeza de que foram feitos corretamente. Em geral, a EPA não tem interesse em qualquer estudo que não seja feito em conformidade com as BPL.

O trabalho de Randy é determinar como usar o material para obter eficácia na eliminação de ácaros. A EPA não tem interesse real em saber se a substância realmente mata os ácaros e não quer estudos de eficácia. Estas são as perguntas que a FDA faz, porque se focam em avaliar se as coisas realmente funcionam. Para os pesticidas que não funcionam ou funcionam, mas causando alguns danos colaterais indesejados, como matar a rainha, estes problemas são resolvido por um utilizador (apicultor) que processa o fornecedor por danos, em tribunais civis. Lembre-se que a EPA deseja dados que digam que o material é seguro para o aplicador usar, os produtos produzidos são seguros para o consumidor usar e o produto químico não causa danos ambientais inaceitáveis. Eu não acho que eles tenham muitas dúvidas com a segurança do utilizador (apicultor) ou o ambiente, seja pelo ácido oxálico ou pela glicerina. Mas há limites para a quantidade de ácido oxálico que uma pessoa pode comer por dia, então algum tipo de dado de resíduo terá de ser indicado para proteger o consumidor. Todos nós sabemos que não é possível usar ácido oxálico em quantidades que venha a causar um problema de saúde ao consumidor por comer mel de colmeias tratadas. Mas saber e ter provas são duas coisas diferentes e os funcionários da EPA vão-se proteger de um erro pedindo algum tipo de dado sobre resíduos. No caso de um tratamento por gotejamento ou por sublimação de oxálico, eles podem contar com dados de registros estrangeiros, como Canadá ou UE. Talvez você possa convencê-los a confiar nos dados da UE neste caso, pois acho que uma mistura de glicerina oxálica está registrada na UE para gotejamento. No pior cenário esta análise pode ter que passar por algum laboratório contratado que tenha BPL (há muitos deles) e gastar $ 30.000 ou $ 60.000 para o trabalho analítico e respectivo relatório. Alguém precisaria fazer o trabalho de campo para obter as amostras e o BPL também é necessário para o trabalho de campo. Os registos dos testes de campo necessários assim como o que o apicultor fez e tudo isto em conformidade com as BPL (Boas Práticas Laboratoriais).

Lembre-se também de que a EPA estava sendo pressionada por Michelle Obama para registrar o gotejamento e a sublimação com oxálico e, como resultado, homologou com menos dados do que jamais os vi homologar qualquer coisa no passado. Se não fosse por sua influência política, provavelmente não teríamos estas utilizações do oxálico homologadas nos Estados Unidos hoje. Ela não é mais a primeira-dama, então não tem mais clube para bater à porta. E, como a Brushy (empresa apícola norte-americana), a empresa que submeteu este processo de homologação, não está mais no mercado, a atual homologação para o gotejamento e a sublimação só é válido até que a agência tenha alguma dúvida que exija uma resposta e como a empresa que o homologou não existe, talvez a homologação seja cancelada. Toda a homologação é totalmente revista pelo menos a cada 15 anos então em algum momento isso vai acontecer com os processos de gotejamento e a sublimação actualmente homologados e alguém deve solicitar essa essa revisão.“R.C.

fonte: Bee-L (fórum apícola norte-americano), 02-09-2020

das abelhas resistentes e das cabras sapadores

No passado dia 4 de agosto informaram-me que, num dos dois apiários que tenho a 600 m de altitude, as cabras de um pastor que partilham o mesmo território tinham derrubado uma colmeia. Ao final da tarde desloquei-me a esse apiário para recolocar no assento não uma mas duas colmeia que estavam tombadas pelo chão completamente viradas ao contrário. Não mereceria este episódio ser trazido aqui, outros semelhantes já me têm acontecido esporadicamente (nesses outros casos provocados não por cabras mas por vitelos e/ou vacas), não fossem dois aspectos do maneio que julgo poderão interessar outros companheiros de lide.

As duas colmeias que se cruzaram no caminho das cabras sapadores!

Hoje tive oportunidade de regressar ao apiário e analisar o estado do ninhos de todas as colónias deste apiário, nomeadamente as duas colónias que haviam sido tombadas.

Na colónia da esquerda verifiquei que estava zanganeira apresentando criação fechada de zângão em alvéolos de obreira. Fazendo alguns cálculos leva-me a supor que as colmeias foram tombadas por volta de 27 de Julho: a postura das obreiras poedeiras intensifica-se passados cerca de 28 dias após a postura do último ovo da rainha perdida, e as larvas de zângão são operculadas após 9 dias a contar do ovo de primeiro dia; sendo assim e recuando 37 dias a partir do dia de hoje encontramos a data provável do choque frontal entre as cabras e o assento das colmeias tombadas.

Este é um dos três quadros que a colónia apresentava com postura de poedeiras. Ainda que existam sempre abelhas poedeiras em todas as colónias o seu número aumenta, assim como a expressão da sua postura, numa situação de orfandade irresolúvel pelas abelhas.
Nesta altura do ano a minha solução passa por eliminar a colónia zanganeira e colocar estes quadros com a criação raspada numa colónia viável para que esta aproveite a proteína destas larvas de zângão.

Na colónia da direita verifico que este acidente não provocou um desfecho semelhante ao da colónia da esquerda. Tem rainha ao dia de hoje, com uma postura vibrante, mas… vi meia-dúzia de abelhas com as asas deformadas e vi “isto” num dos quadros…

… alguns alvéolos com pupas desoperculados pelas abelhas (na foto conto 7 que não me levantam dúvidas).

Este comportamento de desoperculação de alvéolos é a manifestação de um certo grau de comportamento higiénico por parte das abelhas, e surge habitualmente na presença de um grau de infestação pelo ácaro varroa relativamente elevado**. Se alguns apicultores acham que este comportamento é por si só sinónimo de abelhas resistentes ao varroa e/ou de linhas excepcionalmente higiénicas e com genética a explorar e desenvolver, eu e outros achamos que este comportamento é um comportamento banal e padrão presente em quase todas as colónias quando sujeitas a uma taxa de infestação que está a atingir valores elevados. Não há neste comportamento nada de excepcional nem superlativo! Pelo que vou vendo estas colónias irão sucumbir aos ácaros e aos vírus por eles transmitidos, não se fazendo nada para ajudar as abelhas. A natureza, intensidade e extensão deste comportamento nas minhas colónias revelou-se até agora insuficiente para me permitir cruzar os braços e esperar que as colónias resolvam o problema. Como não acho correcto fazer marketing com afirmações despudoradas e mal fundamentadas sobre ter abelhas resistentes e, ao mesmo tempo, devo tirar as devidas implicações desta “filosofia céptica” sobre o que é ou não é um traço de resistência, apoiei esta colónia com os recursos disponíveis no momento: dupliquei a dosagem de Apivar.

Colmeia da direita com 4 tiras de Apivar.

E porque adicionei mais duas tiras de Apivar às duas que já lá estão há cerca de mês e meio? Lembro que esta colónia esteve tombada, de pernas para o ar, cerca de 8 a 10 dias, com as duas tiras de Apivar, que tinha colocado cerca de 15 dias antes, fora do sítio indicado. No dia em que as voltei a recolocar no assento não estive com grandes preocupações de colocar as tiras no sítio adequado dada a agitação das abelhas, e só hoje passados 37 dias da data que estimo ter ocorrido o acidente fiz uma inspecção mais atenta. Como só nesta colónia vi o fenómeno de “cria calva” (designação espanhola para o fenómeno que descrevi) atribuo a causa da falta de eficácia no controlo do ácaro à incorrecta localização das tiras. Como entretanto as tiras foram perdendo “potência” pela exposição ao ar (o amitraz degrada-se na presença do oxigénio) e a infestação foi ganhando “potência” entendi que colocar mais duas tiras iria equilibrar as premissas deste jogo de vida ou morte entre as abelhas e o ácaro.

** a traça da cera também provoca a desoperculação dos alvéolos das pupas. Neste caso surgem habitualmente meia-dúzia de alvéolos adjacentes desoperculados e em linha uns com os outros.

depois da convalescença um passeio pelo botânico de coimbra

Passados dez dias de convalescença de minha esposa, hoje pediu-me para a acompanhar num passeio pelo Jardim Botânico de Coimbra. Que bem que nos soube!

Ficam algumas fotos que fui tirando de alguns pormenores das árvores e plantas deste Jardim. A minha homenagem a todos os protectores e cuidadores deste Jardim, desde  Domingos VandelliAvelar Brotero (sec. XVIII) até à actualidade.

a dinâmica populacional das colónias durante o inverno

Nos meus primeiros 2 anos de apicultura fiquei diversas vezes assustado com o reduzido número de quadros ocupados pelas abelhas durante a invernagem. Depois fui observando que mesmo colónias com 2 a 3 quadros Langstroth ou Lusitana cobertos de abelhas se “aguentavam” relativamente bem durante a invernagem, e destas uma boa parte evoluía bem a partir de meados de fevereiro no território que ocupam.

Quantas abelhas são necessárias para cobrir cada uma das faces de um quadro langstroth, quadros por norma com 8 dm2 de área? Tenho referido várias vezes neste blogue o número de mil. Segundo A. Imdorf (2010) são cerca de 1100 (cerca de 130 abelhas por dm2). Partindo desta referência e fazendo contas simples, um quadro langstroth coberto de abelhas aloja 2200 abelhas (2 faces vezes 1100 abelhas), isto é uma colónia com dois quadros cobertos de abelhas tem uma população à volta de 4400 abelhas, e uma colónia com três quadros cobertos de abelhas tem uma população de um pouco mais de 6500 abelhas. Estes valores podem aplicar-se também aos quadros das colmeias do modelo Lusitana sabendo que têm áreas idênticas.

Se fizerem esta avaliação num dia particularmente frio (o que desaconselho, mas não é letal se o fizerem com alguma rapidez) com as abelhas dispostas em “cacho invernal”, verificarão que uma parte das abelhas estão enfiadas de cabeça para baixo nos alvéolos, comportamento adoptado pelas abelhas para optimizarem a termorregulação e, nesta circunstância, o número de abelhas pode chegar às 400 por dm2 (uma abelha enfiada num alvéolo ocupa 1/3 da área que ocupa quando faz a suas tarefas fora do alvéolo) e, portanto, essa diferença deve ser levada em consideração na avaliação da população.

Resumindo os números da dinâmica populacional durante o inverno em territórios com baixas temperaturas e ausência de floração nectarífera (Imdorf, A., 2010):

  • população à entrada do inverno (Dezembro): 8000-15000 abelhas (4 a 7 quadros cobertos de abelhas);
  • perda normal de inverno: 2000-3000 abelhas;
  • população no final do inverno: 5000-13000 abelhas (2 a 6 quadros cobertos de abelhas).

Conhecesse eu estes valores nos dois primeiros anos da minha aventura com as abelhas e teria dormido algumas noites de inverno mais sossegado, sem temer as piores desgraças, sabendo que aquela população era normal para aquela época do ano num território frio e sem florações nectaríferas.

Nota: No início de 2017 apresentei a minha proposta para a dinâmica populacional nos meses de primavera e verão que, confirmo agora, se aproxima muito dos valores propostos por Anton Imdorf (2010), investigador senior do Centre Suisse de Recherches Apicoles, referenciando um pico de população de 40 mil abelhas no mês de junho.

quadros com mel cristalizado: uma proposta de maneio

Não sendo uma circunstância que verifique nas minhas colónias, em alguns países (Suíça (1), França, por ex.), ou eventualmente em certas regiões do nosso país, acontece com alguma frequência as colónias invernarem com mel que cristalizou nos quadros do ninho. A cristalização do mel está frequentemente associada a elevados teores de melezitose no mel, superior a 10% dos açucares totais. Este mel apresenta uma taxa elevada de sais minerais, o que lhe confere uma condutividade eléctrica típica dos meis de melada, acima dos 0,8 mS/cm.

Mel cristalizado no favo, com elevado teor
de melezitose

Sendo o mel de melada muito procurado por alguns dos maiores apreciadores de mel e valorizado pelos mercados internacionais e pelos grossistas para a produção de lotes mistos, há muito apicultores em certas regiões europeias que entendem que este é um mel “perigososo” enquanto reserva alimentar para as abelhas durante a invernagem. Segundo a sua experiência o consumo deste mel pelas abelhas durante a invernagem está frequentemente associada a desinteria, que pode culminar num excesso de mortalidade de abelhas neste período (2). Na Suíça é recomendado aos apicultores a extracção destes quadros dos ninhos e/ou a sua guarda e re-utilização na primavera seguinte (ver https://www.abeilles.ch/actualites/detail/News/detail/attention-miel-de-melezitose-1005.html).

Para a re-utilização destes quadros com mel cristalizado, um dos maneios aconselhados consiste na colocação na primavera seguinte destes quadros previamente desoperculados numa alça por baixo da caixa do ninho e, simultaneamente, a colocação de uma alça por cima do ninho com quadros puxados vazios. As abelhas irão liquidificar o mel cristalizado e transferi-lo, em maior ou menor percentagem, para os quadros da alça que foi colocada por cima do ninho (ver https://www.apiservices.biz/media/kunena/attachments/9028/zementhonig_f.pdf).

Notas: (1) uma palavra de reconhecimento e gratidão à equipa de pesquisa do Centre Suisse de Recherches Apicoles, Liebefeld, Suiça, pelo que me tem ensinado e pelo que tem confirmado do pouco que já sabia; (2) a mortalidade normal, durante a invernagem, situa-se entre as 2 mil e as 3 mil abelhas (Imdorf, A., 2010).

suplementação artificial de proteína: alguns dados experimentais

O pólen é a única fonte de proteínas das abelhas e desempenha um papel decisivo na criação de novas abelhas, bem como no desenvolvimento das glândulas nas operárias mais jovens. As abelhas suprem as suas necessidades de aminoácidos e minerais essenciais por meio do pólen. A sua ingestão é essencial para o desenvolvimento dos órgãos internos, em particular do tecido adiposo e das glândulas hipofaríngeas das abelhas.

Quadro com reservas de carbohidratos (mel) e proteína bruta (pão-de-abelha).

Os apicultores mais informados estão cientes que a criação de novas abelhas depende radicalmente do suprimento natural de pólen. Se nenhuma reserva de pólen estiver disponível nos favos e/ou se o campo não estiver a disponibilizar pólen a colónia diminui significativamente a criação, podendo esta ser interrompida.

Tendo estes aspectos em conta, alguns apicultores veteranos procuram, através da suplementação artificial de fontes de proteína (conhecidos como bifes proteicos), manter e/ou mesmo estimular a criação de abelhas novas em épocas de escassez. Vejamos se os dados trazidos por alguns estudos controlados (realizados na Suíça), confirmam esta expectativa.

Alimentação de pólen de primavera (Imdorf A., et al., 1988) 
Como às vezes há falta de pólen na primavera [Suiça], um conjunto de estudos foram realizados em 1986/87 para descobrir se a alimentação suplementar com pólen poderia acelerar o desenvolvimento da colónia nesta época do ano. Verificou-se que esta apenas levou a um aumento temporário na criação, mas não influenciou o desenvolvimento das colónias. Além disso, as diferenças observadas não foram estatisticamente significativas .

Alguns detalhes do desenho experimental e dos dados obtidos: na primavera de 1986 e 1987, dois grupos de 5 e 8 colónias, foram suplementados durante 5 semanas, do final de março ao início de maio, recebendo semanalmente 500 g de pasta de pólen (300 g de pólen de sua própria colheita e 200g água com açúcar 1: 1). De final de março ao final de maio, a população foi medida a cada três semanas (criação e abelhas adultas). Grupos de colónias semelhantes sem nenhuma suplementação serviram como controle.
Ao longo dos dois anos da experiência, foi observado um ligeiro aumento na criação de novas abelhas no início de abril. Três semanas depois nenhuma diferença foi observada na quantidade de criação de novas abelhas entre grupos. Nenhuma diferença entre os grupos foi observada durante e após a alimentação no desenvolvimento da população de abelhas.

Colónia suplementada artificialmente com um bife proteico.


Uns anos antes o mesmo investigador tinha avaliado o impacto da suplementação de pólen e de um substituto de pólen na criação de novas abelhas e no crescimento populacional noutra época do ano.

Alimentação de pólen entre meladas (Imdorf, A., et al., 1984)
Estudos realizados na Suíça com centenas de colónias de abelhas mostraram que o pico populacional é alcançado no final de junho ou início de julho e coincide com um período de baixo suprimento de pólen. Durante e após o fluxo de néctar da floresta/bosque, assiste-se a um rápido declínio na população de abelhas.
Em 1981 e 1982, os estudos focaram-se na possibilidade de desacelerar o declínio da população das colónias entre as meladas, suplementado-as com pólen e seus substitutos. Verificou-se que a criação e a expectativa de vida das abelhas não são influenciadas pela suplementação de pólen. A criação de novas abelhas nas colónias suplementadas com pólen não aumentou em comparação com as colónias não suplementadas. Da mesma forma, nenhuma extensão de vida foi observada. Em algumas colónias, o único efeito da suplementação foi a diminuição da colecta de pólen no exterior. Entretanto um aspecto muito negativo foi observado: uma infecção de cria de giz (ascosferiose) ocorreu em colónias alimentadas com pólen. Por esta razão, na América do Norte apenas pólen irradiado é aconselhado para suplementação.


Durante o intervalo entre as meladas no verão de 1981, um teste de alimentação suplementar foi realizado com pasta de pólen (700 g por 5 semanas; alimentação uma vez por semana; n = 6) e uma pasta feita com substituto de pólen de Protivy (540 g; 160 g Protivy 50, 360 g de água com açúcar 1: 1 e 20 g de pólen; n = 9). Um grupo de colónias não suplementadas serviu como controle (n = 12). A ingestão de proteína não teve influência nos dois grupos na criação de novas abelhas e na população de abelhas e não evitou o declínio da população durante o intervalo entre os fluxos de mel em 1981.

Um suplemento proteico industrial para abelhas (creio que não é comercializado na Europa, a ver se assim não firo susceptibilidades).

Reflexão: sendo muito consensual a importância crítica da nutrição das abelhas (ainda não conhecemos abelhas que sobrevivam na ausência de alimento) esse consenso não existe acerca do impacto da nutrição artificial suplementar, seja de proteína seja de carbohidratos, na aceleração do desenvolvimento da população de colónias de abelhas. Portanto, afirmar como uma verdade absoluta e universal, escrita nas pedras, que esse impacto existe é prematuro. O caso ainda está a ser avaliado e julgado! Do que retiro das minhas observações, com as minhas abelhas, no meu território e com o meu maneio, posso confirmar apenas três coisas muito simples, e que vejo repetirem-se ano após ano:

  • já evitei a morte por fome de inúmeras das minhas colónias com alimentação suplementar na forma de pasta de açúcar;
  • as minhas colónias respondem muito bem à entrada de pólen do campo, que se inicia em meados de fevereiro nos territórios onde tenho assentes os apiários, aumentando generosamente a quantidade de criação e, em regra, arrancam bem e chegam muito bem povoadas a abril/maio;
  • até agora nunca utilizei alimentação suplementar proteica no final do verão/início do outono, e as abelhas têm invernado bem sem ela (este ano, 2019-2020, a mortalidade invernal não ultrapassou os 4%).