suplementação artificial de proteína: alguns dados experimentais

O pólen é a única fonte de proteínas das abelhas e desempenha um papel decisivo na criação de novas abelhas, bem como no desenvolvimento das glândulas nas operárias mais jovens. As abelhas suprem as suas necessidades de aminoácidos e minerais essenciais por meio do pólen. A sua ingestão é essencial para o desenvolvimento dos órgãos internos, em particular do tecido adiposo e das glândulas hipofaríngeas das abelhas.

Quadro com reservas de carbohidratos (mel) e proteína bruta (pão-de-abelha).

Os apicultores mais informados estão cientes que a criação de novas abelhas depende radicalmente do suprimento natural de pólen. Se nenhuma reserva de pólen estiver disponível nos favos e/ou se o campo não estiver a disponibilizar pólen a colónia diminui significativamente a criação, podendo esta ser interrompida.

Tendo estes aspectos em conta, alguns apicultores veteranos procuram, através da suplementação artificial de fontes de proteína (conhecidos como bifes proteicos), manter e/ou mesmo estimular a criação de abelhas novas em épocas de escassez. Vejamos se os dados trazidos por alguns estudos controlados (realizados na Suíça), confirmam esta expectativa.

Alimentação de pólen de primavera (Imdorf A., et al., 1988) 
Como às vezes há falta de pólen na primavera [Suiça], um conjunto de estudos foram realizados em 1986/87 para descobrir se a alimentação suplementar com pólen poderia acelerar o desenvolvimento da colónia nesta época do ano. Verificou-se que esta apenas levou a um aumento temporário na criação, mas não influenciou o desenvolvimento das colónias. Além disso, as diferenças observadas não foram estatisticamente significativas .

Alguns detalhes do desenho experimental e dos dados obtidos: na primavera de 1986 e 1987, dois grupos de 5 e 8 colónias, foram suplementados durante 5 semanas, do final de março ao início de maio, recebendo semanalmente 500 g de pasta de pólen (300 g de pólen de sua própria colheita e 200g água com açúcar 1: 1). De final de março ao final de maio, a população foi medida a cada três semanas (criação e abelhas adultas). Grupos de colónias semelhantes sem nenhuma suplementação serviram como controle.
Ao longo dos dois anos da experiência, foi observado um ligeiro aumento na criação de novas abelhas no início de abril. Três semanas depois nenhuma diferença foi observada na quantidade de criação de novas abelhas entre grupos. Nenhuma diferença entre os grupos foi observada durante e após a alimentação no desenvolvimento da população de abelhas.

Colónia suplementada artificialmente com um bife proteico.


Uns anos antes o mesmo investigador tinha avaliado o impacto da suplementação de pólen e de um substituto de pólen na criação de novas abelhas e no crescimento populacional noutra época do ano.

Alimentação de pólen entre meladas (Imdorf, A., et al., 1984)
Estudos realizados na Suíça com centenas de colónias de abelhas mostraram que o pico populacional é alcançado no final de junho ou início de julho e coincide com um período de baixo suprimento de pólen. Durante e após o fluxo de néctar da floresta/bosque, assiste-se a um rápido declínio na população de abelhas.
Em 1981 e 1982, os estudos focaram-se na possibilidade de desacelerar o declínio da população das colónias entre as meladas, suplementado-as com pólen e seus substitutos. Verificou-se que a criação e a expectativa de vida das abelhas não são influenciadas pela suplementação de pólen. A criação de novas abelhas nas colónias suplementadas com pólen não aumentou em comparação com as colónias não suplementadas. Da mesma forma, nenhuma extensão de vida foi observada. Em algumas colónias, o único efeito da suplementação foi a diminuição da colecta de pólen no exterior. Entretanto um aspecto muito negativo foi observado: uma infecção de cria de giz (ascosferiose) ocorreu em colónias alimentadas com pólen. Por esta razão, na América do Norte apenas pólen irradiado é aconselhado para suplementação.


Durante o intervalo entre as meladas no verão de 1981, um teste de alimentação suplementar foi realizado com pasta de pólen (700 g por 5 semanas; alimentação uma vez por semana; n = 6) e uma pasta feita com substituto de pólen de Protivy (540 g; 160 g Protivy 50, 360 g de água com açúcar 1: 1 e 20 g de pólen; n = 9). Um grupo de colónias não suplementadas serviu como controle (n = 12). A ingestão de proteína não teve influência nos dois grupos na criação de novas abelhas e na população de abelhas e não evitou o declínio da população durante o intervalo entre os fluxos de mel em 1981.

Um suplemento proteico industrial para abelhas (creio que não é comercializado na Europa, a ver se assim não firo susceptibilidades).

Reflexão: sendo muito consensual a importância crítica da nutrição das abelhas (ainda não conhecemos abelhas que sobrevivam na ausência de alimento) esse consenso não existe acerca do impacto da nutrição artificial suplementar, seja de proteína seja de carbohidratos, na aceleração do desenvolvimento da população de colónias de abelhas. Portanto, afirmar como uma verdade absoluta e universal, escrita nas pedras, que esse impacto existe é prematuro. O caso ainda está a ser avaliado e julgado! Do que retiro das minhas observações, com as minhas abelhas, no meu território e com o meu maneio, posso confirmar apenas três coisas muito simples, e que vejo repetirem-se ano após ano:

  • já evitei a morte por fome de inúmeras das minhas colónias com alimentação suplementar na forma de pasta de açúcar;
  • as minhas colónias respondem muito bem à entrada de pólen do campo, que se inicia em meados de fevereiro nos territórios onde tenho assentes os apiários, aumentando generosamente a quantidade de criação e, em regra, arrancam bem e chegam muito bem povoadas a abril/maio;
  • até agora nunca utilizei alimentação suplementar proteica no final do verão/início do outono, e as abelhas têm invernado bem sem ela (este ano, 2019-2020, a mortalidade invernal não ultrapassou os 4%).

nutrição de abelhas: o caso dos probióticos, ou quando mais pode ser menos

A nutrição de abelhas é uma das categorias do meu blog com menos publicações. As razões para tal são várias, entre elas:

  • utilizo de forma comedida a nutrição artificial dos meus enxames;
  • utilizei até agora basicamente dois tipos de nutrição artificial: água com açúcar e fondant;
  • a minha experimentação neste domínio é, portanto, muito conservadora e limitada;
  • não tenho forma de controlar rigorosamente e honestamente os impactos nas minhas colónias para além dos que vou observando macroscopicamente e vou referindo numa publicação ou outra, observações que basicamente se resumem a dizer que o fondant salvou estas e aquelas colónias da morte pela fome nos períodos de escassez;
  • encontro poucos estudos sérios, devidamente controlados, sobre os efeitos de certas fórmulas alimentares, e os poucos que vão surgindo não corroboram muitas das vezes as afirmações dos fabricantes e comerciantes de alimentos artificiais acerca dos benefícios dos mesmos na saúde das abelhas e no bem-estar geral da colónia.

Esta publicação, acerca de uma estratégia de alimentação de abelhas em torno dos probióticos, que está muito na moda em certas regiões do mundo, revela uma vez mais esta dissonância entre a cautela e até cepticismo da comunidade científica e o optimismo (desbragado!?) dos fabricantes e comerciantes destes suplementos alimentares. Surgiu na revista apícola norte-americana Bee Culture, em abril deste ano, um interessante artigo acerca dos alegados benefícios da utilização de duas marcas de probióticos na nutrição das abelhas. Em Portugal creio que a utilização destes suplementos ainda é residual, mas como as modas atravessam fronteiras tão ou mais rapidamente que espécies invasoras, fica aqui o ponto de vista dos investigadores que se debruçaram sobre este tema.

Probiótico: pró significa para, biótico significa vida. Para a vida. Sim, nós somos para a vida. Mais vida, mais e melhor, certo? Talvez. Talvez não. […]

Dois produtos probióticos são comercializados especialmente para abelhas: Super DFM, da Strong Microbials, e Pro DFM, da Mann Lake. (Um terceiro produto, Durvet, da PBS Animal Health, foi descontinuado). O Super DFM e Pro DFM listam os mesmos oito micróbios no seu conteúdo, e o Pro DFM tem uma bactéria adicional mais várias leveduras.
Quais são esses produtos? Nossas abelhas precisam deles? Os resultados dos testes de campo não estão disponíveis para nenhum deles, nem existem artigos científicos publicados revistos por pares que os avaliem.
A entomologista Marla Spivak, da Universidade de Minnesota, pediu a uma estudante de graduação em doutoramento para que no laboratório comparasse os ingredientes desses produtos com o que está no bioma intestinal natural das abelhas. Não houve correspondência…[…]

Nancy Moran [uma das maiores especialistas em genómica de insetos e bactérias] olhou para a lista de bactérias presentes no Super DFM e Pro DFM. “Essas bactérias não são normais no intestino das abelhas. Eu não acho que elas vão colonizar o intestino, e se elas colonizaram eu acho que isso não é bom. As abelhas encontram todos os tipos de bactérias, mas o bioma intestinal permanece o mesmo. As abelhas com microbiomas alterados estão principalmente doentes. O que queremos é que a abelha mantenha a microbiota normal. ” […]

Jay Evans, líder de pesquisa do USDA Beltsville Bee Lab, disse: “Muito mais precisa ser feito com a ciência. Por quanto tempo os probióticos persistem no intestino – um dia, uma estação? Ou eles apenas passam pelo intestino [das abelhas]? As pessoas estão gastando muito dinheiro sem saber o que é. ” O pesquisador não descartou a possibilidade de benefício, dizendo que há trabalhos mostrando alguns resultados positivos para colocar bactérias benignas em abelhas. Mas as perguntas permanecem. […]

O segundo produto probiótico, Pro DFM, informa que ajuda a melhorar a saúde das colónias de abelhas, afeta positivamente as reservas de vitelogenina das abelhas nutrizes, auxilia na fermentação e digestão do pão-de-abelha e não possui resíduos prejudiciais. A página “Mais informações” do site está inactiva e a empresa não respondeu à pergunta. Moran especula que as leveduras na fórmula podem ser um suplemento nutricional.
Quanto a qualquer um dos produtos, ela disse: “Estou céptica. Odeio ver as pessoas desperdiçarem dinheiro. Eu não compraria. ” […]

Alternativamente
Considere a possibilidade de alcançar os efeitos que esses produtos probióticos visam sem a necessidade deles. Um artigo do Spivak Lab prestes a ser publicado mostra o melhoramento do microbioma da abelha na presença de própolis.
Enquanto isso, espera para saber mais sobre esses produtos. Alguns novos dados de pesquisa estão chegar, mas os efeitos de longo prazo levarão anos – se alguém puder monitorá-los por tanto tempo.
Própolis já temos.”

fonte: https://www.beeculture.com/probiotics-pro-for-biotic-life/

o efeito da alimentação/ingestão de xarope de açúcar em colónias de abelhas

Só tenho acesso ao sumário do estudo, e desconheço qual a proporção de açúcar em relação à água presente no xarope mais concentrado e no xarope menos concentrado**. Achei particularmente interessante os pontos 4 e 5 deste artigo de 1961, porque me parece confirmam as minhas observações e reflexões. Nos meus apiários tenho verificado que as colónias que alimento com pasta de açúcar aparentam ter mais área de criação à saída do inverno (fevereiro e março) do que as colónias que não alimento ou alimento menos frequentemente. E para o explicar já tinha colocado a hipótese que isso se deveria ao facto das colónias alimentadas a pasta poderem disponibilizar mais abelhas para a colecta de pólen. Assim sendo, estas colónias estarão em condições de fornecer uma dieta mais adequada tanto às abelhas amas como às larvas em desenvolvimento, porque têm acesso a uma maior quantidade e diversidade de aminoácidos.

  1. “As colónias de abelhas foram alimentadas com xarope de açúcar concentrado ou diluído, ou permaneceram não alimentadas, na primavera, verão e outono de 1958 e 1959.
  2. O xarope mais concentrado foi mais aceite que o diluído em todos os grupos experimentais, mas a desproporção de aceitação de xarope concentrado para o diluído diminuiu ao longo dos dois anos.
  3. A concentração do xarope fornecido não fez diferença aparente no ganho de peso das colónias, provavelmente porque a maior eficiência no armazenamento de xarope concentrado foi compensada pela diminuição no forrageamento produzido nas colónias assim alimentadas.
  4. A alimentação de xarope diluído ou concentrado aumentou a área de criação durante e após a alimentação num ano (mau tempo), mas não teve efeito na área de criação no outro ano (bom tempo).
  5. Enquanto eram alimentadas, as colónias geralmente colectavam mais pólen do que as não alimentadas.
  6. A alimentação de qualquer concentração de xarope provavelmente diminuiu a coleta de néctar quando as condições de forrageamento eram boas e o xarope concentrado pode ter diminuído mais do que o xarope diluído o comportamento de forrageamento.”

fonte: https://www.cambridge.org/core/journals/journal-of-agricultural-science/article/effect-of-feeding-sugar-syrup-to-honeybee-colonies/4A944C6F558D3DB78C3801A03D33AD83

** actualização em 13-01-2021: o grupo A foi alimentado xarope de açúcar concentrado (62% de açúcar) e grupo B xarope de açúcar diluído (40% de açúcar).

alimentar ou não alimentar

[Na Austrália] Ensaios em quatro apiários testando várias estratégias de alimentação suplementar foram conduzidos durante os períodos de inverno de 2003 e 2004.

O objetivo do estudo de 2003 foi verificar se colónias de abelhas com alimentação suplementar aumentariam a sua população durante o período de inverno, com o objetivo de fortalecer prematuramente as colónias antes do início da floração das amendoeiras, em meados de agosto. Ao grupo experimental de colónias foram fornecidos suplementos alimentares (xarope de açúcar, pólen ou uma combinação de xarope de açúcar e pólen) durante o período de inverno e, em contraste, o grupo de controle não foi suplementado.

Neste estudo de 2003, houve diferenças significativas entre os apiários, mas as diferenças não dependeram da suplementação alimentar, e sim da flora local. Não se verificaram diferença significativa nos níveis de proteína bruta nas pupas entre as colónias suplementadas e as colónias não suplementadas. Na medição de outubro, não se verificou um benefício claro sobre aumento da população de abelhas com qualquer uma das práticas alimentares testadas. Além disso, o estudo forneceu evidências de que o fornecimento de suplementos a uma colónia durante o período de inverno pode ter aumentado os níveis de nosema em abelhas adultas.

O objetivo do estudo de 2004 foi avaliar a evolução de população de abelhas em colónias num local com um bom um fluxo de néctar (mugga ironbark,
Eucalyptus sideroxylon) mas deficiente em pólen. No grupo experimental foram usados suplementos de pólen com diversas composições, enquanto que o grupo de controle não foi suplementado.

Os resultados do estudo de 2004 forneceram evidências de que todas as três diferentes preparações de alimentação suplementar tiveram algum benefício. O tipo suplementação com mais benefício foi o pólen que surge em primeiro, seguido pela a mistura de farinha de soja / pólen / levedura e em último farinha de soja. Mesmo assim, as colónias de controle (não suplementadas) produziram mais mel num apiário, portanto, o benefício não foi uniforme nos dois apiários.

Notas de rodapé:

  • A farinha de soja, por si só, como suplemento, era muito mais atraente para as abelhas nos alimentadores colectivos do que quando colocadas em bandejas sob as tampas de cada colmeia.
  • O pólen enquanto suplemento alimentar deve ser de origem muito segura do ponto de vista higiénico ou em alternativa ter garantias que foi irradiado. O pólen de fontes desconhecidas pode ser veículo de esporos de loque americana.
  • Os alimentadores colectivos podem ser veículos de diversas patologias das abelhas.
  • A alimentação suplementar é importante/imprescindível quando usada para evitar a fome.

fonte: https://extensionaus.com.au/professionalbeekeepers/to-feed-or-not-to-fee/#comment-6

Reflexão: mais um caso que confirma o velho e sábio adágio que a apicultura é local. Neste caso verificou-se que os impactos da suplementação alimentar são contingentes do local. A apicultura moderna é contexto, contexto, contexto. Cabe ao apicultor avaliar esse contexto, e até fazer testes, para melhor discernir da necessidade de fazer esta ou qualquer outra opção no âmbito da nutrição dos seus enxames.

suplementos alimentares contra a nosemose: uma revisão da eficácia

Foi recentemente publicado no jornal Frontiers of Veterinary Science (março de 2019) uma resenha de muita da investigação realizada até ao momento em torno da nosemose (em particular a veiculada pelo microesporídio Nosema ceranae). Entre outros tópicos desta interessante resenha bibliográfica, destaco o relacionado com a revisão da eficácia de alguns dos suplementos alimentares mais utilizados no combate e controlo deste microesporídio. Deixo em baixo a tradução de alguns excertos que me pareceram relevantes.

Foto de Randy Oliver (scientific beekeeping)

“Vários suplementos comerciais têm sido estudados quanto à atividade contra a nosemose. […] um complexo de aminoácidos e vitaminas chamado BEEWELL AminoPlus diminui as cargas de esporos e protege as abelhas de imunossupressão, aumentando a expressão de peptídeos antimicrobianos. Dados preliminares sugerem que um suplemento fitofarmacológico comercial, o Nozevit®, pode melhorar a saúde das abelhas diminuindo as cargas de esporos em colónias de abelhas. Investigações adicionais e amostras maiores são necessários para confirmar esses resultados, dado que Van den Heever et al. relataram nenhum efeito do Nozevit® em testes laboratoriais. Um levantamento de 2 anos do suplemento HiveAlive ™, baseado em algas marinhas, relatou uma diminuição nas cargas de esporos nas colónias de abelhas e um acréscimo da população em relação aos controles após a administração de dois tratamentos bienais. Surpreendentemente, a sobrevida das colónias não foi avaliada neste estudo […]

Embora certos extratos naturais e suplementos comerciais tenham mostrado eficácia contra a N. ceranae, existem outros suplementos de produtos naturais anunciados como anti-infecciosos que não têm nenhum efeito benéfico sobre as abelhas infectadas com N. ceranae. Nosestat® e Vitafeed Gold® foram avaliados num ensaio de campo e não tiveram impacto sobre a produtividade das colónias e nos níveis de esporos de Nosema. ApiHerb® e Nonosz® também são vendidos para melhorar a saúde das abelhas e, talvez, tratar a nosemose, mas pesquisas adicionais e mais evidências científicas são necessárias para sustentar alegações de eficácia. Evidentemente, os apicultores devem ser cautelosos sobre quais suplementos e extratos que escolhem para o tratamento de infecções por N. ceranae.

Suplementos Microbianos
A administração de suplementos microbianos pode ter impactos positivos na saúde das abelhas e prejudicar a viabilidade da N. ceranae. Baffoni et al. sugerem que a suplementação da dieta das abelhas com estirpes de bifidobactérias e lactobacilos, que secretam metabólitos antibióticos, reduz os níveis de esporos de N. ceranae. […] Outras estirpes bacterianas e probióticos (Parasaccharibacter apium, Bacillus sp., Bactocell® e Levucell SB) mostraram melhorar a sobrevivência das abelhas infectadas, mas não diminuir as cargas de esporos. Um tratamento anti-Nosema bem sucedido deve melhorar a saúde das abelhas e diminuir os níveis de infecção. Suplementar com probióticos, prebióticos e substitutos do pólen podem realmente exacerbar as infecções e aumentar a mortalidade das abelhas.”

fonte: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fvets.2019.00079/full?fbclid=IwAR0G41kxADN8VZkjycnUg4OoTa5GNrfc6i7bgLASLghgn3wzLdluCQWOYmk#B38

relevância de reservas de mel multifloral para a saúde das colónias de abelhas

Sumário:

Colónias de abelhas oferecem um excelente ambiente para o desenvolvimento de patógenos microbianos. Os agentes bacterianos mais mortais e virulentos, que causam morte das colónias, são as bactérias que causam loque americana e a loque europeia. Além da defesa imunológica inata, as abelhas desenvolveram defesas comportamentais para combater infecções. O forrageamento de compostos de plantas antimicrobianas desempenha um papel fundamental para esse comportamento de “imunidade social”. Os metabólitos secundários das plantas no néctar floral são conhecidos pelos seus efeitos antimicrobianos. No entanto, estes compostos são altamente específicos da planta, e os efeitos na saúde das abelhas dependerão da origem floral do mel produzido. Como as abelhas obreiras alimentam também as larvas e outros membros da colónia, o mel é o principal candidato a agente de auto-medicação em colónias de abelhas para prevenir ou diminuir infecções. Aqui, nós testamos oito linhagens de bactérias de loque americana e loque europeia e a atividade inibitória no seu crescimento em três tipos de mel. Usando um ensaio de crescimento celular, verificámos que todos os méis têm alta atividade inibitória do crescimento das diversas bactérias e que dois méis monoflorais parecem ser específicos na inibição de apenas algumas estirpes de bactérias. A especificidade dos méis monoflorais e o forte potencial antimicrobiano do mel multifloral sugerem que a diversidade de méis presentes nas reservas de mel de uma colónia pode ser altamente benéfica para a sua “imunidade social” contra o conjunto altamente diversificado de patógenos encontrados na natureza. Essa diversidade ecológica pode, portanto, operar de forma semelhante aos efeitos bem conhecidos da variação genética do hospedeiro na corrida “às armas” entre hospedeiro e parasita.”

Aspectos de detalhe

“Durante a estação floral, as forrageiras colectam sequencialmente um conjunto de néctares florais, que são armazenados nos favos de mel. A seletividade da fonte de alimento da colónia em termos de néctar, como comportamento de decisão seletivo por abelhas forrageiras, é um processo de seleção natural entre fontes alternativas de néctar, incluindo eficácia e comunicação (Seeley et al., 1991). Assim, as forrageiras podem escolher entre uma mistura complexa de diferentes néctares, porque as reservas de mel se sobreporão à disponibilidade de flores que muda sazonalmente. […] Como o mel é o nutriente central para o desenvolvimento de larvas, a diversidade nas reservas de mel pode servir como uma “farmácia injetável” ricamente abastecida contra uma ampla variedade de doenças. Durante os primeiros 2 dias após a eclosão do ovo, a dieta larval consiste principalmente de componentes secretados pelas glândulas hipofaríngeas das abelhas, presumivelmente misturadas com mel. No entanto, a partir do terceiro dia, o mel e o pólen são adicionados à dieta e alimentadas diretamente às larvas das obreiras (Winston, 1987). Assim, as abelhas nutrizes estão na posição central da teia alimentar intracolonial e podem fornecer um mecanismo para promover o estado de saúde da colónia, alimentando seletivamente méis específicos em resposta a infecções específicas. Na verdade, as abelhas nutrizes têm demonstrado escolher o mel de acordo com seu próprio estado de saúde (Gherman et al. 2014). […] Além disso, as abelhas mostraram um forrageio selectivo entre resinas específicas, mesmo discriminando plantas resinosas estreitamente relacionadas (Wilson et al. 2013). Os autores concluíram que as abelhas podem fazer escolhas discretas entre as espécies de plantas de resina, confirmando ainda mais a comportamento seletivo entre os recursos específicos de promoção da saúde, independentemente da sua disponibilidade.[…]

Se as reservas de mel multifloral facilitarem a saúde das colónias, isso não seria apenas uma conquista evolutiva importante das colónias de abelhas, mas também teria profundas consequências para as práticas de apicultura. Os apicultores podem aproveitar os fluxos específicos de mel para proteger suas colónias contra doenças específicas. Além disso, os apicultores devem estar cientes de que a produção exclusiva de méis monoflorais pode ter consequências negativas para a saúde das colónias. Além disso, a alimentação de açúcar como fonte exclusiva de alimento durante o inverno pode aumentar a propensão da colónia para ser infectada por patógenos. Em conclusão, a biodiversidade floral de fontes de néctar para a colónia terá implicação direta para a saúde da colónia, com importância semelhante à diversidade genética da abelha.”

fonte: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/ece3.1252

Notas:

  • já se sabe há algum tempo que as dietas monoflorais provocam danos ao nível individual e ao nível da colónia de abelhas. Se estou certo as explicações enfatizava sobretudo a monodieta de pólen. Estes e outros estudos ajudam a identificar e compreender melhor e de forma mais abrangente os aspectos subjacentes a este fenómeno;
  • reforço que os autores mencionam que o açúcar como fonte exclusiva de alimento durante o inverno pode fragilizar as defesas da colónia.

as abelhas melíferas (Apis mellifera) nutrizes não consomem pólen com base na sua qualidade nutricional

As abelhas melíferas (Apis mellifera) consomem uma variedade de pólens para responder à maioria de suas necessidades de proteína e lipídos. Trabalhos recentes indicam que as abelhas preferem dietas que refletem a proporção adequada de nutrientes necessários para a sobrevivência e à homeostase. Esta ideia baseia-se no preceito de que as abelhas avaliam a composição nutricional dos alimentos que lhes são fornecidos . Enquanto isto foi evidenciado nos abelhões (bombus sp), os dados actualmente disponíveis para as abelhas melíferas são equívocos. Além disso, há controvérsias sobre se as forrageiras podem avaliar o valor nutricional dos pólens, especialmente porque não o consomem. Neste estudo, focamo-nos nas abelhas nutrizes, que comem a maior parte do pólen que entra na colmeia. Testámos a hipótese de que as abelhas nutrizes preferem dietas com maior valor nutricional. Determinámos primeiro o perfil nutricional dos pólens, o número de plantas disponíveis (riqueza floral) e o grau de crescimento da glândula hipofaríngea provocado por três pólens coletados pelas abelhas. Em seguida, apresentámos às abelhas nutrizes esses mesmos três pólens em testes de escolha emparelhada e medimos o consumo. Para testar se a preferência nutricional era influenciável, também apresentámos às abelhas pólens naturais suplementados com proteínas ou lipidos e dietas líquidas com percentagens proteicas e lipídicas iguais aos pólens naturais. Diferentes pólens provocaram diferentes graus de crescimento da glândula hipofaríngea, mas, apesar dessas diferenças, as abelhas nem sempre preferiram os pólens mais nutritivos. A adição de proteínas e/ou lipidos a pólens menos desejáveis ​​aumentou um pouco a atractividade do pólen, e as abelhas nutrizes não demonstraram uma preferência maior por nenhuma das três dietas líquidas. Concluímos que diferentes pólens fornecem diferentes benefícios nutricionais, mas que as abelhas nutrizes não podem ou não avaliam o valor nutricional do pólen. Isto diz-nos que as abelhas nutrizes podem não conseguir transmitir informações sobre a qualidade do pólen para as abelhas forrageadoras, que regulam os pólens que entram na colmeia.

fonte: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0191050

Em resumo, as abelhas, como nós, nem sempre fazem as escolhas mais acertadas no que respeita à sua dieta. Será de perguntar se os comedouros colectivos de proteína misturados com hidrato de carbono (açúcar) e cheios de abelhas serão o indicador suficiente e inequívoco do valor nutricional da mistura. Ou ao contrário, questionar se uma mistura menos atractiva per si quererá dizer necessariamente que tem menos valor nutricional. Lembro-me rapidamente das couves de Bruxelas e de como o seu elevado valor nutricional não tem correspondência com a pouca vontade que tenho de as consumir.

paragem de postura durante o inverno?

Durante o inverno, e na zona onde os meus apiários estão localizados, as temperaturas diurnas entre os 3ºC – 7ºC  tendem a ser um acontecimento normal e frequente. Com estas temperaturas externas alguns de nós pensarão que as rainhas páram a postura. Ainda que possam estar correctos algumas vezes, o mais provável é estarem afastados da realidade na maioria dos casos.

Tom Seeley e Kirk Visscher descobriram que a postura de ovos começa no momento em que a temperatura média máxima diária atinge cerca de 4 ºC, e se intensifica grandemente se as temperaturas médias diárias se situam entre 5° – 15°C.

Estes investigadores verificaram que este aumento de criação ocorre meses antes do pólen natural estar disponível, e provoca um aumento considerável do consumo de mel/reservas. Isto, claro, aumenta o risco de uma colónia morrer por fome durante o período invernal, mas é um risco que a colónia aceita naturalmente, porque indispensável para que atinja a população de abelhas necessárias ao bom aproveitamento dos fluxos de néctar que virão. Também para  apicultor a criação de abelhas novas nestas condições extremas é crítica para delas tirar os proveitos que o seu trabalho e investimento justificam.

A minha estratégia de suplementação alimentar nos últimos três anos tem sido muito simples e bem sucedida: mais do que estimular a postura da rainha nos meses de Janeiro a Março com suplementos líquidos, procuro dar às minhas colónias o apoio necessário nesta altura do ano, com alimento na forma de pasta de açúcar (fondant), para que elas façam o que entendem e sabem fazer tão bem sem passarem fome e cresçam de forma equilibrada e em sincronia com o seu meio envolvente.

Nota: se e fosse criador de rainhas ou se tivesse contratos de polinização para cumprir a minha estratégia de suplementação de alimentos seria diferente. Tenho que ter, no entanto, o bom senso de não seguir as estratégias de alimentação levadas a cabo por apicultores que têm objectivos tão diferentes dos meus.

Fig. 1: Um exemplo de uma mal-gerida alimentação de estimulação. Esta colónia vai morrer. Vejamos como ela teve recentemente uma grande área de criação, como evidenciado pelo anel de pólen recém-coletado. Mas a sua população de abelhas adultas diminuiu mais rápidamente do que as novas abelhas que foram sendo criadas. O cacho de abelhas foi incapaz de cobrir a criação selada e uma geada e temperaturas mínimas muito baixas, conduziram a que boa parte da criação ficasse congelada e fosse removido no dia seguinte. As elevada mortalidade abelhas adultas nesta época do ano pode ser provocada pela Nosema ceranae.

fonte: Seeley, TD and PK Visscher (1985). Survival of honeybees in cold climates: the critical timing of colony growth and reproduction. Ecological Entomologyhttp://scientificbeekeeping.com/understanding-colony-buildup-and-decline-part-3/

um outono de 2017 como o de 2015?

O outono deste ano começa a assemelhar-se muito ao outono de 2015. Aqui está descrito o que fui observando e fazendo nos meus apiários da Beira Alta e Beira Litoral nesse ano.

A necessidade de efectuar alimentação de manutenção de uma boa parte das colónias poderá surgir como surgiu nesse outono. Vou estar atento como o fiz nesse ano!

que colónias alimentar no outono/inverno

Que colónias alimentar no outono/inverno? Esta é uma questão que nos interpela todos os anos à entrada do outono/inverno.

Em princípio devemos alimentar todas as colónias que apresentem um nível de reservas de mel baixo. Como decidir se o nível de reservas é baixo. Neste post indicámos que o consumo de mel pode variar de acordo com o número de abelhas presentes na colónia. Tomemos como referência o consumo de 2,7 Kg de mel  durante um mês. Se considerarmos que nos meses de Outubro a Janeiro as abelhas pouco ou nenhum néctar fazem entrar na colmeia (esta é a realidade nos meus apiários na Beira Alta), então durante estes 4 meses consumirão 10-11 Kg de mel das sua reservas. Nos meus apiários julgo que consumirão menos porque as baixas temperaturas, mais ou menos habituais por aqueles lados, levam-nas a formar o cacho invernal e portanto a diminuir as suas necessidades energéticas. Mas vamos manter aquele valor como referência, porque neste caso mais vale pecar por excesso. Sendo assim necessito que as colmeias me apresentem pelo menos 4 quadros Langstroth ou Lusitana no ninho bem cheios de mel (que deverão somar 10 a 12 Kg de mel) para ficar tranquilo acerca do seu adequado nível de reservas para passarem estes 4 meses.

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Fig. 1: Quadro cheio de mel maduro em toda a sua superfície

Como avaliar o nível de reservas? A maior parte dos apicultores faz uma pesagem das colónias para verificar o nível de reservas. A forma mais expedita de o fazer é levantar a parte detrás da colmeia. Este tipo de avaliação permite ter uma noção grosseira do nível de reservas de uma colmeia. Há quem faça uma pesagem mais rigorosa recorrendo a uma balança ou dinamómetro (ver aqui uma forma de pesagem das colmeias).

Como calcular o peso real das reservas de mel? Sabendo o peso da colmeia vazia com quadros (há variações dependendo sobretudo do modelo em questão assim como da madeira utilizada na sua construção), sabendo que o peso aproximado das abelhas, numa colónia a invernar, não deverá passar muito os 1,5 kg (7 000 abelhas pesam cerca de 1 Kg e ocupam 3 a 4 quadros do modelo Langstroth) e se adicionarmos mais 2 a 3 Kg para o peso da cera nos 10 quadros, e subtraindo estas parcelas ao peso total, a diferença deverá representar o mel e pólen armazenado no interior da mesma. Retirando o peso do pólen armazenado temos finalmente um valor muito aproximado do peso das reservas de mel. Se estas forem superiores a 12 Kg e nos meus apiários da Beira Alta fico bastante tranquilo.

No papel é fácil. E no campo? Contudo se no papel esta avaliação até é muito simples no campo tudo se complica. A primeira dificuldade passa por pesar com algum rigor cada colmeia. A balança tipo dinamómetro é utilizada para este fim por alguns apicultores, como já vimos. No entanto outros equipamentos são utilizados (ver aqui).  A segunda dificuldade, e na minha opinião a maior, é fazer uma estimativa aproximada do peso do pólen numa colónia estabelecida para o descontar e finalmente alcançarmos um número confiável do peso que as reservas de mel têm.

Dois caminhos, qual escolher? No ano passado para eliminar esta angústia acabei por alimentar todas as 400 colmeias que invernaram nos apiários da Beira Alta (ver aqui). Decidi pecar por excesso e pagar a factura, literalmente. Este ano estou a fazer uma abordagem um pouco diferente. No final de Outubro e nos primeiros dias de Novembro, dei uma volta às 600 colmeias que tenho a invernar, abri-as e fiz uma observação rápida dos 4 quadros laterais (2 de cada lado) para a avaliar o mel efectivamente armazenado. Para isso levantei os quadros mais laterais. Com base nestas observações classifiquei as colónias em quatro categorias: fracas, médias, médias mais, e fortes. Destas quatro categorias estou a alimentar as colónias incluídas nas 3 primeiras.

As minhas observações dizem-me para não confiar numa observação “por cima” dos travessões dos quadros, porque alguns destes tendo uma pequena abobada de mel, que nos podem induzir em erro quando observados “por cima”, apresentam efectivamente a maior parte da sua superfície vazia ou preenchida com pólen.

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Fig. 2: Visão habitual de uma colmeia vista “por cima”

Se estes quadros estiverem vazios o método que eu utilizo, levantar ligeiramente a colmeia pela parte detrás, dá-me uma ideia que esta colmeia está a necessitar de alimento suplementar. Contudo se estes quadros estiverem carregados de pólen podem iludir-me, levando-me a sobrestimar a quantidade de mel armazenado.

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Fig. 3: Quadro em que a maior área está ocupada com pólen

Com a abordagem que estou a utilizar este ano espero que o custo por colmeia com a alimentação suplementar desça cerca de 1/3, e que no final a minha despesa global com 600 colmeias a invernar não ultrapasse a despesa que o ano passado tive ao invernar um pouco mais que 450 colmeias. Mas como prognósticos só no fim vamos ver como corre este ano.