o catedrático que acarreta pedras

Soube ontem que um apicultor veterano da nossa praça, resolveu destratar-me nas minhas costas chamando-me depreciativamente de apicultor “catedrático”. Não fico admirado que alguns não gostem de mim, vivo bem com o desamor/ódio de alguns. Nunca procurei agradar a ninguém. E apesar disso (ou por isso) agrado a muitos mais. Vamos aos factos.

Sei de fonte muito segura, através das estatísticas do WordPress, o servidor que abriga este blog, que as minhas publicações são vistas, em média, por cerca 10 mil leitores todos os meses (destes, 70% são leitores frequentes). Os leitores atentos já perceberam há muito que não sou de dar receitas. Que não sou de ter certezas. Que procuro sempre circunstanciar as minhas observações aos meus apiários, no seu território. Que tenho uma aversão a proclamar verdades universais e absolutas. Que apenas me atrevo a dizer o que faço, porque o faço, e que resultados obtenho. Alguns leitores, que vão escrevendo no espaço dos comentários, dizem-me que algumas das minhas opções também têm resultado quando as ensaiam nos seus apiários. Alguns mais corajosos, digo eu, têm inclusive dado os seus testemunhos que aqui tenho publicado com muito gosto. É este respeito que tenho conquistado entre os mais novos, mas inclusivamente entre os “mestres” da nossa praça, ainda que não o admitam (nunca o admitirão, eu sei).

Se estas publicações fossem de um arrogantezinho catedrático, que publica um conjunto de tretas sem adesão com a realidade, então 10 mil leitores/mês seriam uns néscios. Mas não, não o são! São pessoas como eu, apaixonados pelas abelhas e com mais dúvidas informadas que com certezas cegas, à procura de um caminho para fazer melhor e com o espírito aberto.

Se sou um “catedrático”, sou um catedrático com muitas dúvidas, que sustenta o que diz e faz no que observa e que, quando não é possível observar, vai e lê o que observam os investigadores em experiências devidamente controladas. Se sou um catedrático é porque tenho aversão a afirmações peremptórias fruto de “achismos”, porque tenho uma atitude de cepticismo informado e sou muito mal-disposto com os vendilhões de ilusões, que não fazem a arte avançar, apenas procuram o lucro com os incautos ao virar de cada esquina. Para estes não tenho complacência, daí não gostarem de mim nem das minhas intervenções.

O mais belo e eterno livro escrito em língua portuguesa, os Lusíadas, termina os seus dez cantos com a palavra “inveja”. Das poucas certezas que tenho, sei que quem me apelida de catedrático sofre do pior mal que acomete frequentemente alguns portugueses, o mal de inveja.

Hoje fiz 300 km de urgência e andei a fazer o meu trabalho, sem o adiar para um dia em que já é tarde demais. Andei a colocar pedras sobre os tectos das colmeias para não levantarem voo com as rajadas de vento que se prevêem nos próximos dias. Hoje, uma vez mais sujei as mãos, transpirei, fiz o que tinha que fazer para conseguir o que poucos conseguem no nosso país: viver exclusivamente das abelhas (e ainda ter algum tempo para outras coisas, como ir escrevendo uma linhas neste blog).

Ah, e sou pouco dado a um outro mal, que me parece demasiado frequente nas nossas gentes, e que o meu querido filho tão certeiramente apelidou de “ofendidismo”. Como não me dou a esses achaques, não vou deixar de publicar e comentar o que desejar e me apetecer. E que outros “catedráticos” apareçam a descrever o seu trabalho no campo e as leituras e os conhecimentos actualizados que vão adquirindo. Que falta fazem!

Leio investigação controlada à segunda-feira e acarreto pedras para colocar sobre as minhas colmeias à terça. Esta é uma frase que me define de forma cristalina.

viabilidade de imagens térmicas na detecção de ninhos da Vespa velutina

“Resumo: A Vespa velutina é uma espécie invasora de vespas que está a colonizar a Europa, provocando impactos consideráveis ​​nas abelhas, na apicultura e na biodiversidade. As estratégias de controle e alerta precoce baseiam-se principalmente em planos de monitorização e procedimentos de detecção e destruição de ninhos. Ferramentas tecnológicas (radar harmónico e radiotelemetria) têm sido desenvolvidas para aumentar as probabilidades de detecção de ninhos em novos surtos. Uma vez que as vespas são capazes de regular a temperatura do ninho, a termografia pode representar uma técnica adicional que pode ser usada, tanto isoladamente quanto em apoio a outras técnicas. Neste estudo, a viabilidade da imagem térmica na detecção de ninhos de V. velutina foi avaliada em condições controladas. A influência de diferentes variáveis ​​ambientais e operacionais (hora do dia, presença / ausência de folhas cobrindo o ninho, distância entre o ninho e o operador) foi testada em três ninhos detectados em agosto de 2018 na Itália. Todos os ninhos foram detectados por imagens térmicas, mas as variáveis ​​ambientais e operacionais afetam sua detecção. A diferença de temperatura entre os ninhos e os arredores atinge o máximo antes do nascer do sol e sem a cobertura das copas das árvores. Embora os ninhos fossem visíveis em alguns casos a partir de 30 m, a detectabilidade foi maior em distâncias menores, mesmo que essa variável também possa depender da resolução da câmera infravermelha. Um aumento na temperatura ambiente também gera uma diminuição na detectabilidade do ninho. Embora possam ocorrer algumas limitações, esses resultados mostram a aplicabilidade da termografia na detecção de ninhos de V. velutina antes do início da fase reprodutiva e, consequentemente, sua potencialidade em estratégias de controle.”

Aplicação de imagens térmicas para detecção de ninhos de V. velutina: (A) ninho número um; (B) ninho número dois; (C) ninho número três; (D) ninho número um pela manhã a 30 m do operador; (E) ninho número um à noite a 30 m do operador.

“[…] O aumento da temperatura ambiente durante o dia pode limitar a detectabilidade dos ninhos, devido à maior temperatura do ar e à presença de raios solares na folhagem das árvores. Além disso, V. velutina é predominantemente diurna; uma vez que a temperatura do ninho está positivamente correlacionada com o número de indivíduos dentro do ninho, pode-se supor que a diferença de temperatura entre o ninho e seu meio envolvente está no seu máximo antes do nascer do sol, quando todos as vespas ficam dentro do ninho e a temperatura ambiente do entorno atinge o mínimo. Pelo contrário, a detectabilidade diminui após o nascer do sol, quando a temperatura ambiente atinge valores semelhantes à temperatura interna dos ninhos de vespas. Isso pode representar um limite no uso destas câmeras em países do sul da Europa caracterizados por altos valores de temperatura durante o verão, enquanto em países mais frios esta variável pode ter menos influência na detectabilidade do ninho. A distância entre o ninho e o operador que realiza a amostragem parece influenciar a detectabilidade do ninho, mas este efeito pode estar relacionado com resolução da câmera usada para este estudo (320 × 240 px). Uma vez que câmeras de infra vermelhos com uma resolução mais alta estão disponíveis no mercado (por exemplo, 1024 × 768 px), é possível supor que o efeito desta variável pode diminuir com um equipamento de qualidade superior, com um consequente aumento na detectabilidade do ninho.[…]”

fonte: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/1744-7917.12760

vespa velutina em confronto com cinco vespas nativas da Coreia do Sul

Na publicação anterior escrevi: “Os níveis populacionais de V. velutina são bastante baixos na Ásia em comparação com a Europa, provavelmente devido à competição com muitas outras espécies de Vespa por recursos alimentares e locais de nidificação (Matsuura, 1984).” Apresento em baixo o sumário de um estudo sul coreano, publicado em 2020, sobre a agressividade interespecífica da exótica V. velutina nigrithorax (introduzida na Coreia do Sul em 2003) e cinco outras espécies de vespas nativas.

Comportamento agressivo entre uma vespa alienígena invasora, Vespa velutina, e cinco espécies de vespas nativas coreanas (Vespa simillima, Vespa mandarinia, Vespa analis, Vespa crabro e Vespa dybowskii).
A: mordendo, V. velutina morde V. simillima usando suas mandíbulas, B: levantando antenas e sacudindo as asas, V. mandarinia ameaça V. velutina levantando sua antena e sacudindo suas asas quando V. velutina se aproxima, C: matando, V. mandarinia caça V. velutina, D: forçando para baixo e jogando, V. analis atira V. velutina, E: batendo ou empurrando com a cabeça, V. crabro empurra V. velutina com sua cabeça, F: abre a mandíbula, V. dybowskii ameaça V .velutina com suas mandíbulas. Códigos das espécies: vel: V. velutina, sim: V. simillima, homem: V. mandarinia, ana: V. analis, cra: V. crabro, dyb: V. dybowskii.

“Título: Hierarquias interespecíficas de agressividade e tamanho do corpo entre a vespa alienígena invasora, Vespa velutina nigrithorax e cinco vespas nativas na Coreia do Sul

Sumário: A vespa alienígena invasora, Vespa velutina nigrithorax, tem-se expandido continuamente desde sua invasão da Coreia em 2003. Aqui, comparamos os comportamentos agressivos e o tamanho do corpo da V. velutina nigrithorax com cinco espécies de vespas nativas para identificar as hierarquias interespecíficas que contribui para a propagação desta espécie. Os comportamentos agressivos foram classificados em 11 categorias e cada interação foi pontuada como vitória, derrota ou empate. Como resultado, V. velutina foi superior a V. simillima em 153 lutas em que V. velutina venceu 71% e apresentou uma alta incidência de comportamento ameaçador. V. mandarinia superou V. velutina em 104 lutas onde V. mandarinia ganhou 91% e o comportamento de agarrar foi frequente. V. analis foi superior a V. velutina em 67 lutas em que V. analis venceu 76% e mostrou uma alta quantidade de comportamento ameaçador. V. crabro foi superior a V. velutina em 93 lutas em que V. crabro venceu 73% e apresentou um alto índice de comportamento ameaçador. V. dybowskii foi superior a V. velutina em 132 lutas em que V. dybowskii venceu 91%, e apresentou um alto índice de comportamentos de ameaça e luta. O tamanho corporal de V. velutina era maior do que V. simillima (embora não estatisticamente significativo) e menor do que todas as outras espécies de Vespa. Portanto, de acordo com os resultados deste estudo, as baixas hierarquias interespecíficas de V. velutina parecem ser uma das principais causas de taxas de propagação mais lentas do que tem mostrado na Europa. No entanto, com o tempo, sua densidade foi aumentando gradualmente no interior da floresta, na qual parece estar superando suas desvantagens e expandindo seu alcance, possivelmente porque grandes colónias e boas habilidades de voo facilitam a obtenção de alimento.”

fonte: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0226934

vespa velutina: repostas a questões de um companheiro apicultor

Um companheiro apicultor colocou-me algumas questões num grupo de apicultores do Facebook. Como me questionou sobre aspectos do ciclo de vida das V. velutinas e da biologia dos reprodutores (machos e fundadoras), frequentemente abordados por muitos de nós, decidi responder neste espaço para lhes dar outra visibilidade. As respostas obviamente não decorrem das minhas observações pessoais, sim das observações que investigadores fizeram no terreno ao longo dos últimos anos. Estas observações foram realizadas em território francês, contudo são confirmadas por observações realizadas noutras zonas do mundo. Em Portugal as coisas passar-se-ão da mesma forma? A minha ideia é que em alguns aspectos sim, noutros poderá haver diferenças. Por exemplo, tenho ouvido referências pontuais indicando que a hibernação das fundadoras no litoral terá um período muito mais curto ou será mesmo inexistente. Não me surpreende que assim seja. Sabemos que as velutinas despertam da sua hibernação com temperaturas diurnas acima dos 12-13ºC; sabemos que no litoral os recursos nectaríferos estão presentes e são relativamente abundantes no outono/inverno; na conjugação destes dois factores em regiões do litoral do nosso país pode estar a explicação para o curto período de hibernação ou mesmo a sua inexistência. Tendo em consideração que se trata de seres vivos, cujo ciclo de vida é condicionado por factores abióticos (temperatura e humidade) o estudo do seu ciclo de vida deve ser cada vez mais local. Enquanto não disponho de dados locais publicados vou-me socorrendo dos estudos existentes, que no pior dos casos serão uma aproximação à realidade local.

Ciclo de vida comumente divulgado e aceite pelas entidades oficiais, baseado em estudos internacionais (a imagem da vespa colocada no hexágono relativo ao mês de novembro não corresponde a uma V. Velutina, um pormenor!).

P: Neste momento existem ou não machos para fecundar as vespas? R: A esmagadora maioria dos machos de V. velutina é produzida no outono, juntamente com as fundadoras (fenómeno de sincronização do surgimento dos indivíduos reprodutores comum nas vespas desta e outras espécies). Contudo tem-se encontrado ninhos na primavera com muitos machos. Estes machos primaveris e precoces aparentam ter um potencial reprodutivo mais limitado. Por outro lado é invulgar encontrar futuras fundadoras para acasalar nessa altura precoce do ano. Julga-se que a longevidade média dos machos não deverá ultrapassar os 40 dias.

Dimorfismo sexual em Vespa velutina. A: cabeças masculinas (esquerda) e operárias (direita) de V. velutina. B: Visão ventral do abdómen de um macho de V. velutina. As setas indicam a localização dos dois pequenos pontos característicos deste sexo. C: Visão ventral do abdómen de uma operária de V. velutina. O abdómen é pontiagudo e aqui o ferrão é visível (seta). (Fotos J. Poidatz).

P: Se a rainha morrer alguma obreira passa a por ovos? R: Rainhas e operárias têm ovários com um número semelhante de ovaríolos, bem como uma espermateca. A morte das rainhas, permite que algumas operárias desenvolvam seus ovários (Spradbery 1973) e ponham óvulos não fertilizados (haplóides), que darão origem a machos (Foster & Ratnieks 2000).

P: Na literatura as vespas só fecundam em outubro/ novembro e depois hibernam. Sabe-me dizer se é assim? R: Para o sucesso da espécie é necessário que a emergência/”nascimento” de machos férteis e futuras fundadoras seja síncrona, isto é, aconteça na mesma altura do ano. Do que se observou até agora esta sincronia acontece nos meses de outono. As fundadoras fecundadas hibernam isoladamente ou em pequenos grupos de 2 ou 3 fundadoras. Saem da hibernação quando as temperaturas sobem acima de 12-13 ºC num período de vários dias seguidos. Só depois de hibernarem completam a maturação dos ovários e iniciam a postura.

P: O que come a rainha? R: líquidos açucarados que recebe das obreiras e líquidos açucarados ricos em aminoácidos que recebe das regurgitações das larvas.

Nota: Os níveis populacionais de V. velutina são bastante baixos na Ásia em comparação com a Europa, provavelmente devido à competição com muitas outras espécies de Vespa por recursos alimentares e locais de nidificação (Matsuura, 1984). Na França, densidades extremamente altas de ninhos foram relatadas: 8 ninhos por km2 em zonas rurais a 23 ninhos por km2 numa área urbana (Franklin et al., 2017).

Fonte principal: De la biologie des reproducteurs au comportement d’approvisionnement du nid, vers des pistes de biocontrôle du frelon asiatique Vespa velutina en France,  Juliette Poidatz;

Fonte secundária: https://www.cabi.org/isc/datasheet/109164

vespa velutina: módulo protector de alvado

Deixo em baixo o vídeo e a tradução de um texto informativo sobre o módulo protector de alvado ApiAvant, da empresa Serpa. A intenção é dar ideias a todos nós sobre certos pormenores e como todos eles poderão ser importantes para aumentar a eficácia deste tipo de protectores de alvado. O meu agradecimento ao José Sá que me chamou a tenção para ele.

“Este módulo de proteção foi testado por 3 anos pela empresa SERPA, empresa dedicada à erradicação da vespa velutina. É 100% compatível com colmeias Dadant e Langstroth (também transumância).

  1. Impede a entrada da vespa asiática na colmeia, e também impede a entrada de vespas, bombus terrestres (potenciais portadores de varroa) e outros insetos e animais, gerando um ambiente de segurança e não de intimidação (o enxame funciona com fluidez normal mesmo que a vespa asiática esteja voando no exterior).
  1. Permite uma grande aceleração da abelha ao sair e entrar na colmeia, enquanto a vespa asiática continua em voo flutuante estático do lado de fora. Nesta situação, é muito mais difícil para a vespa asiática caçar as abelhas.
    .
  2. Mimetismo: as cores e a forma de pintar o filtro frontal evitam que a vespa asiática veja a tempo de onde as abelhas saem, aumentando grandemente as possibilidades de as abelhas escaparem com sucesso.
  1. Efeito sónico: ao instalar o módulo, o efeito “caixa de ressonância” é criado, fazendo as vespas acreditarem que estão na frente de um grande enxame de abelhas e manter as vespas do lado de fora com um voo flutuante estático e ineficiente para a vespa (a vespa normalmente não se atreve a entrar no módulo por medo de ser atacada pelo que pensa ser um grande enxame de abelhas).
  1. Efeito térmico: o módulo exerce um efeito regulador da temperatura muito positivo para a colmeia, especialmente no outono e no inverno. No verão, os dois painéis laterais ajudam a ventilar e aclimatar o módulo (além da vibração exercida pelas abelhas que vai ajudar a baixar a temperatura do módulo e o efeito sónico como uma caixa de ressonância que espantará as vespas).
  1. Ajuda a prevenir a varroa: o módulo impede a entrada de bombus terrestre (considerado um potencial portador de varroa). Recomenda-se que o módulo seja deixado instalado até o início da primavera. No início da primavera, o módulo será desinstalado, pois é quando os zângãos devem sair para acasalar com a rainha (após o que ela será reinstalada em julho).
  1. As abelhas entram e saem com o pólen com total fluidez.”

Nota: a intenção desta publicação é unicamente informativa, nomeadamente pretendo realçar como certos detalhes poderão ter um efeito importante na eficácia global deste tipo de dispositivos protectores de alvado. Não tenho experiência para poder fazer uma avaliação do mesmo.

diminuir a pressão das velutinas à entrada do alvado: os dados preliminares de um amigo apicultor

Depois desta publicação de fevereiro de 2020 alguns apicultores, eventualmente inspirados pelo seu conteúdo, começaram a ensaiar as muselière no nosso país (focinhos, em tradução literal).

O Sr. Anibal Caratão teve a amabilidade de me relatar os dados preliminares que observa assim como me enviou fotos destes dispositivos, que passarei a denominar “gaiola anti pressão”, segundo sugestão do André Gonçalo.

“Este tipo de gaiola está em experiência, tira um pouco a pressão, não obstante por aquilo que hoje observei a vespa entra até à rampa de voo agarra na abelha mas não consegue passar c/ela pela rede largando-a. Penso que não deve ser colocada com a vespa a pressionar para que as abelhas se adaptem a passar na rede com naturalidade” (Anibal Caratão).
“Esta gaiola que se acopla à colmeia com 2 garrafas na lateral que levam agua c/sabão ou detergente de louça, embora esta se encontre neste momento em experiências, dos dados preliminares que observo têm algum significado na pressão provocada pelas vespas. Têm ainda a função de captura das mesmas.” (Anibal Caratão)
“Este é o resultado ao fim de uma semana. Pela análise feita fico satisfeito com o resultado, embora me pareça que a colocação da mesma deve ser feito mais cedo na época, que não seja quando as abelhas já estão pressionadas pela velutina.” (Anibal Caratão)

estudo da distribuição de alimentos em ninhos de Vespa velutina e suas implicações na estratégia de controlo por meio de Cavalos de Tróia

Praticamente desde a sua publicação, em 2017, que conheço a magnífica tese de doutoramento de Juliette Poidatz em torno da biologia dos elementos reprodutores da espécie Vespa velutina (fundadoras e machos) e da colecta e distribuição de alimento nos ninhos das mesmas.

O estudo da distribuição de alimentos no interior dos ninhos das velutinas tem diversas implicações práticas, nomeadamente na afinação da estratégia de controlo das suas populações com recurso aos designados Cavalos de Tróia.

A autora escreve (pg. 116 e segs.) “Atualmente, nenhuma prática de controle eficiente pode ser aplicada contra V. velutina, exceto a destruição de seu ninho, que é demorada e bastante cara (Monceau et al. 2014a). O estudo da distribuição de alimentos entre os membros da colónia de V. velutina poderia, assim, permitir uma aplicação posterior, por exemplo, no auxílio ao desenvolvimento de estratégias de Cavalo de Tróia, que consiste em oferecer comida para forrageadoras como isca, contaminada com agentes de controle biológico (por exemplo, fungos entomopatogénicos, toxinas biológicas, ou parasitas (Naug & Camazine 2001)), ou agentes inseticidas (por exemplo, reguladores de crescimento, inibidores da síntese de quitina …), embora tais estratégias tenham que ser primeiro verificadas quanto à ausência de efeitos colaterais inaceitáveis ​​para o ambiente. Tal estratégia foi proposta contra a invasora Vespula germanica na Nova Zelândia, e até o momento é a única eficaz (Beggs et al. 2011).
No presente trabalho, analisámos como as operárias distribuíram os alimentos que coletaram entre os membros de suas colónias, utilizando colónias de diferentes de tamanho e estrutura variáveis, usando dois tipos de marcadores de alimentos não radioativos: rubídio (Rb) para proteínas e césio (Cs) para açúcares.”

“Cada operária do controle positivo, libertada no seu ninho, distribuiu alimento a um número muito variável de indivíduos (considerando todas as castas), com uma média ± desvio padrão de 7,85 ± 6,71 [2-21] indivíduos para proteínas marcadas e 11 ± 9,73 [2-27] indivíduos para o açúcar marcado.[…] Em comparação com as formigas, o número de indivíduos alimentados por uma operária parece ser muito pequeno tanto para açúcar quanto para proteínas, em média 10 para as vespas […] Ovos e larvas receberam proteínas com mais frequência do que açúcar, enquanto as operárias receberam açúcar com mais frequência do que proteínas, como esperado (Montagner 1963).”

fonte: https://tel.archives-ouvertes.fr/tel-01758929/document

Proposta quantitativa para a preparação de Cavalos de Tróia: Operando com esta média de distribuição de alimento por cada operária V. velutina, e sabendo que no pico de desenvolvimento dos ninhos existem cerca de 2000 a 4000 indivíduos adultos presentes, teremos que preparar entre 50 e 100 vespas se pretendemos eliminar 25% da população do ninho, entre 100 e 200 se o objectivo é eliminar 5o% da população do ninho, entre 200 e 400 se o objectivo é eliminar 100% da população do ninho.

rastrear vespas asiáticas no retorno aos seus ninhos: a técnica de radiotelemetria

Um dos meios para controlar as populações de Vespa velutina consiste na localização e eliminação dos seus ninhos. Estas operações devem acontecer tão cedo quanto possível, antes da criação das futuras fundadoras. A maior limitação desta estratégia consiste na localização dos ninhos. Para ultrapassar este enorme obstáculo algumas equipas de investigação estão a testar e aperfeiçoar dois tipos de técnicas: i) recurso ao radar harmónico; ii) recurso à radiotelemetria.

Se numa publicação recente sobre a utilização do radar harmónico para a localização de ninhos, enunciei as suas virtualidades e limitações, chega agora a hora de fazer o mesmo acerca da utilização de equipamentos de radiotelemetria. Para isso, recorro à tradução de um texto de divulgação científica.

“A vespa asiática Vespa velutina é uma espécie invasora que chegou a França em 2004 e desde então tem causado grandes danos à apicultura. O desafio atual é tentar controlar seus níveis populacionais e, assim, reduzir a pressão que exercem sobre as colónias de abelhas. A medida mais eficiente no momento é a destruição o mais precoce possível de seus ninhos, mas o problema é como localizá-los. Cientistas do INRA [França] e seus colegas da Universidade de Exeter, no Reino Unido, desenvolveram uma técnica original de radiotelemetria que, rastreando estes insetos no seu voo de retorno ao ninho (homing), permite uma rápida detecção de seus ninhos. Este trabalho acaba de ser publicado [2018] e oferece um método promissor para o controle de vespas asiáticas.

Vespa velutina nigrithorax em voo.

O vespão asiático é um perigoso predador das abelhas. Desde sua chegada a França em 2004, sua frente de invasão estendeu-se gradualmente a Espanha, Portugal, Itália, Reino Unido, Bélgica e Luxemburgo. Os possíveis fatores que podem restringir sua propagação são a ausência de água que esses insetos precisam para construir seus ninhos e a altitude. Os recursos alimentares não são limitantes, porque além de predar os insetos, as vespas podem alimentar suas larvas usando outras fontes de proteína (carne ou peixe de barracas de mercado, resíduos de pesca, carcaças de gado). A única possibilidade crível de controlar essa praga invasora é limitar suas populações, e duas técnicas são usadas no momento: i) a instalação de armadilhas com isca para capturar e eliminar as fundadoras, e ii) destruir os ninhos o mais cedo possível.

Cientistas do INRA e seus colegas britânicos, especialistas no uso de radiotelemetria em insetos, desenvolveram uma técnica original que envolve equipar vespas asiáticas com tags/transponders de rádio para que possam ser rastreadas de volta aos seus ninhos.

Vespa na qual foi colocado um tag/transponder na zona ventral com um peso de 0, 28gr.

Os cientistas do INRA capturaram vespas que buscavam alimentos perto de colmeias. Em seguida, equiparam-nos com um tag/transponder suspenso ventralmente, amarrado com um fio de algodão. Após longos testes, os cientistas selecionaram vespas com um peso mínimo de 0,35 g para carregar uma tag/transponder de 0,28 g com alcance de 800 m. Na verdade, tinham observado anteriormente que 80% destas vespas podiam carregar até 80% de seu peso corporal.

As vespas marcadas foram treinadas para voar com o tag/tranponder numa gaiola antes de serem soltas e os cientistas puderam segui-los à distância até ao seu ninho. Assim, foi possível detectar ninhos até 1,33 km do ponto de partida da operária.”

fonte: https://www.inrae.fr/en/news/tracking-asian-hornets-they-return-their-nests-method-control-these-dangerous-honeybee-predators

Notas: 1) O equipamento de radiotelemetria tem um custo (valores de 2018) para o receptor e antena de £ 2.000 (libras inglesas) e cerca de £ 140 por tag/transponder. (fonte: https://www.nature.com/articles/s42003-018-0092-9);

2) como fica claro das duas publicações sobre o rastreamento das velutinas “tagar” ou “chipar” as velutinas não é nem barato nem simples. Não é exactamente como ir ao veterinário chipar o cãozinho ou o gatinho. “Chipar” velutinas que mal pesam 0,35 gr. com micro-chips que pesam… 8 gr. (como já li nas redes sociais) é demasiada carga para a mula!

vespas velutinas: chegaram e agora?

Vi pela primeira vez, na semana que passou, colónias de um apiário meu a serem predadas com alguma pressão pelas Vespas velutinas. O que fiz de imediato foi tirar as rampas de voo e colocar as grelhas de alvado na posição invernal, apanhar algumas com uma raquete eléctrica e, finalmente, esmagá-las contra a parede frontal do corpo do ninho.

A primeira!!!
Esmagada contra a parede frontal da colmeia.

Chegaram! E agora?

Desde 2016 que escrevo sobre este animal exótico neste blog (e antes de terem entrado em Portugal, já em 2011 escrevia sobre elas no fórum “As Abelhas”). Tenho alguma informação sobre o que poderá resultar, tendo em conta vários factores, sendo estes os que mais considero neste momento:

  • a eficácia e eficiência das minhas acções, enquadradas num conceito de minimização dos impactos na entomofauna e outros animais não-alvo;
  • o tempo que pretendo passar a controlar este invasor;
  • a factura (€€€) que estou disposto a pagar por dispositivos que seja necessário adquirir;
  • a disposição espacial das colónias em cada apiário.

Por tudo o que tenho lido e considerando os factores atrás referidos vou privilegiar estas duas armas no próximo ano:

O JabeProde, apresentado por D. Jaffré, o seu inventor.
O desinsectizador, ou harpa activa.

Serão as melhores soluções? Como referi vou dar-lhes prioridade, que não significa exclusividade, tendo em conta as minhas circunstâncias e os meus conhecimentos actuais. Não irei deitar a toalha ao chão, depois de tantos de nós, com uma enorme resiliência e de forma exemplar, terem mostrado que é possível manter as colónias vivas e produtivas. Acredito que serei capaz de pertencer a este grupo de excelentes cuidadores.

vespa velutina: o comportamento das novas fundadoras nos meses de outubro a dezembro e medidas a tomar

Depois do pico de pressão das velutinas obreiras sobre as colónias (em geral de início de agosto a meados de outubro), a ameaça não termina. Há que adaptar a estratégia de luta, assim como os equipamentos, à presença de uma nova casta de velutinas: as novas fundadoras. Deixo em baixo a tradução de um boletim informativo, da empresa espanhola Sanve, acerca desta invasão silenciosa.

No outono e no inverno, quando as velutinas fundadoras deixam seus ninhos, tornam-se verdadeiros predadores das reservas de mel de nossas abelhas.

No outono, observamos que as vespas se desinteressam pelas abelhas e vemos que tentam entrar nos alvados das colmeias, em alguns casos vemo-las entrar e depois de algum um tempo saem e pensamos que as abelhas as expulsaram. Nada está mais longe da realidade.

As velutinas procuram as colmeias mais frágeis, assim que a encontram fazem repetidas viagens transportando o mel da colmeia para os seus ninhos. O mais seguro é que a velutina que observamos a sair não é a que acaba de entrar mas uma outra que sai já carregada para o ninho.

As abelhas nas colónias, à medida que o frio se aproxima, formam um cacho para se manterem aquecidas e acabam por expor parte das reservas de mel. Mesmo colónias fortes quando aglomeradas em cacho expõem parte das reservas essenciais para um bom início da colónia na primavera. Sem percebermos, as velutinas saem das colmeias com o mel, causando uma dificuldade acrescida à sobrevivência da colónia.

O que se preconiza é uma redução do alvado com uma dupla função:

Exemplo de um redutor de alvado.
  • Por um lado, evitamos que as velutinas entrem nas colmeias;
  • Nas colmeias mais fracas, que serão preferidas pelos velutinas devido à pouca resistência que as abelhas oferecerão, deve ser colocada uma armadilha que permitirá a entrada das velutinas mas só poderão sair da colmeia para a armadilha que a espere cá fora. Assim evitamos que sejam saqueados e ao mesmo tempo eliminamos parte das velutinas que hibernam nas proximidades dos nossos apiários.”
Armadilha de alvado para velutinas.

fonte: https://sanve.weebly.com/trampa-de-piquera.html

Notas: 1) mesmo tendo a opinião que esta empresa espanhola está a desenvolver um muito bom trabalho, não tenho experiência com os seus produtos. Esta publicação não tem um intuito comercial ou de marketing, apenas tem uma intenção informativa;

2) Para levar para casa: no combate as nossas estratégias e equipamentos devem ir-se ajustando à evolução do ciclo de vida das colónias, tanto o das velutinas como o das nossas abelhas. Que tenhamos uma luta bem sucedida, porque informada, adaptada e afinada aos momentos e locais.