o efeito de diferentes varroacidas na acidez das reservas de mel de inverno e nas reservas de mel da primavera e verão

Este estudo de 2012 ajuda-nos a avaliar um outro ângulo em torno do impacto dos tratamentos com ácidos orgânicos nas nossas abelhas.

Resumo: O objetivo do estudo foi avaliar o efeito de varroacidas selecionados sobre o pH (grau de acidez) nas reservas de mel de inverno, nas reservas de mel da primavera e nas reservas de mel de verão de colónias de abelhas. Com este objectivo estabeleceram-se cinco grupos experimentais, cada um constituído por cinco colónias. O grupo controle foi composto por colónias que não foram tratados contra a varrose. Os outros grupos foram tratados com ácido oxálico, ácido fórmico,  Apivarol (tratamento à base de amitraz) e Bee Vital Hive Clean. A acidez das reservas de mel foi determinada. […] Verificou-se que o ácido oxálico reduz significativamente o pH das reservas de mel de inverno (grupo de controle: pH = 3,65; grupo tratado com ácido oxálico: pH = 3,29) assim como no mel da primavera (controlo pH = 3,87, grupo tratado com ácido oxálico: pH = 3,73). O ácido fórmico diminuiu significativamente o pH do mel de verão (grupo de controlo: pH = 3,73; grupo tratado com ácido fórmico: pH  = 3,56). O Apivarol e o Bee Vital Hive Clean não exibiram qualquer impacto significativo sobre o pH nas reservas de mel de inverno, nas reservas de mel da primavera e nas reservas de mel de verão.

CONCLUSÃO: Até agora, acerca dos ácidos orgânicos considerados eficazes no tratamento da varroose, tem sido dito que não afetam a qualidade do mel. Contudo, os ácidos orgânicos estudados (ácido oxálico e ácido fórmico)apresentam um impacto a longo prazo sobre as colónias de abelhas, porque diminuem o pH do mel até 7 meses após a sua aplicação.

Fonte: http://wydawnictwo.up.lublin.pl/annales/Zootechnica/2012/1/annales_2012(1)_zoot_art_02.pdf

fundamentos de uma apicultura produtiva segundo C. L. Farrar

Clarence L. Farrar, foi um entomólogo norte-americano, que fez muitas e relevantes análises e reflexões em torno dos factores determinantes da produtividade em colmeias. Deixo em baixo alguns dos dados por ele observados e algumas das linhas do seu pensamento.

As boas rainhas raramente colocam mais de 1.600 ovos por dia. São necessários vinte dias para que a criação amadureça. As abelhas adultas vivem de 4 a 6 semanas durante a estação ativa, e a sua longevidade é grandemente influenciada pela intensidade da criação existente no ninho. As abelhas de pequenas colónias, que criam uma quantidade proporcionalmente grande de abelhas novas, têm vidas mais curtas do que as abelhas de colónias mais populosas. A quantidade de novas abelhas a nascer é influenciada pela capacidade de colocação de ovos da rainha, pela população adulta da colónia, pelo fornecimento de pólen e mel, e pelo espaço disponível no ninho para a postura da rainha.

Uma colónia populosa produz mais criação do que uma colónia pequena, contudo apresenta uma proporção mais elevada de abelhas disponíveis para recolher o pólen e o néctar. A produção por abelha  é consideravelmente maior em colónias mais fortes do que em colónias menores, uma vez que proporcionalmente menos abelhas estão envolvidas nos cuidados a prestar à criação. Durante uma melada de 2 semanas, uma colónia com 60.000 abelhas produzirá 50% mais mel do que quatro pequenas colónias, cada uma com 15.000 abelhas (ver aqui a célebre regra de Farrar bem explicada) . Sob um fluxo mais longo, as quatro pequenas colónias aumentarão em população, reduzindo assim a diferença de rendimento entre uma colónia forte e as quatro pequenas colónias. Não há nenhuma vantagem, contudo, em manter colónias pequenas apenas porque sua eficiência de armazenamento aumenta. É melhor gerir o apiário para ter todas as colónias direccionadas à produção na eficiência máxima durante todo o fluxo.

No meu caso particular encontro na equalização uma ferramenta muito útil para fazer a gestão do apiário no sentido que Farrar preconiza.

um inverno quente é bom para as abelhas?

As abelhas, em geral, invernam melhor quando a temperatura exterior mantém o cacho invernal tranquilo e a consumir muito pouco mel. Muitos consideram que a temperatura ideal se situa entre -1ºC e  +5ºC. Os apicultores canadianos, sabendo isto, mantêm as temperaturas nos armazéns onde albergam as suas colmeias em torno dos 5ºC.  Embora as abelhas não hibernem como os ursos, elas aglomeram-se em camadas, produzem calor, comem e esperam por dias mais quentes. Acima dos 5ºC as abelhas consomem mais. Estranhamente ou não, com temperaturas abaixo de -1ºC as abelhas necessitam de gerar mais calor, acabando também por consumir mais.

Outro aspecto a considerar, neste equilíbrio entre temperaturas externas e consumo, é o número de abelhas que a colónia tem. Uma colónia mais densamente povoada está apta a gerar e fornecer o calor necessário durante os picos mais extremos de frio. Uma grande colónia pode gerar mais calor com menos consumo de mel. As colónias mais fortes também mudam o local do cacho e expandem-no mais vezes do que as colónias mais fracas. Todos já encontrámos colónias pequenas que morreram durante inverno e com abundância de mel logo ali ao lado. Isto acontece porque estas colónias não conseguem manter a temperatura no cacho que lhes permita deslocarem-se para o quadro ao lado cheio de mel. Neste caso, o inverno não matou a colónia, mas porventura um verão demasiado seco, ou acaricidas colocados demasiado tarde, portanto uma deficiente gestão do apicultor que durante o fim do verão e outono não lhes deu o suporte que elas necessitavam, por exemplo alimentando-as. A minha opção pelo tipo de alimento a colocar, tem nos últimos dois anos ido para o fondant, também conhecido por pasta de açúcar, que começo a aplicar no final do verão (Setembro) até ao início da primavera seguinte em todas as colmeias mais leves.

Fig. 1: O fondant colocado no local do óculo da prancheta permite às abelhas alimentarem-se facilmente sempre que as temperaturas exteriores estão acima dos 10-12ºC.

Fig. 2: O fondant colocado directamente sobre os quadros permite às abelhas alimentarem-se facilmente sempre que as temperaturas exteriores estão abaixo dos 10ºC.

prevenção da enxameação em colónias de abelhas: uma visão mais global e integrada

Como escrevi aqui a enxameação está, geralmente, associada a este conjunto de factores:

  • dimensão da colónia;
  • congestionamento do ninho;
  • distribuição desequilibrada da idade das obreiras;
  • transferência reduzida das feromonas da rainha.

As medidas abaixo elencadas destinam-se a evitar o mais possível que surjam os alveólos reais de enxameação . Estamos a fazer neste caso prevenção da enxameação. Quando o apicultor intervém já na presença destes alveólos reais está a fazer controlo da enxameação.

A primeira medida que devemos considerar na prevenção da enxameação implica um ajuste das nossas expectativas. Ponderar se todas as medidas que tomamos no intuito  de atingir um nível de enxameação igual a zero são benéficas no médio e longo-prazo e se não comportarão riscos demasiado elevados. Aceitar que a enxameação é o mecanismo de reprodução deste insecto e que temos de aprender a viver com ele naturalmente. Ao mesmo tempo fazer todo o possível para que a enxamear enxameiem no momento em que nos for menos prejudicial e o façam para as nossas caixas/colmeias (desdobramentos ou outras medidas de controlo da enxameação).

A segunda medida passa por possuir um registo dos nossos apiários, construído ao longo dos anos, que identifique os períodos de enxameação e florações que habitualmente lhes estão associadas (naturalmente a consulta de fontes externas fidedignas deve ser tomada também em consideração). Este registo deve apoiar-nos ainda na selecção das matriarcas e sua descendência, que ao longo dos anos têm mostrado tendências mais baixas para enxamear, associadas a alta produtividade e bom estado sanitário.

A terceira medida inclui ter o material que habitualmente utilizamos na prevenção da enxameação pronto a ser utilizado num muito curto espaço de tempo (por ex. a cera).

A quarta medida é ter disponibilidade e vontade para fazer inspecções regulares às colónias durante o período de enxameação, que em regra se prolonga por 30 a 45 dias, não mais, e fazer um maneio competente (aqui e aqui entre outros).

Assumidos estes pré-requisitos e acreditando que em boa medida é possível prevenir a enxameação, porque muitos outros apicultores, tão bons e melhores que nós, o têm vindo a fazer ao longo dos mais de 100 anos de apicultura moderna, detalhemos agora um pouco mais algumas intervenções a realizar e o seu racional.

  • A manipulação do espaço superior ao ninho de forma a que permita espaço para o armazenamento de néctar é uma medida absolutamente essencial. Se tiver alças ou meia-alças meleiras com a cera já puxada, devem ser estas as primeiras a ser colocadas. Em zonas e alturas de fluxos muito intensos é recomendável colocar mais alças/meias-alças do que as necessárias e de uma só vez. Esta medida permitirá às abelhas espalhar o néctar por uma área maior e desidratá-lo mais rapidamente, drenando mais abelhas para o exterior e diminuindo o congestionamento do ninho.
  • As colónias devem receber o máximo de luz solar no período invernal, e terem sombra à tarde nos dias mais quentes de verão. Árvores de folha caduca podem servir muito bem este fim. A mais fácil termorregulação das colónias nos dias mais quentes descongestiona o ninho e liberta abelhas para outras actividades. As entradas das colmeias devem estar orientadas para receberem o sol da manhã (nascente) em zonas mais quentes, ou o do meio-dia (sul) em zonas mais frias. As colmeias pintadas de branco são úteis na regulação da temperatura, mas mais visíveis na mancha vegetativa envolvente o que pode potenciar os roubos.
  • Deve haver ventilação suficiente. As entradas de inverno devem ser removidas no início dos primeiros fluxo de néctar e/ou pólen sempre que as abelhas estejam activas e em número suficiente para defenderem a entrada da colmeia. As alças sobre o ninho podem apresentar uma pequena abertura para ajudar a ventilação. Os óculos das pranchetas devem estar abertos para permitir uma melhor convecção do ar quente. Podem também utilizar-se estrados com rede, sobretudo em apiários menos arejados. No nosso país há que avaliar se este tipo de estrado não aumenta a atracção/predação feita pelas velutinas devido ao odor a mel e criação exalado através deste tipo de estrados.
  • A renovação das rainhas ajuda na prevenção da enxameação. As rainha novas produzem mais feromona mandibular e mantém a colónia mais coesa. A dispersão por toda a colónia da feromona mandibular da rainha suprime tanto a supersedure da rainha como a enxameação (Winston et al., 1989). Esta renovação deve ser feita preferencialmente com rainhas de ecotipos locais e que provenham de colónias com um histórico de enxameação baixo. As rainhas do mesmo ecotipo são mais facilmente aceites pelas abelhas que rainhas exóticas. Devemos também ter em atenção que rainhas de raças exóticas, importadas do estrangeiro, podem veicular novas doenças ou parasitas, desarranjar a integridade genética do nosso efectivo e dos efectivos dos apicultores vizinhos. Estas rainhas importadas poderão ainda apresentar baixa qualidade devido aos constrangimentos sofridos durante o transporte aéreo e/ou rodoviário.

morte de colónias de abelhas ligada à baixa viabilidade espermática nas rainhas e análise de potenciais fatores causais

A saúde da rainha está intimamente ligada ao desempenho das colónias de abelhas, uma vez que uma única rainha é normalmente responsável por toda a criação na colónia. Nos Estados Unidos, nos últimos anos, as rainhas têm falhado a um ritmo elevado, com 50% ou mais de rainhas substituídas nos primeiros 6 meses, quando historicamente uma rainha se mantém prolífica durante o primeiro e segundo ano de vida. Esta alta taxa de falha das rainhas coincide com a alta taxa de mortalidade das colónias nos EUA, alguns anos superando os 50%. No presente estudo, investigou-se se a viabilidade espermática em rainhas dos EUA desempenha um papel nas perdas de colónias. Observou-se uma ampla variação na viabilidade espermática nos quatro grupos de rainhas retiradas de colónias classificadas pelos apicultores em duas categorias: colónias de boa saúde e colónias a falhar.

As rainhas removidas de colónias com boa saúde apresentaram uma média alta de viabilidade espermática (cerca de 85% dos indivíduos), enquanto aquelas consideradas deficientes ou com má saúde apresentaram uma média significativamente menor (apenas cerca de 50% dos indivíduos). A baixa viabilidade espermática foi correlacionada positivamente com o desempenho da colónia. Para investigar a fonte de baixa viabilidade dos espermatozóides, rainhas de seis criadores de rainha foram avaliadas tendo sido documentada ​​uma grande variação na viabilidade espermática (faixa entre 60-90%). Esta variabilidade pode ter origem nos zangãos com que as rainhas acasalam ou nas temperaturas extremas que as rainhas estão expostas durante a expedição (habitualmente por avião). O papel da temperatura de expedição como possível explicação para a baixa viabilidade espermática foi analisada. Foi documentado que durante a expedição as rainhas são expostas a picos de temperatura (de 8ºC até 40°C) e estes picos podem matar 50% ou mais do esperma armazenado na espermateca das rainha. A viabilidade esperada dos espermatozóides está claramente ligada ao desempenho das colónias e os dados laboratoriais e de campo fornecem evidências de que as temperaturas extremas a que estão sujeitas durante o transporte são um potencial factor causal da baixa viabilidade espermática num número significativo de rainhas.

fonte: http://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0147220

P.S.: Os apicultores portugueses ao fazerem encomendas de rainhas estrangeiras, que habitualmente transitam durante horas/dias em aviões e/ou transportes rodoviários correm os riscos acima referidos? Não será demasiado audacioso pensar que a realidade europeia não deverá diferir em nada da realiadade norte-americana.

variação na produção de mel por colmeias de abelhas africanizadas em função da época de introdução de rainhas jovens

Como forma de retribuir a simpatia que os apicultores brasileiros têm demonstrado através do elevado número de consultas ao meu blog deixo este resumo de um estudo realizado no Brasil e recentemente publicado.

RESUMO:

O objetivo deste trabalho foi avaliar a produção de mel por colmeia e as taxas de postura de ovos das rainhas produzidas nos anos de 2007, 2008 e 2010. Foram utilizadas 30 colônias iniciadas com uma rainha/colônia por estação climática, durante os três anos. A cada ano, iniciou-se em: janeiro (verão), abril (outono), julho (inverno) e outubro (primavera) e encerrouse doze meses depois, nos mesmos períodos referentes a cada estação dos anos posteriores. As melgueiras foram pesadas antes e depois da centrifugação para avaliar a quantidade do mel estocado. As colônias com rainhas introduzidas durante o outono e o inverno nos três anos produziram 57,2±6,0kg e 60,7±7,5kg de mel, respectivamente, no primeiro ano de atividade de produção após a introdução das rainhas nas colônias iniciais, valores significativamente superiores aos obtidos para as colônias com rainhas introduzidas no verão (39,3±7,6kg) e na primavera (41,8±3,7kg). As taxas de postura de ovos das rainhas foram mais altas na primavera e no verão (98,2±3,9% e 88,4±7%, respectivamente), indicando maior fluxo de alimento (floradas) nessas épocas, quando comparadas às médias do outono e inverno (30,3±8,1% e 24,5±7,2%, respectivamente). Constatou-se que é economicamente viável produzir rainhas e introduzir em colônias iniciais de Apis mellifera africanizada durante o outono e inverno. Além da produção de mel das colônias iniciadas nesses períodos ser superior, elas terão maior estabilidade populacional em épocas de escassez de floradas.

fonte: http://www.scielo.br/pdf/cr/v46n5/1678-4596-cr-0103_8478cr20151126.pdf

Aproveito a oportunidade para perguntar aos companheiros brasileiros se a varroa já é um problema grande no Brasil. Um abraço a todos e a melhor sorte para esta safra.

o ácaro Tropilaelaps ou a arma de destruição massiva de colónias de abelhas

A maioria dos ácaros Tropilaelaps vivem e reproduzem-se dentro da criação, pois podem alcançar um ciclo de vida mais longo, vivendo apenas cerca de três dias na abelha adulta. A característica mais alarmante deste ácaro é a sua taxa de reprodução e ciclo de reprodução. Em 24 horas a contar da eclosão os ácaros entram num novo alvéolo e iniciam novo ciclo reprodutivo, colocando cerca de quatro ovos de cada vez. Um a quatro ácaros são encontrados geralmente num só alvéolo. No entanto, há relatos de ácaros encontrados em quantidades três vezes superiores num só alvéolo! Eles podem ultrapassar rapidamente e em grande número os ácaros  varroa em colónias de abelhas. O período de incubação é de apenas 12 horas e atingem a plena maturidade em apenas seis dias.

Fig. 1: Ácaros Tropilaelaps a parasitarem larvas de abelhas e abelha adulta enferma

Em comparação com o Tropilaelaps, os ácaros da Varroa não são problema. Os danos que provocam em colónias de abelhas é semelhante aos provocados pelo ácaro Varroa, como deformidades de desenvolvimento, infecções e, eventualmente, a morte da colónia mas a uma taxa muito rápida, porque devido à sua alta taxa de reprodução eles multiplicam-se muito mais rapidamente do que o Varroa causando danos muito mais extensos.

Fig.2: Zonas conhecidas de implantação e distribuição do ácaro Tropilaelaps (notar a coincidência com as zonas originais de implantação e distribuição do ácaro varroa)

quando o aethina tumida (pequeno escaravelho da colmeia) entrou em Portugal

O comércio mundial de abelhas e outras mercadorias acelerou a disseminação de “novos” patogeneos, predadores e pragas para outras partes do mundo. A União Europeia está extremamente preocupada com o risco de introdução de ácaros de aethina tumida (pequeno escaravelho da colmeia) e tropilaelaps na Europa. Em setembro de 2004, duas larvas deaethina tumida foram encontradas em gaiolas de rainhas de Apis mellifera ligustica e amas importados do Texas (EUA) para Portugal. Todas as colmeias do apiário e de um outro apiário, a 5 km do primeiro apiário, foram queimadas e a camada superficial do solo foi removido e enterrado mais fundo. Os locais onde as colmeias estavam localizadas foram cobertos com plástico e o solo foi inundado com permetrina.

fontes: Murilhas, 2004; Neumann and Ellis, 2008; Valerio da Silva, 2014

Fig. 1: Em cima o pequeno escaravelho das colmeias adulto. Em baixo as suas larvas a parasitarem um quadro com mel. 

Depois da primeira entrada documentada do aethina tumida em solo português/europeu, prontamente erradicada, no dia 5 de setembro de 2014 foi feita uma nova detecção deste escaravelho, desta vez em território italiano, e continua por erradicar até à data.

Fig. 2: Queima de colmeias em Itália na tentativa de conter e erradicar a peste do pequeno escaravelho das colmeias.

apis mellifera iberiensis ou a melhor abelha para a península ibérica

A Península Ibérica é povoada naturalmente por uma subespécie de abelhas designado cientificamente apis mellifera iberiensis. É um hibrido natural com linhagem M e A.  Foi este ecotipo que o grande ecossistema peninsular ibérico foi seleccionando e apurando ao longo de milhões de anos.

No entanto este longo e eficaz mecanismo de selecção natural é posto em causa sempre que um de nós decide introduzir linhas exóticas no nosso território (ver aqui). O principal argumento apresentado pelos apicultores que importam outras raças (a ligustica e a cárnica são as preferidas) é o de procuram linhas mais homogéneas e/ou produtivas e gentis. Esta quimera rapidamente se desmonta.

Qualquer apicultor minimamente informado sabe que no território nacional manter linhas exóticas homogéneas obriga a uma de duas coisas: inseminação instrumental ou compra regular de rainhas no estrangeiro. É verdade que se fala da possibilidade de desenvolver zonas de acasalamento dedicadas a estas linhas exóticas mas dada a orografia continental e a elevada densidade de colmeias por Km quadrado, no nosso país essa ideia não passará das boas intenções. Voltando à inseminação instrumental, esta é uma via que requer equipamentos caros e muito sofisticados, a juntar a um conjunto competências muito evoluídas por parte do apicultor-inseminador, só ao alcance de muito poucos. A outra via, a compra regular de rainhas exóticas no estrangeiro, é uma solução que torna o apicultor dependente do criador de rainhas, e sobretudo é uma prática com imensos riscos sanitários, aumentando enormemente a possibilidade de se  introduzirem doenças e/ou patogéneos novos, como já aconteceu no passado com o ácaro varroa e o fungo nosema ceranae, e no futuro poderá vir a acontecer com o  Aethina tumida (pequeno escaravelho da colmeia)  presente em território italiano e o ácaro Tropilaelaps, tão ou mais perigoso que o ácaro varroa. A culminar, a questão do transporte aéreo de rainhas e seu efeito negativo na viabilidade espermática das mesmas poderá dar graves amargos de boca aos inocentes compradores (tema a abordar num post futuro).

Outra das razões mais frequentemente referidas para a compra de linhas exóticas passa pela crença de que serão mais produtivas e menos enxameadoras. Crenças também facilmente desmontáveis. Estudos recentes mostram que as linhas nativas tendem a ser mais produtivas que as linhas exóticas (ver aqui). Mas mesmo que estes estudos não viessem confirmar aquilo  que muitos de nós sabem, os dados das produções espanholas e portuguesas rapidamente demonstram que a nossa abelha ibérica não só produz como produz de forma muito satisfatória. O país com a produção mais elevada de mel na UE é Espanha. Pergunto como será possível um país ser simultaneamente o maior produtor de mel da UE e um dos maiores produtores do mundo com uma abelha pouco produtiva e enxameadora?  Poderá argumentar-se que tal se deve ao maior número de colónias em Espanha. Vejamos então a produção média por colmeia e os dados são elucidativos: Portugal apresentou em 2010 um produção média de 23 Kg por colmeia; Itália com as ligusticas, por alguns intituladas fábricas de fazer mel, ficou atrás com 19 Kg por colmeia; a Áustria, terra das cárnicas e dos grandes mestres apicultores, apresenta apenas 16 Kg. Nós, com uma abelha menosprezada por alguns, estamos à frente de duas raças tão cobiçadas pelos apaixonados das linhas exóticas.

Relativamente à doçura das abelhas das linhas exóticas este é um traço com grande heritabilidade e os inevitáveis cruzamentos com a abelha nativa depressa diluirão esse traço, podendo suceder gerações com comportamentos tão ou mais defensivos que os das nossas abelhas nativas  (falo por experiência pessoal).

Só me apraz uma conclusão: se alguns de nós não conseguem que a abelha ibérica produza, antes de a por em causa faria um grande favor a si próprio se começasse por se por em causa a si e ao seu maneio incompetente.

Num próximo post abordarei outro ângulo desta problemática associado ao impacto negativo que esta prática de importar linhas exóticas tem nos apiários ao redor. Se importar linhas exóticas é um tiro no pé do próprio é também uma facada nas costas do vizinho.

A terminar uma nota de esperança nesta época festiva: estou convencido que a nossa abelha por cá continuará muito depois de termos partido, e seguramente a fazer as alegrias de muitos futuros apicultores… e sem linhas exóticas. É claro para onde as tendências estão a avançar nos meios mais esclarecidos: para a preservação dos ecotipos locais e a proibição de introdução de linhas exóticas, como já acontece na Catalunha e noutras regiões da Europa (ver aqui). As autoridades portuguesas, ou porque estão mal aconselhadas ou porque desconhecem esta problemática, mais tarde ou mais cedo proibirão a importação de linhas exóticas a bem da apicultura nacional.