… estado de guerra

Ontem fiz entre a Guarda e Coimbra 150 Km com o sol sempre por detrás de nuvens de fumo.

Chego a Coimbra e as imagens e notícias da televisão confirmam e expandem esta vivência: Portugal arde de norte-a-sul, de este-a-oeste.

Tenho 50 anos e não me lembro de uma ano tão negro, tão quente, tão mortal. Estamos em terra queimada, estamos feridos, estamos em estado de guerra.

Fig: Uma parede de fumo negro em Vieira de Leiria, com o pinhal real de Leiria a arder 

Um soco no estômago que tem como causas remotas aquilo que alguns ainda negam: alterações climáticas!

Um soco no estômago que tem como causas próximas aquilo que alguns deveriam investigar: como é que os “tolinhos” e “alcoólicos” se conjugam tão perfeitamente entre si para incendiar o país de lés-a-lés num período de tempo tão curto?

Até parece uma acção perfeitamente planeada, organizada, com uma capacidade operacional regional ou até nacional e por gente que de tolo e de bêbado nada têm. E às vezes o que parece é!

paulonia vs. eucalipto

Num ano terrível para apicultura, com milhares de colmeias ardidas, algumas delas minhas, procuro informação sobre árvores-bombeiro e se possível nectaríferas. A paulonia está a merecer neste momento a minha atenção porque me parece reunir estes dois requisitos.

Fig. 1: Árvore paulonia

Fazendo esta pesquisa acerca da paulonia (paulownia em inglês) encontrei a opinião, citada em baixo, que pode deixar algumas pistas para a reforma florestal que tanto se anseia, tendo como quase certo que algumas sub-espécies desta espécie não são consideradas invasoras pelas autoridades portuguesas competentes (ver lista linkada aqui).

 

O governo e os produtores privados parecem adorar a monocultura. Quase qualquer monocultura seria melhor do que o que existe atualmente. Aposto que eles gostariam de uma árvore que tenha retorno ao fim de 10 anos. O Paulownia precisa de mais umidade do que está disponível naqueles montes, mas aposto que seria bom em áreas mais quentes.

A maioria dos assentamentos precisa lidar com as águas cinzentas. Um sistema de tratamento de águas arrasadas, com base nessas árvores, poderia dar uma grande quantidade de proteção contra incêndio em um curto período de tempo. Um grande anel em torno de cada pequena cidade poderia ser irrigado. Isso satisfaria o desejo de cultivar árvores, com a exclusão de outras coisas, e evitaria a propagação do fogo. A cultura acabada é mais valiosa do que o eucalipto.

A indústria de plantio de eucalipto emprega apenas cerca de 3.000 pessoas. Seu país permitiu que uma vasta área fosse cultivada em mono, em nome da economia de 3.000 trabalhos. Quase qualquer outro sistema florestal, produziria mais empregos. Com celulose e papel, é principalmente plantar, aguardar o número de anos necessário, depois cortá-lo e processá-lo em pasta de papel.

As árvores que são moídas em madeira, criam um grande número de indústrias derivadas. Haveria serrarias, fabricantes de móveis e fabricantes de qualquer coisa que pudesse usar uma forte madeira parecida com Balsa. Se a mesma quantidade de terra fosse coberta com qualquer árvore que precisasse ser moída, ela deveria empregar mais de 3.000 pessoas. Isso é algo que precisa ser abraçado pelo povo e pelo governo. Deixe a indústria do papel morrer. A Escandinávia pode facilmente fornecer papel de celulose e papel higiénico para a Europa.

Com uma árvore de crescimento rápido, com salários mais baixos do que a Escandinávia, Portugal poderia facilmente dar uma certa concorrência ao Ikea. A árvore Paulownia passa por uma variedade de nomes … Paulownia (Paulownia tomentosa).

fonte: https://permies.com/t/59285/Reforesting-Portugal-firefighting-trees

Nota: agradeço ao Nuno Oliveira ter chamado a minha atenção para esta espécie.

os mais visitados

Iniciei há quase um ano este blog sobre apicultura. Publiquei até à data 137 posts. Tem sido um exercício que me serve, entre várias finalidades, para ir fazendo um envelhecimento activo (não estou a caminhar para novo!).

Ontem uma querida amiga especialista em Gerontopsicologia, referia a importância de mantermos actividades que nos estimulem criativamente e do seu impacto positivo a médio-longo termo. Este blog, entre outros objectivos, tem servido este também.

Em baixo deixo a listagem dos 10 posts mais visitados até à data:

A terminar agradeço a todos os companheiros/leitores que me têm estimulado a continuar. As mais de 43 500 visitas ao blog, no primeiro ano de vida, são claramente uma mensagem muito forte.

o futuro da apicultura (por Gilles Ratia)

Numa entrevista publicada na Abeilles et Fleures (ed. nº 779 de Fevereiro de 2016), a Gilles Ratia, presidente da Apimondia até muito recentemente, foi-lhe colocada a seguinte questão: Como vê a apicultura no mundo e o seu futuro, à luz das muitas viagens que realizou pelo mundo?

Porque achei a resposta deste experimentado e viajado apicultor muito interessante, deixo aqui a tradução da sua resposta.

“Na verdade, existem várias apiculturas. Há países onde ainda existem os api-coletores — você sabe, aqueles que sobem a árvores para colher o mel das Apis dorsata, ou o ainda mais temerário como suspender escadas feitas de cordas improváveis para re-colectar o mel da Apis laboriosa que vivem agarradas às altas falésias nepalesas.

Há também a apicultura tradicional onde as colmeias sem quadros, feitos de todos os tipos de material, utilizando raças locais (cerana, andansonii, etc.), sem qualquer selecção ou insumo (não utiliza cera laminada, alimentação artificial, tratamento veterinário, etc.).

Em terceiro lugar há a chamada apicultura “intermédia”, com as colónias instaladas em colmeias minimalistas como a famosa KTBH (colmeia queniana de barras superiores) ou as Warré, às vezes alimentadas artificialmente.

Finalmente, há a apicultura como a conhecemos em França, com colmeias Dadant e Langstroth. Este última categoria é altamente afetada no seu lado intensivo e muitas vezes é levantada a questão do seu futuro. Embora eu não seja um adivinho, nem um futurólogo, existem cenários mais ou menos complexos/difíceis de definir, esta é a minha visão quadripartida face ao declínio das colónias de abelhas:

  • Ou os apicultores nada fazem além de se adaptar continuamente, mal ou bem, às novas pressões da profissão: pesticidas cada vez mais perniciosos, globalização das doenças e das parasitoses, produtos veterinários de eficácia questionável, climatologia aleatória, legislação cada vez mais rigorosa a respeito da qualidade dos produtos apícolas, deixando passar simultaneamente as adulterações industriais vindas do Extremo Oriente, custos de produção crescentes, etc. Poucos sobreviverão …
  • Ou os apicultores se voltam para a “apicultura slow”: abandono da criação de rainhas, das ceras laminadas, da alimentação artificial que não seja a estritamente necessária à sobrevivência dos enxames, da redução da transumância e dos tratamento alopáticos, etc., com os outros agricultores a fazerem o mesmo ao seu nível e na sua prática, como parte de uma abordagem holística e cautelosa sobre o futuro da biodiversidade,  e assim de toda a humanidade. Todos sobreviverão…
  • Ou os apicultores se tornam grandes consumidores de alta tecnologia para arrancar com a apicultura 2.0: abelhas geneticamente modificadas, produtos para todos os estádios da colónia e personalizados para cada uma de acordo com o seu estado fisiológico — à imagem das vacas equipadas com coleiras de identificação —, todas as colmeias equipadas com vários sensores para monitorar 24/24 e 7 dias/7 por satélite, previsões metereológicas finas, diversificação de produtos para venda, como sabem fazer os chineses: o pólen + geleia real + ginseng + placenta humana, etc.. Não se sabe se se tratará da sobrevivência a longo prazo ou de um suicídio a curto prazo …
  • Ou ninguém precisa dos apicultores e os políticos vão deixá-los morrer no altar do progresso: plantas GM auto-férteis que não requerem polinização, e nos casos raros em que tal não será possível, micro-drones tocarão o pistilo das flores em vez desses insetos traquinas que picam! Como para o mel, ele é tão facilmente substituído pelo “xarope de frutose de milho” com sabor, não é cavalheiros das fraudes?
  • É óbvio que haverá (na verdade, já existe) uma re-partição dos apicultores na arte das três primeiras apiculturas referidas acima, de acordo com a sua cultura, crença, idade, experiência passada e conta bancária. A verdadeira pergunta que todos devem fazer será: “Em que tipo de mundo viverão os nossos filhos se a quarta opção se impuser?”

apresentação do blog abelhas à beira

Inicio hoje este blog de Apicultura por dois grandes motivos. O primeiro motivo, de natureza um pouco egoísta, é o prazer que me dá escrever; o segundo, de natureza diria mais altruísta, é o prazer que me dá partilhar estes textos com todos vós que o estais a ler neste momento.

 

A razão do nome de blog “abelhas à beira” nasce de um jogo de palavras: a maior parte dos meus apiários estão na região da Beira Alta e, por outro lado, as abelhas como qualquer outro ser vivo, estão permanentemente à beira de qualquer coisa, num estado dinâmico que as aproxima ou afasta de um determinado ponto — estão à beira de enxamear, por exemplo, à beira de colapsarem devido à varroa, … à beira tão somente de um novo dia em que as coisas vão manter-se muito parecidas com as do dia anterior.

 

As grandes linhas de orientação que neste momento tenho para este blog é fazer dele um espaço para escrever sobre o que me interessa no domínio da apicultura, e que espero possa interessar a outros, sejam apicultores ou não. Algumas vezes relatarei as minhas experiências, fazendo uma espécie de diário apícola, outras vezes farei considerações de natureza mais teórica, fundadas em leituras, reflexões e observações sobre este mundo complexo que é o das abelhas e da nossa relação com elas.

 

Sejam todos bem-vindos!

Eduardo Gomes, apicultor profissional desde 2009