ando a (correr) caminhar com gosto

No ano passado, por esta altura, estava relativamente seguro que a minha aventura pelo mundo da apicultura se aproximava do seu terminus. As razões que nutriam estes pensamentos eram várias, e hoje algumas delas ainda persistem. Contudo, uma delas mudou muito de lá para cá: o gosto que reencontrei no maneio das minhas colónias. Em boa medida isso deve-se ao downsising que fui fazendo ao longo destes dois últimos anos na minha operação, que me permite um maneio mais sereno e oportuno, e também ao facto de ter voltado a trabalhar sem a trela e frustrações que por vezes decorriam de ter tido um empregado a tempo inteiro. Agora se acordo às 6h00 é a essa hora que vou para o apiário; agora se o fluir do trabalho me leva para lá da hora do almoço prossigo sem a obrigação de ter de parar de acordo com os horários preconizados pela Autoridade para as Condições do Trabalho e por um contrato assinado. Ando de acordo com os ditames da minha vontade de trabalhar e de acordo com o meu relógio biológico. Resumindo: ando bastas vezes em sintonia.

Para além destes motivadores intrínsecos, com frequência vou encontrando também motivadores extrínsecos, onde se destacam a minha família, os meus amigos e as minhas abelhas. Sendo este um blog de apicultura é natural que me foque nestas últimas.

Ontem, após o almoço e depois de ter estado com o meu amigo David Marques e sua esposa, depois de ter torcido o tornozelo duas vezes, não quis deixar que as dores superassem a minha vontade de fazer um pequeno conjunto de intervenções em algumas colónias do meu apiário preferido.

Num território de montanha!

Entre outras tarefas, abordei esta colónia, que a 11-03 tinha um sobreninho onde a rainha já andava em postura e que a 18-05 foi confinada ao ninho com recurso a uma exlcuidora de rainhas. Como trabalho as horas que quero e até às horas que quero decidi “descer” por esta colónia para satisfazer a minha curiosidade.

Colmeia Langstroth com esta configuração à data de ontem: ninho, excluidora, sobreninho e duas meias-alças.

Descendo pela colmeia, a 2ª meia-alça, colocada há dois dias atrás, estava naturalmente vazia, e a primeira, colocada imediatamente sobre o sobreninho estava a cerca de 2/3 com o mel/néctar.

1ª meia-alça.

Descendo um nível mais, encontro o sobreninho praticamente cheio de mel/néctar, com 8 quadros claros para crestar e 2 quadros escuros, também repletos de mel, que não irão ser crestados.

Vista superior do sobreninho.
Vista de detalhe de um quadro claro do sobreninho.
Como estes sobreninhos se aproximam dos 30 kgs em mel, e mais uns quilos para a madeira, a minha lombar agradece que o movimente apenas depois de parcialmente esvaziado.

E confesso que, mais que tomar o peso do fruto do trabalho das minhas abelhas, ardia em curiosidade por mergulhar neste ninho que não via desde 18-05, altura em que lhe coloquei a excluidora em cima.

O coração da colónia está ali, por baixo desta grade.

Não me surpreenderia encontrar um ninho bastante desbloqueado, com 6 a 7 quadros com boas áreas ocupadas pela criação. Armazenar os cerca de 40 kgs já armazenados não se consegue com poucas abelhas, com um ninho bloqueado ou com uma rainha a fraquejar. Contudo não foi exactamente isso que encontrei neste ninho…

Quadro 10 com esta mancha de criação!!! Corri todos os quadros do ninho e estavam todos semelhantes, do 10 até ao quadro 2; apenas o quadro 1 não tinha criação/postura. Não é habitual, nem sei se desejável até, mas esta colónia surpreendeu-me.

Não me surpreendeu a ausência de qualquer efeito ou impacto negativo que me fosse dado a observar pela presença de uma excluidora de rainhas entre o ninho e o sobreninho.

E são também estes simples mas fortes motivos, que me fazem correr, deveria dizer caminhar, com gosto… quando se sintoniza o território, as abelhas e o apicultor.

6 comentários em “ando a (correr) caminhar com gosto”

  1. Olá sr Eduardo Gomes. Pelo exposto concluo que não perdeu o gosto pela apicultura pese embora as contrariedades que vai , com coragem, enfrentando. Segundo entendi já não deve ter empregado o que lhe deixa um horário a condizer com a sua disponibilidade de tempo e de vontade. Eu sou apicultor em part time e felizmente não dependo do rendimento do mel ou derivados para o meu sustento. sou apicultor porque gosto e o resto vem por acréscimo e por acaso me dá uma folga financeira bastante razoável. Tenho um apiario com as dimensões que me permitem fazer uma gestão dos tempos livres de acordo com a minha vontade, ou não, de trabalhar. Estou a dois passos da reforma e acredito que, se a saúde o permitir, irei manter todos os meus vicios, entre os quais o tabaco que não fumo e o vinho que não bebo, sem por em causa o orçamento familiar. esejo-lhe que mantenha a força de vontade e faça só o que pudere que lhe der prazer.

  2. Excelente artigo amigo Eduardo, costuma-se dizer “quem corre por gosto não cansa”.
    O suspense foi aumentando ao longo da narrativa, fiquei pregado ao texto tentando adivinhar o que se iria encontrar no ninho, para aquém da grelha excluídora. Não esperava que a quantidade de criação fosse tão avassaladora, praticamente não fica espaço para mais nada a não ser a própria criação (será que uma meia alça além do ninho, antes da grelha excluídora, poderia aliviar a densidade de criação no “underground”?). Por outro lado não me parece difícil que as obreiras subam ao primeiro andar para colocarem o pólen e o néctar e daí poderem alimentar a criação. É tudo uma questão de se avaliar o desempenho da colónia (que neste caso parece ser ótimo). Dá gosto ler o “abelhas à beira” e descobrir artigos interessantes como este, como tal apesar da contrariedade do entorse arrisco sugerir “Keep walking” Eduardo!

    1. Bom dia, Fernando! É também com muito gosto que recebo e leio os teus comentários. Sim, esta colónia apresenta uma quantidade de criação acima do que eu vejo habitualmente nas minhas colónias. 7 a 8 quadros com 3/4 ou mais da área do quadro ocupada com criação é relativamente habitual. De vez em quando surge uma colónia assim. Também estou convencido que uma meia-alça a servir de câmara de criação seria também ocupada para fazer postura por esta rainha. Quais seriam os ganhos dessa configuração, conhecida por colmeia Oskman, em homenagem ao grande apicultor argentino Manuel Oskman, para a colónia e para o apicultor? Perguntando de outra forma, quais são os ganhos derivados da colocação de uma excluidora logo por cima do ninho? Já referi que os pré-juízos mais habitualmente feitos à utilização das excluidoras eu não os tenho encontrado, por enquanto, nas minhas colónias. Acerca dos ganhos ainda não publiquei nada de muito sistematizado, porque ainda estou a fazer observações, mas conto fazê-lo em breve. Um abraço amigo!

  3. Excelente Sr. Eduardo, Este foi um artigo que me leva a ter a intenção de experimentar um sobreninho numa colmeia Langstroth, que resumindo e tendo em análise este maneio, colocou um sobreninho , sem grade excluidora, permitiu que a rainha subisse e fizesse postura no ninho superior, e quando esgotou o espaço, “obrigou-a” a descer, colocou a grade exluidora e novamente coloca sobreninho. O que me leva a concluir, que irá ter uma enorme população de abelhas, capazes, e a floração permitindo, de “aguentar” e produzir com uma ou duas meias alças e tirar uns bons kg de mel!

    1. Bom dia, Pedro! Esta colónia passou o inverno com o sobreninho, mas sim também tenho casos em que coloco sobreninhos à entrada da primavera em colmeias que arrancam “demasiadamente” fortes. A meio do período da enxameação reprodutiva (neste apiário o período da enxameação reprodutiva ocorre geralmente entre meados de abril e meados de junho) coloco a excluidora de rainhas. A rainha e todos os quadros com criação e postura e/ou espaço para postura ficam no ninho. Os quadros bloqueados e cera laminadas completam o sobreninho. A população de abelhas destas colmeias deve rondar o máximo (cerca de 45 a 50 mil) no início do fluxo e portanto com um bom fluxo de néctar têm o potencial para produzir entre 25 e 35 kgs de mel em média neste território. Um abraço!

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