deslocar colmeias alguns metros: quando as abelhas nos trocam as voltas

Ao longo destes anos com abelhas, muito raramente tive de deslocar colmeias apenas alguns metros. Com vários apiários activos, quando necessito de tirar algumas colmeias do sítio, transporto-as para um outro apiário a mais de 5 km de distância.

A minha experiência mais recente com a deriva de abelhas e o regresso ao local original, foi a que passo a descrever. Este ano, na altura dos desdobramentos/multiplicação de colónias pelo método Doolittle, tive a oportunidade de aplicar três soluções alternativas para a recolocação dos novos enxames: (i) coloquei alguns destes no apiário onde estavam as colónias-mãe; (ii) coloquei alguns num outro apiário a cerca de 2,5 km/3 km do apiário original; (iii) coloquei a maior parte num apiário a cerca de 25 km de distância do apiário original. Os resultados foram facilmente observáveis: os novos enxames que perderam menos abelhas foram os que foram transferidos para o apiário a 25 km de distância; os que perderam mais abelhas foram os que ficaram no apiário original; os enxames transferidos para o apiário a 2,5/3 km de distância perderam abelhas, mas não tantas como os os que ficaram no apiário original. Nestas condições, sem utilizar nenhumas medidas que forcem a reorientação das abelhas, todos já experimentámos uma grande drenagem de abelhas para o local original se estes ficarem próximo, isto é, a menos de 3-5 km.

Contudo, há diversos protocolos que visam diminuir a deriva das abelhas campeiras para o local original quando não é possível deslocá-las para longe. Em baixo apresento um protocolo bastante completo levado a cabo pela experiente apicultora Rusty Burlew e descrito no seu blog Honey Bee Suite:

“As etapas:

  • À noite ou de manhã cedo, quando quase todas as abelhas estão na colmeia, bloqueie a entrada e mova a colmeia para seu novo local.
  • Mantenha as abelhas sequestradas nas primeiras 72 horas, se possível, e certifique-se de que elas tenham uma boa ventilação. Manter as abelhas trancadas fará com que algumas delas se reorientem na próxima vez que saírem.
  • Nesse ínterim, coloque um galho com folhas, uma cortina de contas, trapos de uma esfregona ou algo semelhante na entrada da colmeia. O objeto deve estar perto o suficiente da entrada da colmeia para que as abelhas sejam forçadas a circular em seu torno ao saírem da colmeia.
  • Após três dias, abra a entrada da colmeia. As abelhas ficarão confusas com o objeto da entrada da colmeia, param por um momento e exclamarão: “Tenho a sensação de que não estamos mais no mesmo sítio !” Cada uma delas fará um vôo curto e se reorientará para a nova localização.
  • Deixe o objecto na entrada da colmeia por dois dias ou mais e, em seguida, remova-o.
  • As abelhas ter-se-ão reorientado para seu novo lar.”
Re-orientando as abelhas com a colocação de vegetação na entrada da colmeia.

Contudo, por vezes, as abelhas trocam-nos as voltas e não seguem o protocolado. Numa publicação mais recente Rusty Burlew descreve o seguinte episódio que lhe sucedeu com uma colónia re-colocada num outro local próximo, mesmo tendo seguido todo o protocolo descrito em cima:

“Três dias depois
Perto do final do terceiro dia, prendi as folhas das samambaias na frente da colmeia, certificando-me de que cobriam a abertura. O emaranhado de folhas e galhos parecia suficiente para mim. Quer dizer, se eu saísse de casa e levasse uma pancada na cabeça de folhas de samambaia, pelo menos pararia e reconsideraria.

Mas não minhas abelhas. Nem por um segundo.

Quando abri a colmeia, as abelhas espumaram pela entrada fora. Nenhuma hesitou. Nenhuma perguntou: “De onde vieram estas folhas?” Em vez disso, as abelhas desapareceram no ar.

Saí rapidamente, atravessei o pinhal e voltei para casa. Mas quando entrei no quintal, lá estavam elas [próximo do local original da colmeia]. Milhares delas a circundaram o pátio, esperando por mim. Mais uns milhares aglomerados nas calhas da casa. Eu podia ouvi-las troçando de mim: “Por que você demorou tanto?”

Tão malvadas quanto podem ser
Talvez a perda de sua casa as tenha chateado. Ou talvez terem sido fechadas por três dias. Ou talvez eles não gostem de samambaias. Seja qual for o motivo, aquelas abelhas estavam muito mal dispostas. Elas começaram a dar cabeçadas imediatamente. Puxei minha máscara para a cabeça, mas não consegui sair dali rapidamente. Fui picada nos braços.

Dei a volta para o outro lado da casa, mas quando abri a porta da frente, algumas daqueles malvadas voaram para o interior. O cachorro, que dormia no chão da cozinha, foi picado sem motivo. O gato foi picado ao sair e desapareceu por 24 horas. Miando, choramingando. Latidos. Zumbido. Incomodando. Eu não me lembro de tamanho pandemónio. Enquanto isso, meu marido – aquele que insistiu nessa mudança – estava na Virgínia. Quão inteligente é isso?

Posso dizer que esta não foi uma predisposição genética para a a agressividade. A colmeia original foi dividida em três partes. A parte que coloquei na colmeia longa estava relaxada e calma. Várias vezes a abri apenas para observar, e as abelhas nem me ligaram. A segunda divisão, que continha criação e as abelhas que jovens, também era doce e serena.

Pense duas vezes antes de mover uma colmeia
Por que razão este método funciona às vezes e outras não? Eu não sei. Pode ser a idade das abelhas. Podem ser condições do néctar. Pode ser algo sobre o qual eu não tenho ideia.

Olhando para trás, acho que perdemos mais abelhas do que pensamos quando movemos colmeias por curtas distâncias. Se houver outras colmeias por perto, talvez algumas encontrem um lar. Mas outras abelhas, eu acho, simplesmente continuam circulando como pombos-correio. Quem sabe? Eu, pelo menos, nunca mais tentarei o método dos três dias.

Rusty”

fonte: https://www.honeybeesuite.com/how-to-move-a-hive/; https://www.honeybeesuite.com/before-you-move-a-hive-read-this/

Esta publicação surge no contexto de um pedido de opinião de um leitor sobre a deslocação de colmeias numa distância curta. Na minha opinião, podendo ser feito, a deslocação deve ser feita para um local a uma distância superior a 5 km. Não podendo, utilizem o protocolo da Rusty, ou outro qualquer. Umas vezes resultará melhor, outras vezes resultará pior. A razão para tanta divergência de resultados e opiniões acerca dos protocolos seguidos para deslocar colmeias em distâncias curtas está sobretudo relacionado, na minha opinião, com um aspecto que não é controlado: as colónias em questão têm maior ou menor proporção de abelhas forrageiras no momento em que são deslocadas? Se a proporção de abelhas forrageiras na colónia deslocada é grande, perderão muitas destas, e tal será facilmente observável; se a proporção for baixa, a colónia perderá um número de abelhas que dificilmente se observará a olho nú. Estes protocolos resultam tanto quanto podem resultar, dadas as condições iniciais dos enxames. Milagres acho que não farão! Nem conseguirão reverter a natureza das abelhas, que é fazerem o “homing” [regresso ao local original], como sempre o fizeram ao longo de milhões de anos, quando as suas casas eram em buracos de árvores, árvores que não se deslocam ao final do dia para 50 m de distância.

2 comentários em “deslocar colmeias alguns metros: quando as abelhas nos trocam as voltas”

  1. Bom dia
    Muito bom o estudo!
    De facto, há muita coisa ainda desconhecida em relação a estes espectaculares insectos. Cada colónia tem o seu comportamento.
    Na minha última experiência, desloquei 3 caixas os tais 50m com um método parecido. Fechei as caixas durante 3 dias, com garantia de alimento, água e ventilação e com sombra para não deixar produzir sobreaquecimento da colónia.
    Passados os 3 dias, à noite e antes de abrir a colmeia, obstruí a piqueira com uma folha de jornal bem esticada e colada, de forma a ficar somente a espessura de uma folha.
    Na manhã seguinte, cedo, percebia-se o trabalho das abelhas a tentarem desobstruir a saída/entrada da caixa. A meio da manhã já tinham e pequenos buracos por onde começaram a sair abelhas. fizeram, de facto aquela saída em espuma, algumas voaram em volta da caixa, naturalmente para tentar perceber a diferença do local.
    No final desse mesmo dia haviam, de facto, umas quantas abelhas a sobrevoar o local inicial mas nada de preocupante. Desmontei tudo o que havia no local inicial, deixei um balde de chapa com umas ervas a arder, pulverizei creolina para eliminar algum resto de cheiro do feromona da rainha que pudesse existir e elas acabaram por dispersar.
    Resultado final: cerca de uma semana depois, abri as 3 caixas e verifiquei que uma delas continuava tudo como verificado inicialmente. A 2ª estava muito fraca e quase sem abelhas, sem postura, não encontrei a rainha e com algumas abelhas nascentes mas a colónia estava em risco! A 3ª que era um pequeno núcleo que tinha há umas semanas passado para uma caixa, tinha duplicado o contingente e estava com uma actividade e postura brutal!
    Para não perder a 2ª colmeia, acabei por fazer uma fusão pelo método do jornal e salvei-a!
    A Questão é saber: o que levou à perda da rainha, se morreu na deslocação, ou durante a obstrução, de stress por exemplo, e porque razão, aparentemente as campeiras desta caixa ocuparam a caixa vizinha reforçando-a de contingente! Terão percebido que ficaram sem rainha e abandonaram a colónia, preferindo a outra? terão ficado desnorteadas e no regresso trocaram as caixas?

    É isto! cada colónia reagiu de forma diferente a este teste de stress.
    De facto, estou convencido que o melhor é deslocalizar as caixas para uma distancia grande, acima dos 5 km por 3/4 dias para que seja feito um reset de localização.

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