Entre muitas questões no mundo complexo da apicultura esta é das mais importantes e recorrentes nos dias de hoje: como tratar contra a varroa?
Fig. 1 — Imagem ampliada do ácaro varroa destructor
Para a resposta à questão não há regras universais (que sejam válidas para todos os locais) e intemporais (que sejam válidas para todas as épocas). Como bons princípios, utilize um acaricida que é adequado às suas condições locais e ao momento em que pretende utilizá-lo, utilize-o de acordo com as instruções do fabricante e mantenha registos dos tratamentos que realiza (marca, lote, data de início e término do tratamento bem como resultado obtido).
Tendo em consideração os acaricidas homologados em Portugal para o controle da varroa, vale a pena ter em conta alguns aspetos bem estudados e consensuais na comunidade apícola internacional, a saber:
- Evite o uso de acaricidas à base de piretróides (Apistan e Bayvarol, são as marcas homologadas em Portugal) se há alguma evidência credível de resistência aos seus princípios ativos nas suas colmeias ou em colmeias vizinhas.
Fig. 2 — Jovem abelha com a língua estirada que morreu no momento do nascimento por causa da varroa
- Evite usar os acaricidas com formulações baseadas no timol (Apiguard, Thymovar e Apilife Var, são as marcas homologadas em Portugal), se as temperaturas, durante cerca de um mês, estiverem frequentemente abaixo dos 15ºC ou acima dos 30ºC. Para que estes acaricidas funcionem de forma eficaz, a temperatura ideal situa-se entre os 15ºC e os 30ºC. Se usados com temperaturas abaixo dos 15ºC, muitos ácaros não serão atingidos; se utilizados acima dos 30ºC, as abelhas poderão abandonar a colmeia.
Fig. 3 — Imagem de uma colónia que, por causa das baixas temperaturas, não contacta o suficiente com o tratamento à base de timol ali colocado
- Evite o gotejamento de ácido oxálico/Api-Bioxal se tem criação (operculada ou não) na colónia. O ácido oxálico é tóxico para a criação não operculada e, por outro lado, os ácaros na criação operculada vão escapar ilesos (cerca de 90% da população de ácaros encontra-se na criação operculada). Evite a vaporização/sublimação do ácido oxálico se a colónia tiver criação operculada ou se não estiver preparado para repetir rigorosamente o tratamento três a quatro vezes, com intervalos de cinco dias, para apanhar as varroas foréticas e as varroa emergentes.
Fig. 4 — Imagem das varroas que se multiplicam debaixo dos opérculos na criação operculada
- Esteja ciente de que alguns acaricidas, como o ácido fórmico ou o timol, podem inibir a postura da rainha e podem aumentar a mortalidade das jovens larvas em cerca de 25% (caso do ácido fórmico presente no MAQS, que é a marca homologada em Portugal). Evite estes ingredientes quando é crucial que a colónia aumente o número de abelhas novas para a sua sobrevivência, cenário que se aplica especialmente ao período outono-inverno, durante o qual as colónias dependem do nascimento destas abelhas para chegarem em boas condições à primavera seguinte.
Fig. 5 — Quadro com criação em mosaico, sinal de uma elevada mortalidade de larvas
- Não reduza as doses de tratamento ou o seu tempo de aplicação, pois que os tratamentos parciais são só parcialmente eficazes. Este procedimento errado é também uma ótima maneira de selecionar para as varroas resistentes. Coloque os tratamentos exatamente como o fabricante preconiza, mesmo que isso signifique um pouco mais de trabalho e mais alguma demora. Se eliminarmos uma porção baixa de varroas tal irá obrigar-nos a tratar em épocas menos convenientes mais adiante e, pior, irá contribuir para que haja cada vez mais abelhas doentes. Será mais ou menos como se nós tivéssemos um ácaro do tamanho de um gato nas nossas costas a sugar-nos uma parte do nosso sangue todos os dias. Estas varroas vão continuar a ferir as abelhas, a alimentar-se da sua hemolinfa e a transmitir virús muito perniciosos entre elas.
Fig. 6 — Abelhas doentes por causa das varroas que se alimentam da sua hemolinfa dia após dia
Pelo exposto, não compreendo e também não acredito na vantagem de se fazerem tratamentos que só eliminam as varroas foréticas. Julgo que servirá para melhor compreensão a seguinte imagem: quando pretendo desinfetar as mãos, devo lavar bem as duas e não apenas uma.
Actualização: na altura em que este post foi escrito ainda não se tinha verificado/confirmado que o ácaro varroa se alimenta predominantemente do orgão corpo gordo. Neste momento, decorrente desta descoberta, e pela importância do corpo gordo (orgão equivalente ao nosso fígado) no mecanismo imunitário, na desintoxicação, e outras funções… em suma na vitalidade global das abelhas, entende-se que os ácaros na sua fase “forética” são mais prejudiciais do que se supunha.
Boa noite Eduardo.
Os seus conselhos são sensatos.
Mas, a realidade da esmagadora maioria dos apicultores nacionais, aqueles que detem até vinte colmeias, como podem efectuar um ataque apropriado ao maldito ácaro da varrôa se não tem acesso aos princípios ativos mais indicados? e quando os encontra á venda são a preços proibitivos? Quantos pequenos apicultores estão associados para acederem a estes tratamentos a preços acessiveis? Quantas associações a nivel nacional existem que facultam este “serviço”?
Devido á realidade acima descrita é que a esmagadora maioria dos ditos pequenos apicultores recorre ao que lhes aparece mais á mão ou nem se quer trata as suas abelhas deixando-as á sua sorte.
Aliado á dificuldade de encontrar boas e acessíveis soluções no combate á varrôa a falta de formação é também um fator importante a ter em conta.
Tudo de bom.
Boa noite Martinho
Coloca-me um grupo de questões para as quais não tenho daquelas respostas que alguns gostam. Como não sou político, sinto-me livre para responder de acordo com a minha consciência, com a minha experiência e com aquilo que vejo ou ouço ao meu lado.
Começando pela questão da formação parece-me que, como noutros sectores, a resposta formativa na zona litoral do nosso país é mais frequente e acessível que no interior do país. A internet ajuda a colmatar algumas lacunas, mas não substitui a formação presencial e, em especial, a formação no terreno.
Não tenho a certeza que a maior parte dos pequenos apicultores não tem acesso aos tratamentos e aos princípios activos na luta contra a varroa. Quando iniciei a minha actividade em 2009, com 50 colmeias, era um pequeno apicultor e associei-me sem qualquer dificuldade. Passado um ano passei a ter acesso aos tratamentos homologados a um preço co-financiado. Conheço apicultores que estão associados na mesma associação em que eu estou e que continuam a utilizar tratamentos caseiros. Não estão impedidos de adquirir os tratamentos a 1€ por colmeia, mas acham que são caros, sobretudo porque podem fazer as suas formulações em casa por metade do preço. Como não tenho vocação de cozinheiro e alquimista, como estou no radar da DGAV, como me parece que 1€ é um preço muito razoável a pagar, opto por adquirir os homologados. Posso estranhar outras opções diferentes mas não as julgo. Não me consigo é calar quando se pretende que os homologados são maus tratamentos, que os caseiros é que sim senhor, que os sintéticos são obra do demo e que os orgânicos são azuis da cor do céu.
Vou também aprendendo com o que se passa ao meu lado. Um companheiro que tem colmeias próximas das minhas, na beira, tratou-as com acadrex em setembro (tiras de cartão com amitraz). Na passada semana viu muitas abelhas com varroa e claro fez novo tratamento. Depois do tratamento viu muitas abelhas mortas à entrada da colmeia. Eu tratei cerca de 3 semanas antes com Apivar, ainda em Agosto, e nas minhas colmeias ainda não vejo varroa. No final, somando todas as parcelas, parece-me que sou eu que estou a gastar menos dinheiro. Cada um tem que fazer as suas contas, sugiro apenas que somem tudo o que há a somar.
Outro aspecto que nunca é demais sublinhar: as associações de apicultores têm a obrigação estrita de aceitar a inscrição de qualquer apicultor que o deseje fazer. A FNAP tem 28 associações apícolas agregadas. A minha associação dista de minha casa em Coimbra, 30 Km. Quando estou na minha casa da beira dista muitas dezenas de Kms. Considero que está perto o suficiente. Em regra preciso de me deslocar fisicamente à minha associação cerca de 4 a 5 vezes ano. A maior parte das vezes os assuntos são tratados ao telefone e/ou net. O gasto em combustível para me deslocar à minha associação é perfeitamente desprezível no total dos meus gastos.
Tratar mal ou até não tratar não é apanágio exclusivo dos pequenos apicultores. Conheço pequenos apicultores que tratam as suas colmeias muito bem e conheço apicultores de dimensão média (mais de 100 colmeias) que inventam, que estão constantemente a mudar e a experimentar a última novidade. Quem vive da apicultura (300 e mais colmeias) pouco ou nada inventa. Em regra seguem por terreno sólido. Um erro nesta dimensão não são umas dezenas de euros, são umas dezenas de milhar de euros. A minha sugestão ao pequenos apicultores é que façam os tratamentos como fazem os apicultores que são bem sucedidos e que mantêm as colmeias vivas ano após ano na zona de cada uma. Liguem-se a um mentor com experiência e sucesso.
Hoje foi-me dito que um apicultor na beira, com mais de 100 colmeias, só já tem 11. Perguntei qual a razão da mortandade e foi-me dito que morreram à fome. Não tem nada a ver com tratamentos mas é revelador de uma atitude. Com as abelhas é preciso gastar dinheiro, às vezes muito dinheiro. Para muitos grandes apicultores, como noutros sectores da produção pecuária, as abelhas são vistas como ganadaria/pecuária (livestock) e é necessário ter dinheiro disponível para as tratar e alimentar devidamente. O seu lucro vem depois deste investimento e apenas porque o investimento foi realizado. Não há milagres.
Para os pequenos apicultores o gasto em alimentação é dispensável se deixarem as colmeias com um nível prudente de reservas. O gasto nos tratamentos é indispensável. Sugiro que façam os tratamentos com produtos testados e re-testados. Por caros que sejam os produtos homologados, fica sempre mais caro não tratar ou tratar com um produto caseiro mal formulado.
Martinho, se desejar detalhar um pouco mais as situações que questiona, dentro do que considera ser prudente num espaço público, esteja à vontade. Tenho ideia que o Martinho tem as suas colmeias a sul do Tejo, mas não sei se estou certo.
Cumprimentos!
Só mais um aspecto adicional aos excelentes comentários do administrador lá acima. A questão do preço dos produtos homologados. Se aplicados na altura certa e de forma correcta e integrada numa estratégia de combate que enquadra o ano inteiro e o diagnostico e controlo dos níveis de infestação continuo e pré- e pos-tratamento fazem o trabalho e salvam a colmeia do colapso. Mesmo um repetido tratamento a custo não subsidiado sai nesta luz mais barato que de ter substituir o enxame e perder a colheita de um ano inteiro…… Preço de um enxame decente no mercado de hoje = +/- 70€, perda de uma colheita por colmeia (mesmo se fraca de só 20 kg) vendido enfrascado a um preço módico de 5€/kg = 100€, uma rainha nova qualquer virgem = 5€, fecundada = 15-20€……. perda de ao menos um enxame que podia ter sido tirado desta colmeia para aumentar efectivos, substituir perdas, ou ser vendido = 70€, Cera nova para substituir a cera ruim ou destruida por traça de uma colmeia morta = 10-13€ (mais se as alças foram destruidas também) a isso soma se ainda o custo do trabalho de remover a colmeia morta do apiario e da sua limpeza e posterior repovoação, os possíveis custos mais elevados para a alimentação para por o novo enxame em condições de poder produzir 12 meses depois………..é fácil de fazer as contas, mas para voltar a ter uma colmeia forte em produção diria que a perda real é bem além de 200€. Comparado com isso, os custos de um tratamento homologado a preço do mercado são peanuts……..
Sou da zona de Coimbra e tenho 3 colmeias é possível associar me a alguma associaçã? Pretendo fazer nesta área grade investimento, mas para tal preciso de condições, nomeadamente alguma formação.
Atenciosamente,
Boa noite, Rafael! Como é de Coimbra sugiro que contacte a Associação de Apicultores do Litoral Centro.