shake, shake: fazendo os ácaros soltarem as suas garras


Conforme apontado pelo Dr. David de Jong em 1982, os ácaros aderentes de forma superficial a uma abelha são relativamente fáceis de remover agitando as abelhas num líquido [ou açúcar em pó], mas os ácaros que estão profundamente alojados nas membranas intersegmentais no abdómen das abelhas podem ser mais difíceis de desalojar.

Curioso em determinar exatamente como os ácaros varroa se seguram numa abelha, passei algum tempo olhando-os de perto sob o microscópio.

É fascinante observar um ácaro caminhando sobre o vidro. A cada passo, o ácaro infla um empódio pegajoso. Nesta foto, coloquei um ácaro vivo de costas numa lâmina de microscópio e, em seguida, coloquei uma lamínula de vidro fina sobre ele. O ácaro é obrigado a andar de cabeça para baixo no vidro. O empódio da perna superior nesta foto está a começar a se desdobrar; o próximo está totalmente estendido no vidro.”

fonte: https://scientificbeekeeping.com/6960-2/

Nota: para além desta capacidade de grande aderência, os varroas mimetizam também os odores do corpo das abelhas de forma perfeita, o que lhes permite escapar boa parte das vezes ao comportamento de auto e hetero limpeza das abelhas. Esta capacidade de ocultação é mais um aspecto que faz deles uma arma de aniquilação massiva das abelhas.

enxameação e pilhagem: um dispositivo tecnológico de alerta

Na publicação anterior fiz alusão a um dispositivo tecnológico. Embora não fosse minha intenção inicial escrever em profundidade sobre este dispositivo, dado o elevado número de mensagens e e-mails que recebi a questionarem-me sobre a função deste equipamento, decidi complementar a publicação anterior com informações mais detalhadas acerca das funcionalidades deste equipamento.

Sensor de radar e vibração instalado na colmeia.

Existem dois eventos num apiário que requerem intervenção imediata do apicultor: enxameação e roubo.

A enxameação é um evento natural durante o qual cerca de metade da população de abelhas deixa a colmeia para estabelecer uma nova colónia. Na medida do possível, os apicultores gostam de evitar a enxameação e a perda associada da produção de mel, utilizando técnicas de maneio adequadas. Quando a enxameação acontece inesperadamente, no entanto, o apicultor gostaria de ser alertado o mais rápido possível. A enxameação pode ocorrer em questão de minutos. Geralmente começa com um grande alvoroço vindo da colmeia, seguido por um rápido voo de milhares de abelhas numa nuvem para o exterior. O enxame pousa inicialmente e forma um aglomerado próximo à colmeia original antes de voar para seu destino final. Este acampamento [bivouac] pode durar uma hora, ou dependendo do clima, pode durar dias. A ação rápida durante a fase de acampamento é a melhor chance do apicultor de capturar um enxame e, assim, aumentar seu efectivo.

Em épocas de fluxo insuficiente de néctar, as abelhas de uma colmeia mais forte podem atacar uma colmeia mais fraca e roubar o seu mel. Se forem bem-sucedidos, os ladrões podem limpar todo o mel da colmeia em poucos dias. Roubar tende a ser um evento persistente durante todo o dia, geralmente acompanhado por um alto nível de ruído e atividade frenética de voo contínuo na frente da colmeia. Uma maneira de lidar com essa situação é reduzir temporariamente o tamanho da entrada da colmeia ou fechá-la totalmente.

Uma atividade comum e inofensiva é o “voo de orientação em massa”, uma atividade das abelhas que até agora escapou a uma explicação biológica concisa. Neste cenário, uma nuvem substancial de abelhas voa para frente e para trás na frente da entrada da colmeia. Voos de orientação em massa costumam ser confundidos com enxameação, excepto que as abelhas não voam para longe da colmeia e retornam à colmeia após alguns minutos. O nível de atividade de voo, de voos de orientação e enxameação, pode ser muito semelhante; no entanto, o nível de ruído acústico associado aos voos de orientação é consideravelmente mais baixo. Embora os voos de orientação também sejam detectados pelo nosso sensor, eles geralmente não requerem intervenção do apicultor.

Observando cuidadosamente a atividade de voo perto da entrada da colmeia e o ruído acústico da colmeia, um apicultor experiente pode dizer rapidamente se as abelhas estão felizes, tristes ou enraivecidas. No entanto, muitas vezes não é prático para o apicultor verificar diariamente as colmeias num apiário remoto. Um sistema de monitorização de colmeias de baixo custo é de interesse para avisar o apicultor que a enxameação está para acontecer, ou acabou de ocorrer, ou que um roubo/pilhagem está em andamento.

Dispositivo Janus.

Um sensor externo, conforme ilustrado, pode atender ao requisito acima mencionado. Mostraremos que as observações de eventos de enxameação, feitas tanto com um radar Doppler quanto com um sensor de vibração, estão altamente correlacionadas, embora estejam baseadas em fenómenos totalmente diferentes. Quando ocorre uma grande perturbação da colmeia e os níveis de Doppler e de vibração estão altos, é provável que seja uma enxameação. Quando os níveis diferem significativamente, então o evento é mais provavelmente devido a um roubo ou a um “voo de orientação”.

Diagrama do bloco do sensor de radar e vibração.

Conclusão
Tanto o radar quanto o sensor de vibração, quando montados na parede externa de uma colmeia, são capazes de detectar a atividade de enxameação e roubo/pilhagem. Embora o sensor de vibração por si só seja consideravelmente mais barato, o desempenho de detecção pode ser melhorado (isto é, falsos alarmes reduzidos) combinando medições de ambos os sensores e submetendo-os a um PCA (principal component analysis)*.

* “Numa experiência, numa colmeia (8B), o espaço disponível para a expansão da população de abelhas foi limitado propositadamente para induzir a enxameação. Na verdade, a colmeia enxameou cinco vezes. A análise de PCA identificou de forma clara e inequívoca esses eventos, permitindo que os enxames fossem capturados. Notámos um nível reduzido de atividade cerca de dez dias antes do enxame primário. Este nível de atividade reduzido foi relatado num outro artigo**, mas é difícil de detectar automaticamente ou com antecedência.”

fonte: https://ieeexplore.ieee.org/document/9346064

** S. Ferrari, M. Silva, M. Guarino and D. Berckmans, “Monitoring of swarming sounds in bee hives for early detection of the swarming period”, Comput. Electron. Agriculture, vol. 64, pp. 72-77, 2008.

Notas:

  1. tenho ideia que as colmeias nos EUA são fabricadas com tábuas com 2cm de espessura. Em Portugal, como sabemos, as tábuas das nossas colmeias têm 2,5 cm de espessura. Se esta diferença de espessura deve ser ou não tida em consideração, na eventualidade de desejarmos colocar este dispositivo nas nossas colmeias, não ficou claro para mim da leitura que fiz do artigo original.
  2. em apiários não cobertos por rede de telemóvel, temo que a transferência de dados para os nossos telemóveis ou computadores seja impossível. Não o garanto, é um aspecto que também não está absolutamente claro para mim.

novas tecnologias na apicultura: uma opinião e uma reflexão

Deixo em baixo uma opinião do apicultor J.F. sobre um dispositivo tecnológico que apareceu recentemente no mercado e sua visão sobre a introdução de tecnologias em determinados sectores agrícolas e sua comparação com o sector apícola. A terminar apresento a minha reflexão.

Uma patente comercial foi recentemente emitida com base na “intenção de uso” para a “JANUS HIVESENTRY” para a Maine Biosensors LLC, portanto, mais uma esperança que entra no mercado, baterias não incluídas.

O sensor Janus.

Não há vida útil mais curta do que os muitos flashes das empresas de “tecnologia para colmeias”. A verdade básica é que os apicultores estão entre os clientes mais forretas de toda a agricultura e gastarão US $ 10 na tentativa de economizar US $ 5.
Os produtores de leite têm espalhadores de estrume que dispensam quantidades precisas de fertilizante para cada metro quadrado de terra localizado no GPS, calibrados para dados de humidade e vegetação coletados por satélites apenas para melhorar a produção de feno para alimentar suas vacas, enquanto a maioria dos apicultores ainda lutam com a mudança de “gerir pelo calendário” para “gerir pelas mudanças sazonais” (mais quente, mais cedo), e a maioria nem sequer consegue manter um simples caderno com anotações do que observa e faz.

A apicultura permanece essencialmente inalterada desde a época de Langstroth, excepto pelo impacto de doenças exóticas invasivas e pragas perpetradas na agricultura pelo “Comércio Mundial”. Eu vejo isso como uma coisa boa, semelhante ao tiro ao alvo com meu Fausti, uma espingarda quase idêntica à Benelli que meu avô usava. Coisas que são um prazer nem sempre se tornam mais prazerosas com o acréscimo de tecnologia, e tenho sido privilegiado com a apicultura que continua sendo um prazer.” J.F. (Bee-L, 07-12-2021)

Nota: este ponto de vista, não coincide totalmente com o meu ponto de vista. Contudo entendo-o, na medida que uma parte do prazer que retiro da minha apicultura está associado ao desafio, e sua superação, que encontro na avaliação regular que faço das minhas colónias. Mais, associado a esta vontade de avaliar está o prazer em obter a resposta para o “suspense” que cada colmeia por abrir representa. Se um conjunto de sensores deste e daquele tipo, instalados fora e dentro da colmeia, fizerem esta avaliação por mim, temo que a minha apicultura perda a componente cognitiva mais complexa e estimulante, a de avaliar. Perderia também um aspecto lúdico muito intenso e prazeroso, o do “suspense antes de abrir”. Temo que a minha apicultura passasse a ser predominantemente uma actividade psico-motora, isto é, tirar e colocar coisas na colmeia. Contudo, dispositivos que meçam com rigor os acontecimentos da colónia, por ex. a taxa de infestação por varroa a cada semana/quinzena, ou outros aspectos, dispositivos que me forneçam dados inteligíveis, que me permitam calibrar/ajustar as minhas intervenções poupar-me-ia dinheiro, tempo e esforço. Não estou certo se os adoptaria e não estou certo que lhes viraria as costas. Muito provavelmente compraria alguns e faria os meus ensaios-piloto. E avaliaria.

Bob Binnie entrevista: tratamento da varroose com ácido oxálico

Grato ao Nuno Cascais por me ter chamado a atenção para este conjunto de entrevistas conduzidas pelo apicultor norte-americano Bob Binnie a dois investigadores da Universidade do Estado da Georgia. Jennifer Berry e Lewis Bartlett estão a conduzir esta investigação sobre o tratamento da varroose com recurso ao ácido oxalico. O meu interesse pelos tratamentos com ácido oxálico não é de agora (ver aqui e aqui). Contudo, o aumento substancial de apicultores a recorrerem a este químico simples para fazerem os tratamentos tem provocado um interesse cada vez maior nos investigadores. E assim, os estudos controlados que têm surgido recentemente ajudam-nos a compreender melhor as virtudes e limitações desta opção com o ácido oxálico.

Em baixo elenco um conjunto de dados e conclusões que estes dois especialistas têm retirado nos seus ensaios com a utilização de ácido oxálico:

  • ao contrário de Randy Oliver, que no clima quente e seco do norte da Califórnia, tem tido sucesso com os dispensadores lentos de ácido oxálico, isto é, com os suportes celulósicos com uma mistura de glicerina e ácido oxálico, no clima quente mas húmido da Geórgia os dispensadores celulósicos não são efectivos no controlo/abaixamento do número de varroas de acordo com os resultados obtidos por esta equipa de investigadores; a ecologia do local, em particular a maior humidade relativa do ecossistema do estado georgiano, parece estar na causa desta pouca efectividade, associado ao facto de neste estado as colónias terem criação presente ao longo de 12 meses, ou próximo disso;
  • outro aspecto que esta equipa testou foi o regime de tratamentos utilizado. Por exemplo vaporizaram com ácido oxálico as colónias num regime de 7 vaporizações com 5 dias de intervalo entre vaporizações; conseguiram estabilizar o número de varroas mas não conseguiram que a população de varroas decrescesse até números abaixo do limiar de danos económicos, isto é menos de uma varroa por cem abelhas adultas;
  • o pressuposto de que todas as colónias têm a mesma taxa de infestação no início dos tratamentos e, consequentemente, a mesma taxa de infestação no final do tratamento não é realista. Nesta publicação “arrisquei a pele” dizendo isto mesmo; é reconfortante ouvir agora a Jennifer Berry defender basicamente o mesmo: monitorizar sim, mas monitorizar todas as colónias porque todas as colónias apresentam à partida do tratamento e no final do tratamento diferentes taxas de infestação;
  • numa abordagem de Gestão Integrada de Pragas estas opções com ácido oxálico e neste contexto, presença de criação durante quase todo o ano e clima quente e húmido, podem não servir os objectivos dos apicultores;
  • Binnie coloca a questão sobre a extensão do período forético/fase de dispersão, se este pode ser inferior a 4 dias. Resposta: esqueçam tudo o que julgam saber. Pode ser menos de 4 dias. Como já referi em publicações anteriores, em laboratório, Rosankranz e colegas, identificaram varroas com um período forético de cerca de um dia;
  • o conceito tão caro à Gestão Integrada de Pragas de apenas tratar as colónias que atingiram o limiar de dano económico (2 a 3% de infestação de abelhas adultas) deve ser revisto. O “super-organismo” é o apiário todo, não a colónia. Os fenómenos de deriva, de pilhagem, os zângãos vagabundos, permite às varroas viajarem rapidamente entre colónias do mesmo apiário e entre colónias de apiários diferentes. Quando se identifica uma colónia que ultrapassou o limiar de dano económico devem tratar-se todas as colónias desse apiário;
  • com os métodos mais comuns de monitorização dos níveis de infestação, como a lavagem de abelhas adultas para fazer soltar os ácaros ou a queda destes em cartolinas/tabuleiros colocados no fundo das colmeias, podemos não obter uma boa representação, um número fidedigno, do nível de infestação das colónias.

identificando o impacto das condições climáticas nas doenças das abelhas melíferas

Publicado em novembro deste ano, este estudo longitudinal que decorreu entre 2006 e 2016 em Inglaterra e no País de Gales, com uma enorme riqueza de detalhes, teve como âmbito e objectivo clarificar a interacção entre a doença em abelhas e o clima, os dois principais causadores de perda de colónias, nas palavras dos autores. A equipa de investigadores, combinaram os registros de doenças resultantes das inspeções ao estado sanitário das colónias com dados meteorológicos para identificar o impacto do clima na loque europeia, loque americana, paralisia crónica das abelhas, varroose, ascosferiose e criação ensacada.

Segundo os autores “As abelhas melíferas sofrem de uma variedade de patógenos bacterianos, fúngicos, microsporídicos e virais, bem como ácaros ectoparasitários, que podem levar a uma saúde precária e à perda de colónias. Especificamente a loque europeia, loque americana, paralisia crónica das abelhas, varroose, ascosferiose e criação ensacada. São todas doenças que podem ter efeitos adversos diretos bem documentados em colónias de abelhas, como a deterioração da criação e paralisia de abelhas adultas. Além dos efeitos diretos óbvios sobre a saúde da colónia, a doença pode ter consequências indiretas mais subtis que são menos bem definidas e mais difíceis de estudar. Por exemplo, a perda de obreiras devido à infestação da colónia com ácaros Varroa destructor resulta em forrageamento pobre e subsequente inanição de larvas e adultos. Além disso, o encurtamento da expectativa de vida das abelhas infectadas com o vírus das asas deformadas associado ao ácaro pode levar à perda de colónias no inverno. Doenças da criação, como loque europeia, loque americana, ascosferiose e criação ensacada, são conhecidas por terem efeitos diretos significativos na saúde das colónias por causa de seu impacto nos estágios iniciais da vida, posteriormente limitando o número de futuras operárias disponíveis para realizar tarefas essenciais na colmeia.

As abelhas atendem a todas as suas necessidades nutricionais, procurando no seu ambiente local néctar (carboidrato) e pólen (proteína), mas o forrageamento depende muito das condições climáticas. Chuvas, baixas temperaturas e ventos fortes são conhecidos por restringir a atividade de forrageamento das abelhas. A escassez de pólen pode ocorrer após alguns dias sem forrageamento, levando à operculação mais precoce das larvas e redução da amamentação/fornecimento da geleia de obreiras. O consumo de pólen não fresco pode causar disbiose intestinal [desequilíbrio na flora intestinal em que existe alteração na quantidade e na distribuição de bactérias no intestino] e um aumento na prevalência de patógenos. O mau tempo na primavera e no verão, quando as colónias são mais populosas, pode levar ao aumento da congestão das colmeias, o que, por sua vez, tem sido relacionado com um aumento na transmissão de doenças. A mudança climática pode trazer um clima mais severo e imprevisível que pode, em última análise, ser prejudicial à sobrevivência das colónias de abelhas e pode alterar as fontes de alimento naturalmente disponíveis.” […]

Entre 2006 e 2016, houve 317.838 visitas às colónias por inspetores, com uma média de 28.894 por ano. A prevalência de cada doença variava anualmente. A loque americana foi a doença mais rara, seguida pela paralisia crónica das abelhas e loque europeia. Varroose, criação ensacada e criação de giz [ascosferiose] foram as três doenças mais prevalentes observadas durante as inspeções.”

Número total de casos de diferentes doenças das abelhas melíferas em Inglaterra e no País de Gales entre 2006 e 2016. Cada condado foi normalizado para casos por 1000 colónias visitadas para evitar viés do número de inspeções.

Vejamos as conclusões deste estudo fecundo de pistas para todos os apicultores que pretendem uma compreensão mais completa das relações entre o clima e a prevalência destas doenças:

  • A nossa nova abordagem analítica demonstra claramente pela primeira vez que o risco de quatro das seis doenças das abelhas melíferas é impactado por condições meteorológicas, apesar de ser causado por diversos agentes causadores que abrangem bactérias, fungos, vírus e ácaros.
  • As condições meteorológicas temperatura, precipitação e vento foram selecionadas por causa de sua clara influência no forrageamento e reprodução das abelhas.
  • O Varroa é um problema considerável para os apicultores em todos os lugares, devido à sua ubiquidade e vectorização de outras doenças. A infestação pelo Varroa aumentou com o aumento da temperatura e reduziu com o aumento da chuva e do vento. Embora a reprodução do Varroa exija a criação presente, os ácaros Varroa transferem-se entre as colónias de abelhas montadas nas costas de abelhas adultas que andam em busca de alimentos. A atividade de forrageamento das abelhas melíferas aumenta à medida que as temperaturas aumentam e quando a chuva e o vento diminuem. Como tal, os comportamentos que levam à transferência das abelhas entre as colónias, como a deriva, onde as abelhas adultas retornam para uma colónia diferente, e roubo/pilhagem, onde as forrageadoras roubam mel de outras colónias mais fracas, podem ocorrer durante os períodos que também permitem o forrageamento. Os eventos de transmissão ao nível de colónia, portanto, requerem tempo bom, e a maioria das invasões ocorreu no final do verão.
  • Nossa análise sugeriu que o risco do vírus da criação ensacada aumentou com o aumento das temperaturas, o que está de acordo com outros estudos, que sugerem que o vírus da criação ensacada tem maior probabilidade de ocorrer nos meses mais quentes.”
  • Criação de giz/ascosferiose é causado por um patógeno fúngico, e essa doença da criação tem uma relação oposta com a temperatura, tornando-se mais provável de ocorrer à medida que as temperaturas baixam. Embora isto aparentemente contradiga as observações de laboratório que determinaram a temperatura ideal para o crescimento do agente causador em 30 ° C, a temperatura no ninho com criação presente numa colónia de abelhas permanece constante, mesmo durante os períodos de frio. Os patógenos fúngicos precisam de humidade para se replicar e se espalhar, contudo não encontrámos nenhuma relação entre chuva e risco de criação de giz, o que é surpreendente.
  • Nossas observações indicam que o surgimento da paralisia crónica das abelhas é independente de qualquer mudança nos padrões climáticos, destacando uma causa alternativa para o surgimento. Estudos anteriores indicaram um aumento do risco de paralisia crónica das abelhas associado a certas práticas de apicultura, como a importação de rainhas, a escala da operação apícola ou a colocação de capta-pólenes nas colónias.
  • A loque americana foi a doença mais rara, com apenas 46 relatados em Inglaterra e País de Gales em 2016, muito mais baixa do que outros países. O baixo número de observações provavelmente contribuiu para nossa incapacidade de relacionar o risco de loque americana com qualquer condição específica. A loque americana é uma doença epidémica em Inglaterra e no País de Gales, com a maioria dos casos sendo provavelmente causados por acções humanas, como a importação de mel, e não pela disseminação natural. A loque americana é uma doença difícil de modelar, pois muitos dos veículos que lhe estão associados são difíceis de identificar, uma vez que estas epidemias costumam ser oportunistas e aleatórias, e os casos costumam ser exponencialmente baixos. A contribuição da propagação antropomórfica/com origem humana tem sido observada noutras regiões.
  • A loque europeia foi mais prevalente do que loque americana (356 casos em 2016), e nossa análise destacou algumas características interessantes desta doença endémica. O risco de loque europeia aumentou com altos níveis de chuva, clima associado a más condições de forrageamento. Os casos de loque europeia têm sido associados a condições de setresse nas colónias, como a falta de alimentos. Embora as abelhas armazenem quilos de mel durante os meses de verão, elas armazenam uma quantidade relativamente pequena de pólen. Períodos de chuva ou ventos fortes reduzem a oportunidade de forrageamento e podem adicionar setresse nutricional às colónias de abelhas, possivelmente contribuindo para surtos de loque europeia. Curiosamente, as abelhas recorrem ao canibalismo da criação durante os períodos de forrageamento insuficiente, e isso poderia contribuir para um aumento direto da transmissão de parasitas da criação dentro da colmeia. O risco de loque europeia no sul e no oeste é muito reduzido, sugerindo que o clima é um fator importante na distribuição/prevalência desta doença.

fonte: https://www.nature.com/articles/s41598-021-01495-w

Nota: os estudos científicos não se preocupam com a verdade geral e absoluta. De uma forma mais humilde, procuram compreender as relações entre as variáveis num contexto específico. No caso deste estudo não devemos esquecer que o contexto onde ele foi levado a cabo, Inglaterra e e País de Gales, é outro diferente do nosso. No nosso caso, atrevo-me a dizer que o calor extremo que se atinge nos meses de julho e agosto em certas zonas do nosso país tem um contributo inegável na redução do forrageamento, e deve ser uma variável a considerar por todos nós para, em conjunto com os dados deste estudo, poder fazer uma aproximação mais afinada à realidade da doença em colónias de abelhas no nosso país.

um documento essencial para a sobrevivência da apicultura portuguesa

Deixo em baixo o documento elaborado pelos apicultores João Neto e José Vicente, da Melbionisa, no âmbito de 2ª fase de consulta para a elaboração do PEPAC, 2023-2027 (ver aqui). Este documento deve ser lido com toda a atenção por todos nós, em particular pelas Associações de Apicultores, que o poderão/deverão ter como base de trabalho nesta fase de consulta do PEPAC 2023-2027. Tal como actualmente está desenhado, este Plano Estratégico para os próximos 5 anos não responde às dificuldades, necessidades e justas aspirações dos apicultores portugueses. A todos os companheiros, incentivo que façam chegar este documento às Vossas Associações, para que estas sejam os megafones das nossas preocupações, das nossas propostas, das nossas esperanças.

uma conversa no Bee-L sobre teoria e prática apícola

Um dos grandes passos para se tornar um verdadeiro apicultor é transcender as ideias apresentadas nos cursos básicos e na literatura básica e perceber que as abelhas são muito complexas e bastante inteligentes e que a apicultura não é apenas uma relação [assimétrica] de cima [apicultor] para baixo [abelhas] . Há uma conversa envolvida.

Algumas coisas são bastante previsíveis, mas outras são únicas e podem surpreender-nos. Você pode ler todos os livros, assistir a todos os vídeos, fazer todos os cursos e ter uma centena de colmeias, mas se não conseguir ler as abelhas, você está apenas a metade do caminho.” A.D.

A,B, C das abelhas.

Acho que fiz o percurso ao contrário. Comecei trabalhando para “verdadeiros apicultores” e só depois descobri que havia “cursos” para esse tipo de coisa. Ser um leitor voraz, no entanto, pelo que vejo, nunca me fez mal.” P.B.

Como tenho referido, teoria sem prática é um exercício fútil; prática sem teoria é actuação cega.

Quantas vezes tenho verificado que a teoria e conhecimentos transmitidos nos cursos básicos de apicultura são hiper-simplificações? quantas vezes tenho observado que os iletrados e sem formação andam cegos e não conseguem focar devidamente o seu olhar sobre aspectos fundamentais e críticos do comportamento das abelhas? quantas vezes tenho procurado fazer a melhor síntese entre o que leio e o que observo nas minhas colónias? Questões para cada um responder, se assim o entender.

reação dos enxames a um generoso fluxo de pólen: o testemunho de um amigo apicultor

Uma das diversas e sempre pertinentes questões que o meu amigo Marcelo Murta me colocou nas nossas muitas conversas foi esta: “Eduardo, como e quando estimulas os teus enxames?” Referi que tinha deixado de utilizar alimentação estimulante há vários anos atrás. Esclareci que o pólen com qualidade e em abundância, que as minhas abelhas colhem no campo e do qual se alimentam a partir de meados de fevereiro, é o único estimulante que conhecem. Para os meus objectivos, esse fluxo vem em boa hora e em quantidade suficiente para estimular os enxames. Esta publicação do Marcelo vem confirmar o que vejo todos os anos nos meus apiários de forma consistente.

Deixo em baixo o texto que o Marcelo teve a amabilidade de escrever para o meu blog. As fotos que acompanham e ilustram o texto são suas.

Meio envolvente.

“Após algumas observações que fui partilhando com o Eduardo nas últimas semanas sobre a minha experiência, fui desafiado pelo mesmo a partilhá-las convosco. 

Ao longo do último ano, anotei as florações existentes num determinado local e, após alguma reflexão, percebi que esse mesmo sítio me iria oferecer maior potencial do que tinha em Coimbra. Potencial este no que toca a localização, exposição solar, intensidade e variedade dos fluxos e pouca vespa asiática (pelo menos por agora). 

No passado dia 19 de Setembro, procedi à transumância de todas as minhas colónias situadas em Coimbra. 75% viajaram para um recanto bastante bonito em Alcobaça e as restantes mudaram de apiário, mas continuam por Coimbra. 

Com um maneio semelhante em todos os enxames, observo que as colmeias de Alcobaça evoluíram estrondosamente num espaço de um mês e meio e que as restantes 25% (Coimbra) estão ainda mais atrasadas e enfraquecidas. Não “culpo” a varroa ou vespa velutina pela situação, mas sim dois fatores extremamente importantes: (1) a existência de um variado e constante fluxo de pólen em Alcobaça desde setembro e (2) a inexistência de um bom e rico fluxo de pólen em Coimbra. 

As fotos que se seguem são referentes aos enxames transumados para Alcobaça.

Na primeira observação, realizada após 3 semanas (10 de outubro), foi possível verificar o forte fluxo de pólen ao longo dos quadros que ia observando. De relembrar que os enxames chegaram com quadros vazios de qualquer reserva de pólen.

Quadro com mel e pão de abelha fresco.

Nesse mesmo dia, também foi visível o impacto deste fluxo constante e variado.

Quadro de criação.
Quadro de criação com uma grande abóbada de mel e pólen. Acredito que nesta descrição o Eduardo colocaria: “estes são os quadros que gosto de ver à entrada e saída do inverno” :).

A 29 de Outubro, a cadência manteve-se, sendo possível de verificar uma forte manifestação do fluxo de néctar uma vez que já era possível sentir os seus doces odores na aproximação ao apiário e, claramente, visível no interior da colmeia, resultado dos poucos mas bons eucaliptos existentes na zona.

O padrão recorrente nos diversos enxames:

Quadro de criação.
Ninho com abelhas.

Após 6 semanas, os enxames transumados em núcleos levaram a primeira meia alça e sobreninho (“colmeia armazém“) para receber o fluxo atual proveniente do eucalipto e de preparo para a entrada do fluxo de medronheiro, que se encontra ativo neste momento.

Colmeia com meia alça.

Não consegui detetar a fonte de pólen nos meses de setembro e outubro. No entanto, havia uma forte predominância da Tágueda, mas sem qualquer visita por parte das abelhas. Verifiquei sim a predominância de abelhas nos figos e no alecrim, que já se via em flor, na altura. Penso que haverá outras florações com maior interesse polinífero que não me são conhecidas (os locais que me ajudem). Ao longo destes dois meses, observei, principalmente, a entrada de pólen laranja, amarelo e um branco amarelado.

Na foto seguinte é visível alguma variedade do pólen armazenado nas últimas semanas. É visível um pólen branco que nos levantou alguma curiosidade sobre a sua possível origem.

Quadro de pólen em tons de laranja, azuis, cinzentos e brancos.

Os enxames de Coimbra encontram-se, à data de 29 de outubro, maioritariamente sem criação e com reservas de pólen praticamente inexistentes.

A foto seguinte representa o padrão: algumas reservas de mel, néctar e uma clara ausência de pólen que se reflete numa interrupção de postura por parte da rainha. “

Quadro de um enxame em Coimbra com abelhas e néctar.