alive and kicking

Num período de interregno da minha actividade apícola no campo, o bichinho permanece, e uma parte do meu tempo é ocupado a pesquisar, ler, reflectir, sonhar sobre abelhas. Como mestre em Ciências da Educação, é natural que me interesse muito a faceta pedagógica/andragógica, interesse que consigo expressar em boa medida com este blog. Sem o apoio de minha mulher e de meu filho tudo seria muito mais difícil. Um beijo para Vós!

Agradeço a todos os que acompanham as publicações que vou fazendo, são uma grande motivação para continuar. Nos últimos dois meses a maior parte das 20 mil visitas são expectavelmente leitores de Portugal… mas não só. Fica em baixo o escalonamento por país de origem das visitas ao abelhas à beira. Muita saúde para todos e muita saúde para as vossas abelhas onde quer que estejam.

o programa apícola francês: apoios à transumância para 2023

Os apoios à transumância são críticos para a sustentabilidade do sector, porque cada vez mais o apicultor tem de “andar atrás” de fluxos. Se os fluxos da primavera não dão (como não deram este ano) transuma-se as colónias para zonas onde os fluxos de verão poderão dar alguma coisa. Se nem uns nem outros dão, transuma-se para a polinização de pomares,… e outras combinações possíveis. Para fazer a transumância de colónias são muito úteis alguns equipamentos dedicados, geralmente dispendiosos, indispensáveis para fazer um trabalho com melhores condições de higiene e segurança e com mais eficiência e eficácia. Estes apoios à sua aquisição fazem uma grande diferença no momento da decisão para avançar.

Nesta publicação apresento a actualização para 2023 dos apoios ao dispor dos apicultores franceses para modernizarem as suas operações de transumância. Em baixo deixo a tradução (para aceder ao documento original clique na imagem em baixo).


“Este dispositivo visa ajudar a financiar equipamentos para modernizar os apiários e reduzir a dureza do trabalho durante as operações de transumância.

O auxílio é de no máximo 40% do montante sem impostos do investimento elegível.

A ajuda financeira é co-financiada: 50% com créditos europeus (FEAGA) e 50% com créditos nacionais.

Investimentos elegíveis

  • Gruas
  • Empilhadores todo o terreno de 4 rodas
  • Carrinhos com motor elétrico
  • Empilhadores elétricos
  • Reboques
  • Plataformas elevatórias
  • Bandeja de carga para veículos
  • Paletes
  • Roçadeira com autopropulsão
  • Roçadeira de mochila
  • Melhoramento/adaptação dos locais de transumância
  • Balanças eletrónicas com informação remota

Valor mínimo de ajuda: € 700 por pedido (representa um valor mínimo de investimentos elegíveis de € 1.750)
Montante máximo da ajuda: a ajuda é limitada anualmente por exploração aos seguintes montantes:

Até 150 colónias declaradas: 7.000€ de ajuda correspondente a um montante total de investimentos elegíveis de 17.500€ excluindo impostos;

Mais de 150 colónias declaradas: 15.000€ de ajuda correspondente a um montante total de investimentos elegíveis de 37.500€ excluindo impostos.

Nota: nesta publicação indiquei os equipamentos e valores máximos elegíveis para o ano de 2021.

Notas: 1) O FEAGA também abrange Portugal. 2) Estive a ler e reler as condições/regulamento dos actuais apoios aos apicultores transumantes portugueses e não entendi as normas/artigos* (ver aqui, na pag. 301-302, secção IV). Se alguém quiser explicar pode utilizar a caixa de comentários para o fazer. Desde já o meu bem-haja!

  • não deixa de ter alguma ironia não ter compreendido, num documento escrito na minha língua materna, que apoios em concreto tem o apicultor português, e facilmente ter entendido os apoios que tem um apicultor francês, e escritos numa língua que não é minha.

a melada de azinheira: um caso específico

Até há quatro anos atrás, 3 dos meus 12 apiários estavam situados numa pequena freguesia do distrito da Guarda, num território com condições edafo-climáticas muito particulares, povoado por alguns sobreiros, muitas azinheiras, e onde não se viam castanheiros — a 10 Km da Guarda! Estes três apiários albergavam em média 130 colmeias. Anos houve de terem produzido cerca de 1200 kgs de mel de melada de azinheira. Esta melada começava a ver-se nas meias-alças no início de julho e terminava no início de agosto. Todos os anos colhia mel desta melada, mas os melhores anos estiveram associados a uma primavera sem ondas de calor e um mês de julho quente e com madrugadas enevoadas.

Quercus ilex rotundifolia (azinheira)

A propósito da coleta pelas abelhas da melada das azinheiras esta tem duas origens, de acordo com os especialistas: 1) as secreções da planta, em particular durante processo de formação das bolotas; 2) as excreções dos afídeos.

Bolotas de Quercus ilex mostrando secreções de melada. a. Bolota seca (esquerda) e bolota em desenvolvimento secretando melada, que surge entre a cúpula e a bolota. b. Desenvolvimento de melada na bolota. c. Bolota seca secretando melada. d. Cúpula com melada após a queda da bolota. Fotografias: P. López (a) e A. Gómez Pajuelo (b–d). Fonte: The profile of phenolic compounds by HPLC-MS in Spanish oak (Quercus) honeydew honey and their relationships with color and antioxidant activity, (2023).

Abelha libando a melada excretada pelos afídeos nas folhas de uma árvore .

apicultores da Europa Ocidental temem pelo futuro

Excelente artigo! Por esta razão deixo a tradução (os sublinhados/negrito são meus). Foi publicado em 2022.

“Em frente à loja de mel Api Douceur em Giromagny, em França, está um recipiente de vidro incomum ao lado do caminho que leva às colmeias. Trata-se de uma vending machine, instalada pelos donos do apiário em 2019. “Como éramos apenas dois, inicialmente não conseguíamos abrir a loja em horários regulares, então tivemos a ideia de uma vending machine, para permitir que os transeuntes, ou mesmo os caminhantes de domingo, comprem seu pote de mel”, diz Flavien Durant, 31 anos, que administra a empresa ao lado de Patrick Giraud desde 2017. A máquina de venda automática ajuda a expandir sua base de clientes e tentar lucrar com um comércio cada vez mais precário.

Embora Flavien e Patrick produzam em média oito toneladas de mel por ano, em 2021 o número caiu para 300 quilos. A maioria das 400 colmeias que tinham no final do inverno não produziram mel. A maioria dos apicultores teve o mesmo destino. A colheita de mel da França em 2021 foi de cerca de 7.000 a 9.000 toneladas, de acordo com a União Nacional de Apicultura da França (UNAF). Em 2020, foram cerca de 19.000 toneladas.

Condições climáticas adversas foram as responsáveis por uma colheita tão ruim. O inverno foi particularmente ameno, mas foi seguido por períodos de geada, frio e chuva durante a primavera e no verão. Junho chegou e Flavien ainda não tinha colhido um quilo de mel. Pior ainda, ele teve que alimentar suas abelhas, e elas já tinham consumido todas as reservas de mel de sua colmeia. “É um ano perdido, um ano pobre como nunca vimos antes.”

A situação era tal que Flavien decidiu procurar um emprego extra. Ele agora está trabalhando na indústria da construção e espera voltar a cuidar de suas abelhas na primavera. “Sendo gerente, é mais fácil para mim ir e vir do apiário. E isso me permite manter nossos dois funcionários, que realmente queremos manter.”

O departamento do Territoire de Belfort está atualmente analisando a declaração de uma “calamidade apícola”, o que poderia abrir caminho para a ajuda do Estado. Por enquanto, Flavien e seu parceiro de negócios receberam € 4.000 em ajuda da autoridade local para compensar as perdas causadas pela geada tardia. “Para produtores como nós, que vivem do que produzimos, quando não produzimos, a solução é viver das nossas reservas. Mas quando você acabou de começar, eles são muito limitados”, diz Flavien. Eles só tinham reservas suficientes para durar até dezembro.

O prelúdio de um desastre ambiental


Não é apenas na França que os apicultores estão lutando, mas em toda a Europa, refletindo uma tendência mais ampla. A produção de mel e a sobrevivência das abelhas têm diminuído constantemente nas últimas décadas. A taxa de mortalidade das abelhas é atualmente de cerca de 30 por cento. Em 1995, era de 5%, segundo a UNAF. E, no entanto, as abelhas contribuem com cerca de € 22 mil milhões para o setor agrícola europeu a cada ano – não graças ao mel que produzem, mas aos serviços de polinização que fornecem para as plantações. Os cientistas estimam que uma em cada três dentadas de comida depende de polinizadores.

A perturbação climática não é a única responsável por esse declínio. Os pesticidas usados em grande escala desde a década de 1990 também desempenharam seu papel. Numerosos estudos demonstraram a toxicidade dessas substâncias, como o realizado pela Universidade de Maryland em 2016, que também destaca os perigos do efeito sinérgico dos pesticidas.

Sébastien Guillier está mais do que familiarizado com o assunto. Em 2008, ele perdeu a maior parte de suas colónias, provavelmente devido a envenenamento. Ele trabalhava como apicultor profissional há dez anos em Haute-Saône, no nordeste da França. “No outono de 2007, as abelhas estavam com sede. Tratamentos foram aplicados na área para combater os ácaros vermelhos do trigo, e as abelhas beberam das poças, como costumam fazer. A dose deve ter sido muito alta”, explica o apicultor.

Os estados membros da UE podem conceder autorizações de emergência por até 120 dias quando houver “um perigo que não pode ser controlado por nenhum outro meio razoável”, de acordo com a diretiva da UE que rege essas medidas de emergência. A Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) identificou 17 medidas de emergência desde 2020, todas para a beterraba sacarina. Entre 2018 e 2020, no entanto, o projeto de jornalismo Unearthed da Greenpeace registou pelo menos 67 autorizações de emergência nos vários estados membros da UE.

Após sua derrota em 2008, Sébastien procurou levantar a questão no parlamento francês e na mídia. De pouco adiantou. Recebeu 45€ por colmeia em compensação do Estado, embora o montante necessário para reconstruir a colónia rondasse os 150€ por colmeia. Ele também teve que encontrar um segundo emprego. Ele agora trabalha como inspetor de leite e mantém cerca de 100 colméias na zona rural de Haute-Saône.

Na França, apenas três por cento dos 70.000 apicultores do país eram profissionais em 2019. O restante era amador (92 por cento) ou pluriativo (5 por cento). E embora o número de apicultores esteja aumentando em quase toda a Europa, o padrão permanece o mesmo da França: eles são principalmente amadores. Os apicultores europeus têm em média 21 colmeias.

Competição insustentável


Outro fator stressante para os apicultores é a concorrência barata do exterior. Os preços dos supermercados são muito baixos para os apicultores locais ganharem a vida, especialmente para aqueles que produzem em pequena escala.

Alguns dos produtores que mantêm os preços muito baixos estão baseados em países do Leste Europeu, como a Ucrânia, mas muitos também estão na China. Um quilo de mel importado da China custou aos grossistas € 1,40, em média, em 2020. A maioria dos apicultores da União Europeia não pode competir com esses preços. Seu custo médio de produção já é de € 3,90 por quilo, segundo a Copa-Cogeca, que representa agricultores e cooperativas agrícolas na UE. Cerca de 40 por cento do mel no mercado europeu é importado.” (ver esta publicação a propósito)

fonte: https://www.equaltimes.org/beekeepers-in-western-europe-fear

do Parque Natural de Montesinho ao Parque Natural da Serra da Estrela, um cenário de escassez

Li ontem, no jornal Brigantia, este testemunho de Carlos Alves: “Carlos Alves é o maior apicultor do Parque Natural de Montesinho. Tem 1200 colmeias, em Passos de Lomba, concelho de Vinhais. A apicultura começou por ser um passatempo, mas há cerca de sete anos decidiu profissionalizar-se, quando a actividade ainda era “rentável”. Agora, os prejuízos são grandes. “Pelas minhas contas anuais, o ano passado, na minha exploração, que se dedica exclusivamente à produção de mel, tive prejuízos entre os 12 a 15 mil euros”.

A continuar assim, pondera deixar a actividade, porque começa a ser intolerável aguentar os custos de produção. “Se este ano tiver perdas, em 2024 tenho que pensar seriamente se posso continuar ou não na actividade porque está a deixar de ser rentável. As produções estão a ser muito baixas, o custo de produção está elevadíssimo, os materiais para a apicultura estão muito caros, os alimentos também, o preço deles duplicou”.

O apicultor não compreende a falta de apoios do Ministério da Agricultura. “A falta de apoios, que temos pela parte do Estado, não se compreende porque nós temos que seguir as normas europeias, a nível de produção, tanto de bens derivados da apicultura como a forma como tratamos as colmeias. Quando se trata de direitos… não temos os mesmos direitos que os apicultores europeus”.

Foi um mero acaso, mas ontem em conversa o meu amigo Pires Veiga confirmou um cenário muito semelhante nos seus apiários situados no Parque Natural da Serra da Estrela. Meias alças vazias em junho, com as abelhas a não subirem apesar dos ninhos estarem bem povoados, com as abelhas paradas na frente das colmeias, sem vontade de saírem para o campo. A explicação que me adiantou foi a escassez de néctar no mês de abril, com o rosmaninho e outras florações a durar meia dúzia de dias, consequência das ondas de calor que também ali se sentiram. E como uma desgraça nunca vem só, as fortes chuvadas e as trovoadas do mês de maio lavaram as flores, piorando mais ainda as condições de pasto para as abelhas. Dizia-me a terminar que as coisas a continuarem assim, com fracas produções e os materiais cada vez mais caros, sem qualquer apoio digno desse nome (porque um apoio não é uma esmolinha) a apicultura será para aqueles com meia-dúzia de colmeias, que desejem passar algum do seu tempo livre a cuidar delas.

A terminar esta publicação dizer, caro amigo, que acompanho a tua análise da época e o teu sentimento acerca do futuro próximo. Haverá seguramente algumas zonas com produções razoáveis, infelizmente uma excepção à regra.

sobre a epidemia de enxameação e sobre as abelhas domésticas no Reino Unido

Em baixo deixo a tradução de um artigo publicado ontem na BBC News intitulado “Beekeepers ‘run out of equipment’ as swarms rise“. Muito interessante a explicação do apicultor Alan Deeley — eu também atrasei/adiei algumas vezes o meu maneio de prevenção da enxameação em alguns apiários por razões devidas à metereologia difícil e, quando finalmente o podia fazer, algumas colónias estavam já em modo de enxameação. Muito interessante também a opinião do professor David Chandler, sobre o papel dos apicultores na sobrevivência das abelhas melíferas domésticas.

“Os apicultores dizem que estão a ficar sem equipamentos para albergar o aumento do número dos enxames de abelhas após um período de calor.

Uma primavera longa e fria seguida do aumento das temperaturas significa que um número grande de enxames agora procuram novas localizações, dizem especialistas da Universidade de Warwick.

O público está sendo aconselhado a não entrar em pânico se avistar as abelhas e, em vez disso, chamar profissionais para as retirar.

“Foi um ano muito incomum para enxames”, disse o apicultor Alan Deeley.

Alan Deeley diz que uma longa primavera fria seguida de clima quente levou a um aumento de enxames.

Os apicultores inspecionaram as colmeias assim que se atingiram 15°C, no entanto, no início da primavera, as temperaturas permaneceram baixas, e por essa razão eles não conseguiram fazer o maneio de prevenção da enxameação, disse Deeley.

“Assim que o tempo melhorou, a enxameação aumentou de forma louca”, acrescentou.

O professor David Chandler, microbiologista e entomologista da Universidade de Warwick, disse: “Agora só existem abelhas por causa dos apicultores.

“Não há abelhas selvagens neste país porque as abelhas são afetadas por um ácaro parasita que se alimenta de seu sangue – é uma espécie invasora”.

O meu acordo total com o professor David Chandler, como se pode confirmar pelo que escrevi aqui há uma semana atrás.

Fonte: https://www.bbc.com/news/uk-england-coventry-warwickshire-65746081

jornadas apícolas marienses

Um agradecimento aos organizadores pelo convite para participar, onde descreverei as técncicas de prevenção da enxameação e as técnicas de controlo da enxameação que utilizei ao longo de vários anos num cantinho da Serra da Estrela.

Para mais informações ficam o número de telefone e o endereço electrónico no canto inferior direito do cartaz. Apareçam!

o papel dos apicultores na sobrevivência de enxames de abelhas domésticas europeias

Ontem, escrevi o seguinte no meu mural do facebook:

“A abelha doméstica europeia não está em perigo de extinção, mas tal não se deve à qualidade do ambiente como se sabe. Deve-se aos apicultores que cuidam delas. E os apicultores estão a ficar desalentados por diversas razões, principalmente pela falta de retorno do investimento que fazem ano após ano. E se assim continuar, com o abandono e falta de substituição dos apicultores mais velhos por apicultores mais novos, a abelha doméstica europeia poderá vir a correr riscos de extinção. Para que tal não aconteça importa evitar a extinção dos seus cuidadores, os apicultores.”

Uma colónia de abelhas domésticas europeias (A.m. iberiensis). A terminologia doméstica é utilizada neste contexto para identificar as colónias de abelhas que são acompanhadas e geridas pelo apicultor, e distingui-las das colónias de abelhas assilvestradas e/ou selvagens que se desenvolvem sem esse acompanhamento.

Num artigo recente da Comissão Europeia (2022), surge este quadro com a evolução do número de colónias domésticas de abelhas no período de 2016 a 2020 e no espaço da UE. Fica evidente que nos últimos 3 anos avaliados o número de colónias domésticas tem aumentado.

Contudo as razões deste aumento do número de colónias devem ser bem identificadas e melhor compreendidas.

Primeiro ponto: o efectivo tem aumentado não porque o ambiente tenha melhorado. Segundo ponto: o efectivo tem aumentado porque as colónias de abelhas têm tido, genericamente, cuidadores à altura das exigências do momento, os apicultores.

Vejamos com algum detalhe. Muitos aspectos do ambiente têm-se detriorado nos últimos anos, entre outros: o principal inimigo das abelhas melíferas, o ácaro Varroa destructor, adquire resistência a medicamentos e veicula vírus mais virulentos (tipo 2 do VAD, por exemplo); as alterações climáticas retiram potencial apícola onde antes ele existia (zonas de clima mediterrânico, entre outras); os predadores ultrapassam geografias por via do comércio global e invadem a Europa (V. velutina, entre outros); os custos e esforços para a manutenção de efectivos produtivos são cada vez maiores (custos de diversos equipamentos e produtos essenciais à apicultura e manutenção dos enxames).

Ao mesmo tempo é evidente, para os que conhecem a realidade, que o aumento de colónias de abelhas melíferas depende exclusivamente do aumento de colónias domésticas. O aumento das colónias de abelhas na Europa não se deve ao aumento dos enxames assilvestrados. Estes enxames, que surgem dos processos de enxameação de colónias domésticas, têm taxas de sobrevivência muito baixas, e a grande maioria não sobrevivem durante o primeiro ano. Os enxames de abelhas melíferas selvagens, aqueles que sobrevivem durante anos seguidos sem intervenção do homem, contam-se pelos dedos.

Nos dias de hoje a dependência da sobrevivência dos enxames de abelhas melíferas dos cuidados dos a apicultores é um aspecto por demais evidente. E este é um copo meio cheio. Por enquanto, conseguimos sustentar e até aumentar o número de colónias. Contudo esta relação é frágil, porque um dos maiores motivadores para a sua manutenção é económica, e este motivo tem sofrido uma erosão forte nos últimos anos. Sei que outros motivos, desde os espirituais, aos emocionais e ecológicos, também estão presentes nos apicultores. Tenho muitas dúvidas, contudo, se estes serão suficientes para manter os 19 milhões de colónias de abelhas domésticas existentes em 2020 na UE.

eficácia de harpas elétricas na redução da pressão de predação de Vespa velutina e consequências para o desenvolvimento de colónias de abelhas

Recentemente publicado, este estudo levado a cabo na Galiza vem confirmar os resultados que diversos apicultores encontram com a utilização de harpas eléctricas em apiários fortemente pressionados pela Vespa velutina. Realça ainda a importância das medidas de protecção que diminuem a paralisia dos voos de forrageamento. Finalmente, dizer que não se conhecendo uma medida super-eficaz, é da utilização atempada, correcta e diversificada de algumas delas que se retira os melhores resultados (ver outras medidas mencionadas neste blog e nesta categoria “predadores e inimigos”).

Foco: Avaliámos a pressão de predação e comparámos o desempenho da colónia de abelhas, o peso corporal das operárias e a sobrevivência no inverno para colónias protegidas versus desprotegidas em 36 colmeias experimentais em três apiários.”

Resultados: As harpas elétricas protegeram as abelhas, reduzindo a pressão de predação e, portanto, mitigando a paralisia de forrageamento. Consequentemente, a atividade de forrageamento, colecta de pólen, produção de cria e peso corporal de operárias foram maiores em colónias protegidas que por sua vez apresentaram maior sobrevivência de inverno do que aquelas que não foram protegidas, especialmente em locais com níveis intermédios a altos de predação.”

Detalhes do estudo

“As harpas elétricas foram colocadas perpendicularmente às entradas das colmeias, entre duas colmeias contíguas (a). Estes dispositivos foram colocados nos apiários 1 mês antes das primeiras observações. Durante a primeira semana as harpas foram desligadas para permitir que as abelhas se habituassem à sua presença. A armadilha consiste numa armação com fios verticais paralelos conectados alternadamente aos pólos positivo e negativo de um circuito elétrico. O modelo aqui utilizado possui uma modificação para minimizar as capturas acessórias. As vespas voadoras recebem um choque elétrico sempre que tocam dois fios consecutivos (b), paralisando-as por alguns segundos e caindo numa gaiola em baixo com paredes de malha que permitem a fuga de insetos menores. Em seguida, as vespas rastejam dentro da gaiola até cair numa garrafa coletora.”

Sistema de proteção: seis colmeias colocadas em linha, separadas de 20 a 30 cm cada, protegidas com cinco harpas elétricas (a). Ao caçar abelhas na frente das colmeias, as vespas voam entre fios eletrificados que as paralisam (b). Depois caem numa gaiola da qual insetos menores escapam enquanto vespas caem numa garrafa de coleta.

Atividade de forrageamento: O número de forrageiras foi afetado pela pressão de caça e mês em questão. A paralisia forrageira registada nas colmeias desprotegidas no local de maior predação (Gondomar) iniciou-se em agosto e manteve-se durante todo o estudo apesar da diminuição da predação observada em setembro. A paralisia de forrageamento ocorreu principalmente em colónias de abelhas que sofreram taxas de caça superiores a 0,8 vespas/colmeia/10 min . No local com maior pressão predatória, as colónias protegidas apresentaram maiores tamanhos populacionais dentro da colmeia do que as não protegidas durante agosto e setembro, precisamente quando estas colónias apresentaram paralisia. Observámos operárias de todas as idades permanecendo dentro da colmeia em colónias paralisadas. Além do forrageamento, outros comportamentos comuns, como coleta de resinas para produção de própolis ou atividades higiénicas, como voos higiénicos, remoção de indivíduos doentes ou cadáveres, também foram interrompidos.”

Recursos armazenados: Colmeias desprotegidas apresentaram menor colecta de pólen. Os depósitos de pólen e mel não foram significativamente afetados pela predação de V. velutina.”

Desenvolvimento da colónia: A quantidade de cria e a atividade de forrageamento foram significativamente afetadas pela pressão de predação e pelo mês em questão. A quantidade de cria apresentou níveis mais baixos nas colmeias desprotegidas do que nas colmeias protegidas no apiário com maior pressão das V. veluitnas.”

Peso das abelhas: As operárias de colmeias desprotegidas eram 6,7% mais leves do que as de colmeias protegidas.”

Sobrevivência: A sobrevivência no inverno foi de 77,8% para colónias protegidas e 55,6% para colónias desprotegidas. A sobrevivência de colónias desprotegidas foi menor nos locais com pressão de caça intermédia e alta (Fig. 5). A sobrevivência das colónias de abelhas foi ligada à pressão geral de caça e à interação entre pressão de caça e peso das abelhas, mas não apenas ao peso das abelhas.”

Sobrevivência de inverno de colónias de abelhas em três apiários, com pressão elevada, média e baixa, (desprotegidas e protegidas com harpas elétricas).

Conclusões

“Os dados revelaram que, além da predação, fatores temporais também desempenharam papéis importantes na quantidade de recursos disponíveis na colmeia e na sobrevivência da colónia. A redução na colecta de pólen coincidiu com a paralisia de forrageamento em colónias desprotegidas e provavelmente está relacionada com a baixa quantidade de cria observada durante os últimos meses do estudo. Estes resultados suportam a ideia da paralisia de forrageamento como a principal razão para os processos de enfraquecimento e subsequente colapso que afetam as colónias sob ataque de vespas. Nossas evidências sugerem que em apiários com baixas taxas de predação (menos de 1 vespa/colmeia/10 min), as abelhas foram mais capazes de lidar com o predador e o uso de harpas elétricas é de menor utilidade. No entanto, em locais onde a estação de floração é mais curta e o inverno é mais longo e com temperaturas mais baixas (como em Oia, o local de maior altitude do nosso estudo), taxas intermédia de predação levam a uma menor sobrevivência de colónias em colmeias protegidas e particularmente em colónias desprotegidas (ver gráfico em cima).

O menor peso corporal das operárias em colónias desprotegidas fornece novas evidências do stresse fisiológico que as abelhas sofrem sob esta nova ameaça. O pólen é um recurso de capital relevância para as abelhas, pois é uma importante fonte de proteínas, lipídios, vitaminas e outros nutrientes, necessários para a produção de geleia real, com a qual as larvas são alimentadas. Além disso, a qualidade e a diversidade do pólen influenciam as abelhas. Sabe-se que a saúde e a longevidade e a qualidade do pólen afetam o peso das larvas e das abelhas. Assim, a escassez de nutrientes durante a criação das larvas é um mecanismo plausível que está por trás das operárias mais leves. Além disso, a menor quantidade de criação observada em colmeias desprotegidas no final do estudo sugere que o número de operárias para hibernar é menor do que em colónias protegidas. Assim, nossos resultados revelaram que, além do baixo armazenamento de recursos alimentares, dois fatores estão por trás das mortes no inverno de colónias de abelhas desprotegidas: uma deficiência nos níveis nutricionais de adultos invernantes e um número reduzido de operárias.

Além disso, fornecemos evidências de que o estado fisiológico das operárias das abelhas é afetado pela predação de vespas. Portanto, incentivamos os apicultores a facilitar o acesso das abelhas a diversos recursos florais e de água doce, contribuindo assim para diminuir seu stresse fisiológico e falhas no regresso à colmeia. Por isso, quando as colónias sofrem de paralisia de forrageamento é recomendável a suplementação de uma dieta diversificada e rica em todos os nutrientes necessários. Isso deve ser fornecido não apenas durante o inverno para evitar a fome de colónias fracas, mas também no outono, quando as operárias que vão suportar o inverno estão em fase larval.

A instalação de harpas elétricas representa um importante investimento económico inicial para os apicultores que depende do número de harpas e seu preço comercial. Isto, por sua vez, está relacionado ao número e localização das colmeias. Tem sido sugerido um racional de uma harpa a cada duas ou três colmeias, o que provavelmente é inviável para grandes apiários. Além disso, é necessário tempo para manter um sistema funcional. Os apiários precisam ser adaptados frequentemente, e sugere-se formar linhas com distância reduzida entre as colmeias para diminuir a distância das entradas das colmeias à harpa, para obter um maior efeito protetor. Contudo, observámos que em apiários colocados em locais com alta abundância de V. velutina, com uma linha compacta de colmeias (20–30 cm de separação entre elas) e uma harpa entre duas colmeias consecutivas, a redução da pressão de caça foi significativa, mas ainda não suficiente para atingir uma predação nula. Portanto, em áreas altamente invadidas, este método de controle deve ser implantado em conjunto com medidas adicionais, como detecção e destruição de ninhos de V. velutina no entorno dos apiários, a fim de reduzir o número de vespas caçadoras e suas consequências prejudiciais à colónia de abelhas, desempenho e sobrevivência.”

fonte: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/ps.7132

ajudas à renovação do efectivo apícola… em França

Em França, país com uma realidade apícola próxima da nossa, em particular no que respeita a médias de produção e às dificuldades decorrentes do actual contexto meteorológico, os decisores atrevem-se a cometer a “heresia” de dar ajudas forfetárias e a fundo perdido aos apicultores que desejam efectuar a renovação do efectivo apícola.

Que me desculpem alguns campeões da apicultura portuguesa, que desdenham desta tipologia de ajudas, vir aqui falar novamente do “bizarro” caso francês… A razão é simples: pretendo comparar o que é razoavelmente comparável.

Não comparo com os EUA, onde os serviços de polinização dos amendoais são pagos a +200€/colónia; não comparo com o Canadá onde são habituais médias de +100kg/colónia nos campos de canola; não comparo com a Nova Zelândia onde mercado paga o mel de manuka a +400 €/kg; não comparo com a China onde o mel é maturado em fábricas; … comparo com França, com uma realidade próxima, onde os apicultores não desdenham destas ajudas, agradecem-nas e utilizam-nas.

Programa francês de ajuda à renovação do efectivo apícola, com recursos comunitários e nacionais

Ajuda forfetária para compras realizadas entre 01/08/2021 e 31/12/2022

Colmeias novas vazias: 20€
Núcleos novos vazios: 13€
Nucléolos: 8€
Enxames: 40€
Enxames Bio certificados: € 55
Pacotes de abelhas sem rainha: 32€
Rainhas: 8€

fonte: https://www.franceagrimer.fr/Autres-filieres/Apiculture/Accompagner/Dispositifs-par-filiere/Programme-apicole-europeen-PAE-2020-2022/Repeuplement-du-Cheptel