Ontem, com a ajuda do Pedro Miguel, continuei a cresta das colmeias situadas no território das marcavalas e dos castanheiros. Verifiquei que coexistiam quadros em três estágios de progressão: quadros maduros, com mel operculado de travessão a travessão (os que trouxe para a extracção), quadros com mel verde por opercular e que pingavam néctar quando sacudidos e quadros com parcelas de criação operculada (os que ficaram nas colmeias para cresta futura, dentro de duas a três semanas).
Hoje, com a ajuda de minha mulher, terminei a primeira fase da cresta deste apiário. Como habitualmente, surgem favos adventícios entre as meias-alças, utilizados frequentemente para criação de zângãos. Nestes casos aproveito para trazer alguns para casa para fazer uma análise mais atenta da presença/ausência de varroa.
Este tipo de análise é meramente indicativo, muito falível e porventura enganador acerca do nível de infestação por varroose. Contudo, o facto de em 30 pupas de zângãos não ter encontrado uma única varroa indica que alguma coisa estarei a fazer bem no que ao tratamento da varroose concerne. Convém-me, mesmo assim, manter os pés bem assentes no chão e não desrespeitar os timings de verão para o tratamento principal e o mais crítico da varroose. Na esperança que o relativo fracasso do ano passado no controlo da varroose me tenha ensinado o que de substantivo tinha que aprender para fazer melhor este ano. Até ao momento, os sinais são encorajadores, na luta contra o pior e mais previsível inimigo das abelhas — previsível porque a varroa não faz prisioneiros, ou a controlamos a tempo e horas ou ela massacra os seus hospedeiros.
Randy Oliver escreveu recentemente no Bee-L acerca dos progressos, lentos, e dos obstáculos inesperados e inexplicados com que o seu programa para seleccionar e propagar linhas de abelhas resistentes ao ácaro varroa se está a confrontar. Atentem ao elevado número de lavagens de abelhas que são realizadas, em todas ou quase todas as colónias, para monitorar o nível de resistência de cada. Este caso de progressão lenta ilustra bem o relativo fracasso de tantos e tantos programas levados a cabo nestas duas últimas décadas para seleccionar, preservar e massificar linhas de abelhas resistentes ao varroa, e isto apesar de todo o investimento feito. Realisticamente, uma solução simples e rápida, que possa ser passada de apicultor em apicultor, de apiário em apiário, de território em território está longe de ser encontrada, é um objectivo ainda longínquo, mas o sonho permanece… sempre!
(Randy Oliver escreve:) Este tópico está muito na minha mente, já que estamos a meio de nossa primeira rodada de lavagem de ácaros nesta temporada para identificar quais são as colónias, com novas rainhas filhas de colónias resistentes. Estamos a realizar entre 1000 e 1500 lavagens de ácaros para selecionar as criadoras com potencial, que então serão submetidas a lavagens uma vez cada mês para confirmar [a resistência].
Já fazemos isso desde 2017, substituindo todas as nossas rainhas a cada ano apenas com rainhas filhas de mães de colónias rigorosamente comprovadas como resistentes aos ácaros. O que aprendi é que existe uma falta frustrante de herdabilidade. Só porque a colónia mãe era completamente à prova de ácaros, não significa que as filhas da rainha daquela colónia resistente irão liderar colónias resistentes.
Estamos progredindo e, ao longo dos anos, passámos de menos de 1% de colónias exibindo resistência para mais de 7%, mas longe de 95%. E isto [acontece] com um programa de seleção rigoroso de acasalamentos amplamente controlado. Neste verão, planeamos realizar acasalamentos em alguns locais de grande altitude, onde não há zângãos externos.
Estou surpreso, depois de criarmos facilmente abelhas com esta ou aquela cor, temperamento, comportamento higiénico, ou resistência do ácaro da traqueia, com o quão difícil é preservar o traço resistência à varroa.
Randy Oliver Grass Valley, CA 530 277 4450 ScientificBeekeeping.com
Nota: sobre os avanços e perspectivas na seleção de características de resistência ao ácaro Varroa destructor em abelhas melíferas ver também aqui.
Ontem, para o Marcelo Murta, que me veio ajudar, e para mim, o dia começou às 6h45m.
Por volta das 7h50 estávamos a entrar neste apiário de Lusitanas, território das flores com coração, para iniciar a cresta dos méis claros deste ano. O plano era crestarmos os sete sobreninhos lá presentes. Por volta das 9h10 estávamos de regresso a casa, com a carga que tinha sido planeado trazer. As imagens são do início desta cresta e extracção deste néctar prístino, intocado, que fluiu de forma natural e primitiva entre as abelhas.
A todos nós que iniciámos a cresta, ou a vamos iniciar, desejo uma boa cresta e colheita. Que o semeado ao longo de meses tenha agora correspondência no que colhemos.
No decurso de duas das últimas publicações, onde refiro a execução de um tratamento intermédio contra a varroose, têm surgido no meu e-mail e na caixa de comentários do blog basicamente quatro tipos de questões e comentários:
que medicamento estou a utilizar;
onde adquiri esse tratamento;
por que razão faço este tratamento intermédio;
que resíduos deixa no mel se aplicado durante o fluxo e com meias alças nas colmeias.
Resposta à primeira questão: estou a utilizar tiras de cartão com ácido oxalico impregnado em glicerina. Estas tiras são fabricadas pela empresa polaca Lyson.
Resposta à segunda questão: adquiri estas tiras na Golden Bee, situada em Mira.
Resposta à terceira questão: no plano de tratamentos contra a varroose deste ano achei que devia experimentar fazer um tratamento intermédio, com vista a manter a taxa de infestação baixa até à colocação do último tratamento do ano e, em simultâneo, eliminar eventuais varroas resistentes ao amitraz, princípio activo dos dois tratamentos principais com Apivar, tratamentos que inicio no final de janeiro e na primeira semana de agosto.
Resposta à última questão: sobre a questão dos resíduos deixados no mel por estas tiras, deixo a tradução de um excerto de um estudo científico, referenciado por mim em 2016 nesta publicação. “
Detecção de ácido oxálico em abelhas, mel e cera de abelha. A Tabela III resume as medições de ácido oxálico (AO) em todas as amostras tiradas antes e depois do tratamento. O teor de ácido oxálico natural variou entre 2,5 e 33,8 mg / kg. Não houve aumento no teor de ácido oxálico do mel, cera e abelhas após os tratamentos, em todos os três ensaios (P> 0,05). Todas as amostras de abelhas e cera de abelha foram negativas antes e depois do tratamento com AO. […] A maioria dos vegetais contém quantidades muito maiores de ácido oxálico do que o mel, então a ingestão diária total é insignificante. Assim, do ponto de vista nutricional, o ácido oxálico deve, como o ácido fórmico, também ter um status geralmente reconhecido como seguro (GRAS — generally recognized as safe). Além disso, nenhum resíduo significativo é esperado após os tratamentos com ácido oxálico, conforme demonstrado em nossa pesquisa. Na verdade, não há risco de resíduos de mel após todos os tipos de tratamentos com ácido oxálico (Radetzki 1994; Mutinelli et al. 1997; Del Nozal et al. 2000; Bernardini e Gardi 2001; Radetzki e Barmann 2001; Bogdanov et al. 2002). — fonte: https://link.springer.com/article/10.1007/s13592-015-0405-7
Desde 2016 que conheço estes dados. Desde 2014 que acedi e acedo a informação, acessível a todos nós, reveladora da tremenda falta de informação no que concerne aos resíduos deixados pelas tiras de Apivar no mel. Tenho uma grande preocupação e sensibilidade para a questão dos resíduos dos acaricidas no mel; passei horas e horas a pesquisar, ler, comparar e reflectir sobre este assunto. Por esta razão peço a melhor compreensão para uma resposta eventualmente mais impaciente a um ou outro comentário no FaceBook, quando sou interpelado por alguém que “sabe tudo” sobre resíduos dos acaricidas, sem ter lido uma linha sequer sobre este assunto, repetindo acriticamente chavões. Sobre este e outros assuntos a minha opção é clara: na dúvida informo-me em fontes fidedignas e de preferência em fontes sustentadas em dados experimentalmente controlados; em fontes não influenciadas por interesses comerciais evidentes; em fontes que resistem à persuasão de seguir um “meme” acriticamente, que resistem a papaguear o que a maioria diz, que utilizam a sua cabeça para decidir o seu caminho e inspirar outros.
Ontem, 28 de junho, fui ao meu apiário das lusitanas (a 600 m de altitude) aplicar o tratamento intermédio contra a varroa. Para tal tive de desmontar todas as colónias ali assentes para chegar ao ninho. Aproveitei a oportunidade para fotografar a intimidade da primeira colónia que desnudei.
Do topo para a base vou expor gradualmente a sua intimidade, despindo-a suave e prazerosamente.
Num processo continuo e circular para decidirmos onde se situa o seu início temos de o pontuar. Com o desiderato de apresentar, com a limpidez que me é possível, a timeline das operações efectuadas nas minhas colmeias armazém ao longo da época, decido pontuar o início deste processo continuo e circular nestes dias que agora correm. E é nestes dias, os dias do castanheiro, em que desbloqueio alguns ninhos de jovens colónias, retirando-lhes aqueles quadros mais velhos bloqueados com mel e pólen, que tendo sido úteis aquando da introdução de rainhas virgens ou mestreiros com rainhas prestes a emergir, se tornam agora um peso, um travão, ao seu mais rápido desenvolvimento, que dou origem às colmeias armazém.
No final do inverno/entrada da primavera estas colónias armazém vão evoluindo gradualmente, respondendo às necessidades decorrentes do crescimento linear das colónias dedicadas à produção. Passam a armazenar os quadros semi-bloqueados e com criação predominantemente operculada, retirados daquelas.
Uma a duas semanas após a colocação destes quadros nas colmeias armazém, inicio os desdobramentos com recurso à técnica Doolittle.
Com o avançar da época, para o meio da primavera estas colónias vão sendo gradualmente adaptadas ao fluir da época. Deixam de estar direccionadas para os desdobramentos e evoluem para a produção de mel.
Hoje, dia 26 de junho, à entrada do verão voltei às abelhas. Após quase 15 dias de férias, voltei! Por lá andei das 10h00 às 13h00, a fazer o maneio que me apeteceu fazer, que devia fazer e que não me cansou fazer; isto tudo num assento com cerca de 40 colónias, entre núcleos, colónias novas em desenvolvimento não dirigidas à produção e colónias orientadas para a produção. Para o final da tarde iremos às restantes 50 estacionadas neste apiário.
Muito recentemente foi publicado na revista Plos One um artigo muito interessante com o título Honey bee behaviours within the hive: Insights from long-term video analysis. Como o próprio título indica com recurso a imagens de vídeo foi observado e analisado o comportamento das abelhas no interior da própria colmeia. Esta publicação apresenta em baixo alguns desses vídeos. Só para amantes!
Como em Portugal, o setor apícola francês beneficia de apoio financeiro no âmbito de um programa europeu, regido pelo regulamento (UE) 1308/2013 (OCM única), regulamentos (UE) 2015/1366 e 2015/1368 e pela decisão do Diretor-Geral da FranceAgriMer INTV SANAEI 2019-17.
Como o programa apícola português, definido para um triénio, o programa apícola francês prevê ajudas de carácter colectivo, que têm como objectivo a implementação de ações que visem a melhoria da produção e comercialização dos produtos apícolas:
assistência técnica e formação;
a luta contra agressores e doenças da colmeia;
pesquisa aplicada;
análises de mel;
melhoria da qualidade do produto.
Contudo, ao contrário de programa apícola português, o programa francês prevê ajudas directas aos apicultores nestas duas rubricas:
racionalização da transumância;
ajuda para manter e reforçar o efectivo apícola.
Por exemplo, os apoios à transumância têm como objetivo financiar equipamentos para modernizar os apiários e reduzir a árdua tarefa inerente às operações de transumância, sendo investimentos elegíveis para apoio os abaixo descriminados:
Grua;
Empilhadores todo terreno de 4 rodas ou esteira;
Reboque;
Plataforma elevatória;
Layout da plataforma do veículo;
Paletes;
Moto-roçadora ou roçadora com rodas;
Preparação de locais de transumância;
Balanças eletrónicas controláveis remotamente.
As taxas de ajuda podem atingir 40% no máximo do montante, excluindo impostos sobre o investimento elegível efetivamente realizado. O tecto de investimento está definido a três anos:
Até 150 colmeias declaradas: € 5.000 sem impostos;
Mais de 151 colmeias declaradas: € 23.000 sem impostos.
Por cá, o estado paternalista, com pelo menos 95 anos — 48 antes do 25 de abril e 47 anos depois do 25 de abril—, continua a achar que os cidadãos não sabem onde, como e quando investir e aplicar o dinheiro dos apoios. E vai fazendo cada vez mais o papel de um pai esclorosado e demente!