Economic Costs of the Invasive Asian Hornet on Honey Bees é um artigo que vai ser publicado no próximo novembro, na revista Science of The Total Environment. É um artigo muito elucidativo e enfático sobre o impacto económico que a Vespa velutina tem sobre a apicultura francesa nos dias de hoje.
O estudo procurou dar uma resposta precisa, com base em dados de grande escala e técnicas de modelagem, aos custos económicos da predação da V. velutina sobre as abelhas melíferas em França, através de estimativas relativas a estes três pontos: (i) o risco de mortalidade das colónias de abelhas relacionado com as vespas, (ii) o custo económico da perda de colónias para os apicultores e (iii) o impacto económico da substituição de colónias em comparação com as receitas do mel às escalas regional e nacional.
As conclusões são: “Estimamos uma densidade global de 1,07 ninhos de vespas asiáticas/km2 na França, com base no registro de campo de 1.260 ninhos em uma área pesquisada de 28.348 km2. No entanto, esta densidade de predadores estava espalhada de forma heterogénea por todo o país, bem como a distribuição das colónias de abelhas geridas. No geral, este risco de mortalidade de colónias de abelhas relacionado com vespas pode atingir até 29,2% das colónias dos apicultores à escala nacional todos os anos num cenário de elevada predação. Este custo nacional poderá atingir 30,8 milhões de euros por ano devido à perda de colónias, o que representa para os apicultores um impacto económico da substituição de colónias de 26,6% das receitas do mel.“
Esta publicação visa colocar o “problema velutina” na exacta magnitude do mesmo: é um problema enorme para a apicultura dos países onde já está instalada e sê-lo-á naqueles onde se vier a instalar num futuro próximo — segundo alguns estudos a V. velutina será capaz de colonizar uma grande diversidade de habitats na Europa e regiões de fronteira, dos países nórdicos até às zonas costeiras do norte de África.
Se… tivesse colmeias no litoral centro como as trataria em 2024? Vou utilizar alguns dados do terreno obtidos no acompanhamento que fiz conjuntamente com o Marcelo às suas colmeias e apresentar algumas simulações feitas no simulador do Randy Oliver parametrizado por mim para o ciclo de desenvolvimento de colónias no litoral centro.
Se por hipótese começar o ano de 2024 nas minhas colmeias com uma população de 2109 varroas, o seu controlo ao longo do ano será muito difícil e arriscado. Mesmo com 4 tratamentos eficazes (80%-90%) e muito eficazes (95% ou acima) as minhas colmeias ultrapassariam os limiares de dano económico — mais de 15 varroas por 300 abelhas, como se pode ver na simulação em baixo.
Como vemos da simulação em cima os quatro tratamentos, nas condições simuladas, são suficientes para evitar o colapso das colónias, mas não são suficientes para evitar o prejuízo económico na sequência de se terem atingido taxas de infestação demasiado altas — acima das 15 varroas por 300 abelhas. Chegado aqui, entre a espada e a parede, decidi simular adicionando um quinto tratamento. Vejamos em baixo o resultado:
Começar o ano de 2024 com 211 varroas em lugar das mais de duas mil é um aspecto crítico para ter a população abaixo dos limiares de dano económico, com as colónias em pleno estado de saúde e com o máximo potencial produtivo ao longo de todo o ano como me mostra a simulação seguinte:
Como vemos a introdução do quinto tratamento nas condições simuladas muda o jogo a nosso favor: permite entrar num circulo virtuoso e atingir o final do ano com um número de varroas inferior a 200 que me permitirá olhar para o ano seguinte com mais tranquilidade no que respeita ao controlo da varroose.
E se… decidisse voltar aos dois tratamentos anuais, tratando quando a varroa atinge os 3% de taxa de infestação?
Pois, qualquer semelhança com a realidade…
Notas: 1) não vou esquecer que são apenas simulações, não é a realidade. Mas é uma ferramenta mais que me ajudará a reflectir e até a planear de forma mais informada.
2) Será altura de se mudar o paradigma do PAN atribuir uma comparticipação para apenas dois medicamentos, que em muitos casos serão insuficientes para um efectivo controlo da varroose ao longo do ano. Só os meus dois cêntimos para a conversa!
Nesta publicação descrevo o caso dos tratamentos e monitorização de infestação que o meu amigo Marcelo Murta levou a cabo nas suas colmeias.
Da monitorização feita a 19 de julho obteve taxas de infestação a rondar os 8%, isto é 24 varroas por cada 300 abelhas. Utilizando o simulador do Randy Oliver para obter 24 varroas nessa data foi necessário partir do pressuposto de que as colónias entraram no ano com uma população de 180 varroas (simulei este valor porque não possuo dados reais da taxa de infestação anteriores a esta data; ver quadrícula “mite population”, no fundo à esquerda ).
Como descrito na publicação, o Marcelo fez um tratamento em finais de Julho para fazer baixar a taxa de infestação. No último dia de agosto fez uma segunda monitorização da taxa de infestação e os valores encontrados andavam em torno de 1% (3 varroas em 300 abelhas).
Como vemos da simulação em cima, mesmo com a elevada eficácia do tratamento de finais de julho, de outubro em diante o simulador apresenta valores superiores a 15 ácaros (ver valores azul no interior dos pequenos quadrados brancos), valor a partir do qual se observa um declínio no desempenho da colónia, em geral (Randy Oliver).
Em boa hora o Marcelo optou por fazer, nesse último dia de agosto, o quarto tratamento do ano, recorrendo ao ácido oxálico gotejado. De acordo com Randy Oliver é expectável este tratamento atingir uma eficácia entre 80%-95%, quando as colónias não apresentam criação operculada. Fiz mais uma simulação para contemplar este tratamento, como podem ver em baixo.
Sei que é intenção do Marcelo, fazer um 5º tratamento antes de finalizar o ano, até porque provavelmente terá uma taxa de infestação superior uma vez que não se verifica um ligeiro aumento de criação no outono, típico de um clima temperado do interior do país, mas um aumento de criação pronunciado, o típico no litoral norte e centro.
Finalizando com a questão do título, a resposta é que neste caso e neste ano muito provavelmente 4 tratamentos será curto para o Marcelo atingir as suas expectativas. E cada caso é uma boa fonte de reflexão, desde que não se façam generalizações apressadas. A partir deste não vamos concluir que de norte a sul e de este a oeste do nosso país sejam necessários os mesmos tratamentos e nas mesmas datas. Se for para generalizar apenas isto: 12 dias depois de cada tratamento monitorizem a sua eficácia e utilizem este ou outro bom simulador que vos ajude a tomar decisões informadas. Bom combate!
Simulador do Randy aqui: https://scientificbeekeeping.com/randys-varroa-model/
Nos três primeiros vídeos um apicultor galego apresenta-nos a sua experiência e conclusões dos efeitos alcançados com a utilização de cavalos de troia num ninho localizado no interior de uma habitação nos últimos dias de agosto.
O apicultor conclui que os troianos com fipronil não têm capacidade de eliminar os ninhos. No final confessa que esperava que os troianos com fipronil seria o suficiente para eliminar os ninhos. Neste ponto pergunto se as expectativas deste apicultor são realistas, isto é, podemos esperar realisticamente que libertar 175 troianos num ambiente com 6 ninhos activos os elimine por completo?
Nesta publicação, com dois anos, observou-se que cada velutina distribui o alimento por oito 8-10 irmãs. Sustentando e informado por estes dados escrevi: “Proposta quantitativa para a preparação de Cavalos de Tróia: Operando com esta média de distribuição de alimento por cada operária V. velutina, e sabendo que no pico de desenvolvimento dos ninhos existem cerca de 2000 a 4000 indivíduos adultos presentes, teremos que preparar entre 50 e 100 vespas se pretendemos eliminar 25% da população do ninho, entre 100 e 200 se o objectivo é eliminar 5o% da população do ninho, entre 200 e 400 se o objectivo é eliminar 100% da população do ninho.“
A terminar pergunto se as expectativas deste apicultor são realistas, isto é, podemos esperar realisticamente que libertar 175 troianos num ambiente com 6 ninhos activos os elimine por completo? Será que num ninho com 60 cm de altura, em excelentes condições de abrigo e em finais de agosto, não seria de esperar encontrar mais do que 1500 adultos e 150 larvas e uma a duas dezenas de futuras fundadoras? É de descartar um efeito letal dos troianos em parte da população adulta e larvas que explique estes números baixos? Será possível que todas as diminuições de predação que se relatam após a libertação dos troianos se devam à coincidência de acontecerem precisamente na altura de diminuição de criação?
Na minha opinião não encontro nos três primeiros vídeos evidências que os cavalos de troia não produzam efeito nenhum sobre os ninhos; encontro contudo aspectos que me fortalecem a convicção de que é necessário enviar uma grande quantidade de troianos para eliminar por completo um ninho, como já era minha convicção há dois anos atrás. Na minha opinião, a questão que cada um terá que responder para si, caso acredite nos efeitos desta técnica, é se o procedimento de besuntar o abdómen ou o tórax das velutinas será o mais prático para enviar o número suficiente de velutinas para que causem um grande dano no ninho ou ninhos envolventes aos nossos apiários.
No documento “Precios miel — campaña 2022/2023”, publicado em julho de 2023, encontramos, entre outros, os valores médios a que têm sido comercializados a granel os méis de meladas e multiflorais em Espanha até há uns poucos meses atrás. Desejando que de lá para cá os valores médios tenham subido, transcrevo em baixo o primeiro parágrafo do documento e apresento dois dos quadros lá constantes com a evolução dos preços nas últimas 3 campanhas.
“Respecto a, en primer lugar, las MIELES A GRANEL, en la primera que se analiz, la miel de mielada, se constata un inicio tranquilo de campaña, ya que se mantienen los precios en 4,33 €/Kg hasta prácticamente la mitad de la misma. A partir de septiembre, los precios muestran altibajos, de tal forma que los picos mínimo y máximo se encuentran en este período (los meses de septiembre y octubre registran el pico máximo ―4,22 €/Kg―, si bien, en el mes de febrero, alcanzando el final de la campaña, se registra el mínimo ―4,14 €/Kg―). Todo lo anterior se traduce en una variación del -3,42 % en el precio de la miel de mielada, si comparamos los dos puntos inicial y final de la campaña. Por su parte, la miel variedad multifloral muestra un comportamiento distinto, pues sus precios van en un aumento, ligero pero constante, hasta el mes de octubre, donde se registra un precio máximo de la campaña de 3,93 €/Kg, para terminar la campaña en un descenso, también ligero pero constante, anotando precisamente su precio mínimo al cierre de la misma (3,41 €/Kg). En este caso, la variación porcentual del precio de la miel multifloral a granel de la campaña 2022/2023 es del -3,76 %.”
A V. velutina, assim como as suas primas, a V. crabro e a V. orientalis, são vistas frequentemente sobre as flores.
O que procuram? Prioritariamente o néctar, para darem resposta à elevada quantidade de energia que os seus voos exigem. Como caçadores oportunistas que são não dizem que não à possibilidade de caçar um insecto ou outro mais distraído que tenha o azar de estar no local errado e à hora errada.
Contudo, se a procura dos néctares responde a essa necessidade primária ela é também essencial para responder a necessidades sociais destas espécies. Neste artigo, Continuous exchange of nectar nutrients in an Oriental hornet colony, (2022), podemos apreender alguns detalhes do processo de troca contínua, em loop, dos nutrientes açucarados num ninho de V. orientalis — a probabilidade de se passar o mesmo com a V. velutina é grande.
“A troca de nutrientes entre indivíduos adultos em insetos sociais é bidirecional, ou seja, podem ser doadores e receptores do mesmo tipo de alimento ou nutriente. […] Nas vespas sociais, as secreções larvais constituem um dos principais recursos alimentares dos adultos. As larvas de vespas são alimentadas com presas (artrópodes ou carne) coletadas pelos adultos e, em troca, as larvas devolvem aos adultos os produtos da degradação proteica na forma de uma secreção contendo carboidratos simples e aminoácidos livres (resultantes da gliconeogénese e da quebra de proteínas, respectivamente). […] Sugere-se que esta troca recíproca e unilateral de nutrientes (isto é, proteínas versus carboidratos e aminoácidos livres) e a consequente co-dependência nutricional entre adultos e larvas seja a chave para o estabelecimento da sociabilidade em Vespidae.
Apesar das vespas sociais serem ferozes caçadoras de insetos, os adultos também são frequentemente observados alimentando-se de néctar floral de uma variedade de espécies de plantas diferentes. A vespa asiática (Vespa velutina nigrithorax), por exemplo, foi observada alimentando-se de néctar floral de 27 espécies de plantas. Este consumo de néctar, no entanto, tem sido frequentemente caracterizado simplesmente como um comportamento oportunista, uma vez que a visita às flores também pode estar associada à caça de presas. As operárias adultas são voadoras fortes com uma taxa metabólica extremamente alta e alimentam seu metabolismo com uma dieta rica em carboidratos e aminoácidos livres encontrados no néctar e nas secreções larvais. Estas dietas ricas em carboidratos também podem proteger os músculos de vôo do stresse oxidativo derivado do alto desempenho aeróbico. A composição de macronutrientes das secreções larvais é análoga ao néctar das plantas visitadas pelas vespidae, embora geralmente seja mais rico em concentração e diversidade de aminoácidos. Ao contrário das operárias, as larvas necessitam de alimentos ricos em aminoácidos para sintetizar as proteínas necessárias ao seu desenvolvimento e são sustentadas por uma dieta altamente proteica. Como as larvas são alimentadas com presas e as secreções larvais são mais nutritivas para os adultos do que o néctar, por que razão as vespas também se alimentam de néctar floral?
[…] Também investigamos a importância do néctar para a sobrevivência da colónia. Nossos resultados revelam um papel importante do néctar na nutrição das vespas. Mostramos que os nutrientes do néctar são trocados num ciclo contínuo entre todas as diferentes fases da vida dos membros da colónia, desafiando o conhecimento predominante neste campo até o momento.”
Notas para levar para casa:
mesmo na designada fase proteica, os vespões adultos continuam a procurar fontes açucaradas;
a presença destes vespões nas flores explica-se pela procura de néctares e não exclusivamente por ali poder emboscar e caçar insectos;
se as larvas são alimentadas predominantemente com proteínas, os vespões adultos também lhes entregam nutrientes açucarados;
uma parte destes nutrientes açucarados, enriquecidos com aminoácidos, retornam aos indivíduos adultos através do consumo que fazem das secreções que as larvas produzem.
Na minha opinião estamos a atravessar, de há uns anos para cá, uma época de mudanças importantes no combate à varroa. Estas mudanças advém de dois aspectos documentados: existência de populações de varroas resistentes ao amitraz na Europa e a colonização e disseminação de uma estirpe mais virulenta de vírus no nosso continente. A juntar a estes dois factos junto um terceiro, que resulta da minha especulação e de outros apicultores informados: ao utilizarmos massivamente acaricidas que matam exclusivamente varroas na fase de dispersão (fase forética), fomos seleccionando as varroas com períodos mais curtos de dispersão, aquelas que mais adaptadas estavam para sobreviver à mecânica da maior parte dos acaricidas sintéticos e orgânicos que temos vindo a utilizar.
Nestes tempos de mudança e aumento de complexidade conheço basicamente três tipos de resposta dos apicultores para o controle da varroa:
1) os que acreditam que as mudanças biológicas e comportamentais das varroas e vírus não existem, que tudo é uma conspiração, que as varroas e os vírus continuam a ser os mesmos de sempre, apicultores cheios das certezas típicas da ignorância, e que vão falhar desastrosamente e silenciosamente, sem nunca assumirem que falharam nas suas opções e sem perceberem porque falharam;
2) os que percebendo as mudanças e que as soluções antigas estão a falhar querem mudar a sua estratégia, mas desejam alternativas milagrosas e estão apenas disponíveis para utilizar “receitas do tipo limão”, baratas e hiper-simples de utilizar. Parece-me que nunca lhes ocorreu pensar que se fosse assim tão simples já todos utilizaríamos essas “balas de prata”. Também estes, com a suas ilusões, vão falhar;
3) aqueles que estão conscientes das mudanças e que vão enriquecer as suas qualificações de combate e o seu arsenal de acaricidas. Estes assumem a necessidade de continuar a aprender e procuram conhecer o melhor possível o inimigo, as suas forças e fragilidades, e a sua evolução. Ao mesmo tempo procuram conhecer mais profundamente o potencial e as limitações dos chamados acaricidas suaves (orgânicos) e de medidas culturais (interrupção da criação, entre outras), para as introduzir numa estratégia mais inteligente e efectiva. Estes têm as melhores probabilidades de manter a varroose “at bay”.
Especulando, acho que nos dois primeiros grupos encontramos 80% dos apicultores europeus e 20% deles enquadro-os no terceiro grupo.
Para os apicultores do terceiro grupo sugiro lerem este bom artigo de revisão sobre a evolução da varroa, vírus e vantagens e limitações da utilização dos acaricidas suaves, publicado em 2021: Varroa destructor from the Laboratory to the Field: Control, Biocontrol and IPM Perspectives—A Review. Mais adiante conto fazer traduções de alguns excertos, para os que têm mais dificuldades com o inglês.
Desde 2009, quando iniciei a minha actividade apícola, até 2023, quando a interrompi, sempre me acompanharam as folhas de Excel, que ía preenchendo sempre que fazia uma compra ou sempre que fazia uma venda. No final do ano apícola, último dia de setembro para mim, fazia o encontro de contas para avaliar o maior ou menor sucesso financeiro alcançado no ano. Como apicultor profissional esta era uma ferramenta indispensável de registo — mais vale um lápis pequeno do que uma grande memória, P. Drucker —, de memória, de análise, de comparação, de previsão, de planeamento e de reflexão.
Esta publicação vem a propósito do artigo The Economics of Honey Bee (Hymenoptera: Apidae) Management and Overwintering Strategies for Colonies Used to Pollinate Almonds (2019), onde Gloria Degrandi-Hofman, reputada investigadora, e colegas concluem que contas bem feitas a rentabilidade que os apicultores profissionais retiram com o aluguer de colmeias para a polinização das amendoeiras na Califórnia é pouca ou nenhuma. Nas suas palavras “A key finding from our study is that there is little or no profit in renting colonies for almond pollination once summer management and overwintering costs are considered.“
Para mim esta conclusão é surpreendente por duas razões: 1) ou os apicultores profissionais norte-americanos não estão a considerar alguns custos (custos esquecidos, ocultos ou difíceis de quantificar) e andam a trocar dinheiro; 2) ou Gloria Degrandi-Hofman e colegas, apesar de terem feito os cálculos com colmeias reais (a amostra foi de 190 colmeias) e no terreno ao longo de 10 meses, tiveram despesas acima da média, em especial no maneio de verão e inverno.
Esta publicação reflecte a complexidade em fazer a “conta” anual na apicultura.
Nota: estou consciente que para alguns apicultores a rentabilidade que tiram da sua apicultura é pouco ou nada importante, para outros é medianamente importante e muito importante e determinante para outros ainda.
Na passada sexta-feira o Armando Monteiro convidou-me para ir aos seus dois apiários situados nas proximidades de Coimbra. Pretendeu 1) mostrar-me o efeito quase imediato das suas harpas combinado com a utilização de rede na redução da pressão das velutinas sobre as suas colónias de abelhas; 2) ajuda na medição da taxa de infestação por varroa em abelhas adultas.
Relativamente ao ponto 1) e começando pelo princípio, dizer que o Armando teve o cuidado de desligar as harpas cerca de uma hora antes de eu chegar ao seu apiário, para que pudesse ver ao vivo a rapidez da dissuasão das mesmas. Assim, quando cheguei ao apiário estavam 20-30 vespas a pairar nas proximidades das colónias, com as abelhitas paralisadas de medo no interior e entradas das colmeias. Ligadas as harpas observei rapidamente o seu efeito: velutinas “chocadas” de forma dolorosa (a dor tem um efeito aversivo sobre todos os animais) e até letal (muitas delas morriam ou ficavam com as asas queimadas) por aqueles fios. Após 10-15 minutos estarem ligadas, a presença de velutinas reduziu-se para próximo do zero.
Quanto ao ponto 2), depois de nos livrarmos das velutinas estávamos a abrir as colmeias passados cerca de 15 minutos a nossa entrada no apiário. O primeiro passo foi localizar o quadro onde andava a rainha nas colmeias que nos serviram de amostra. Esse quadro era posto de lado por momentos enquanto procedíamos à recolha de abelhas em quadros com criação. Das abelhas recolhidas e lavadas libertaram-se duas varroas, número que dá uma taxa de infestação de 0,6%.
O meu amigo Armando compara a mortalidade de colónias que teve o ano passado por varroose, cerca de 50%, com a mortalidade deste ano, 0%. Quando o questionei sobre o que estava a fazer de diferente este ano, referiu-me que no ano que corre decidiu introduzir um tratamento intermédio. De forma generosa disse-me que este blog o influenciou nesta mudança no regime de tratamentos deste ano.
Nota: 1) nesta publicação relato a experiência do meu amigo Fernando Moreira com as harpas e nesta outra a experiência do meu amigo Marcelo Murta com a monitorização da taxa de infestação por varroa em abelhas adultas.
Nestas publicações (aqui e aqui) apresentei uma técnica inovadora de aplicação do ácido fórmico por escovagem. O objectivo desta técnica é eliminar a varroa que se encontra na criação operculada das abelhas. Como sabemos, em colónias com criação, cerca de 70-90% das varroas estão na sua fase reprodutiva, a parasitarem as abelhas em formação (Rosenkranz, P., Aumeier, P., & Ziegelmann, B. (2010)). A protecção dada pelos opérculos é um factor limitante à eficácia de muitos dos acaricidas que utilizamos. O ácido fórmico, mais especificamente os seus vapores, é dos poucos acaricidas com elevado potencial nesta fase do ciclo de vida das varroas.
Os procedimentos básicos para a aplicação do ácido fórmico sobre a criação operculada por escovagem estão descritos nesta publicação e podem ser lidos com maior detalhe no artigo original aí e aqui referenciado.
No artigo podemos ler que eficácia desta técnica, avaliada pela mortalidade das varroas fundadoras e sua descendência 24 horas após a escovagem, se situa entre os 90 e 92%, para utilização de ácido fórmico com concentrações de 65% e 85%, respectivamente. A análise estatística revela que estas diferenças não são significativas, por esta razão concluo que não há vantagens em utilizar a concentração de 85%. Um aspecto que me parece revelante é o facto de os autores terem observado passadas 48h-72h após a aplicação da técnica que mesmo as varroas que ainda viviam após-24h, uma parte estava morta ou incapaz de se reproduzir.
Uma limitação desta técnica é o facto de não eliminar as varroas na fase de dispersão (fase forética). Os autores recomendam um novo tratamento com esta técnica passados 10 dias ou a utilização de um outro acaricida/técnica com efeito comprovado sobre os ácaros na fase de dispersão.
Acerca do impacto nas pupas e nas abelhas os autores escrevem: “In these experiments, all the honeybees that emerged from the treated brood were found active and healthy, the hive population and activity being normal during the whole period of experiments [2 anos].” Em poucas palavras, não encontraram efeitos negativos assinaláveis nas abelhas que emergiram após o tratamento. E acrescentam “Thus, in the brood protection perspective, the brushing procedure can be considered superior to the treatment in a closed space as the volatile substances will come in contact only with the capped stages of honeybee brood and the mites inside cells, while in treatment boxes all brood, including larvae and eggs are treated and open brood is clearly affected. Having an immediate result and being targeted only on the capped brood frames, the effect of any external temperature and humidity do not influence the results and procedures’ effectiveness as in the classical treatments with formic acids. More than this, by these new treatments we can avoid exposing the adult honeybees which are very sensitive to these substances, as their volatility is very high, increasing rapidly at high, external and nest temperatures.” Em resumo, esta técnica de aplicação do fórmico é mais segura para ovos, larvas e abelhas adultas, quando comparada com as técnicas tradicionais de aplicação do ácido fórmico.
Dito isto, num cenário hipotético, se fosse um apicultor confrontado com a elevada ineficácia de medicamentos homologados e/ou das formulações caseiras, não deixaria de experimentar esta técnica em 3 ou 4 colónias para a avaliar no meu território e com as minhas abelhas, com o objectivo de me preparar para um futuro que tudo aponta ser difícil e complexo.
Notas: 1) como muitas vezes mais é menos, se eu fosse aplicar o fórmico por escovagem não iria utilizar uma trincha de 25 cm de largura, e muito menos aplicá-lo com a trincha a escorrer. A aplicação deve ser só sobre a criação operculada e com o quadro ligeiramente inclinado para que alguma gotícula a mais caia para o chão e não para o interior de um alvéolo não operculado. Nunca me esqueceria que com este ácido o limiar entre matar o ácaro sem matar o hospedeiro é muito estreito. Não me esqueceria também de utilizar os EPI’s necessários na utilização de um ácido tão corrosivo.
2) Não estou a sugerir a aplicação deste tratamento por outros pois carece de homologação no nosso país. Estou a revelar o que se vai fazendo na Europa e no mundo para combater o primeiro e mais perigoso inimigo das abelhas. Espero que este olhar pelo que nos rodeia acalente em nós a esperança de que novas armas estão a ser preparadas para substituir e/ou complementar as actualmente disponíveis, que parecem não estar a acompanhar os ganhos de resistência do inimigo.